Garoto-propaganda traz confiança

Para afastar o estigma das marcas chinesas e conquistar seu espaço
no Brasil, a JAC Motors investe alto em comunicação integrada

por Kleber Nogueira

Das marcas chinesas que tentam se estabelecer no Brasil, a JAC Motors talvez seja a que tenha a comunicação mais estruturada, até agora. Claro que montar a operação de um negócio automotivo não é algo fácil, rápido, tampouco barato, mas as conterrâneas da JAC não parecem demonstrar a mesma habilidade, ou podem não estar tão bem assessoradas.

A empresa, em si, e a média daquilo que oferece em termos de produtos e serviços não difere em nada de algumas de suas concorrentes chinesas, como Lifan e Chery — basta consultar os respectivos sites. Mas quero aqui fixar como parâmetro de comparação a Chery. Talvez porque as ambições de mercado e o tamanho da operação de ambas seja parecido, mas as estratégias de comunicação com seus públicos sejam distintas e, devo assumir, a JAC Motors, embora recém-chegada, está ensinando algumas lições básicas às conterrâneas e concorrentes.

A mente por trás da vinda da JAC ao Brasil é conhecida: o empresário Sérgio Habib, que consolidou a Citroën no País e ainda detém a maioria das concessionárias da marca. Sem dúvida a experiência de Habib contou, e muito. A estratégia que a JAC escolheu para estrear no mercado não é, exatamente, inovadora ou sensacional, mas denota um cuidado mercadológico que até agora não se viu nas marcas chinesas aqui.

Em primeiro lugar, o próprio Habib vem preparando a imprensa automotiva há mais de um ano para a chegada da JAC. A Chery igualmente fez isso, mas novamente a experiência de Habib fez a diferença. Carros da JAC, rodando em testes por meses nas ruas com placas verdes e sem logotipos, não tinham só a função de engenharia. São pequenas, mas poderosas armas de marketing. Eles alimentam especulações e ganham publicidade gratuita, pois inúmeras vezes os carros apareceram em fotos na imprensa e nas mídias sociais da internet. Além disso, passam a impressão de que, mecanicamente, chegarão mais preparados.

Na pesquisa que fiz sobre o histórico de imprensa da JAC Motors no Brasil e os testes de seus automóveis, são recorrentes as citações do empresário de que ele, pessoalmente, estava adaptando os veículos ao gosto do brasileiro, providenciando alterações mecânicas, estéticas e de acabamento. Busca, assim, diferenciar-se das outras chinesas que trazem ao Brasil carros iguais aos oferecidos por lá, com seus erros e acertos.

Escolado, ele conhece bem o papel que a imprensa automotiva brasileira tem na formação de opinião e sabe, igualmente, que o consumidor brasileiro é dado a aplicar pechas aos automóveis. Que o digam Fiat, na década de 1980, e os próprios franceses, que penam até hoje para eliminar a fama de manutenção cara e problemática. Por isso, assumiu para si o desafio de corrigir todas as falhas apontadas e, dando dia e hora para apresentar a solução, começa a mitigar o maior problema de que sofrem os veículos chineses aqui: a falta de confiança. É onde a marca atua para neutralizar suas fraquezas no "P" de produto.

Quando o assunto é o "P" da propaganda, percebe-se que a estratégia de comunicação para o lançamento da JAC é baseada, quase que inteiramente, na intenção de mitigar o desgaste de imagem que já vem de série nos carros chineses. O primeiro passo é manjado: a agência de propaganda tratou de escolher um bom garoto-propaganda que pudesse emprestar um pouco de sua credibilidade ao carro e à marca.

Limbo mental
A Ogilvy, dona da conta da JAC, usou um pouco do orçamento de R$ 70 milhões para 2011 e tratou de oferecer um ator conhecido de seu portfólio, Fausto Silva, que também oferece produtos de outros dois clientes da agência, Magazine Luiza e Claro. Lado bom: ver uma personalidade consolidada associada à marca diminui a insegurança do consumidor. Lado ruim: ele diz a mesma coisa de "n" outras marcas, de operadoras de telefone a bancos de varejo. Assim, a marca anunciada por ele fica num limbo mental do consumidor, misturada com muitas outras.

Mas, para quem é totalmente desconhecido, ser apresentado por alguém familiar já é um grande passo. Daí, tentam-se desesperadamente importar referências externas para conseguir um pouco mais de credibilidade, como dizer que o desenho é italiano e as peças são de conhecidos fornecedores como Bosch e Delphi.

Não importa o caminho escolhido: a JAC já está alguns passos à frente da Chery, que veiculou poucos anúncios em mídia impressa e, ainda assim, de tremendo mau gosto, carecendo de personalidade na identidade visual, o chamado "look-and-feel". Resumo: continua uma quase anônima, ao passo que a JAC sofreu um boom em suas 50 concessionárias no último fim de semana, no qual a propaganda de TV foi veiculada com Fausto Silva no comando.

Claro que os seis anos de garantia e o pacote de seguro, peças e revisões mais barato que o da concorrência ajudam a quebrar o gelo, mas a percepção de "unidade" conta demais. Visitei duas concessionárias da JAC em São Paulo e ambas, ao extremo, eram padronizadas visualmente. Lotadas de clientes, havia vendedores e assessores em boa quantidade e o material de apoio, como catálogos, era farto e bem feito. Os saguões são bem estruturados e os carros expostos têm apliques que indicam os elementos diferenciais ao visitante, como preço, equipamentos e tecnologia.

Fui atendido de forma cortês nas duas e os vendedores estavam bem preparados, usando uniformes pretos com a marca estampada, e sabiam direitinho a lição de casa. A única atrocidade foi uma vendedora dizer que o motor do J3 era "o mesmo usado no Corolla e Civic". Deixei a malícia de lado e procurei entender que ela se referia à tecnologia de variação do tempo de válvulas e não que tentava me ludibriar. A mesma funcionária me convidou para um teste e disse que desde o "Dia J", em 18 de março, já haviam vendido 12 unidades do J3.

Já as revendas Chery são um tanto desagregadas entre si. No saguão os vendedores se parecem com aqueles de lojas de carros usados: não conhecem muito do produto, nem são especialistas em vendas. Em uma revendedora no bairro na Vila Olímpia, o vendedor, um tanto descuidado no visual, me confessou que tinha um segundo emprego como promotor de festas e focou o assunto nisso. Em definitivo, não contribuiu para uma boa impressão da marca quanto a organização, foco e solidez. E o material de apoio trazia poucas informações e não era visualmente tão atraente e conciso.

Aguardaremos ansiosos pelo resultado da investida da JAC Motors. A empresa, ao menos pelo que sua comunicação integrada nos revelou até agora, parece ser a candidata aos primeiros louros entre as várias chinesas que aportam por aqui. É esperar para ver.

Para quem é desconhecido, ser apresentado por alguém familiar já é um grande passo. Daí, tentam-se importar referências externas.

 

Colunas - Página principal - Envie por e-mail

Data de publicação: 22/3/11

© Copyright - Best Cars Web Site - Todos os direitos reservados