Embora já tenhamos nos
referido a este assunto em outras consultas, Guilherme, é sempre bom
voltar ao tema para um melhor esclarecimento.
Para se conceituar torque e potência é preciso entrar com a noção de
trabalho realizado. Subir uma escada é um trabalho. Empurrar um carro
é um trabalho. Levar o corpo de um lugar a outro (andar ou correr) é
um trabalho. Com o motor é a mesma coisa. Ele faz um carro andar de
uma cidade a outra ou faz o veículo ir do litoral à montanha. Isso é
trabalho.
Não importa se o menor motor de 1,0 litro ou um gigantesco V10 de 8,3
litros do Dodge Viper, ambos farão exatamente o mesmo trabalho.
Pode-se perfeitamente considerar torque como trabalho, pois há uma
força envolvida que faz o motor produzir o trabalho que dele se
espera.
Agora a potência: é a menor ou maior rapidez com esse trabalho é
feito. Quem for capaz de correr mais rápido que outra pessoa tem mais
potência, muscular no caso. Ou gastar menos tempo para subir a escada.
O Dodge Viper certamente subirá a serra mais rapidamente que o carro
de 1,0 litro.
Essas duas grandezas, torque e potência, são usadas para "medir" o
motor. Ambas são obtidas por meio de um artifício, que é pôr o motor
para funcionar fora do carro num dispositivo feito para esse fim (o
dinamômetro), mantê-lo seguro por um freio enquanto funciona todo
acelerado, sendo a outra parte do freio é ligada a uma balança -- isso
mesmo, uma balança como a que se usa para pesar peixe, carne e outros
alimentos.
Só que entre essa outra parte do freio e a balança há uma certa
distância. Se não fosse assim, não haveria como fazer a parte do freio
exercer força na balança. Com a leitura em quilos da balança,
multiplica-se ela pelo comprimento do braço e temos aí o torque
medido.
Por exemplo, o motor exercendo a força de 10 kg por meio de um braço
de 1 metro significa que o torque é de 10 x 1 = 10 quilogramas x
metro. Essa unidade de torque por norma brasileira, que é igual à ISO
internacional, é m.kg. Mas, como se trata de força e não de massa, é
quilograma-força, daí a unidade que você lê no BCWS ser m.kgf.
A potência, como já foi dito, tem a ver com tempo. Ela também é medida
no dinamômetro, palavra que veio do grego, dynos (força) e
metron (medição). Uma vez no dinamômetro, observa-se a força
exercida e em que rotação do motor (rotações por minuto) isso ocorre.
Digamos que o motor esteja funcionando a 5.000 rotações por minuto
(rpm) e esteja "puxando'" 10 kg. A potência será de 5 x 10 = 50
cavalos-vapor (cv). Por que multiplicar por 5, e não por 5.000, é
questão de simplificação de fórmulas. Inclusive, esse tal braço que
vai do freio à balança sempre mede 0,7162 metro, o que explica tirar
os três zeros da rotação. E hp é abreviação de horsepower,
cavalo de força, unidade do sistema inglês de medidas.
Por definição, 1 cv é a potência necessária para levantar um peso de
75 kg a uma altura de 1 metro em 1 segundo. Portanto, 1 cv é igual a
75 kg.m por segundo (75 kg.m/s). O seu "torque" de 8 m.kgf daria para
efetuar o trabalho de levantar 8 kg a uma altura de 1 metro. Se isso
fosse feito em 1 segundo, sua potência seria de 8/75 = 0,106 cv. Se
fosse em 0,1 s a potência teria de ser de 1,06 cv.
Quando se aperta um parafuso como o da roda, exerce-se um torque, que
é a força aplicada na chave de roda, multiplicada pela distância entre
o ponto onde se aplica a força e o parafuso. Dobrando essa distância e
mantendo a força, o torque dobra. Ou então, para produzir o mesmo
torque anterior, a força só precisa ser a metade.
Nas várias rotações em que esses eventos -- torque e potência --
ocorrem seus valores variam. O torque sobe à medida em que rotação
aumenta, atinge um máximo e depois cai. Esse máximo é justamente o
torque máximo. A potência tem o mesmo comportamento, sobe com a
rotação -- mas vai atingir seu máximo (potência máxima) em rotação
acima da rotação de torque máximo. Também chega uma rotação em que ela
começa a cair.
Esses pontos -- de torque e potência -- são plotados num sistema
cartesiano (de dois eixos, o horizontal correspondente a rotação e o
vertical a torque e a potência), e traçam-se as curvas de torque e de
potência.
É importante entender que o motor produz torque a partir da combustão
da mistura ar-combustível, que gera uma grande pressão, resultando que
os pistões se deslocam e movimentam as manivelas dispostas numa
árvore, que por isso tem o nome de árvore de manivelas, também
conhecido por virabrequim (do francês villebrequin). A peça que
transmite o movimento dos pistões -- movimento retilíneo -- às
manivelas é a biela. Cada pistão tem a sua.
Como vimos antes ao falar do aperto de roda, a distância da mão para o
parafuso é crucial na questão de torque. Do mesmo jeito que o tamanho
da manivela na árvore de manivelas. Como maior a manivela (o raio da
manivela), maior o curso do pistão, temos que em princípio os motores
de curso longo têm mais torque do que os de curso curto.
Por outro lado, quando o curso é muito grande, a velocidade média do
pistão no cilindro torna-se elevada, impondo severos esforços a ele.
Por isso, é muito importante encontrar o termo ideal, que atenda ao
compromisso de torque e velocidade média do pistão, dentro de limites
que assegurem sua integridade (saiba mais).
Agora, o que tudo isso tem a ver com o carro que você dirige? Esqueça
o que se fala por aí, que "torque é para arrancada e potência é para
velocidade". Isso não tem nada a ver. Tenha em mente também que torque
e potência são grandezas que atuam em conjunto durante todo o tempo em
que se está usando um carro.
Sempre insisto em dizer que o que vale é o quanto de potência se
dispõe em baixas rotações. É claro que, para apresentar essa
característica, o torque do motor tem de ser necessariamente alto.
Observe que é possível muita potência com pouco torque,
mas nesse caso será preciso "arder" o motor o tempo quase todo, para
que essa potência elevada apareça.
Importante também avaliar a potência
específica, aquela em relação ao tamanho, à cilindrada do motor.
No estado atual da tecnologia, um motor de 65 cv por litro de
cilindrada é o máximo para se ter uma razoável elasticidade, isto é,
potência palpável em rotações baixas. Mas se um motor tem mais
cilindrada, digamos 4,0 litros, mesmo que tenha potência elevada em
alta rotação, em baixa ainda tem muita potência, podendo ser dirigido
normalmente, sem "arder".
Enfim, o tema é longo e sobretudo interessante, mas espero ter-lhe
dado um pouco de todo esse panorama. Quanto aos demais termos que você
gostaria de compreender melhor, constam de nosso
glossário, ao qual conduzimos o leitor
quando esses termos são citados em outros artigos.
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