Faltando apenas uma
semana para a apresentação oficial à imprensa, o novo Ka (foi
confirmado que o nome será mantido, ao contrário do que se especulou)
já não é mais o bem-guardado segredo, tendo aparecido com e sem
disfarces na imprensa (veja foto da
traseira). E a impressão ao ver suas fotos não poderia ser outra:
acabou-se a forte identidade de estilo do modelo anterior, substituída
por linhas mais genéricas, que tendem a agradar a maior número de
pessoas.
Essa é uma tendência que se aplica a vários fabricantes. Quando a
Citroën revelou o novo C5, em
outubro, causou duas sensações: uma, de que o desenho da segunda
geração ficou mesmo bem-resolvido; outra, de que agora ele pode ser
confundido com modelos de outras marcas, o que era impossível no
anterior. A coisa chegou a extremos no oitavo
Honda Accord para o mercado
americano, mostrado dois meses antes do modelo francês: houve quem
perguntasse se a marca japonesa se tornou coreana, já que é uma
conhecida característica dos automóveis feitos na Coréia se parecer
com vários outros. E, voltando à Ford, o conceito
Verve — que deve antecipar o
futuro Fiesta europeu — tem tudo para receber o logotipo da Peugeot,
com seus faróis alongados e enorme tomada de ar frontal.
O que anda acontecendo com os projetistas? Falta de inspiração?
Exigência dos fabricantes de que o desenho obtenha o mínimo de
rejeição em todos os mercados? Excessivas restrições por fatores como
a legislação européia de proteção a pedestres, que requer frente mais
alta e retilínea nos novos projetos?
Pode ser um pouco de tudo isso. No caso do Ka brasileiro, que não será
vendido na Europa (lá haverá uma nova geração com desenho próprio e,
ao que se tem mostrado, bem mais ousado que o nosso), a maior
preocupação parece ter sido a de agradar ao grande público, de evitar
a rejeição causada pelo primeiro modelo e apenas amenizada com a
reestilização da traseira em 2002. É interessante que na Europa essa
mudança nunca foi feita e o Ka, aos 11 anos de mercado, persiste com o
desenho intocado. Resta saber se os compradores de lá gostam mesmo
desse estilo ou se apenas não se importam. E saber como se sente seu
diretor de projeto, o francês Claude Lobo, que vivenciou dias de
glória quando o Ka foi apresentado em 1996.
Outras marcas têm-se dividido entre a ousadia e a moderação, conforme
o modelo e o mercado. A Honda impressionou com o atual Civic, mas
recuou no caso do Accord americano — no que certamente influiu o
público-alvo de faixa etária superior — e evitou ousar com a segunda
geração do Fit, muito parecida
à anterior. Também nos Estados Unidos, a remodelação do
Focus para 2008 deixou-o com ar tão
conservador que, se o modelo original de 1998 e o novo fossem
mostrados a quem nunca os conheceu, o primeiro certamente seria
apontado como sucessor e o segundo como sucedido...
A mesma Citroën que foi tão arrojada no
C4 de três portas preferiu um aspecto mais tradicional no de cinco
portas. A compatriota Renault também parece ter aprendido a ousar
menos — como no novo Laguna —
depois dos fracassos do Avantime e do Vel Satis. A Mercedes-Benz, que
causou alvoroço há 12 anos com o Classe E de faróis ovais, tem sido
prudente com os últimos lançamentos — talvez em excesso, como no atual
Classe C, que não consegue ser mais moderno que o da geração passada.
E até a BMW, talvez a marca mais discutida em termos de desenho nesta
década, mostra que limitou a criatividade do polêmico desenhista Chris
Bangle no atual Série 3 e no
Série 1 cupê, depois de
arroubos como o Série 7 de 2001 e
o Série 5 de dois anos depois (em
minha opinião, o primeiro muito estranho e o segundo atraente, mas há
quem pense diferente).
Na Fiat, por outro lado, o arrojo voltou às pranchetas com os atuais
Punto e Bravo, depois de ter sido
esquecido nos projetos de Stilo e Idea. Costumo dizer que o Stilo
parece uma evolução do Tipo, como se não tivesse existido entre eles a
dupla mais original dos três, o Brava e o Bravo de 1995. Caso
diferente é o da divisão Alfa Romeo, que tem evoluído o tema iniciado
na década passada, a meu ver com impecáveis resultados. Outras
européias, como Audi, Volkswagen, Peugeot e Opel, também optaram pela
continuidade, mas a última dá sinais de que o futuro será mais
dinâmico, a começar pelo Insignia, sucessor do Vectra de lá.
Enfim, quaisquer que sejam os rumos do desenho dos automóveis, o que
os brasileiros mais esperam é que as novas tendências cheguem logo por
aqui, sem a defasagem — ou mesmo a ausência de vários modelos — que
marcou os últimos anos em diversos fabricantes. |