Confortável, Captur sofre com heranças do Duster

Novo utilitário esporte combina estilo, espaço e itens de conforto; mecânica superada impõe limitações

Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação

 

Em meio à avalanche de lançamentos de utilitários esporte compactos, a Renault precisava se renovar: já não havia muito apelo visual no Duster, apesar de seus atributos. Essa missão cabe ao Captur fabricado em São José dos Pinhais, PR, que começa a chegar às concessionárias na próxima semana em duas versões.

Os novos nomes, que serão estendidos a outros modelos da marca, são Zen para a opção de entrada e Intense para a superior. De início o Captur Zen oferece motor de 1,6 litro (com potência de 118 cv com gasolina e 120 com álcool) apenas com transmissão manual, com preço sugerido a partir de R$ 78.900, enquanto o Intense vem com o de 2,0 litros (143/148 cv) e caixa automática de quatro marchas e começa em R$ 88.490 — veja no quadro abaixo os equipamentos de cada uma. Em alguns meses haverá o Zen 1,6 com transmissão automática de variação contínua (CVT) Jatco.

Por proximidade de preço e potência, a concorrência mais direta do Zen envolve Ford Ecosport Freestyle (1,6 litro, 110/115 cv, R$ 79.150), Honda HR-V LX (1,8, 140/139 cv, R$ 79.900), Hyundai Creta Pulse (1,6, 123/130 cv, R$ 78.290), Jeep Renegade Sport (1,75 litro, 135/138 cv, R$ 79.490), Peugeot 2008 Griffe (1,6, 115/122 cv, R$ 78.790) e o próprio Duster Dynamique (1,6, 118/120 cv, R$ 75.290), todos com transmissão manual. O Chevrolet Tracker tem a versão LT automática (1,4 litro turbo, 150/153 cv) a valor semelhante, R$ 80 mil.

 

 

Na faixa do Captur Intense, sempre com caixa automática, estão Tracker LTZ (mesmo motor do LT, R$ 90 mil), Ecosport Titanium (2,0 litros, 140/147 cv, R$ 93.550), HR-V EX (motor igual ao do LX, R$ 93 mil), Creta Pulse (2,0, 156/166 cv, R$ 92.490), Renegade Longitude (mesmo motor do Sport, R$ 91 mil), Nissan Kicks SL (1,6, 114 cv, R$ 90 mil), 2008 Griffe (mesmo motor do manual, R$ 82.490), Duster Dynamique (2,0, 143/148 cv, R$ 83.540) e Suzuki Vitara 4All (1,6, 126 cv, R$ 90 mil).

 

O ambiente interno repete o do modelo francês nas formas; na versão Intense os bancos têm inserções de couro em tom marfim e o quadro de instrumentos usa velocímetro digital

 

Duster e 2008 têm quatro marchas na caixa automática como o Captur: os demais vão de seis, salvo por HR-V e Kicks, que usam CVT. A proximidade de preços entre o novo Renault e seu “irmão mais velho” não deixa dúvidas: será preciso reduzir os valores do Duster, seja oficialmente ou mediante promoções, se a marca pretender mantê-lo no mercado.

Ao primeiro olhar, o Captur brasileiro pode parecer igual ao lançado na Europa em 2013, salvo por detalhes como o para-choque dianteiro. Engano: apenas portas dianteiras, tampa traseira e poucos outros itens são iguais entre eles. A versão escolhida para nosso mercado, desenvolvida pela Renault local, apareceu no ano passado na Rússia sob o nome Kaptur e difere tanto em dimensões quanto em plataforma e mecânica.

 

O estilo é quase igual ao do francês, mas o Captur nacional segue a carroceria do Kaptur russo, com 21 cm a mais de comprimento

 

O Captur francês é um tanto compacto, com 4,12 metros de comprimento, 2,61 m de distância entre eixos e capacidade de bagagem de 377 litros com o banco traseiro corrediço na posição mais avançada. A versão brasileira mede 4,33 e 2,67 m, na ordem, o que a deixa na liderança da classe em ambos as medidas, e leva 437 litros de bagagem (não há ajuste longitudinal do banco). Além disso, o modelo da França baseia-se na moderna plataforma do Clio de quarta geração, enquanto a arquitetura do nosso foi, segundo a Renault, “inspirada” na do Duster.

 

 

Do ponto de vista estético o Captur nacional parece ter bons argumentos, mesmo que a versão alongada e elevada em relação ao solo nos pareça menos harmoniosa que a original. É um desenho tipicamente francês, com curvas suaves, poucas arestas e detalhes interessantes como os faróis com refletor elipsoidal para o facho baixo, luzes diurnas com leds e opção de pintura em dois tons — o teto pode ser preto ou marfim em vez da cor da carroceria. As rodas de alumínio de 17 pol são as mesmas nas duas versões, salvo pelo acabamento.

O ambiente interno repete o do modelo francês nas formas, mas temos dúvida se usam os mesmos materiais: no brasileiro os plásticos são todos rígidos e de aspecto melhorável, ainda que os elementos cromados e em preto brilhante valorizem a aparência. Incompatível com a faixa de preços é o porta-luvas — que, não por acaso, é diferente no francês. No conjunto, embora mais agradável aos olhos que o do Duster (seria difícil o contrário), o acabamento do Captur nos parece inferior aos de Renegade e Kicks, por exemplo.

 

Interior tem bom aspecto, amplo espaço e bancos confortáveis, mas falhas de acabamento; espaço de bagagem do brasileiro é maior, 437 litros

 

Na versão Intense com bancos de tecido há inserções de couro em tom marfim, cor que se repete na seção inferior do painel e parte das portas; caso venha com couro, tudo passa a ser preto. O volante é exclusivo do brasileiro. O quadro de instrumentos usa velocímetro digital e traz luzes para motor frio e quente em vez de termômetro. Em se tratando de Renault, é boa notícia ver a posição adequada da tela central de sete polegadas do sistema Media Nav, que compreende áudio, telefone, navegação e monitor de condução eficiente: modelos como Logan, Sandero e Duster a trazem baixa demais ou inclinada a ponto de produzir reflexos.

Outras evoluções do Captur em relação ao “irmão velho” são ar-condicionado automático e bem mais silencioso, retrovisor esquerdo biconvexo e chave presencial em forma de cartão para acesso e partida (por botão). O controle elétrico de vidros tem função um-toque para todos e, ao sair, nota-se com satisfação que a vedação inferior das portas protege a soleira de poeira ou lama — chega de sujar a barra da calça como no Duster. A visibilidade dianteira está na média do segmento; a traseira é crítica.

Próxima parte

 

Versões, preços e equipamentos

Captur Zen 1,6 manual (R$ 78.900): alarme perimétrico, ar-condicionado, assistente de partida em rampas, bolsas infláveis frontais e laterais, chave-cartão presencial, comando satélite de áudio, controlador e limitador de velocidade, controle eletrônico de estabilidade e tração, direção com assistência eletro-hidráulica, fixação Isofix para cadeira infantil, luzes diurnas em leds, rodas de alumínio de 17 polegadas com pneus 215/60, volante com regulagem em altura. Opcionais: sistema de áudio com câmera traseira de manobras, navegador e tela de 7 pol (Media Nav, R$ 2.000), pintura em dois tons (R$ 1.400).

Captur Intense 2,0 automático (R$ 88.490): como o Zen, mais apoio de braço central, ar-condicionado automático, faróis de neblina com iluminação de curvas, faróis e limpador de para-brisa automáticos, rodas diferenciadas, sistema Media Nav, transmissão automática. Opcionais: bancos de couro (R$ 1.500) e pintura em dois tons (R$ 1.400).

Garantia: três anos ou 100 mil quilômetros, o que ocorrer primeiro.

Próxima parte

 

Versão Zen é quase igual por fora e também pode ter teto em preto ou marfim; motor SCE de 1,6 litro e 120 cv terá opção de caixa CVT em alguns meses

 

Pontos melhoráveis: não há regulagem do volante em distância, faixa degradê no para-brisa ou iluminação nos espelhos dos para-sóis, e estranham-se os botões de controlador/limitador de velocidade e do modo de condução Eco (que altera parâmetros de acelerador e transmissão) embaixo da alavanca de freio de estacionamento. Curioso é ver o capô sustentado por vareta em um carro refinado, enquanto o espartano Duster usa mola a gás: a Renault argumenta que a mola gera pontos de tensão na chapa e, com o tempo, afeta seu alinhamento.

O Captur dispõe de banco traseiro espaçoso e confortável, dotado de encostos de cabeça e cintos de três pontos para todos os passageiros (o cinto central vem do teto), assim como fixações Isofix para cadeira infantil. O compartimento de bagagem oferece espaço entre os maiores da classe, embora perca para o do Duster (437 ante 475 litros), e sua forma quadrangular facilita acomodar a bagagem. Como no “irmão”, o estepe fica abaixo da carroceria, enquanto no francês vem por dentro; o pneu é diferente dos de serviço.

 

Trem de força poderia ser melhor

Menor, com outras ambições de mercado e destinado a países com normas severas de emissão de gás carbônico (CO2), o Captur francês usa motores compactos e eficientes: de três cilindros e 900 cm³ com turbo e 90 cv, de 1,2 litro turbo com 120 cv (ambos a gasolina) e turbodiesel de 1,5 litro com 90 ou 110 cv. No Brasil, tudo muda: as unidades flexíveis são a SCE de 1,6 litro de origem Nissan e a F4R de 2,0 litros, iguais às do Duster atual.

 

Interior do Zen perde alguns equipamentos e cobra à parte pelo sistema de aúdio e navegação com tela de 7 pol; atrás há cintos de três pontos e Isofix

 

Decepciona encontrar algo tão antigo — o F4R surgiu aqui em 2001 na Scénic — sob o capô de um carro moderno como o Captur. Embora careça de evoluções para ganhar potência, a unidade Nissan que equipa o Fluence é superior em refinamento, usa corrente para acionar os comandos de válvulas (correia dentada no F4R), tem bloco mais leve de alumínio e já teria pronto o “casamento” com a caixa CVT, em vez de recorrer à ultrapassada caixa automática Renault de quatro marchas, também originária da Scénic.

 

No uso urbano a impressão é de conforto: as mudanças de marcha são suaves, a suspensão macia revela-se agradável e o nível de ruído é baixo no tráfego

 

Outras especificações que o Captur reprisa do Duster são suspensão traseira por eixo de torção, freios a tambor atrás (HR-V e Renegade têm discos em todas as versões) e assistência eletro-hidráulica de direção (o francês e a maior parte dos concorrentes locais usam elétrica, não prevista para esta plataforma), mas os pneus 215/60 em rodas de 17 pol são inéditos. A Renault destaca o maior vão livre do solo da categoria, 212 mm. Para tração integral — disponível na Rússia — o fabricante não vê demanda suficiente aqui, embora afirme que a engenharia está feita para eventual interesse do mercado.

O Best Cars dirigiu o Captur Intense por 70 quilômetros no lançamento à imprensa, que tinha poucas unidades 1,6 à disposição — a fábrica espera maiores vendas para o 2,0, o que a nosso ver pode mudar com a estreia da caixa CVT para o motor menor. O trajeto de São Paulo, SP, até a Estrada Velha de Santos incluiu trânsito urbano e rodovia.

 

Motor de 2,0 litros e caixa automática do Duster limitam o Captur: desempenho só razoável, grande intervalo entre marchas, consumo melhorável

 

A primeira boa impressão é de conforto, com bancos dianteiros bem desenhados e com apoio lateral adequado, volante bem definido e apliques macios nas portas na região em que se apoia o braço. Motor e caixa dão conta do recado nas situações mais comuns de uso e, com bom trabalho de calibração das centrais eletrônicas, as mudanças de marcha são suaves. Em pisos ondulados a suspensão macia revela-se agradável e o nível de ruído é baixo ao seguir a corrente de tráfego: acreditamos quando a Renault diz que isolamento acústico foi um dos pontos mais trabalhados do modelo.

 

 

A satisfação diminui ao chegar à rodovia dos Imigrantes: acelerado a fundo, o velho F4R torna-se áspero e ruidoso acima de 4.000 rpm — embora menos que no Duster —, fornece desempenho apenas razoável e sofre com o grande intervalo entre as relações da caixa, inerente às quatro marchas. A quarta impõe 3.000 rpm a 120 km/h, mais que o usual hoje, e quando se requer mais potência a rotação sobe além do necessário por falta de marchas intermediárias. Ah, como ficaria melhor com seis…

Os dados oficiais de desempenho refletem a baixa eficiência da caixa: o pesado Intense automático (1.352 kg) com álcool acelera de 0 a 100 km/h em 11,1 segundos, apenas 0,8 s a menos que o Zen manual (1.273 kg, também um alto peso para seu porte), apesar dos 28 cv de diferença. Além disso, as limitações da transmissão impactam no consumo, com modestos 7,3 km/l de álcool em rodovia pelo padrão do Inmetro, por mais que os discutíveis critérios do órgão lhe atribuam nota A na categoria (o HR-V cumpre 8,5 km/l na mesma condição).

 

Isolamento de ruídos foi grande progresso em relação ao Duster; acerto de suspensão privilegia conforto, mas pode melhorar em impactos

 

Como o trajeto não previa curvas rápidas, impressões sobre estabilidade ficam para a avaliação completa. Foi possível apenas andarmos de passageiros em uma demonstração do controle eletrônico de estabilidade e tração em circuito, incluindo pisos de baixa aderência. Um breve trecho esburacado confirmou o acerto confortável da suspensão, talvez mais que no Duster, mas com um mal herdado do “irmão”: transmite mais os grandes impactos do que alguns concorrentes. Pareceu-nos também que a direção filtra mal as irregularidades quando esterçada: assistência elétrica costuma ajudar muito nesse aspecto.

As heranças do Duster parecem ser mesmo o grande limitador do Captur. Bonito, agradável por dentro, espaçoso e com boa oferta de itens de conforto e segurança (faltaram bolsas infláveis de cortina), ele seria muito beneficiado por um trem de força mais moderno na versão Intense ou, ao menos, uma transmissão atual para aproveitar melhor o motor. Do modo como a versão de topo foi lançada, não será fácil fazer mudar de direção quem estava inclinado a levar para casa um dos líderes da categoria.

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Ficha técnica

Zen 1,6 manual Intense 2,0 automático
Motor
Posição transversal
Cilindros 4 em linha
Comando de válvulas duplo no cabeçote
Válvulas por cilindro 4, variação de tempo
Diâmetro e curso 78 x 83,6 mm 82,7 x 93 mm
Cilindrada 1.597 cm³ 1.998 cm³
Taxa de compressão 10,7:1 11,2:1
Alimentação injeção multiponto sequencial
Potência máxima (gas./álc.) 118/120 cv a 5.500 rpm 143/148 cv a 5.750 rpm
Torque máximo (gas./álc.) 16,2 m.kgf a 4.000 rpm 20,2/20,9 m.kgf a 4.000 rpm
Transmissão
Tipo de caixa e marchas manual, 5 automática, 4
Tração dianteira
Freios
Dianteiros a disco ventilado
Traseiros a tambor
Antitravamento (ABS) sim
Direção
Sistema pinhão e cremalheira
Assistência eletro-hidráulica
Suspensão
Dianteira independente, McPherson, mola helicoidal
Traseira eixo de torção, mola helicoidal
Rodas
Dimensões 17 pol
Pneus 215/60 R 17
Dimensões
Comprimento 4,329 m
Largura 1,813 m
Altura 1,619 m
Entre-eixos 2,673 m
Capacidades e peso
Tanque de combustível 50 l
Compartimento de bagagem 437 l
Peso em ordem de marcha 1.273 kg 1.352 kg
Desempenho e consumo (gás./álc.)
Velocidade máxima 168/169 km/h 174/179 km/h
Aceleração de 0 a 100 km/h 13,3/11,9 s 12,0/11,1 s
Consumo em cidade 10,9/7,6 km/l 8,8/6,2 km/l
Consumo em rodovia 11,3/8,0 km/l 10,8/7,3 km/l
Dados do fabricante; consumo conforme padrões do Inmetro

 

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