

O Typ 12 construído pela Zundapp,
em cima, e o Typ 32 da NSU: propostas anteriores projetadas por Porsche
já esboçavam as formas do que se tornaria o Volkswagen



Um protótipo conversível,
o chassi do V1 visto pela traseira e o V3: a receita mecânica do Fusca,
simples e resistente, começava a passar pelos testes do governo |
Volkswagen... Poucas vezes um nome representou um produto com tanta
clareza, honestidade e profecia. A palavra alemã significa carro do povo
— seja povo no sentido de população ou no de classe trabalhadora. Se foi
para o povo alemão que ele foi criado, foram os povos de vários países
que o consagraram como um dos projetos mais bem-sucedidos — em termos
tecnológicos, comerciais e culturais — da indústria automobilística
mundial no século 20. Dentre esses, nenhum alcançou a popularidade e o
carisma daquele automóvel alemão com perfil de besouro.
Não se explica o êxito do Fusca em poucas palavras. E, ainda assim,
todos parecem compreender que ele não poderia ter alcançado outra
trajetória. Ainda hoje é controverso o cenário e o contexto em que
nasceu o projeto. A Alemanha perdera a Primeira Guerra Mundial em 1918.
Não havia emprego, o dinheiro valia praticamente nada na hora de comprar
alimentos, a aquisição de um carro era um sonho distante para a grande
maioria dos alemães.
A indústria
automobilística do país em que o automóvel nasceu enfrentava uma
iminente falência com a crise mundial, desencadeada pela queda da Bolsa
de Nova York em 1929.
A idéia do carro de baixo custo para motorizar o país já existia até
antes disso. Em 1904 a Bergmann Company havia produzido um exemplar do
Volksauto. Discorria-se sobre a necessidade de um veículo
nesses moldes, e o conceito era tratado como Kleinauto ou Kleinwagen
(carro pequeno), Jedermansauto (carro para cada um) e até Volkswagen.
Foi este último nome que ganhou mais força.
O desafio de criar um carro popular ganhou novo impulso nos anos 20,
quando o veículo mais utilizado na Alemanha era a motocicleta.
Os
alemães eram os líderes mundiais em veículos de
duas rodas, com marcas como Zündapp, BMW, DKW e NSU. Ainda assim, o país
era um dos menos motorizados da Europa. Se
havia um carro para cada 100 alemães, a proporção na França era de um
para 28 habitantes e nos Estados Unidos já era de um para seis, mérito
que deve muito ao Ford Modelo T
e à produção em massa estabelecida por seu criador, Henry Ford.
Embora carros ainda fossem artigos de luxo na Alemanha, a tradição da
engenharia do país onde o automóvel nasceu era inegável. Entre os
profissionais mais destacados dessa área estava o engenheiro de origem
austríaca Ferdinand Porsche (leia boxe). Na
década de 1920 ele já tentara desenvolver um pequeno automóvel na
Mercedes-Benz, mas sua idéia não foi bem recebida. Em 1931, Porsche
fundou sua empresa de engenharia em Stuttgart e um dos primeiros
projetos foi o de um automóvel desenvolvido desde o princípio como um
modelo pequeno, não um carro maior encolhido. Era o Typ (tipo em alemão)
12.
O preço
de uma oportunidade
O projeto Typ 12 foi levado à Zündapp e surgiram três protótipos, mas o fabricante de motocicletas
logo o abandonou. Porsche então levou proposta equivalente à NSU, o Typ
32 ou Volksauto. Outros três protótipos nasceram dessa associação, até
que também a NSU desistiu de ter um compacto criado por Porsche, em
1933. Pouco depois, um compromisso em Berlim mudaria os rumos de Porsche
e seu sonho de criar um carro popular alemão. Ao sair do encontro, ele
teria o mais forte incentivo que poderia conseguir para deslanchar seu
projeto no país. Era uma audiência com o recém-eleito chanceler Adolf
Hitler.
O líder do terceiro Reich queria criar o carro do povo alemão e a idéia
de Porsche vinha ao encontro desse propósito. Por outro lado, Hitler
trouxe também uma grande limitação: o preço. O carro deveria custar
menos de mil marcos imperiais, além de ter espaço para quatro
passageiros, capacidade de viajar à velocidade constante de 100 km/h,
vencer rampas de até 30% e
rodar 14 km/l de combustível em
média. Mesmo a contragosto pela questão do objetivo de preço, Porsche se
viu obrigado a aceitar.
Com o contrato assinado em 1934, o engenheiro investiu em equipamentos que produziriam os primeiros protótipos. O verdadeiro desafio seria alcançar as metas
estabelecidas pelo governo no prazo estipulado. Não houve jeito: o tempo
previsto acabou se revelando bem aquém do que Porsche precisava. Motores
a dois e quatro tempos e com dois, três e quatro cilindros foram
avaliados, mas vingou a última opção, em disposição contraposta (boxer)
e refrigerada a ar. A carroceria já seguia os padrões arredondados e
suaves da tendência de busca pela aerodinâmica, nascida naquela época.
Continua
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