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Os irados da estrada

Não são os carros "tunados" do vocabulário juvenil, mas um
problema sério: os motoristas que perdem a paciência

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editorNa semana passada, a caminho de São Paulo para Pindamonhangaba, tive uma má surpresa ao tomar a via Dutra, ao final da Carvalho Pinto, já na região do Vale do Paraíba. Apesar do cuidado habitual que tenho em acessos a rodovias, percebi por uma buzinada intensa que devia ter fechado outro carro, um Kadett, que trazia a bordo alguns tipos não muito simpáticos.

Eu não estava a menos de 100 km/h ao assumir a faixa da estrada (há uma razoável pista marginal para aceleração) e o Kadett não aparecia no retrovisor esquerdo biconvexo, de ótimo campo visual, da Renault Scénic que eu dirigia. Talvez ele viesse bem acima do limite de velocidade (110 km/h no caso); além disso, já era quase noite e seus faróis estavam apagados. O fato é que aquele motorista se irritou e passou a vir atrás da Scénic, de faróis altos e tentando ultrapassar pela direita quando eu já estava na faixa esquerda, mantendo o melhor ritmo que o tráfego da rodovia permitia. Acabei me afastando do Kadett impondo uma velocidade que seu motorista, por alguma razão, deixou de acompanhar.

O incidente, que felizmente terminou por ali sem maiores conseqüências, me levou a trazer o tema a este Editorial. O que presenciei foi uma pequena parte do que em inglês se tem chamado de road rage, ou ira da estrada. As atitudes típicas de um motorista acometido por esse problema começam em gestos e buzinadas excessivas, passam por perseguições e fechadas e, em alguns casos, chegam à violência física e ao uso de armas. E o que desperta essa ira muitas vezes é algo banal e sem riscos à segurança — algo como a gota d'água que faz transbordar a taça, que no caso é a paciência de alguém já abalado por outros fatores.

E como prevenir esse tipo de situação? Uma vez que não é possível conhecer o perfil psicológico de outros motoristas, saber se estão em seu juízo normal ou se têm passado por estresse, algumas dicas podem ajudar muito:

> Redobre a atenção em toda mudança de faixa (o que inclui sair de sua pista para ultrapassar) de modo a ter certeza de não fechar outro veículo. Sinalize sua intenção, olhe os retrovisores e procure ouvir o tráfego abrindo parte do vidro. Esta é uma das causas mais comuns de violência por motociclistas nos grandes centros, pois eles se deslocam rápido pelos corredores entre os carros.

> Deixe livre, tanto quanto possível, a faixa ou as faixas da esquerda. Rodar no limite de velocidade da via não autoriza ninguém a ser dono da faixa, que só deve ser usada para ultrapassagem.

> Mantenha sempre velocidade compatível com o tráfego. Vêem-se muitos motoristas lentos demais, seja passeando distraídos, seja falando ao celular, seja por receio e inexperiência — tenho visto isso com grande freqüência na descida de serra de Campos do Jordão, SP, onde esse tipo de condutor gera longas filas e muita irritação. Se quiser ou precisar andar devagar, mantenha a atenção: dê passagem e sinalize a quem vem atrás para que ultrapasse se for o caso. Da mesma forma, não obstrua o tráfego para conversar, pedir informação e coisas do gênero: faça-o sempre fora da via.

> Na situação inversa, em que o motorista à frente é que está lento demais, peça passagem com a seta esquerda ou piscando brevemente os faróis altos (evite-os à noite, porém). Nada de "colar" no outro carro ou exagerar nos faróis e na buzina. Se ultrapassar, faça-o com tranqüilidade e não ofenda o motorista lento — até um olhar de reprovação pode despertar a ira. Também não queira "punir" quem força a ultrapassagem de vários veículos e acaba entrando à sua frente por não a completar: em geral o motorista não quis incomodar ninguém ou colocar a segurança dos outros em risco. E você não sabe as razões de quem está dirigindo com pressa.

> Tenha paciência com condutores de veículos pesados. Um motorista de caminhão não vai querer perder o embalo para evitar que você perca o seu, pois a retomada dele é bem mais lenta. No caso de frenagem a situação é pior, pois ela requer muito mais espaço que a de um carro: fechar um caminhão é uma aposta em problemas.

> Seja cortês nos menores detalhes. Peça passagem; agradeça a quem lhe facilita algo no trânsito; não dispute vagas de estacionamento; só use faróis e luz traseira de neblina enquanto houver nevoeiro; deixe o farol alto para as estradas desertas; apague os baixos se estiver ofuscando quem está no sentido contrário, como ao parar em certos cruzamentos e, sobretudo, se precisar estacionar no lado oposto da via; não use adesivos cujas mensagens possam irritar outras pessoas.

> Peça desculpas se fizer algo errado. Um aceno ou leve buzinada pode ser o bastante para encerrar a questão de maneira pacífica. E em hipótese nenhuma responda a uma ofensa: a coincidência de humores é muitas vezes o que estimula o motorista nervoso a persistir.

> Às autoridades, o colunista Bob Sharp deu ótimas sugestões em coluna sobre o mesmo tema, publicada há dois anos. Comandos policiais, manifestações, obras e interrupções de tráfego em geral devem ser feitas com critério para minimizar os prejuízos aos motoristas.

A ira da estrada não vai acabar com essas medidas, mas pode diminuir bastante, um objetivo que interessa a todos.

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Data de publicação: 23/7/05

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