Um elefante incomoda muita gente

A Volkswagen recorre à força e ao companheirismo do animal para
anunciar o picape Amarok, que desafia os modelos tradicionais

Texto: Kleber Nogueira - Fotos: reprodução

O protagonista trata desde sua infância da elefanta Korama, seu meio de transporte para o trabalho, o lazer e até levar a mulher à maternidade

Quando Korama perde as forças, é hora da retribuição pela dedicação com que atendeu a seu dono: agora ela passeia na caçamba do Amarok

 

A Volkswagen, que jamais em sua história produziu um picape de porte médio — a não ser por algumas unidades de um antigo Toyota Hilux na Alemanha, nos anos 90, aos quais chamou de Taro —, estreia em um segmento disputado por marcas que têm longa tradição, como Toyota, Nissan, Ford e Chevrolet. A empresa alemã se arrisca em um projeto absolutamente novo, o Amarok, e sua estratégia de posicionamento do produto, em grande parte, é balizada por sua própria imagem de marca, constantemente autoassociada à robustez, e à apropriação de mitos do comportamento animal, também usuais na propaganda de automóveis.

Esse é um aspecto interessante a ser abordado no Amarok: a "ciência" da criação e escolha de nomes de marcas, conhecida em inglês por naming. Trata-se de um ramo muito restrito do branding (ferramenta de construção e gestão das marcas) e dominado por poucos profissionais no mercado. Um bom nome, um nome forte, coeso, marcante, é onde está quase toda a força de uma grande marca. Existem "regras" para a criação de bons nomes e todas elas contornam aspectos culturais, psicológicos, étnicos e outras tantas variáveis da sociedade, do comportamento e da mente humana.

A escolha do nome é um trabalho complexo e caríssimo, que dura longos meses até que se chegue às opções finais e, enfim, ao nome escolhido. Amarok, segundo o que a própria VW divulgou, significa lobo na língua de uma certa raça de esquimós. Mais uma vez a empresa apropria-se de características do comportamento animal e associa-as ao produto, como já fez com os nomes Fox (raposa), Lupo (que também significa lobo) e Pointer (uma raça de cão de corrida). Nomes de outras marcas como Corcel, Puma, Mustang e tantos outros buscam a mesma aproximação.

Ford e Chevrolet, antigas no mercado dos picapes médios e grandes, já são capazes de construir marcas em cima de seus próprios espólios. Isso é possível porque elas têm algumas dezenas de produtos na história e várias décadas no segmento. Graças ao estoque de "imagem" acumulado, podem autoproclamar-se com bordões do tipo "Pick-up Ford, raça forte". Já a VW, novata na categoria, sem tradição alguma num segmento onde a imagem de robustez é tratada com certo radicalismo, tenta associar seu novo produto a um animal — mas desta vez vai além da simples robustez ou valentia.

Como no lendário mundo de Marlboro, o clichê é ver os picapes associados a animais que exprimem atributos como a força e o instinto. Bichos fortes, xucros, agressivos e que precisam ser domados para se tornarem verdadeiramente úteis ao trabalho. Os cavalos, claro, são os queridinhos e aparecem em 10 entre 10 propagandas de picapes. E a realização do consumidor é projetar-se naquele que "doma" o "bicho".

A VW associa seu Amarok a uma elefantinha, chamada de Korama. E conta sua história na Índia, junto de seu dono, num filme de um minuto. Repare que o narrador ressalta os atributos físicos da elefanta, mas sempre associados a um atributo emocional. Quando Korama envelhece e deixa de carregar o dono nas costas, seu dono passa a carregá-la... em um Amarok.

Repare que Korama e Amarok são anagramas — leia um dos nomes de trás para frente e confira. Sim, eles são a mesma pessoa no filme e substituem-se como numa passagem de gerações. O Amarok não é apresentado apenas como um cavalo indomável, como as outras marcas associam seus picapes. Ele leva sua carga, sim, mas tem muito mais que isso: "sensibilidades" espalhadas em sua boa lista de equipamentos de conforto e conveniência, que o aproximam muito mais de um utilitário esporte, ou até de um automóvel, que de um picape.

Entre um cavalo selvagem e um elefante há uma grande diferença. E a arte da boa publicidade, aquela que constrói marcas líderes, reside justamente aí. Aquele que sente a diferença entre os dois animais é capaz de optar, no momento da compra, pelo produto correto. Que para a VW, naturalmente, só pode ser a "elefantinha" Amarok.

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Data de publicação: 31/8/10

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