Best Cars Web Site0

Bonzinhos demais

Enquanto os americanos protestam pelos novos preços da
gasolina, os brasileiros pagam mais caro sem reclamar

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editorNas últimas semanas, todos pudemos ver a reação dos americanos à alta de preços da gasolina. O tipo intermediário (mid-grade), o mais usado lá, subiu de US$ 1,58 para US$ 2,18 o galão (3,785 litros) nos últimos 12 meses (preços médios no país), conforme a American Automobile Association, um aumento de 38%. Surpreendidos, os motoristas protestaram muito e espalharam pela internet correntes com o fim de boicotar postos, de uma distribuidora por vez, para que elas se vissem obrigadas a conter os preços.

Enquanto isso, numa pobre nação do lado de baixo do Equador, as coisas são um pouco diferentes. A gasolina brasileira não é só gasolina (a quarta parte é álcool) e o tipo comum, que não contém os aditivos presentes na americana ("opcionais" por aqui), custava na semana passada em média R$ 1,85 na cidade de São Paulo, de acordo com a ANP, Agência Nacional do Petróleo. Nesta quarta-feira houve aumento de 1,5%, o que deve levá-la a perto de R$ 1,90 na média paulistana. Com o dólar a R$ 3,16 na mesma data, o preço dos EUA corresponderia aqui a R$ 1,82 o litro.

Isso mesmo. Entre dois países com renda per cápita tão diferente, mesmo após os sucessivos aumentos que geraram tantos protestos por lá, nossa gasolina ainda é mais cara que a dos americanos. O brasileiro é mesmo muito bonzinho, como se dizia num programa humorístico de TV anos atrás.

Fica fácil entender como a Petrobrás obteve, no ano passado, o maior lucro de sua história de 50 anos (R$ 17,8 bilhões), com aumento de 120% em relação a 2002, uma cifra que impressiona. É que o reajuste dos combustíveis se dá em cima de duas variáveis: o preço do petróleo no mercado internacional e a cotação do dólar. E, embora o valor da moeda americana tenha despencado durante o ano passado e o petróleo não tenha subido na mesma proporção, praticamente não se viu redução de preço nos postos. Continuamos pagando caro — muito caro — para abastecer os cofres da estatal cada vez que entrávamos num posto.

Aqueles que consideram o automóvel um bem supérfluo, um meio de transporte de luxo, alegam que seus proprietários podem bancar o preço. Concordar com essa teoria é ignorar o enorme impacto que o custo dos combustíveis gera na economia do País. Além dos transportes de carga e de passageiros, baseados em sua maioria em veículos a diesel (que também não ficou menos caro), é nos automóveis que se apóiam importantes segmentos econômicos, da indústria que o produz ao turismo.

O preço injustificável da gasolina explica o rápido crescimento da procura pelos modelos flexíveis em combustível, já que o álcool hoje custa pouco mais da metade da gasolina, em São Paulo (já considerado o aumento desta semana), e seu rendimento por litro é apenas cerca de 30% menor. Mas, como os usineiros de bobos não têm nada, já começam a impor aumentos a passos largos. É a reprise de um velho filme.

Com o petróleo em alta lá fora e o dólar passeando por perto dos R$ 3,20, a Petrobrás já revelou que pretende subir o preço dos combustíveis caso esse patamar não se reverta a médio prazo — apesar de produzirmos aqui mais de 90% do que consumimos. A mesma sistemática de preços que foi esquecida durante o ano passado, quando não interessava à estatal, volta a ser razão para aumentos.

Enquanto os americanos protestam, nós assistimos passivos à perspectiva de uma mordida ainda mais dolorida a seus bolsos. Até quando?

Atualidades - Página principal - Envie por e-mail

Data de publicação: 29/5/04

© Copyright - Best Cars Web Site - Todos os direitos reservados