Depois de vender apenas
820 unidades no ano passado, ante uma previsão inicial de 10.000
anuais, a Volkswagen decidiu puxar a tomada do sedã de alto luxo
Phaeton no mercado americano. Se em outros países o topo de linha da
empresa tem conseguido algum êxito, nos Estados Unidos foi um tremendo
fiasco — embora os compradores de usados já vejam com euforia a
possibilidade de ter um a preços tentadores, depois da imensa
desvalorização absorvida pelo primeiro proprietário.
O que há de errado com o Phaeton, a ponto de ter sido apelidado por lá
de Phantom (aparição, fantasma) por ser tão difícil de ser visto nas
ruas? No veículo em si, nada: é uma variação do projeto do atual Audi
A8, com uma infinidade de itens de conforto e conveniência, potentes
motores de oito e 12 cilindros (as únicas versões oferecidas nos EUA)
e preço sugerido de US$ 66.700 a US$ 101.300, pouco abaixo do próprio
A8.
A questão é, sem dúvida, de imagem. Depois de meio século vendo
Volkswagens como simples meios de transporte ou, quando muito,
honestos carros familiares — casos do Passat e do Jetta — e acessíveis
esportivos — como o Golf GTI —, seria mesmo difícil convencer os
americanos de que a marca pode oferecer o prestígio esperado por quem
gasta tanto dinheiro em um automóvel. Nessa classe, o logotipo
ostentado na grade (ou acima dela) vale algumas dezenas de milhares de
dólares. Sem um nome que fale por si, que diga aos passantes que ali
está alguém especial, um bom carro perde muito de seu apelo.
O fator imagem afeta também outros segmentos. Esta parece ser a melhor
explicação para o começo tímido do novo Renault Mégane, que tem
vendido cerca de 500 unidades mensais, contra mais de 3.000 do Honda
Civic, que disputa a mesma categoria. Uma situação ainda mais incômoda
ao se notar que, enquanto a novidade da marca japonesa tem sido
vendida com sobrepreço (leia editorial), a dos
franceses é oferecida cerca de R$ 3.000 abaixo do preço sugerido pelo
fabricante.
Sem entrar na análise dos produtos, que cabe ao comparativo a ser
publicado em breve no Best Cars, é fácil perceber que o novo
Civic chegou amparado em um prestígio adquirido por três gerações
anteriores, desde o início de sua importação em 1992. Já a Renault,
embora tenha oferecido os (bons) modelos argentinos 19 e Mégane de primeira
geração desde a mesma época, nunca conseguiu grande penetração nesse
mercado. Assim, o novo carro tem de abrir caminho por si próprio — e
logo em um momento de efervescência da categoria, que não pára de
receber lançamentos. É provável que consiga estabelecer-se com
sucesso, mas não será de imediato.
Outro caso bem ilustrativo foi o do Mercedes-Benz Classe A. Chegou ao
mercado brasileiro em 1999 e despediu-se no ano passado, com um total
de vendas — pouco mais de 60 mil — pouco maior que o volume pretendido
por ano pela DaimlerChrysler. Embora tenham influído fatores
alheios à empresa (como a desvalorização do real meses antes do
lançamento, que elevou em 50% o custo de elementos importados e pagos
em dólar), fica a sensação de que o fabricante superestimou o valor da
estrela de três pontas que vinha na grade. Cheio de qualidades, o
carro nunca foi bem compreendido pelos brasileiros e ainda hoje divide
opiniões no mercado de usados: elogiado por uns pela qualidade de
construção, criticado por outros pelo custo de manutenção. Em parte é
fato, mas em parte apenas imagem.
Seria possível alegar que os casos citados decorreram do risco natural
de apostar em novos mercados, de estender os tentáculos da marca a
segmentos ainda inexplorados. Pode ser, mas o que dizer do sucesso do
Porsche Cayenne, lá fora e também aqui (foram vendidos respeitáveis 41
no Brasil em junho)? Um fabricante que nem sequer produzia um carro de
quatro portas resolveu partir logo para um utilitário esporte, à custa
de muitas críticas dos puristas e de boa parte de seus fãs. A
diferença é que havia uma demanda reprimida por um SUV da Porsche: os
clientes que colocavam na garagem, ao lado de um 911 ou Boxster, um
utilitário de outra marca.
Portanto, o quadro é mais complexo do que parece. Se a questão da
imagem da marca não for bem considerada, um lançamento que às vezes
surge como ótima idéia pode se revelar um grande desperdício de
recursos. E, por ironia, um prejuízo à própria imagem do fabricante. |