Os controles ativos da suspensão e da aerodinâmica eram
recursos ousados desse conceito de 1991 da marca da estrela
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
Durante uma década, de 1969 a 1979, a Mercedes-Benz apresentou diversas versões da série de carros-conceito C-111. Eram projetos de superesportivos com formas incomuns de propulsão, como motores rotativos e a diesel, e que inspiravam ousadia e velocidade em suas formas. Depois de uma longa inatividade em relação a esse tipo de estudo, um sucessor aparecia em 1991 no Salão de Frankfurt, na Alemanha.
A marca da estrela havia se associado à Sauber para criar o C-111 do Grupo C de competição, que conquistou o título mundial na temporada de 1990. Daquele carro de corridas veio a ideia de testar sistemas ativos de controle dinâmico antes de adotá-los em modelos de produção. Foi com esse fim que o C-112 foi desenvolvido pelo departamento de desenho avançado, o DAS, dentro da área de Estilo comandada por Bruno Sacco.
Seu desenho podia ser considerado uma interpretação moderna daqueles conceitos dos anos 70. A carroceria, construída pela empresa Coggiola em Turim, Itália, mostrava perfil baixo, frente arredondada com faróis carenados, cabine avançada à frente do motor central, para-brisa e vidro traseiro envolventes, grandes tomadas de ar laterais para os radiadores, traseira longa. Nesta, as lanternas mantinham o padrão canelado dos Mercedes de produção e havia um aerofólio formado pela ligação entre os para-lamas, mais altos que a seção central da tampa.
Toda essa parte podia ser regulada em diferentes ângulos e posições para produzir sustentação negativa em alta velocidade ou, na posição mais extrema, atuar como freio aerodinâmico. O defletor do para-choque dianteiro também admitia regulagem. Esse conjunto, estudado para criar uma força descendente de 1.000 kg à velocidade máxima teórica de 310 km/h, atuava de modo automático em situações extremas de uso, conforme indicação de medidores de força g na frente, no meio e na traseira do carro.
Foi o primeiro projeto da Mercedes a usar o controle ativo de carroceria, que reduzia em muito sua inclinação e apareceria em produção, oito anos mais tarde, no cupê CL
Não poderiam faltar as portas abertas para cima, “asas de gaivota”, um ícone dos carros mais exóticos da marca desde o 300 SL dos anos 50. Elas subiam e desciam por meio de cilindros hidráulicos, ao toque de um botão, e foram projetadas para permitir a saída dos ocupantes mesmo que o carro estivesse virado para baixo. Por dentro dessa carroceria vinha uma estrutura monocoque de alumínio. No interior do C-112, nada lembrava um carro de competição. Era um esportivo alemão em essência, com volante de quatro raios, revestimentos em couro e um painel desenhado para ser prático antes de ser atraente.
A não ser pela posição central-traseira, seu motor era conhecido: o V12 de 6,0 litros com potência de 408 cv e torque de 59 m.kgf que havia surgido pouco antes no conversível SL 600 e no sedã S 600. Essa usina de força — então o motor mais potente em produção em série para automóveis no mundo — podia levar o esportivo, que pesava importantes 1.570 kg, de 0 a 100 km/h em 4,9 segundos de acordo com cálculos da marca. O câmbio manual tinha seis marchas, algo incomum naquele tempo, e a tração era traseira. As rodas Speedline de magnésio usavam aro de 17 pol e tala de 13 pol no caso das posteriores.
O que sobressaía no C-112 era mesmo o aparato eletrônico. Ele foi o primeiro projeto revelado pela Mercedes a usar o Active Body Control (ABC), controle ativo de carroceria, que reduzia em muito sua inclinação (rolagem) em curvas, acelerações e frenagens. Algo similar apareceria em produção, oito anos mais tarde, no cupê CL. O ABC usava molas e elementos hidráulicos para cada roda e sensores que monitoravam os movimentos da carroceria. Pela análise de tais informações, a central eletrônica definia como cada elemento da suspensão deveria se ajustar.
Outro recurso era a direção ativa nas rodas traseiras, que podia compensar influências no comportamento por ventos laterais ou tipos de superfície com diferentes graus de aderência. O C-112 trazia ainda radar na dianteira para detectar outros veículos à frente, monitores de pressão nos pneus, freios antitravamento (ABS) com discos Brembo e controle eletrônico de tração.
Uma produção em pequena série foi cogitada, pois desde o início o projeto considerou exigências legais variadas como os limites suíços de ruídos e as restrições de emissões poluentes da Califórnia, nos Estados Unidos. O maior desafio da Mercedes seria integrar da melhor forma os muitos sistemas eletrônicos que, no conceito C-112, operavam cada um com sua central. Mas o “pai” do esportivo, Werner Niefer, aposentava-se em 1993 após 50 anos da empresa e, sem ele, não houve interesse em levar adiante o plano de colocar nas ruas esse concentrado de tecnologia.