Nissan Kicks aposta no desenho para a briga dos SUVs

De início importado, depois nacional, ele agrada pelo aspecto e ao volante, mas o desempenho está incompatível com a faixa de preço

Texto: Geraldo Tite Simões – Fotos: divulgação

 

Donos de sedãs cansados do visual pacato, mulheres que gostam de dirigir em uma posição mais alta, donos de utilitários esporte que não precisam de tração nas quatro rodas, consumidores que gostam do estilo “aventureiro” sem praticar fora de estrada. Esses são alguns dos perfis mapeados em pesquisas feitas pela Nissan para chegar ao Kicks, que acaba de ser lançado oficialmente no Brasil em versão única SL por R$ 90 mil.

Assim como o Honda HR-V, talvez seu concorrente mais direto, o Kicks fica no caminho entre um hatchback e um SUV — o chamado crossover, cruzamento em inglês —, sendo enquadrado para fins práticos na segunda categoria pelo Best Cars. Não é novidade que o segmento está crescendo rápido por misturar qualidades dos SUVs tradicionais ao conforto de um sedã, passando pelo estilo robusto e até pela prosaica justificativa de resistir melhor à qualidade de nossa pavimentação. Foi a classe que mais cresceu nos últimos cinco anos, de 1,7% para 9,8% de participação no mercado.

 

Previsto pelo conceito de 2014, o desenho anguloso e original é um ponto alto do Kicks

 

O novo Nissan chega para competir, além do HR-V (R$ 90.600 na versão EX de 1,8 litro e 140 cv), com Chevrolet Tracker (R$ 87.290 o LTZ 1,8 de 140 cv), Ford Ecosport (R$ 90.390 o Titanium 2,0 de 147 cv), Jeep Renegade (R$ 91.220 o Longitude 1,75 de 132 cv), Peugeot 2008 (R$ 78.090 o Griffe 1,6 de 122 cv) e Renault Duster (R$ 85.150 o Dynamique 2,0 de 148 cv). Todos os preços são com caixa automática ou automatizada. De início será trazido do México, o que o isenta de Imposto de Importação, mas restringe seu volume à cota compartilhada com o Sentra de mesma origem. Por isso, a decisão do fabricante foi começar por cima com a versão SL, deixando para mais tarde — quando for produzido em Resende, RJ, ao lado de March e Versa — opções mais acessíveis.

 

Similar ao carro-conceito, o Kicks causa ótima impressão pelo estilo moderno e jovial, longe do conservador padrão da Nissan para sedãs

 

O Kicks SL vem de série com transmissão automática de variação contínua (CVT) e um amplo conteúdo: acionamento automático de faróis, alarme, ar-condicionado automático, assistente de saída em rampa, banco do motorista com ajuste de altura, bancos e volante revestidos em couro, bolsas infláveis laterais e de cortina, câmeras de 360° com imagem no painel, chave presencial, controle eletrônico de estabilidade e tração, detector de objetos em movimento, direção com assistência elétrica, faróis com leds diurnos, faróis de neblina, fixação Isofix para cadeiras de crianças, freios com distribuição eletrônica (EBD) e assistência de frenagem, navegador, rodas de alumínio de 17 pol, sensores de estacionamento traseiros e sistema de áudio com CD/MP3 e tela de 7 pol.

As três opções referem-se a cores: R$ 1.500 pelo tipo metálico, R$ 2.500 pelo teto em laranja e R$ 500 para que o couro dos bancos e do painel venha em outra cor, além do preto. A garantia é de três anos.

Similar ao carro-conceito de 2014, o Kicks causa ótima impressão pelo estilo moderno e jovial, longe do conservador padrão da Nissan para seus sedãs. As linhas angulosas são bem equilibradas, com traços retos que causam impacto logo de cara. Os formatos sinuosos dos faróis (de duplo refletor) e lanternas destacam-se na carroceria. As rodas de 17 polegadas, além do aspecto esportivo, contribuem para os 20 cm de vão livre do solo, típicos de um utilitário esporte. O coeficiente aerodinâmico (Cx) 0,345 é bom para o tipo de veículo.

 

Lanternas e tampa traseira têm recortes ousados; porta-malas leva bons 432 litros

 

Por dentro nota-se uma bem balanceada mistura de luxo com economia, com detalhes bem acabados como a forração de parte do painel em padrão e cor iguais aos dos bancos, com opção entre três tons, e o aplique que simula alumínio escovado nas portas. O motorista encontra posição confortável até para os mais altos, com ajustes de altura e distância do volante, e seu banco tem formato muito anatômico.

 

 

No centro do painel, a tela de sete polegadas traz informações e interatividade com aparelhos celulares, além de navegador e sistema de áudio com entradas USB e auxiliar. Já o quadro de instrumentos tem, ao lado do velocímetro analógico, um mostrador que pode exibir conta-giros (digital, mas em formato analógico), computador de bordo, consumo instantâneo e alguns ajustes personalizados, como tempo de permanência da luz acesa após fechar a porta.

O carro oferece cintos de três pontos para todos os passageiros, controle elétrico de vidros com função um-toque e abertura/fechamento a distância e banco traseiro bipartido 60/40. O espaço para os passageiros de trás é bom, na média dos concorrentes, com destaque para a altura útil. Satisfaz também a capacidade de bagagem de 432 litros, similar à do HR-V (437) e maior que as de Ecosport (362), Tracker (306) e Renegade (260), embora bem menor que a do Duster (475 litros).

 

Interior tem bom aspecto e painel segue padrão dos bancos; instrumento é configurável

 

O Kicks compartilha com March e Versa o motor flexível de 1,6 litro e quatro válvulas por cilindro e a transmissão CVT. Embora seja atual, com bloco de alumínio e variação do tempo de abertura das válvulas de admissão, e resulte em bons índices oficiais de consumo, a unidade é pouco potente para um carro de sua categoria e seu preço: 114 cv com torque de 15,5 m.kgf. A partida a frio com álcool por preaquecimento do combustível dispensa tanque auxiliar de gasolina.

Embora a plataforma V seja derivada da que serve àqueles carros compactos, as suspensões usam componentes mais robustos e adequados ao tipo de veículo, com maior rigidez no subchassi dianteiro e no eixo traseiro (de torção, como na maioria dos competidores; o Renegade é um caso raro de sistema McPherson). Há também controles eletrônicos que compõem o que a Nissan chama de Controle Dinâmico de Chassi.

Próxima parte

 

Motorista acomoda-se bem e há espaço adequado atrás; tela de 7 pol serve a áudio, navegador e a câmeras que mostram 360 graus, com sensores para obstáculos móveis

 

O Controle Dinâmico em Curvas busca controlar o movimento da carroceria: um sensor de aceleração identifica tal movimento e atua no freio-motor e nos freios em cada roda. Outra função, o Estabilizador Ativo de Carroceria, pode fazer lembrar sistemas sofisticados de controle de suspensão, mas não é o caso: atua de forma semelhante à do dispositivo anterior. Há ainda o Controle Dinâmico de Freio Motor, que recebe sinais de sensores de aceleração e da posição do volante, atuando no freio-motor em curvas e descidas.

 

Ao volante

A Nissan destaca como um dos pontos fortes do Kicks o isolamento acústico. Logo que acionamos o motor, percebemos que o nível de ruído interno é realmente contido, pelo menos em baixa rotação. No trecho urbano em São Paulo, SP, pudemos avaliar atributos como o volante com boa empunhadura e base reta, a direção com acionamento muito suave e ótimo ângulo de giro e o sistema de câmeras em 360°, que não só mostra os espaços dos quatro lados do carro: sensores alertam sobre pessoas, animais ou qualquer coisa se movendo por perto.

 

Suspensão foi bem acertada, mas desempenho com 114 cv está abaixo do esperado

 

Já em rodovia, percebemos que o Kicks merecia um motor mais potente. Os 114 cv para 1.142 kg são pouco diante do que oferece a concorrência nessa faixa de preço (Ecosport, Duster e 2008 têm versões de mesma cilindrada e potência semelhante, mas mais baratas). O fabricante anuncia aceleração de 0 a 100 km/h em 12 segundos e velocidade máxima de 175 km/h, o que confirma a sensação de desempenho tímido. O 2,0-litros de 140 cv do Sentra seria uma interessante opção para ele, para não falar em um turboalimentado.

 

Os 114 cv para 1.142 kg são pouco diante do que oferece a concorrência nessa faixa de preço: o 2,0-litros do Sentra seria uma interessante opção

 

Uma das consequências do uso de CVT é a grande variação de rotação em retomada de velocidade, transmitindo muito ruído do motor para o interior — acima de 4.000 rpm a sensação inicial de silêncio se desfaz e os ocupantes precisam elevar a voz. Fizemos algumas simulações com a transmissão: na posição D (drive), a 120 km/h com acelerador leve, o motor se mantém em baixas 1.800 rpm para favorecer a economia e reduzir os ruídos. Já na posição S, de Sport, acionada por um botão escondido na alavanca, na mesma velocidade o motor vai a 3.500 rpm para responder com rapidez ao acelerador, como em um trajeto sinuoso.

Contudo, ao afundar o pé na acelerador a 60 km/h e levar até 120 km/h, eventual diferença entre as duas posições se torna bem sutil, pois em qualquer caso o motor é levado até 6.000 rpm para pleno aproveitamento de sua potência. Existe ainda a opção L (low, baixa). Como os veículos com CVT apresentam freio-motor muito baixo, o motorista pode optar por manter o L para enfrentar uma descida ou subida íngreme, pois a função simula uma relação de transmissão mais curta. Pena que o Kicks não conte com controlador de velocidade, que faz falta em viagens longas.

 

Motor de 1,6 litro e transmissão automática CVT são os mesmos de March e Versa

 

Apesar de não conseguirmos avaliar todo o aparato de controles eletrônicos no trajeto de avaliação, o Kicks revelou bom compromisso entre estabilidade e conforto no ajuste de suspensão. A visibilidade geral é boa, mas a largura das colunas traseiras se traduz em grande área de ponto cego, a ser compensada pelos retrovisores amplos e bem projetados e as várias câmeras. O que deve incomodar em viagens é a autonomia com álcool pelo diminuto tanque de 41 litros, um mal frequente na marca.

 

 

Com uma grande campanha 100% baseada nos Jogos Olímpicos — o Kicks foi o carro oficial do revezamento da tocha olímpica —, a Nissan anuncia as vendas oficialmente para dia 5 de agosto, data de abertura dos jogos, mas a pré-venda pelo site oficial resultou em 1.800 pessoas predispostas a comprar o novo carro antes mesmo de olharem de perto. Esperamos que eles não se frustrem pelo desempenho…

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Ficha técnica

Motor
Posição transversal
Cilindros 4 em linha
Comando de válvulas duplo no cabeçote
Válvulas por cilindro 4, variação de tempo
Diâmetro e curso 78 x 83,6 mm
Cilindrada 1.598 cm³
Taxa de compressão 10,7:1
Alimentação injeção multiponto sequencial
Potência máxima (gas./álc.) 114 cv a 5.600 rpm
Torque máximo (gas./álc.) 15,5 m.kgf a 4.000 rpm
Transmissão
Tipo de caixa automática de variação contínua
Tração dianteira
Freios
Dianteiros a disco ventilado
Traseiros a tambor
Antitravamento (ABS) sim
Direção
Sistema pinhão e cremalheira
Assistência elétrica
Suspensão
Dianteira independente, McPherson, mola helicoidal
Traseira eixo de torção, mola helicoidal
Rodas
Dimensões 17 pol
Pneus 205/55 R 17
Dimensões
Comprimento 4,295 m
Largura 1,76 m
Altura 1,59 m
Entre-eixos 2,61 m
Capacidades e peso
Tanque de combustível 41 l
Compartimento de bagagem 432 l
Peso em ordem de marcha 1.142 kg
Desempenho e consumo (gas./álc.)
Velocidade máxima 175 km/h
Aceleração de 0 a 100 km/h 12,0 s
Consumo em cidade 11,4/8,1 km/l
Consumo em rodovia 13,7/9,6 km/l
Dados do fabricante

 

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