Na semana final do teste prolongado, conjunto mecânico da versão Shine Pack THP é analisado em detalhes
Texto: Felipe Hoffmann – Fotos: autor e Fabrício Samahá
Os testes de desempenho e estabilidade foram o destaque da quarta semana do Citroën C4 Cactus Shine Pack THP no teste Um Mês ao Volante. Foi feita também a gravação da análise técnica em oficina, que será publicada em alguns dias. O carro fecha nossa avaliação com o uso de álcool em ciclo urbano por 381 quilômetros na semana com média de 7,5 km/l. A pior marca, de 5,9 km/l, foi em uma curta viagem de 4,5 km à média de 22 km/h pelo bairro, enquanto a melhor marca de 9,4 km/l foi atingida em 17 km com 38 km/h de média num horário de pouco movimento em São Paulo. A diferença entre a bomba e o computador de bordo foi de apenas 0,9% (melhor número no painel), mostrando que o carro realmente é econômico.
É chover no molhado dizer que o C4 Cactus possui um excelente desempenho, já que seu grande diferencial na categoria é o motor THP, apto às melhores acelerações entre os SUVs compactos que já testamos. Comentamos aqui como é consistente sua resposta em baixa rotação e que, com isso, há menor necessidade de reduções de marcha. O resultado é um carro bastante agradável, sobretudo para quem tem na vivacidade do motor uma de suas prioridades na escolha.
Vivacidade do motor turbo de até 173 cv é um ponto alto do mais novo Citroën nacional
A transmissão oferece, além do modo normal, os botões Eco e Sport para os programas econômico e esportivo. No modo Eco as trocas de marchas ocorrem bem cedo, mantendo o motor perto de 1.300 rpm (o painel mostra 1.000 rpm; leia sobre o conta-giros) ou até menos, em condução moderada, e usa o método de carga até certo ponto. Afinal, motor turbo tem um limite para trabalhar com carga alta: pressão de turbo mais elevada necessita de excesso de combustível para resfriar as câmaras de combustão.
No caso do C4 Cactus isso não é um grande problema. Primeiro porque o motor THP dá conta em muitas situações de movimentar o carro ainda na fase aspirada, ou seja, sem o turbo atuar. Com o instrumento de aquisição de dados Race Capture Pro, nota-se que a pressão dentro do coletor fica sempre perto de 100 kPa, ou seja, pressão ao nível do mar, o que dispensa o excesso de combustível. Ao acelerar a fundo o motor “enche” o turbo em vez de pedir uma redução de marcha, mesmo porque há certo tempo para que tudo se aqueça — ainda mais em rotação tão baixa —, o que permite à central evitar o excesso de combustível.
Contudo, ao se pegar uma ladeira que demande maior pressão de turbo por certo tempo, a central reduz a marcha. Como se trata de exigência de potência prolongada, impor rotação mais alta é preferível a impor excesso de combustível, visando ao melhor consumo. Os senões do modo Eco são o aumento do ruído de aspiração e um “boom” vindo do escapamento entre 1.500 e 2.000 rpm, muito notado para quem vai no banco traseiro. Tais ruídos se acentuam com cargas e torques mais elevados, algo que em Eco é mais corriqueiro. O “boom” no escapamento pode ser proposital, pois não incomoda e traz um tom de esportividade.
Transmissão automática mostrou calibração bem acertada, oferece três programas de uso e, curiosamente, admite saídas até em terceira marcha
Há também, em situações de retomadas mais fortes, um certo retardo pelo fato de a transmissão ter de pular mais marchas, ou seja, deve esperar o motor ganhar rotação para realmente acelerar. Por exemplo, em modo Normal, numa determinada situação se está em quinta marcha enquanto em Eco se está em sexta. Ao exigir a retomada a transmissão tem de pular para quinta, para fornecer a resposta que o motorista exigiu, coisa para a qual no modo Normal ela já estava preparada. Outra diferença é nas descidas: no modo Normal há reduções de marchas para gerar freio-motor.
E o modo Sport? Como é habitual, as rotações são mantidas em regimes mais altos, fora da faixa em que poderia haver maior retardo de ação do turbo. Além disso, há reduções com aceleração interina quando se freia mais forte, como ao entrar em curvas. O sistema se adapta tão bem que dispensa trocas manuais pela alavanca e ameniza, em boa parte, a falta de comandos no volante. No fim, o comportamento da transmissão é muito bom em todas as situações.
O motor THP dá conta de movimentar bem o carro mesmo sem o turbo atuar; ao acelerar a fundo, o motor “enche” o turbo em vez de pedir redução de marcha
Quando se fala em retardo de turbo, alguns devem estranhar, pois o motor tem torque máximo de 24,5 m.kgf já a 1.400 rpm. É preciso entender que esse valor se refere ao turbo “cheio”, operando na máxima pressão definida para aquela condição, e que existe um retardo até o valor ser alcançado. Também não se pode confundir rotação de torque máximo com retardo de turbo. Em hipótese, pode-se ter um turbo minúsculo que “enche” em rotações baixas, mas com rotor de grande inércia e circuito de pressurização longo, o que leva a retardos maiores.
Uma manobra explica melhor a característica. Conforme o gráfico a seguir, a 60 km/h em sexta marcha no modo manual apertamos o pedal a pleno (100% indicados na linha verde) por volta do ponto de 52 segundos. De forma quase que instantânea, a pressão no coletor de admissão (sensor MAP, linha vermelha) saiu de 20 kPa para 92 kPa, a pressão atmosférica durante o teste. Ou seja, a borboleta fechada criava vácuo e, no momento em que abriu por inteiro, a pressão no coletor se equalizou com a atmosférica. A rotação estava um pouco abaixo de 1.250 rpm.
Com a transmissão em marcha alta, demorou para o carro ganhar velocidade. Levou cerca de 7 segundos (de 52,5 s até 59,5 s, zona amarela) para a pressão no coletor sair da atmosférica e chegar à pressão de trabalho do turbo, de 160 kPa ou 0,6 bar relativos. Isso mostra que mesmo turbos pequenos, com circuitos de pressurização pequenos, sofrem retardo em baixas rotações. Claro que com transmissão automática tal efeito é escondido, pois ou se destrava o conversor de torque, para ganhar rotação e o turbo encher mais rápido, ou se reduz marcha. Com caixa manual, dificilmente o motorista exige resposta forte numa rotação tão baixa. No fim, com 1.500 rpm o turbo já havia atingido seu máximo de operação — um retardo muito menor que nos turbos da década de 1990.
As medições de aceleração apontaram outros pontos. Ao realizar a manobra de estol chega-se a ter dificuldade de segurar o carro com os freios, de tanto torque que chega às rodas pela multiplicação do torque pelo conversor. É verdade que os freios não são tão grandes, mas encontramos o mesmo efeito visto no Volkswagen Polo TSI: em freadas progressivas se sente a necessidade de maior esforço no pedal que o normal, mas se o sistema reconhece como freada de emergência, há um auxílio com aumento de pressão na linha de freio que amplia em muito a ajuda no pedal. Como na manobra de estol essa ajuda não é empregada, cabe ao motorista apertar bem os freios.
E poderia haver ainda mais torque: há uma restrição que impede o turbo de encher, para não sobrecarregar a transmissão, pois a central restringe a pressão no coletor a 100 kPa. Mesmo assim, ao liberar os freios o C4 Cactus sai com vigor, destracionando os pneus, e obtém 0,55 g de aceleração — perto do limite para um carro de tração dianteira. Os resultados foram muito bons: 0 a 100 km/h em 7,9 segundos e 0 a 400 metros em 15,7 s. Curiosamente, apesar do uso de álcool, ele foi menos rápido que o carro testado antes com gasolina, que fez em 7,7 e 15,5 s, na ordem.
Próxima parte
No gráfico de aceleração, acima, nota-se que a pressão de turbo (MAP, linha vermelha) não cai mesmo acima de 6.000 rpm, revelando que o turbo não se “estrangula” em alta — para alegria dos donos que quiserem aumentar a pressão de trabalho. Percebe-se também que a temperatura de admissão (IAT, linha amarela) ganha 28°C do início ao fim da arrancada, apesar de em uso cotidiano ficar 3 ou 4°C acima da temperatura ambiente. Esse aumento é oriundo da compressão do turbo, que esquenta o ar, e do uso de resfriador de ar relativamente pequeno. O ganho, porém, está dentro do tolerável. O sistema do Polo TSI mantinha o ar 25°C acima do ambiente, não importando a condição, uma desvantagem no uso cotidiano.
A transmissão do Citroën permite sair não apenas em segunda, mas até em terceira marcha em modo manual. Saindo a pleno em segunda (gráfico acima) os tempos de aceleração se mantiveram, assim como a perda de tração. Isso mostra que, com motor forte, o uso de conversor de torque e menos marchas pode trazer os mesmos resultados. Afinal, não se gasta energia do motor para fazê-lo ganhar rotação muito rápido e se evita perda de tempo com troca de marchas.
Já em terceira marcha os tempos pioram para 9,3 e 16,6 s, na ordem. Nessa manobra se veem nitidamente, no gráfico acima, o intervalo no qual o conversor patina (rotação praticamente constante entre 3 e 5 s na linha preta) e o ponto em que atua o bloqueio do conversor e a rotação passa a subir de forma linear, após 5 s. Em saídas com acelerador parcial, a terceira faz lembrar o comportamento de uma CVT. Algo que aumenta a sensação de desempenho é o leve “tranco” durante as trocas de marcha: há uma breve interrupção na aceleração e depois um leve pulo.
A aceleração lateral foi boa para a proposta e sua categoria, sobretudo ao se levar em conta a suspensão macia: superou Creta e Kicks, embora atrás do HR-V
No teste de aceleração lateral o C4 Cactus se mostrou bom para a proposta, com controle de estabilidade permissível (pode ser desligado, mas acima de 55 km/h volta a ligar), permitindo que o motorista solte mais a frente ou a traseira nas curvas. O valor de 0,91 g é bom para sua categoria, sobretudo ao se levar em conta a suspensão mais focada no conforto. Foi melhor que o Hyundai Creta Sport 2,0 (0,88 g) e o Nissan Kicks SV 1,6 (0,84 g), embora não tão bom quanto o Honda HR-V EXL 1,8 (0,96 g). Faltaram melhor apoio lateral melhor nos bancos (o autor precisou se apoiar na alavanca do freio de estacionamento em curva à esquerda) e alças de teto para os passageiros.
Apesar da boa atitude em curvas, em altas velocidades o carro passa a sensação de ser mole, tanto em movimentos verticais quanto em laterais, devido a buchas dos braços de suspensão macias e focadas ao conforto. O motor THP parece potente demais para a suspensão, mas em momento algum ele passa a impressão de que vai se perder. Uma calibração mais firme, se ajudaria em tais situações, sairia do foco do carro.
Apesar da suspensão macia, o C4 Cactus revelou boa capacidade de curvas; nas portas dianteiras, a ponta sem dobra de chapa pode provocar ferimentos
Por fim, um ponto que chamou atenção da pior forma: o acabamento da chapa da porta dianteira, na parte inferior, não possui canto arredondado. Parecia mero detalhe até estacionarmos em via inclinada e, ao descer do carro, a mola que segura a porta não sustentar seu peso, fazendo-a fechar na perna do motorista. Mesmo com calça jeans, o autor ganhou um “friso” na panturrilha de sair sangue. Como ficam as mulheres de meia-calça que, na hora de descer, possam esbarrar nessa ponta e rasgá-la?
O C4 Cactus termina nosso mês de teste com boas impressões mecânicas — desempenho, consumo, acerto de transmissão — e pelo conforto de rodagem, sobretudo em rodovia. Além de limitações do projeto, como a capacidade de bagagem, há alguns pontos de fácil correção pela Citroën: aplicar alças de teto e luz de cortesia para o banco traseiro, corrigir o citado acabamento da chapa das portas, melhorar o isolamento térmico da longarina traseira e adotar um ar-condicionado mais potente para nosso clima.
Semana anterior
Quarta semana
Distância percorrida | 381 km |
Distância em cidade | 381 km |
Distância em rodovia | – |
Consumo médio geral | 7,5 km/l |
Consumo médio em cidade | 7,5 km/l |
Consumo médio em rodovia | – |
Melhor média | 9,4 km/l |
Pior média | 5,9 km/l |
Dados do computador de bordo com álcool |
Desde o início
Distância percorrida | 1.810 km |
Distância em cidade | 1.418 km |
Distância em rodovia | 392 km |
Consumo médio geral | 12,1 km/l (gas.) / 8,9 km/l (álc.) |
Consumo médio em cidade | 12,1 km/l (gas.) / 7,6 km/l (álc.) |
Consumo médio em rodovia | 11,0 km/l (álc.) |
Melhor média | 16,6 km/l (gas.) / 11,2 km/l (álc.) |
Pior média | 5,8 km/l (gas.) / 5,9 km/l (álc.) |
Dados do computador de bordo |
Equipamentos de série
• C4 Cactus Shine Pack THP – Alarme volumétrico, alertas de saída de faixa e desatenção do motorista, ar-condicionado automático, assistente de saída em rampa, banco traseiro bipartido 60:40, bancos revestidos em couro, bolsas infláveis laterais dianteiras e de cortina, câmera traseira de manobras, central de áudio com tela de 7 pol e integração a celular, chave presencial para acesso e partida, computador de bordo, controlador e limitador de velocidade, controle de tração ajustável Grip Control, controle elétrico de vidros com função um-toque para todos, controle eletrônico de estabilidade e tração, faróis de neblina, faróis e limpador de para-brisa automáticos, fixação Isofix para cadeiras infantis, luzes diurnas de leds, monitor de pressão dos pneus, monitor frontal com frenagem automática, retrovisor interno fotocrômico, rodas de alumínio de 17 pol, volante ajustável em altura e distância, volante de couro.
• Opcionais – Pacote Plus (retrovisores cromados, frisos laterais, organizador de porta-malas, antena curta), pacote Security, (sensor de estacionamento traseiro, protetor de cárter, rebatimento do retrovisor direito em ré), pacote Tech (como o Security mais tapetes de carpete), pacote Voyage (barras de teto transversais, porta-bicicletas Thule Freeride).
• Garantia – Três anos sem limite de quilometragem.
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 77 x 85,8 mm |
Cilindrada | 1.598 cm³ |
Taxa de compressão | 10,2:1 |
Alimentação | injeção direta, turbocompressor, resfriador de ar |
Potência máxima (gas./álc.) | 166/173 cv a 6.000 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 24,5 m.kgf a 1.400 rpm |
Transmissão | |
Tipo de caxa e marchas | automática, 6 |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a disco |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 17 pol |
Pneus | 205/55 R 17 |
Dimensões | |
Comprimento | 4,17 m |
Largura | 1,714 m |
Altura | 1,563 m |
Entre-eixos | 2,60 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 55 l |
Compartimento de bagagem | 320 l |
Peso em ordem de marcha | 1.214 kg |
Desempenho (gas./álc.) | |
Velocidade máxima | 212/212 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 7,5/7,3 s |
Consumo em cidade | 10,4/7,2 km/l |
Consumo em rodovia | 12,6/8,9 km/l |
Dados do fabricante; consumo não disponível |