Dias atrás estive com um
carro especial: um Chamonix Speedster, réplica nacional da versão
mais despojada do Porsche 356 da década de 1950, feita em Jarinu, SP
com mecânica Volkswagen de 1,6 litro "a ar". Sem entrar no mérito de
o que o pequeno conversível oferece pelo que custa — questão que
fica para a avaliação a ser publicada em breve —, o fato é que ele
me deu uma certeza: carros fora-de-série, como são conhecidos, são
um prazer para os entusiastas por automóvel.
Quem viveu os anos 60, 70 e 80, ou se interessa pelos carros daquele
período, sabe como esses pequenos construtores tiveram espaço para
criar e se desenvolver no Brasil. Ainda nos primeiros 10 anos de
nossa indústria surgiram propostas como o Brasinca 4200 GT/Uirapuru,
com motor de seis cilindros dos caminhões Chevrolet, e o DKW Malzoni,
com a mecânica a dois tempos dos carros da Vemag, cuja linhagem
evoluiria para os modelos com motor VW arrefecido a ar e depois a
água.
Nas décadas de 1970 e 1980 os fora-de-série se multiplicaram.
Surgiram modelos com desenho esportivo, mas em geral limitados em
desempenho pela mecânica VW "a ar", como Bianco, Adamo e Miura, e
pelo motor de 1,3 litro da Fiat, caso do Farus e do Dardo. Com o
tempo foram usados propulsores mais adequados, como o 1,8 e o 2,0 do
Santana — às vezes vestidos com carrocerias ousadas, a exemplo do
Hofstetter. Apareceram réplicas de MG (Avallone, MP Lafer), Jaguar
XK 120 (Fera XK), Mercedes-Benz SL "Pagoda" (Phoenix), Cobra (Glaspac),
Ford Thunderbird (do mesmo fabricante) e até de Ferrari Dino (com o
nome Dimo); grandes cupês com motor seis-cilindros de Opala, como
Puma GT e Santa Matilde SM; e curiosidades como o pequeno Dacon 828,
minicarro também com motor do Fusca.
A abertura do mercado às importações, em 1990, foi o que encerrou a
maioria dessas iniciativas. As poucas que vieram depois — como o
Aurora, esportivo com motor 2,2 turbo baseado no 2,0 do Monza —
pareciam deslocadas diante da oferta de carros modernos, potentes e
relativamente acessíveis do Primeiro Mundo. Já não se justificava
recorrer a pequenas fábricas, com suas limitações naturais de
recursos ou mesmo de qualidade. E os fora-de-série praticamente
acabaram. A Chamonix, iniciada em 1988, e a mais recente Lobini —
com seu esportivo de motor VW 1,8 turbo — são duas das poucas
sobreviventes.
O que é uma pena, quando se olha para outros mercados e se percebe a
variedade de opções. Mesmo em países com legislação de segurança e
emissões poluentes bastante severa, os fora-de-série mantêm seu
espaço, mesmo que apelem a recursos como a venda em kits, chassi e
carroceria sem mecânica. Essa brecha na lei permite que um americano
adquira, por exemplo, uma réplica de Cobra roadster ou cupê ou mesmo
do Ford GT original.
Na Inglaterra, a Caterham e a Westfield fazem versões muito potentes
com base no antigo Lotus Super Seven, enquanto a TVR e a Morgan
esbanjam tradição — a segunda mantém o estilo original desde os anos
30. E há nos principais mercados uma infinidade de pequenos
fabricantes de carros esporte, alguns com excelentes resultados. A
sueca Koenigsegg, as americanas SSC e Saleen, a inglesa TVR e a
italiana Pagani (fabricante do Zonda) colocaram seus supercarros
entre os mais velozes do mundo.
De modo geral, esses fabricantes não conseguem oferecer o padrão de
qualidade a relação entre preço e produto das grandes marcas, mas
isso pouco importa para o entusiasta. Um fora-de-série se compra
pela exclusividade, pelo prazer de dirigir algo diferente ou que
resgate sensações do passado. Algo que o Speedster da Chamonix
cumpre com perfeição. |