A presença do VW em competições começou antes mesmo de ser
produzido. O carro precisava ser divulgado o suficiente para
atrair o interesse do público para o plano de poupança criado
pelo governo nacional-socialista. Uma das maneiras de
consegui-lo foi apresentando dois sedãs na subida de montanha do
Passo Grossglockner de 1938, antes da prova propriamente dita.
Os pilotos? Ninguém menos que o próprio Ferdinand Porsche e seu
filho Ferry. Os carros fizeram uma grande exibição, obtendo a
média horária de 36 km/h, e levaram os espectadores ao delírio.
A estratégia dera certo.
Carros de corrida com potência até 26 vezes maior conseguiam
média de 65 km/h, o que dá uma idéia da dimensão do desempenho
do VW, ainda com motor de 985 cm3. Todavia, Arthur Railton, no
livro The Beetle – A Most Unlikely Story (Fusca - Uma
História bem Improvável), comenta que os Porsches dominavam
preparação de motores, inerente a sua atividade, e que na
ocasião houve bastante ceticismo quanto àqueles motores serem
normais, sem modificação.
O fato é que a demonstração deu enorme retorno de imprensa. Isso
teria agradado bastante o Führer Adolf Hitler, que teria ficado
imensamente grato aos Porsches pai e filho, no sentido de
eclipsar o carro que os alemães mais desejavam então, o
"americano" Opel.
Diz a história, na continuação, que quando Ferry Porsche
construiu o 356, em 1948, o motor de 1.086 cm3 produzia elevados
(para a época) 40 cv, graças a cabeçotes com as válvulas de
escapamento em ângulo. Teriam sido usados nos dois sedãs para a
apresentação no Passo Grossglockner? Tudo indica que sim.
No Brasil, o Fusca começou a aparecer nas corridas de turismo em
1953. Na concessionária Rio Motor, do Rio de Janeiro, alemães
que lá trabalhavam como Buby Kistman, gerente de assistência
técnica, e Harald Gessner, gerente de vendas, apresentavam-se
nas corridas de rua com seus VW de motor 1100, bem como alguns
particulares, como Gabriel de Novaes. Mas o desempenho sempre
era sofrível.

O primeiro grande momento do Fusca nas pistas foi na primeira
Mil Milhas Brasileiras, em novembro de 1956. O carro, um 1952 de
vidro traseiro bipartido, foi pilotado por Christian Heins e
Eugênio Martins (acima) e chegou em segundo depois de liderar por mais
de 10 horas. Perdeu para a dupla gaúcha Catharino Andreatta–Breno Fornari (com uma carretera Ford) devido à quebra do cabo
do acelerador, a 11 voltas do final da corrida — e longe, na
curva 3, obrigando Christian a vir lentamente para o boxe. Cabo
trocado, voltou à pista, mas não houve mais tempo para alcançar
os gaúchos.
Mas esse Fusca tinha algo muito especial para andar tanto:
virabrequim, bielas, cilindros, pistões e cabeçotes de Porsche
1500 Super, com dois carburadores Solex duplos de 40 mm. A
potência era bem alta, 74 cv a 5.000 rpm, e podia ser esticado
até 7.000 rpm. Só foi possível usar "miolo" de motor Porsche
porque o regulamento exigia que o bloco fosse da marca do
veículo, mas não que fosse do mesmo ano. Naquele tempo, a
Porsche usava carcaça de motor VW. O regulamento estava
atendido.
Seria necessário esperar até 1967, quando o motor do Fusca
passou de 1200 a 1300 e recebeu alterações profundas na
carcaça e acionamento de válvulas. Então começaram a aparecer kits de cilindros e pistões de 85,5 mm de diâmetro, o que
elevava a cilindrada para 1.600 cm3. |
Ao mesmo tempo começaram a ser vendidos os kits de dois
carburadores de 32 ou 40 mm e resultou que os Fuscas passaram a
ser muito rápidos. Antes, com motor 1200, não havia muito o que
fazer em termos de aumento de cilindrada, restringindo-se as
modificações aos kits Okrasa,
alemão, e Denzel, austríaco, ambos para 1.300 cm3.
De esporádica, a participação do Fusca em corrida incrementou-se
quando em 1964 o comando do automobilismo brasileiro passou para
Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA), fundada em 1961,
após uma interminável e épica disputa judicial pelo mando do
automobilismo com o Automóvel Club do Brasil. Com a CBA vieram
grandes mudanças nos regulamentos técnicos e foi criado o
Turismo Especial Brasileiro, Divisão 3, em que os motores podiam
chegar a 1.600 cm3 e passar por grandes modificações —
carburadores duplos de grande diâmetro, escapamento de escolha
do preparador, entre outras liberalidades.
Dali em diante, a presença do Fusca nas pistas chegou a um
número impressionante. Mesmo hoje se mantém elevado em alguns
estados, como São Paulo e Rio Grande do Sul, com campeonatos
monomarca de nome Speed 1600. Houve corridas, no início dos anos
70 em Interlagos, de largarem 60 Fuscas Divisão 3.
Foi nessa década, mais para o final, que surgiu o Fusca bimotor
dos irmãos Fittipaldi, com dois motores 1600 acoplados por uma
junta elástica de borracha Giubo e montados em posição
central-traseira. Para todos os efeitos, era um motor de 3.200
cm3 e oito cilindros. O carro andava muito, mas sempre teve
problema de embreagem, que não agüentava o torque em torno de 25
m.kgf. A potência superava 320 cv.

O Fusca também foi usado em ralis (acima um modelo no
Trans-Chaco, no Uruguai). Chegou a vencer o Safári
africano em 1953, 1954, 1957 e 1962, além do rali Kristall em
1971. Mas aqui era mais usado em provas de regularidade. Quando
o rali de velocidade impôs-se, de 1984 para cá, o Fusca já
estava no ocaso e havia carros mais rápidos como Passat, Gol e
Chevette. Para o Campeonato Brasileiro de Rali de 1986, a área
de competições da VW esboçou usar o Fusca na equipe oficial, mas
a diretoria de marketing foi contra, pois internamente o carro
já estava com a sorte decidida. Pararia de ser produzido naquele
mesmo ano.
Teria dado certo? Muitos acham que sim, inclusive o colunista do
Best Cars Bob Sharp, na época o responsável por
competições na VW. "O fato de ter motor e tração traseiros, mais
a brecha no regulamento chamado Grupo B Brasil — que permitia
usar carburadores duplos em modelos que saíssem de fábrica com
dois carburadores simples —, teria feito toda a diferença frente
aos outros carros", conta.
Deve ser lembrado que, embora desprovida de carroceria e chassi
originais, a mecânica do Fusca foi largamente usada nos
monopostos Fórmula V e Fórmula Super V, que brilharam por três
anos e fizeram pilotos da estirpe de Émerson Fittipaldi e Nélson
Piquet. |