A versão "de produção" deste carro apareceu um ano depois, como 350 GT, com carroceria da Touring, de Milão. Parece que Ferruccio não ficou muito contente com o episódio do motor e com o estúdio Bertone... Mas voltaria a contratá-los. Quanto ao 350 GT, embora fosse um carro muito bom, realmente superior aos Ferraris da época, consta que a empresa perdia quase 2.000 dólares por unidade vendida. Ferruccio exigia que seu carro fosse mais barato que os Ferraris, mas não deixava ninguém economizar na qualidade.

O Miura   Naqueles dias, tudo na Lamborghini era decidido por três pessoas: Lamborghini, Dallara e Stanzani. Tudo em conversas informais de três entusiastas, numa prática que hoje tem o nome de brainstorming. Os três viviam bolando novos carros e às vezes eles aconteciam. Foi a fase áurea da empresa, e durou até o lançamento do Countach em 1974. 

Numa dessas conversas, Dallara expôs seu genial conceito de motor central traseiro, disposto transversalmente e com a carcaça do câmbio e diferencial fundidos em um bloco só com o motor, para obter-se um conjunto compacto, e por conseqüência um entreeixos razoável (sempre um problema nesse tipo de veículo). Já no Salão de Genebra de 1965 mostravam um chassi pronto com esse conceito. Bertone já estava encarregada de desenhar a carroceria. 

É difícil tentar explicar o que foi o Lamborghini Miura em seu lançamento. Ferraris usavam molas semi-elíticas (iguais às de carroça) e eixos rígidos traseiros. Somente carros de competição eram tão avançados. E o estilo do bicho... Para muitos, nunca mais houve carro que combinasse suavidade e agressividade como ele.

Ferrucio levou o primeiro Miura ao Grande Prêmio de Mônaco de 1966, onde -- dizem os locais -- nenhum carro até hoje causou tanto furor. Lamborghini estacionou-o na frente do famoso cassino, e de hora em hora, saía das mesas de jogo para ligar o carro e acelerar forte, ensurdecendo o local com o urro bestial do V12. A galera delirava... E o pragmático Bob Wallace balançava a cabeça, inconformado com o abuso infligido a sua criança e com o ilógico temperamento latino de seu chefe.

Dirigir o Miura era uma experiência única. Carro para macho, tem câmbio, direção, embreagem e freios de acionamento pesado, mas altamente moduláveis e sempre melhoram se usados com vontade. O motor é instalado a milímetros das costas do motorista e funciona como se aparafusado a seu crânio. O urro ensurdecedor do V12 provocado vem sempre acompanhado de um empurrão contra o banco, até hoje só igualado pelos mais caros esportivos.

O último Miura, modelo SV, tinha 385 cv e pesava apenas 1.200 kg. Chegava a 280 km/h. Após dirigi-lo, um entusiasta invariavelmente saía suando, tremendo sob o efeito da adrenalina, quase moído pela vibração e barulho, mas louco para dar outra volta. Por isso, podemos entender o famoso ator Nicolas Cage, dono do mais caro Miura já vendido (um dos três SVs existentes, que pertenceu ao Xá da Pérsia), que já disse: "Quem precisa de cocaína quando se tem um Miura na garagem? Um vício autodestrutivo só já basta." 

O único defeito que se conhece do Miura é sua famosa tendência a levantar vôo em altas velocidades. A linda carroceria tinha certa sustentação aerodinâmica na dianteira. Mas, quando apareceu o SV em 1968, o problema já havia sido praticamente solucionado com sutis mudanças no nariz do carro. De qualquer forma, o problema só aparece depois dos 240 km/h. E, contrariando seus detratores (Ferraristas invejosos), não era necessário brevê de piloto para comprar um Miura... Continua

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