Esta semana um amigo
veio me contar, animado, sobre uma suposta promoção da General Motors:
Astra Advantage com câmbio automático e bolsas infláveis por R$
43.490. Embora ciente de que hoje todos querem vender em meio a uma
guerra de preços, estranhei. Primeiro porque, salvo engano, esse preço
até outro dia referia-se ao carro básico, sem aqueles opcionais. E
segundo porque, afinal de contas, seria barato demais.
Respondi a ele que deveria haver engano, mas ele insistiu: "A
propaganda cita os equipamentos e dá o preço. Deve ser isso mesmo.
Veja lá no site da GM". Diante da controvérsia, fui verificar. O que a
publicidade — na internet assim como na televisão — faz é relacionar
os itens agora disponíveis como opcionais nas versões Advantage
de quatro e cinco portas, e fechar com o preço do modelo de três
portas, que não os oferece. Na verdade, com bolsas infláveis e caixa
automática, o Advantage cinco-portas vai a R$ 52.990 — 21% a mais que
o preço anunciado com tanta ênfase.
Expliquei a estratégia a meu amigo, que até o fechamento desta edição
ainda não concordava com que estivesse sendo iludido... Ele tem razão
em sua insistência: a pequena janela do site traz caracteres ilegíveis
(veja abaixo uma reprodução em tamanho real) onde devem estar
as observações habituais — sobre os itens citados serem opcionais ou
exclusivos de outra versão, não a Advantage três-portas. Quem não tem
visão de Super-Homem só vai conseguir lê-las se clicar sobre o
anúncio, abrir outra janela, assistir a mais uma animação publicitária
e então clicar sobre o item preço. Assim aparecem, por cerca de
um segundo, as tais observações. É quase impossível chegar a elas. Eu
só consegui por orientação da central de atendimento da GM, após pedir
esclarecimentos como um consumidor comum.
O anúncio, portanto, realmente pode gerar dúvida. Se não leva a crer
que os R$ 43.490 incluam tais opcionais — embora o amigo tenha suposto
isso —, ao menos deixa a impressão de que ambos estão disponíveis para
a versão cujo preço é informado, a Advantage três-portas.
A
campanha provavelmente não chega a configurar propaganda enganosa,
pois a empresa pode alegar que, ao clicar no item preço da
segunda animação, o consumidor é informado das ressalvas. No entanto,
a empresa no mínimo age de forma desrespeitosa ao consumidor quando
deixa ilegível, na primeira animação, uma observação tão importante.
O caso do Astra pode ter ido mais longe, mas — justiça seja feita —
não é o primeiro nem será o último a se usar desse artifício. Nestes
50 anos da indústria automobilística brasileira, tornou-se comum
informar na publicidade os numerosos opcionais disponíveis, muitas
vezes ao lado de um preço convidativo, até que se encontra em letras
miúdas a ressalva de que alguns itens são opcionais... ou mesmo todos
eles. Se a propaganda passa na TV, a observação normalmente não pode
ser lida, a não ser que seja gravada e a imagem congelada. Quando
muito.
Se estivéssemos na terra da matriz da GM, porém, a situação seria bem
outra. Nos Estados Unidos não se passa nem perto dessa ousadia. Quando
o anúncio contém o preço básico e a foto mostra o carro com opcionais
— rodas de alumínio, por exemplo —, não basta a menção de que alguns
itens podem ser cobrados à parte: é informado o preço sugerido do
veículo como foi mostrado. Uma manobra como a vista no anúncio do
Astra seria inconcebível por lá.
A publicidade no Brasil, não resta dúvida, evoluiu desde a entrada em
vigor do Código de Defesa do Consumidor em 1990. Mas casos como o de
meu amigo, que acabou sem poder comprar o Astra completo por R$
43.490, mostram que ainda temos um longo caminho a percorrer. |