Estilo genérico

O novo Ka é mais um que, em busca de agradar ao
público geral, perde a forte identidade do anterior

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editorFaltando apenas uma semana para a apresentação oficial à imprensa, o novo Ka (foi confirmado que o nome será mantido, ao contrário do que se especulou) já não é mais o bem-guardado segredo, tendo aparecido com e sem disfarces na imprensa (veja foto da traseira). E a impressão ao ver suas fotos não poderia ser outra: acabou-se a forte identidade de estilo do modelo anterior, substituída por linhas mais genéricas, que tendem a agradar a maior número de pessoas.

Essa é uma tendência que se aplica a vários fabricantes. Quando a Citroën revelou o novo C5, em outubro, causou duas sensações: uma, de que o desenho da segunda geração ficou mesmo bem-resolvido; outra, de que agora ele pode ser confundido com modelos de outras marcas, o que era impossível no anterior. A coisa chegou a extremos no oitavo Honda Accord para o mercado americano, mostrado dois meses antes do modelo francês: houve quem perguntasse se a marca japonesa se tornou coreana, já que é uma conhecida característica dos automóveis feitos na Coréia se parecer com vários outros. E, voltando à Ford, o conceito Verve — que deve antecipar o futuro Fiesta europeu — tem tudo para receber o logotipo da Peugeot, com seus faróis alongados e enorme tomada de ar frontal.

O que anda acontecendo com os projetistas? Falta de inspiração? Exigência dos fabricantes de que o desenho obtenha o mínimo de rejeição em todos os mercados? Excessivas restrições por fatores como a legislação européia de proteção a pedestres, que requer frente mais alta e retilínea nos novos projetos?

Pode ser um pouco de tudo isso. No caso do Ka brasileiro, que não será vendido na Europa (lá haverá uma nova geração com desenho próprio e, ao que se tem mostrado, bem mais ousado que o nosso), a maior preocupação parece ter sido a de agradar ao grande público, de evitar a rejeição causada pelo primeiro modelo e apenas amenizada com a reestilização da traseira em 2002. É interessante que na Europa essa mudança nunca foi feita e o Ka, aos 11 anos de mercado, persiste com o desenho intocado. Resta saber se os compradores de lá gostam mesmo desse estilo ou se apenas não se importam. E saber como se sente seu diretor de projeto, o francês Claude Lobo, que vivenciou dias de glória quando o Ka foi apresentado em 1996.

Outras marcas têm-se dividido entre a ousadia e a moderação, conforme o modelo e o mercado. A Honda impressionou com o atual Civic, mas recuou no caso do Accord americano — no que certamente influiu o público-alvo de faixa etária superior — e evitou ousar com a segunda geração do Fit, muito parecida à anterior. Também nos Estados Unidos, a remodelação do Focus para 2008 deixou-o com ar tão conservador que, se o modelo original de 1998 e o novo fossem mostrados a quem nunca os conheceu, o primeiro certamente seria apontado como sucessor e o segundo como sucedido...

A mesma Citroën que foi tão arrojada no C4 de três portas preferiu um aspecto mais tradicional no de cinco portas. A compatriota Renault também parece ter aprendido a ousar menos — como no novo Laguna — depois dos fracassos do Avantime e do Vel Satis. A Mercedes-Benz, que causou alvoroço há 12 anos com o Classe E de faróis ovais, tem sido prudente com os últimos lançamentos — talvez em excesso, como no atual Classe C, que não consegue ser mais moderno que o da geração passada. E até a BMW, talvez a marca mais discutida em termos de desenho nesta década, mostra que limitou a criatividade do polêmico desenhista Chris Bangle no atual Série 3 e no Série 1 cupê, depois de arroubos como o Série 7 de 2001 e o Série 5 de dois anos depois (em minha opinião, o primeiro muito estranho e o segundo atraente, mas há quem pense diferente).

Na Fiat, por outro lado, o arrojo voltou às pranchetas com os atuais Punto e Bravo, depois de ter sido esquecido nos projetos de Stilo e Idea. Costumo dizer que o Stilo parece uma evolução do Tipo, como se não tivesse existido entre eles a dupla mais original dos três, o Brava e o Bravo de 1995. Caso diferente é o da divisão Alfa Romeo, que tem evoluído o tema iniciado na década passada, a meu ver com impecáveis resultados. Outras européias, como Audi, Volkswagen, Peugeot e Opel, também optaram pela continuidade, mas a última dá sinais de que o futuro será mais dinâmico, a começar pelo Insignia, sucessor do Vectra de lá.

Enfim, quaisquer que sejam os rumos do desenho dos automóveis, o que os brasileiros mais esperam é que as novas tendências cheguem logo por aqui, sem a defasagem — ou mesmo a ausência de vários modelos — que marcou os últimos anos em diversos fabricantes.

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Data de publicação: 8/12/07

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