|
As vantagens
Melhor ou pior, não
há como dizer da circulação por um ou outro lado. Ainda assim, alguns
pesquisadores apontam menores índices de acidentes nos países com "mão
inglesa". A razão, defendem, é que são mais comuns as pessoas com melhor
visão pelo olho direito — mais usado, nesses casos, para se ver o
tráfego contrário e o retrovisor externo antes de uma ultrapassagem.
Há outros argumentos a favor desse padrão. Quando gira o corpo para uma
manobra em marcha à ré, o motorista mantém a mão direita no volante, o
que é melhor para os destros. E, em relação aos ciclistas e
motociclistas, vale a teoria que em outros tempos aplicava-se aos
cavalos: como eles montam no veículo com a perna direita, no padrão
britânico podem fazê-lo a partir da calçada com o veículo na direção do
tráfego. Em contrapartida, o volante à esquerda faz com que a mão mais
habilidosa da maioria destra seja a usada para a alavanca de câmbio.
O fato é que as diferentes mãos criam dificuldades para fabricantes de
automóveis, motoristas e pedestres. A dimensão do assunto é maior do que
se imagina. O uso da "mão inglesa" afeta os cruzamentos, as rotatórias
(que funcionam em sentido horário), a sinalização das vias (em geral
colocada no lado externo, mesmo quando as mãos são separadas por
canteiro central), as ultrapassagens (leia
boxe sobre essa experiência). Mesmo quem não dirige precisa rever
hábitos: para atravessar, o pedestre deve olhar antes para a direita.
A situação agrava-se nas fronteiras entre países com sistemas
diferentes. Um caso típico é o da Tailândia, que circula à esquerda, mas
tem 90% de suas fronteiras com países de mão oposta. Foi para eliminar
essa fonte de problemas que muitos países trocaram de circulação no
passado. Antigas colônias inglesas na África passaram a rodar pela
direita, como as nações vizinhas colonizadas pela França. Mas em
Moçambique, ex-colônia portuguesa, roda-se pela esquerda, assim como nos
países ao redor colonizados pela Inglaterra. Taiwan e as Coréias do Sul
e do Norte mudaram de circulação esquerda para direita.
Há também casos de países e regiões com alteração temporária de tráfego
sob ocupação estrangeira. Nos anos 30 e 40, Áustria, Hungria e
Tchecoslováquia tiveram de abandonar a "mão inglesa" durante o domínio
alemão. No Japão, a região de Okinawa adotou a circulação à direita por
força da ocupação americana, após a Segunda Guerra Mundial, mas se
reverteu ao padrão do país quando ela cessou em 1978 — um caso raro de
duas mudanças no mesmo local.
É de se imaginar a complexidade de uma transição como essa. Na Suécia
dirigia-se pela esquerda, embora a maioria dos carros tivesse o volante
desse lado — o objetivo era maior controle em relação à extremidade da
pista em estradas estreitas. A confusão nas fronteiras com a Noruega e a
Finlândia (ambas com mão à direita) levou a um referendo, em 1955, mas
82% da população reprovou a idéia de mudança de mão. |
Mesmo assim, oito anos depois o parlamento sueco aprovou a troca. Houve
então o famoso Dagen H, o Dia H (de Högertrafik ou tráfego com mão
direita). Na madrugada do domingo 3 de setembro de 1967 o trânsito de
carros particulares foi impedido e, às cinco da manhã, os veículos
permitidos mudaram de lado nas ruas. Limites de velocidade mais baixos
vigoraram por cerca de um mês até que as pessoas se habituassem. Embora
a mudança de mão tenha reduzido os índices de acidentes por algum tempo,
eles voltaram ao habitual em dois anos, quando os suecos deixaram de
dirigir com o cuidado redobrado inerente à novidade.
Os carros
Quando se
trata dos automóveis, a principal conseqüência de haver dois modos de
circulação mundo afora é evidente: em caso de importação do carro ou
mesmo de seu projeto, pode ser necessário alterar a posição do volante e
de todo o sistema de direção.
É por isso que alguns países com mão à esquerda, que são minoria, impõem
restrições à importação de modelos com o volante do lado errado. Na
Austrália e na Nova Zelândia, só podem ter direção à esquerda carros
antigos, com mais de 20 anos no caso neozelandês. Os mais novos têm de
ser convertidos, um processo que não custa pouco. As restrições não se
aplicam a carros de turistas nos países que assinaram a Convenção de
Tráfego de Viena, de 1968, que prevê que o veículo deve atender à
legislação de onde foi registrado pela primeira vez.
Nas Filipinas é o contrário: proibida é a direção à direita, mas há
casos de vans importadas do Japão que permanecem com a porta dos
passageiros à esquerda, o lado da rua e não da calçada. Em países
sul-americanos como Bolívia e Peru, velhos carros japoneses rodam com o
volante trocado de lado, só que o painel inalterado fica diante do
passageiro... Por mais estranho que seja, deve prejudicar menos a
segurança no trânsito que a predominância de carros com volante à
direita (também comprados usados do Japão) na Rússia, onde a circulação
é por esse lado. O governo local já tentou banir os carros com direção
do lado errado (fontes indicam mais de 90% da frota em algumas regiões),
mas recuou diante dos protestos.
E na Itália, embora se andasse pela direita, até os anos 50 a Lancia
insistia em usar o volante "errado". A fábrica alegava que fazia carros
esportivos, para serem usados intensamente em estradas estreitas e
sinuosas, como nos Alpes. Assim, o controle da distância até a
extremidade da via seria mais importante que a facilidade de rodar na
cidade ou de fazer ultrapassagens.
Além da direção, há outros equipamentos envolvidos. Os faróis
assimétricos, os mais comuns no mundo hoje, têm maior alcance de facho
no lado externo da pista. Assim, a legislação européia exige que um
carro com volante oposto ao padrão local tenha algum tipo de correção
nos faróis. Alguns modelos, sobretudo os dotados de
lâmpadas de xenônio, já prevêem um modo
de inversão de facho para essa finalidade.
Continua |