Não é novidade para
ninguém que a indústria automobilística — como qualquer empresa hoje
— persegue a redução de custos. O problema que vou abordar nesta
edição é a má economia, o corte de despesas que traz mais
desvantagens que benefícios.
Caso típico: estepe. Sabemos que ele representa custo, peso e espaço
muitas vezes desperdiçados, pois há quem não precise dele por todo o
período de uso do carro. Só que tem sido freqüente — à medida em que
rodas e pneus de serviço se tornam mais largos, sofisticados e caros
— adotar um estepe de medida diferente dos demais pneus, mesmo em
carros de preço elevado.
Além da evidente restrição em seu uso (o motorista terá de dirigir
de maneira mais moderada, às vezes por distância limitada, caso do
Vectra Elite com rodas de 17 pol e estepe de 15 pol), surge outro
problema. Um pneu sobressalente assim nunca poderá substituir outro
em caráter permanente, como ao se fazer rodízio ou comprar, para
reposição, apenas um em vez do par. O comprador paga, portanto, por
um estepe destinado a rodar poucos quilômetros ou nem isso. Se fosse
igual aos demais, o custo inicial seria compensado já na primeira
troca de pneus.
Há outras economias que incomodam pela dificuldade em ser
revertidas. Um pára-brisa com faixa degradê custa pouco a mais que
um sem a faixa, mas é bem menos agradável num país ensolarado como o
nosso. Para o fabricante, redução de custo ínfima; para o cliente,
despesa elevada se quiser trocá-lo por um degradê — isso se existir
no mercado. Faixa de película escura pode fazer a mesma função, mas
perde muito no aspecto estético.
No começo da década havia insistência de algumas marcas em vender
carros — e não os mais simples — com toca-fitas, às vezes item de
série, em vez de toca-CDs. Era sair da concessionária e trocar o
aparelho, jogando dinheiro fora. Hoje acontece o mesmo com a função
MP3, ausente de vários equipamentos de
áudio (caso, até bem pouco tempo, do Focus GLX e do pacote mais equipado do
Fiesta). Quem quiser ouvir esse formato, que faça adaptações ou
substitua o aparelho de série, cujo custo foi incluído no do carro.
Outras economias afetam a conveniência de tal modo, que é difícil
entender as razões do fabricante. Banco traseiro rebatível tornou-se
padrão nos sedãs de 10 ou 15 anos para cá, a ponto de ser
inaceitável não existir em um Corolla XEi — só no SE-G, ou seja,
redução de custos — ou em algumas versões do Classic da GM. Controle
de iluminação dos instrumentos e ajuste elétrico do facho dos
faróis, cada vez mais raros, fazem falta em muitos casos quando se
viaja à noite.
Controle elétrico dos vidros sem
temporizador é inaceitável sob qualquer análise. Tampa de
porta-malas que exija o uso da chave, em carro com travamento
central das portas, também. E por que o teto solar do Vectra Elite
não acompanha o fechamento centralizado dos vidros? Trava-se o carro
e, se o teto tiver sido esquecido, é preciso religar a ignição para
a tarefa.
Itens de segurança também são alvos freqüentes de cortes de custos,
o que não deveria acontecer. Repetidores laterais das luzes de
direção, que são baratos, não equipam vários modelos nacionais que
os têm em outros países ou nas versões de topo. A importante luz
suplementar de freio é tratada como acessório de luxo, apesar do
custo irrisório. E a Ford chegou ao absurdo de dispensar, no Fiesta
nacional, os refletores no pára-choque traseiro — os que vêm nas
lanternas são altos demais para refletir faróis e sinalizar o
veículo estacionado.
O leitor pode perceber que não tratamos aqui da "depenação", o
lamentável processo pelo qual alguns carros perdem recursos de
tempos em tempos. Os itens que citamos costumam faltar já no
lançamento do modelo ou da versão, por definição do fabricante de
que não são necessários.
Em meio aos exemplos, alguns vão me lembrar do marcador de
temperatura do motor — e aqui sou obrigado a discordar. Este
mostrador, hoje, é calibrado para indicar determinado ponto durante
toda a operação normal do carro, sem refletir pequenas oscilações de
temperatura. O ponteiro só se desloca quando o motor aquece além do
limite seguro e o motorista deve parar o carro — o mesmo ponto em
que acende a luz-piloto, presente sempre que falta o mostrador. De
resto, uma segunda luz para indicar a fase fria (durante a qual o
motor não deve ser usado plenamente), como no Honda Fit, supre por
inteiro a ausência do termômetro.
Mas é um caso à parte entre tantos, e estou certo de que os leitores
terão mais exemplos. Os fabricantes se justificam da mesma forma que
na historinha da companhia aérea que, por medida de economia,
decidiu usar só meia azeitona em cada empada servida aos
passageiros. Os centavos poupados por empada tornaram-se alguns
milhares de reais no faturamento anual da companhia, mas,
confrontados aos bilhões do faturamento, esses milhares pareceram
apenas... centavos. |