JAC T5 CVT é um bom chinês, mas com ressalvas

Com progressos técnicos e forte relação entre preço e conteúdo, SUV precisa passar por refinamentos

Texto e fotos: Fabrício Samahá

 

“Carro chinês… Esse é bom?”

Quase seis anos após a chegada da JAC Motors ao Brasil, perguntas como essa ainda são frequentes quando nos veem avaliando os automóveis da Jianghuai Automobile Co., Ltd., marca sediada em Hefei, na China. Desde o primeiro deles a desembarcar, o hatch pequeno J3, acompanhamos sua evolução até o mais recente lançamento, o utilitário esporte compacto T5 com transmissão automática de variação contínua (CVT). E então, qual a resposta?

Em poucas palavras: sim, esse é bom. Mas bom o suficiente para ser uma válida alternativa aos concorrentes nacionais? Bem, essa pergunta requer uma análise mais extensa.

 

Proeminente, a frente do T5 mostra ampla grade; faróis baixos são elipsoidais; laterais volumosas fazem parecer pequenas as rodas de 16 pol

 

O T5 é recente mesmo na China, onde surgiu em 2014 designado como S3. No mercado brasileiro usa o motor conhecido de J3 e J5, o flexível de 1,5 litro, com potência de 125/127 cv e torque de 15,5/15,7 m.kgf, na ordem gasolina/álcool. A versão CVT custa R$ 71.490, aumento de apenas 2% sobre a manual de conteúdo similar (R$ 70 mil).

 

Concorrentes mais baratos com caixa automática, apenas o Chery Tiggo e o antigo Hyundai Tucson; outros nacionais, mesmo simples, custam mais

 

Por esse valor leva-se um pacote bem servido de equipamentos: alarme antifurto, alerta para baixa pressão dos pneus, ar-condicionado automático, assistente de saída em rampa, bancos revestidos em couro, câmera traseira de manobras, computador de bordo, controlador de velocidade, controle eletrônico de estabilidade e tração, fixação de cadeira infantil em padrão Isofix, rodas de alumínio de 16 polegadas, sensores de estacionamento traseiros e sistema de áudio com tela de 8 pol. Bolsas infláveis são apenas as frontais.

Como fica a concorrência? Mais baratos com caixa automática, apenas o Chery Tiggo (2,0 litros, 138 cv, R$ 60 mil) e o antigo Hyundai Tucson GLS (2,0 litros, 142/146 cv, R$ 70 mil). Há outros nacionais pouco acima, como Peugeot 2008 Allure (1,6, 115/122 cv, (R$ 76.890) e Ford Ecosport SE (1,6, 126/131 cv, R$ 77.650), mas versões automáticas de Chevrolet Tracker, Honda HR-V, Jeep Renegade e Renault Duster ficam de R$ 80 mil em diante.

 

A relação preço-conteúdo é destaque: por R$ 71,5 mil, menos que Ecosport ou 2008 mais simples, leva-se o T5 bem recheado em conforto e segurança

 

O desenho do T5, que alguns confundem com modelos Hyundai — sobretudo nas laterais e traseira —, não é o mais harmonioso da classe. Além da frente protuberante, que destoa do conjunto, o volume de chapas nas laterais é tão amplo que faz as rodas de 16 pol parecerem ter 13. Boa a impressão quanto aos vãos estreitos, embora nem sempre exatos, entre os painéis de carroceria.

 

 

Seu interior mostra bom aspecto e acabamento bem feito, apesar dos plásticos rígidos. Os bancos dianteiros são adequados em desenho, firmeza e apoios laterais e o motorista encontra posição cômoda em relação aos pedais e ao volante, que deveria ser regulável também em distância. O quadro de instrumentos de fácil leitura inclui computador de bordo, cuja operação usa o botão zerador do hodômetro e está longe de ser intuitiva.

O sistema de áudio com tela tátil das mais amplas do mercado traz entradas USB, HDMI e para cartão SD, além de espelhamento de telefone celular. Melhor qualidade de áudio, sobretudo os graves, e aparência menos carnavalesca seriam bem-vindas. A tela serve também às imagens da câmera traseira de manobras, que demoram a aparecer quando se liga o carro e sai de ré. O espaço para objetos do dia a dia é razoável.

 

Interior tem bancos e acabamento adequados e amplo espaço longitudinal e vertical; quadro de instrumentos inclui computador de uso difícil

 

Bons detalhes do T5 são acendedor de cigarros em adição à tomada de 12 volts, ajuste elétrico do facho dos faróis (praticamente extinto de carros nacionais), alerta específico para porta mal fechada, alerta para uso do cinto, apoio de braço central dianteiro, cintos de três pontos e encostos de cabeça para todos os ocupantes, faróis e luz traseira de neblina, faróis eficientes com duplo refletor (elipsoidal no facho baixo), luzes de cortesia nas portas, porta-óculos, preaquecimento de álcool para partida a frio, repetidores laterais das luzes de direção e vidros traseiros que descem por inteiro.

Alguns pontos merecem correção: o controle elétrico de vidros tem função um-toque só para o do motorista, o ar-condicionado é impreciso (resfria muito mais que o necessário pela temperatura inserida), a faixa degradê no para-brisa é estreita, o tanque de combustível de 45 litros deveria ser ampliado e o funcionamento a frio com álcool não é regular nos primeiros instantes. Crítica é a visibilidade, tanto em ângulo na frente quanto para trás, por causa das largas colunas.

O espaço interno surpreende em altura e agrada às pernas de quem viaja atrás, enquanto a largura desse banco é limitada para três pessoas, como esperado por seu porte. Para a capacidade de bagagem a JAC divulga 600 litros até o topo do encosto traseiro, mas pelos métodos habituais no Brasil (medição com blocos) estimamos que não passe de 400 litros. O banco traseiro é bipartido e, ao contrário do usual na marca, o estepe usa pneu de tamanho integral, só com roda de aço.

Próxima parte

 

Desempenho e consumo

Para extrair a melhor aceleração do T5, esqueça o modo manual da caixa: ao produzir oscilações entre 4.500 e 5.500 rpm para simular mudanças de marcha, a CVT evita o som monótono, mas mantém o motor abaixo do pico de potência (6.000 rpm). Melhor deixar a alavanca em D ou S, o que permite chegar a quase 6.000 e ali estacionar enquanto a velocidade cresce. Não fez diferença usar o estol da caixa (baixo, 2.200 rpm) ou sair acelerando a fundo, de modo que recomendamos a segunda prática por preservar a embreagem.

Arrancando da melhor forma, chegamos a 100 km/h em adequados 13,4 segundos, competitivo com o 2008 1,6 automático de quatro marchas (13,1 s) e não distante do Ecosport 1,6 automatizado de seis marchas (12,0 s), comparados em 2016. Mas o T5 perde para ambos nas retomadas, apesar da eficiência da CVT em manter o motor a cerca de 5.800 rpm pela maior parte da manobra: de 60 a 120 km/h precisou de 15,5 s ante 13,6 s do Peugeot e 14,4 s do Ford.

Caixas CVT costumam favorecer o consumo por deixar o motor em baixos regimes tanto quanto possível. A do JAC resultou em bons valores nos trajetos urbanos de medição, como 10,5 km/l de álcool no mais leve (o Ecosport fez 10,4 e o 2008 obteve 9,3 km/l), mas não no percurso rodoviário. Sem torque suficiente para manter a velocidade fixada de 120 km/h no controlador em subidas, o motor precisava subir de rotação e chegava a 4.300 rpm em algumas delas. Giros nas alturas, consumo idem: 8,4 km/l, bem abaixo dos 9,9 do Ford (o Peugeot fez 8,9).

Além disso, com o diminuto tanque de 45 litros, o chinês não vai longe sem abastecer: sua autonomia rodoviária de 340 km fica distante dos cerca de 450 km alcançados pelos dois rivais.

 

Aceleração
0 a 100 km/h 13,4 s
0 a 120 km/h 18,2 s
0 a 400 m 19,6 s
Retomada
60 a 100 km/h* 10,3 s
60 a 120 km/h* 15,5 s
80 a 120 km/h* 11,9 s
Consumo
Trajeto leve em cidade 10,5 km/l
Trajeto exigente em cidade 5,6 km/l
Trajeto em rodovia 8,4 km/l
Autonomia
Trajeto leve em cidade 421 km
Trajeto exigente em cidade 231 km
Trajeto em rodovia 340 km
Testes efetuados com álcool; *com reduções automáticas; conheça nossos métodos de medição

 

Dados do fabricante

Velocidade máxima 192 km/h
Aceleração de 0 a 100 km/h 12,3 s
Consumo em cidade ND
Consumo em rodovia ND
Consumo conforme padrões do Inmetro; ND = não disponível
Próxima parte

 

Tela tátil de 8 pol inclui espelhamento de celular e câmera traseira; T5 tem ar-condicionado automático, entrada HDMI e luzes de cortesia nas portas

 

Caixa CVT ajuda e atrapalha

O motor de 1,5 litro e quatro válvulas por cilindro (leia sobre técnica no quadro abaixo) sobressai mais na categoria pela potência que pelo torque. De fato, a experiência com J3 e J5 havia indicado desempenho satisfatório em alta rotação, mas não em baixa. Como seria no T5, que pesa 1.220 kg e tem grande área frontal?

 

O T5 obtém relativa desenvoltura no trânsito, mas para andar mais rápido precisa de altas rotações, região em que o nível de ruído incomoda

 

A sensação inicial ao acelerar é desconcertante: com relação inicial longa e sem um conversor de torque para ajudar (leia também no quadro), a CVT produzida pela belga Punch Powertrain faz o carro sair em baixa rotação com uma resposta lenta, típica de motores subdimensionados. Mas a situação melhora logo depois e, ao manter o T5 em regimes mais altos conforme o motorista demanda potência, a caixa disfarça bem a falta de torque em baixa.

Assim o utilitário obtém relativa desenvoltura no trânsito, não diferente dos competidores de 1,6 litro como Ecosport e o 2008 aspirado. O problema começa quando se quer andar mais rápido ou simplesmente viajar em rodovias não tão planas. É preciso levar o quatro-cilindros a altas rotações, acima de 4.000 rpm, região em que o nível de ruído incomoda: melhor isolamento acústico faria bem ao T5, pois não se trata de motor tão áspero. Outros barulhos e a aspereza do piso também são muito transmitidos.

 

Motor de até 127 cv traz desempenho razoável, mas a caixa CVT não contribui nas saídas e o nível de ruído torna-se excessivo com frequência

 

Em rodovia plana os 120 km/h são mantidos com moderadas 3.000 rpm, mas subidas fazem a CVT levar os giros a até 4.300 rpm para sustentar tal velocidade, como constatado na medição de consumo rodoviário na Rodovia Carvalho Pinto, no interior paulista. Isso sacrifica o consumo, que obteve bons índices apenas nos trajetos urbanos. Em alta rotação seu desempenho é mediano, pouco inferior ao de Ecosport e 2008, caso da aceleração de 0 a 100 km/h em 13,4 segundos (leia mais e veja os resultados completos na página 1).

 

 

À parte a lentidão inicial, a transmissão opera tão bem quanto outras do gênero. Além do programa básico, oferece o esportivo (que mantém giros mais altos, mas deveria produzir retenção para freio-motor ao deixar de acelerar) e o de inverno, adequado a pisos de baixa aderência. Mudanças manuais entre seis relações podem ser feitas por toques na alavanca, subindo para frente; nesse modo, a próxima “marcha” entra ao atingir 5.500 rpm. Ao usar pleno acelerador ocorrem reduções.

Em termos de suspensão o T5 revela aprimoramentos para a marca, mas ainda não chegou ao ponto de acerto que alguns fabricantes locais alcançaram. A parte que surpreende é a aderência dos pneus Giti: pode-se atirar o JAC com vigor em curvas sem atingir seu limite, a ponto só se acionar o controle eletrônico de estabilidade com muito abuso ao volante.

 

Aderência dos pneus em curvas é ponto alto desse JAC; embora melhor que o do T6, o conforto da suspensão em irregularidades pode melhorar

 

Contudo, permanecem em menor grau as críticas feitas ao utilitário esporte maior T6, que avaliamos em 2015: nota-se transmissão excessiva de impactos e irregularidades, enquanto os amortecedores macios (que trazem sensação de conforto) controlam mal os movimentos. Ao transpor lombadas, por exemplo, é comum a traseira descer forte e atingir os batentes. Se os freios respondem bem, a direção pode melhorar: bem leve ao redor do centro, passa a falsa impressão de que movimentos involuntários tirarão o carro da trajetória. Em uso urbano é macia e confortável.

Tudo considerado, o T5 CVT atesta o processo evolutivo da JAC, fabricante de automóveis há apenas 10 anos. Certamente ainda tem onde trabalhar em seu modelo mais recente entre nós, mas está no caminho certo. E o binômio conteúdo-preço, que tanto fez a marca agitar o mercado ao chegar por aqui há seis anos, é um fator decisivo para colocar o T5 como válida alternativa aos concorrentes locais.

Mais Avaliações

 

Avaliação em vídeo

 

Comentário técnico

• O motor de 1,5 litro do T5, da mesma família do 1,35-litro dos modelos J2 e J3, usa soluções como variação de tempo de abertura das válvulas de admissão e bloco de alumínio. A potência e o torque alcançados no Brasil, 127 cv e 15,7 m.kgf com álcool, não se repetem na origem: a versão chinesa fica em 112 cv e 14,9 m.kgf. A relação r/l 0,312 é razoável, embora não atenda ao limite convencionado de 0,3 para um funcionamento suave e eficiente.

• A transmissão opera com embreagem em banho de óleo para conexão ao motor, como no Honda Fit de primeira geração (até 2007). Caixas CVT recentes têm preferido o uso de conversor de torque para essa ligação, como no Fit atual e nos Nissans, tanto pela multiplicação de torque nas saídas quanto pela robustez em condições severas, como partida em aclive acentuado. O auxílio para saídas em rampa de série ameniza a situação no T5, mas permanece a lenta resposta ao arrancar.

• O espectro das relações de transmissão (mais curta dividida pela mais longa) é menor que o esperado, considerando-se que CVTs permitem ampliá-lo com facilidade: 4,7 entre as seis relações (o Nissan March, por exemplo, chega a 8,9).

• O T5 usa o simples e comprovado eixo traseiro de torção, a exemplo do J2. Nesse item eles diferem dos demais JACs vendidos aqui: J3, J5, a minivan J6 e o utilitário esporte T6 usam um sistema independente chamado pela empresa de Dual Link, similar ao McPherson (não chega a ser multibraço). Como ocorreu com as marcas francesas, que abandonaram a suspensão traseira independente na maioria dos modelos de 20 anos para cá, o “arroz com feijão” ganha espaço nesse quesito também em projetos da JAC.

 

Ficha técnica

Motor
Posição transversal
Cilindros 4 em linha
Material do bloco/cabeçote alumínio
Comando de válvulas duplo no cabeçote
Válvulas por cilindro 4, variação de tempo
Diâmetro e curso 75 x 84,8 mm
Cilindrada 1.499 cm³
Taxa de compressão 10:1
Alimentação injeção multiponto sequencial
Potência máxima (gas./álc.) 125/127 cv a 6.000 rpm
Torque máximo (gas./álc.) 15,5/15,7 m.kgf a 4.000 rpm
Potência específica (gas./álc.) 83,4/84,7 cv/l
Transmissão
Tipo de caixa e marchas automática de variação contínua, emulação de 6 marchas
Relação e velocidade por 1.000 rpm (modo manual)
1ª. 2,42 / 9 km/h
2ª. 1,51 / 14 km/h
3ª. 1,00 / 21 km/h
4ª. 0,83 / 25 km/h
5ª. 0,65 / 32 km/h
6ª. 0,52 / 40 km/h
Relação de diferencial 5,76
Regime a 120 km/h 3.000 rpm (6ª.)
Regime à vel. máxima informada 6.050 rpm (5ª.)
Tração dianteira
Freios
Dianteiros a disco ventilado (ø ND)
Traseiros a disco (ø ND)
Antitravamento (ABS) sim
Direção
Sistema pinhão e cremalheira
Assistência elétrica
Diâmetro de giro 11,0 m
Suspensão
Dianteira independente, McPherson, mola helicoidal
Traseira eixo de torção, mola helicoidal
Estabilizador(es) dianteiro e traseiro
Rodas
Dimensões 16 pol
Pneus 205/55 R 16 V
Dimensões
Comprimento 4,325 m
Largura 1,765 m
Altura 1,66 m
Entre-eixos 2,56 m
Bitola dianteira 1,48 m
Bitola traseira 1,475 m
Coeficiente aerodinâmico (Cx) ND
Capacidades e peso
Tanque de combustível 45 l
Compartimento de bagagem 600 l
Peso em ordem de marcha 1.220 kg
Relação peso-potência (gas./álc.) 9,8/9,6 kg/cv
Garantia
Prazo 6 anos sem limite de quilometragem
Carro avaliado
Ano-modelo 2017
Pneus Giti Comfort 221
Quilometragem inicial 3.000 km
Dados do fabricante; ND = não disponível

 

Sair da versão mobile