Em uma arrancada de 0 a 180 km/h lado a lado, o Audi lidaria melhor com a potência e venceria do início ao fim, com os V8 juntos no meio e o Jaguar mais longe
Desempenho e consumo
A proximidade de relação peso-potência entre três dos competidores, entre 3,6 e 3,8 kg/cv, deixava expectativa por qual obteria os melhores índices de desempenho. Nossas medições com o equipamento de alta precisão Race Capture Pro apontaram o claro vencedor: o TT, que foi de 0 a 100 km/h em 3,7 segundos, o mesmo tempo divulgado pela fábrica. Camaro e Mustang ficaram empatados com 4,9 s e o F-Type, como esperado pelo motor menos potente, em último com 5,9 s.
Além de usufruir a grande aderência trazida pela tração integral, o Audi permite que o máximo do motor seja fornecido logo na saída. Como o gráfico revela, após 2,5 segundos as potências mais altas dos norte-americanos começam a falar mais alto, o que diminui gradativamente a diferença para o TT. A ordem no grupo e a semelhança entre os norte-americanos se mantiveram em provas mais longas, como de 0 a 180 km/h e de 0 a 400 metros. O Jaguar fica cada vez mais para trás pela potência muito menor.
O TT RS realmente impressiona. Freio acionado, leva-se o motor a até 3.500 rpm e basta soltar o pé esquerdo do pedal para o turbo prover mais de 1,2 bar de pressão relativa ao ambiente (220 kPa absolutos) em menos de 0,5 segundo, catapultando o carro com aceleração de mais de 1 g. Isso mesmo: ele se move para frente mais rápido do que cairia se solto em queda livre. Não existe perda de aderência, só a sensação de aceleração intensa e instantânea, como no movimento que se atribui nos filmes a discos voadores. O pequeno cupê então “engole” marcha após marcha, em uma sucessão extremamente rápida. Os 100 km/h chegam antes que em qualquer carro já testado pelo Best Cars, até mesmo a superpotente perua RS6 Avant de 560 cv da mesma marca, e em 12 s ele está a quase 190 km/h.
Interessante notar que nesse nível de potência e com uma primeira marcha relativamente curta, por haver sete marchas, o conversor de torque não fez falta ao Audi para resultar em grande força transmitida às rodas nos primeiros segundos. Também merece atenção o quanto é difícil fazer uma transmissão robusta e eficiente na medida certa. Seria fácil construir caixa, eixos, semiárvores e juntas enormes e parrudos para suportar tanto torque alinhado a tal aderência ao solo, mas isso afetaria o consumo e mesmo o desempenho por suas inércias. A fábrica fez a lição de casa direitinho.
Não que os dois V8 não empolguem: dão grande prazer ao acelerar e, como o Audi, alcançam 180 km/h no espaço de 400 metros, o famoso quarto de milha dos norte-americanos. Seria possível melhorar os tempos desses dois carros?
Talvez: ao acelerar tudo e liberar o freio com controle de tração desligado, eles “queimam” muito os pneus traseiros e se desviam da trajetória, o que representa perda de tempo. Quem dispuser de paciência e mais um par de pneus para voltar para casa pode ganhar alguns décimos de segundo, mas optamos por repetir mais vezes a largada “limpa” com tal controle ativado (no Camaro foi usado o modo Track). Um controle que funciona muito bem, aliás, e não “mata” potência mais que o necessário, diferente do que se costuma ver em carros comuns. No F-Type, as enormes “patas” traseiras mal destracionam e desativar o controle de tração não fez diferença nos tempos.
Contribui para as acelerações do TT a transmissão permitir a mais alta rotação de estol — 3.500 rpm ao usar o assistente eletrônico de largada —, de modo que o turbo encha bem rápido e sem retardo. O F-Type não precisa de tanta rotação (aceita 2.300 rpm), uma vez que o conversor de torque multiplica o torque que chega às rodas na saída. Seu retardo de turbo também é pequeno: ele chega a 1 bar relativo (200 kPa absolutos) em 0,5 s, mas sobe gradativamente ao longo da aceleração até atingir 1,45 bar relativo (245 kPa). Percebe-se a lógica para otimizar a aceleração sem destracionar os pneus, que perderia tempo (vale notar que os largos pneus em rodas de 20 pol são opcionais em alguns mercados, ou seja, o acerto é feito para o conjunto básico).
Os V8 não saem com rotações tão altas por uma simples razão: a combinação do enorme torque oriundo de motores de grande cilindrada ao conversor de torque das caixas automáticas. O Mustang permite 2.000 rpm e o Camaro apenas 1.600, o que faz sentido — não há como jogar mais torque ao chão sem destracionar. Ao acelerar só depois de liberar o freio (sem estol, portanto), o tempo de 0 a 100 piora mais no TT: 0,9 s ante 0,2 s ou menos dos outros.
A rotação de mudança automática de marcha foi calculada para priorizar o desempenho em todos: 7.400 rpm no Mustang (400 acima do pico de potência), 6.800 no TT (dentro da faixa de potência máxima), 6.200 no F-Type (700 acima do pico) e no Camaro (200 acima). O inglês pode ser levado a 6.700 rpm em modo manual, mas os tempos pioram.
Os dois V8 produzem quase a mesma potência, só que o Mustang precisa girar mais para compensar a menor cilindrada. O interessante é que os pontos de troca das marchas ficam bem próximos, embora o Ford tenha duas a mais, pois nele as rotações são maiores — mas o Camaro usa só a terceira enquanto o Mustang trabalha com ele a e a quarta. Por isso os dois obtêm exatamente o mesmo desempenho. Ao acelerar a pleno, o motor do Ford mantém-se mais tempo perto de sua rotação de potência máxima.
Ao usar o modo Pista Drag, o Mustang chega a acionar o controle eletrônico de tração por instantes após as trocas para terceira e quarta marchas! O breve destracionamento foi provado pela comparação entre a velocidade lida pelo GPS e a informada pela porta OBD (veja no gráfico). A velocidade das rodas tem um pico até na troca para quinta. Isso mostra que a estratégia da Ford é de não “aliviar” o motor durante as mudanças, deixando que as embreagens da caixa de 10 marchas consigam segurar todo o torque junto com a desaceleração do motor. O mesmo não foi encontrado no oponente.
As retomadas apresentaram, mais uma vez, números que revelam grande rapidez. Os dois V8 continuaram bem próximos e o Audi só perdeu a dianteira na prova de 80 a 120 km/h, apesar da desvantagem do tipo de transmissão (caixas de dupla embreagem são mais lentas para a redução súbita de várias marchas, sobretudo quando precisam “pular” marchas que usam a mesma embreagem) e de não mais aproveitar a aderência da tração integral.
O TT se beneficia da estratégia de “segurar” mais as marchas no modo esportivo da caixa. O teste de 60 a 120 km/h (acima), por exemplo, foi iniciado com o motor a altas 2.800 rpm, o que diminui o tempo de resposta do turbo e o número de marchas para pular. Enquanto isso, o Mustang partiu de 1.500 rpm e o Camaro de 1.300, uma escolha dos fabricantes para compensar, com rotações mais baixas, a maior sede por combustível dos V8 em baixas cargas. Como resultado o Audi teve uma resposta mais rápida que os norte-americanos, que precisavam ganhar giros para obter a potência desejada — perde-se tempo para que o motor vença sua inércia, o que limita o tempo de troca.
O Mustang levou 1,1 s para ir de 1.500 a 5.300 rpm, enquanto o Camaro foi de 1.300 para 4.300 rpm. Daria para fazer uma troca mais rápida? Sim, mas acarretaria em trancos durante as trocas, pois as rodas precisariam ajudar o motor a ganhar rotação mais rápido. Enquanto isso o TT só precisou ir de 2.800 para 3.600 rpm. O F-Type ficou no meio-termo, passando de 2.000 para 3.500 rpm, e revelou-se bem lento nas reduções apesar da moderna transmissão — provavelmente uma estratégia da marca para transições de trocas mais suaves e progressivas, já notada na avaliação dos sedãs XE e XF.
As retomadas de 80 a 120 km/h (acima) mostraram melhores respostas dos norte-americanos em relação ao TT, por já estarem com rotações mais altas, apesar de o alemão seguir levemente à frente até os 6 s. Vale lembrar que as manobras são feitas em modo automático. Os V8 poderiam mostrar vantagem em modo manual, com a marcha mais adequada previamente selecionada, pois têm maior potência que o rival.
A velocidade máxima declarada do Camaro, 290 km/h, supera em 40 km/h as dos rivais. Curiosamente, sua transmissão é curta a ponto de quase “encher” a oitava e última marcha para isso, enquanto o Audi usaria a quinta de sete marchas; o Mustang, a sétima de 10; e o F-Type, a sétima de oito. Com essa escolha, o Chevrolet mantém a rotação mais alta a 120 km/h, embora tenha um motor menos disposto a girar que o do Ford, o de menor regime.
Em consumo, como se esperava, os motores turbo dos europeus em carros mais leves chegaram aos melhores resultados, sendo o TT mais econômico no trajeto rodoviário e o F-Type nas medições urbanas. Entre os grandes de oito cilindros, o Camaro foi melhor em cidade (talvez por usar a desativação de cilindros por mais tempo ali) e o Mustang em rodovia (beneficiado pela transmissão bem mais longa e pela melhor aerodinâmica).
Mesmo as marcas dos V8 são bastante razoáveis para as características dos carros, sendo atribuídas a medidas de eficiência como as citadas e a injeção direta. No entanto, vale lembrar que o consumo depende de quanta potência se demanda. As condições de velocidade e aceleração de nossos trajetos-padrão, iguais para todos os automóveis, são brandas para eles — o que representam 120 km/h para um carro apto a 250 ou mais? Com pé direito pesado, o tanque de qualquer um deles se esgotará bem mais cedo do que nossos testes apontaram.
A combinação de consumo moderado e boa capacidade de tanque deixa o Jaguar com a melhor autonomia em qualquer condição, enquanto o Ford é o mais limitado nesse quesito.
Análise por Felipe Hoffmann da FHB Performance
TT | Camaro | Mustang | F-Type | |
Aceleração | ||||
0 a 100 km/h | 3,7 s | 4,9 s | 4,9 s | 5,9 s |
0 a 120 km/h | 5,0 s | 6,3 s | 6,3 s | 8,1 s |
0 a 150 km/h | 7,8 s | 9,1 s | 9,1 s | 12,3 s |
0 a 180 km/h | 11,2 s | 12,8 s | 12,9 s | 18,6 s |
0 a 400 m | 11,9 s | 12,9 s | 13,0 s | 14,2 s |
Retomada | ||||
60 a 100 km/h* | 2,4 s | 3,0 s | 2,9 s | 3,6 s |
60 a 120 km/h* | 3,8 s | 4,4 s | 4,3 s | 5,7 s |
80 a 120 km/h* | 3,6 s | 3,2 s | 3,0 s | 4,8 s |
80 a 150 km/h* | 6,2 s | 6,3 s | 6,3 s | 9,8 s |
80 a 180 km/h* | 9,7 s | 10,0 s | 9,8 s | NA |
Consumo | ||||
Trajeto leve em cidade | 9,7 km/l | 8,5 km/l | 7,7 km/l | 10,6 km/l |
Trajeto exigente em cidade | 5,2 km/l | 4,2 km/l | 3,9 km/l | 5,6 km/l |
Trajeto em rodovia | 12,0 km/l | 9,2 km/l | 9,9 km/l | 11,3 km/l |
Autonomia | ||||
Trajeto leve em cidade | 480 km | 551 km | 423 km | 601 km |
Trajeto exigente em cidade | 257 km | 272 km | 214 km | 318 km |
Trajeto em rodovia | 594 km | 596 km | 543 km | 641 km |
Testes com gasolina; *com reduções automáticas; NA = não aplicável por limitação de espaço na pista; melhores resultados em negrito; conheça nossos métodos de medição |
Dados dos fabricantes
TT | Camaro | Mustang | F-Type | |
Velocidade máxima | 250 km/h | 290 km/h | 250 km/h | 250 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 3,7 s | 4,2 s | 4,3 s | 5,7 s |
Consumo em cidade | 7,5 km/l | 6,4 km/l | 5,9 km/l | 7,8 km/l |
Consumo em rodovia | 10,3 km/l | 9,6 km/l | 8,9 km/l | 10,6 km/l |
Gasolina; consumo conforme padrões do Inmetro |
Comentário técnico
Tração integral com repartição variável no Audi, motor V8 com desligamento de cilindros no Chevrolet, muitos ajustes de condução no Ford, novo quatro-cilindros no Jaguar
• O motor do TT RS é novo na atual geração, 26 kg mais leve que o anterior e com novidades como o revestimento por pulverização térmica a plasma, para obter um revestimento mais fino dos cilindros no bloco de alumínio. A pressão máxima de turbo é de 1,35 bar relativo ao ambiente. O sistema Valvelift faz variar o levantamento das válvulas de escapamento e são empregados dois sistemas de injeção: indireta no duto, para rotações e cargas mais baixas, e direta, para rotações e cargas elevadas.
• Embora tradicional pelo comando de válvulas no bloco e as duas válvulas por cilindro, o LT1 do Camaro é atual no restante, com bloco de alumínio e variação de tempo de abertura das válvulas, recursos que os demais também têm. Exclusivo seu é o desligamento de quatro dos cilindros em condições de baixa demanda de potência, aplicado apenas no caso de transmissão automática.
• No Mustang o motor Coyote foi revisto no modelo 2018. Entre suas soluções técnicas estão dois sensores de detonação em cada bancada (importantes pela alta taxa de compressão, 12:1). Como o TT, emprega injeções direta e indireta e cilindros com plasma.
• O quatro-cilindros do F-Type, da nova série Ingenium, também faz variar o tempo de todas as válvulas e o curso daquelas de admissão.
• Para que 10 marchas no Mustang? Para atender a dois objetivos antagônicos. De um lado, ampliar o leque de relações: chega a 7,5 na divisão da primeira pela última, contra 7 no Camaro e no F-Type e 5,6 no TT. De outro, deixar as marchas numericamente mais próximas entre si, o que produz aceleração mais rápida e ajuda a reduzir o consumo (importante para atender a normas governamentais, mesmo que o comprador não se preocupe com isso).
• O único sistema de tração integral do grupo —o do TT — usa embreagem multidisco junto ao eixo traseiro, com controle eletrônico, que promove a distribuição de torque entre os eixos conforme a condição de uso, o modo de dirigir e o programa de condução selecionado: Dinâmico faz uma parcela maior de torque chegar às rodas traseiras, para atitude mais esportiva em curvas
• A construção mais sofisticada é a do Jaguar, que emprega alumínio na estrutura e na carroceria; a armação dos bancos usa magnésio. O Audi recorre a alumínio nas soleiras de porta, no teto e sua estrutura, nos braços da suspensão dianteira (forjados) e nos subchassis à frente e atrás. No Chevrolet os braços dianteiros e a estrutura do painel de instrumentos também são de alumínio.
• O Camaro adotou na atual geração a plataforma Alpha da GM, comum aos Cadillacs ATS e CTS, em lugar daquela originária do Holden Commodore australiano, o sedã que aqui foi vendido como Omega. A mudança rendeu expressiva redução de peso (83 kg) e aumento de 43% na rigidez torcional.
• Os três modelos de tração traseira usam pneus mais largos nesse eixo, com diferença de 20 mm no Ford, 30 mm no Chevrolet e 40 mm no Jaguar. Com tração integral, o Audi dispensa essa solução.
• O Mustang vendido no Brasil vem de série com pacote Performance, que traz potência adicional, diferencial autobloqueante da renomada Torsen, radiador e freios com maior capacidade, pneus Michelin Pilot Sport 4S e ajuste magneto-reológico da carga dos amortecedores — oferecidos também ao Camaro e ao TT em outros países. A função Line Lock aciona os freios da frente enquanto permite aos pneus traseiros girar em falso, para seu aquecimento antes da largada em uma arrancada.