Alguns ainda devem se lembrar: em 10 de fevereiro no ano passado publicávamos neste espaço
(leia) minha opinião sobre a proposta, comentada à época, de unificar as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados, IPI, entre carros com motor de até 1.000 cm3 e acima.
O texto concluía-se com uma nova proposta: 10% para motores até 1,0 litro, 15% para a faixa de 1,0 a 1,6 litro e 20% para os maiores, sem distinção entre aspirados e superalimentados. E questionava se haveria coerência para ver nessa escala uma boa
solução para a questão.
Um ano e meio depois, só posso constatar que a coerência existiu. Governo federal e Anfavea, a Associação dos Fabricantes de Veículos Automotores, chegaram a um escalonamento de alíquotas
(saiba mais) muito parecido com o que
sugeri.
As diferenças são poucas. Uma, a cilindrada que separa as duas faixas superiores: decidiu-se por 2,0 litros em vez de 1,6, talvez por influência de alguns fabricantes que têm produtos relevantes acima desta cilindrada, como o Civic 1,7 na Honda e o Corsa 1,8 na General Motors. A outra diferença são pequenas distinções nas alíquotas, como 14 e 16% para os motores intermediários, em vez de 15%, e 9% para os 1,0 a álcool, contra 10% da proposta. A maior disparidade está na manutenção dos 25% para motores a gasolina acima de 2,0 litros, alíquota muito alta a
meu ver. Poderia cair para algo como 22%.
Curiosamente, o carro a álcool não foi contemplado com as mudanças, pois apesar de novo incentivo de 1 ponto percentual nos 1,0-litro, caiu de 5 para 2 pontos percentuais na imediatamente superior. Na última classe,
em que o incentivo é de 5 pontos, não há versão a álcool hoje e é improvável que algum fabricante vá
desenvolvê-la.
Alguns poderiam desejar que os motores até 1,0 litro deixassem de receber estímulo, por se tratar de limite muito baixo -- considerando-se aspiração
natural, é claro --, alegando nossas condições de tráfego desfavoráveis em muitas regiões. De fato, mesmo os mais potentes motores 1,0 aspirados deixam a desejar no torque em baixas rotações, para muitos,
e requerem relações de marcha curtas demais para mascarar essa característica, prejudicando o conforto em rodovias e levando a consumo de combustível maior do que seria possível.
Seria ingênuo, no entanto, esperar que a própria Anfavea propusesse a extinção do benefício aos
1,0. Constituiria tiro no pé das marcas que mais desenvolveram essa cilindrada recentemente, como a Volkswagen e a Ford. Por outro lado, com uma diferença de 6 pontos percentuais (entre versões a gasolina, a partir de novembro), contra 15 pontos até então, é previsível que motores 1,6, 1,8 ou mesmo 2,0 tornem-se competitivos diante dos limitados 1,0. Num futuro breve, talvez
o mercado volte a ter na faixa de 1,6 litro sua maior fatia, como nos anos 80 -- com a vantagem de que essa cilindrada hoje rende de 100 a 110 cv, contra 70 ou 80 cv da época.
Ao contrário do que alguns podem pensar, a arrecadação do imposto federal poderá aumentar ligeiramente, mesmo que a produção anual estacione em 1,5 milhão de unidades para o mercado interno. Em um pequeno exercício de estimativa de redistribuição do mercado, imaginemos passar da atual 70-20-10% (referente a até 1,0 litro, de 1,0 até 2,0 e acima de 2,0) para 40-50-10%, com preços médios hoje de R$ 15/28/40 mil caindo para R$ 13/24/40 mil.
O fisco estaria no
lucro -- por pouco, mas estaria. Agora, se a produção subir, como sempre ocorre quando o governo abre mão de parte da sua parte...
Portanto, chegamos enfim a uma legislação típica de mercado europeu no que se refere às alíquotas de imposto. Degraus mais suaves entre as categorias, nada de limitações de potência (lembra-se das barreiras de 99 e 127 hp, que levavam fabricantes a ocultar os cavalos adicionais?) e, quem sabe, a oportunidade de ter motores melhores na faixa
intermediária, em função do esperado aumento da demanda.
Bem que falamos.
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