Ford Galaxie, LTD e Landau: superlativos em conforto

Fabricados por 17 anos, os grandes sedãs ofereciam espaço e maciez ao rodar que nunca foram superados

Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação*

Que carro nacional representou o máximo em conforto em todos os tempos? Para muitos conhecedores, a resposta será a linha composta por Ford Galaxie, LTD e Landau. Esses sedãs de origem norte-americana, lançados em 1966 e produzidos até 1983, marcaram época como poucos automóveis brasileiros.

O primeiro Galaxie apareceu nos Estados Unidos em 1959 como o Ford de grande porte. Oferecia seis modelos, com destaque para o conversível Skyliner, cujo teto rígido alojava-se no porta-malas em 60 segundos. Como era praxe na época, ostentava muitos cromados e aletas (“rabos de peixe”) nos para-lamas traseiros. As opções de motores passavam por um seis-cilindros de 3,65 litros, o V8 de 4,8 litros e o V8 de 5,7 litros com até 300 cv (potência bruta, como todas as citadas neste artigo).

O primeiro Galaxie nos EUA, e 1959 (ilustrações em cima), e o modelo 1966 em versões cupê e sedã hardtop, que não chegaram aqui

O modelo 1960 crescia e no ano seguinte aparecia o V8 390 (6,4 litros) de até 375 cv. Esse motor dava lugar em 1962 ao de 406 pol³ (6,6 litros) e até 405 cv. O famoso 427 (7,0 litros) chegava um ano depois com 410 cv. A reformulação para 1965 deu ao Galaxie as linhas com que o conhecemos no Brasil, com faróis sobrepostos.

Havia 17 versões, incluindo sedãs normais e hardtop (sem coluna central), perua, cupê e conversível, e cinco motores do seis-cilindros de 4,0 litros ao V8 de 7,0 litros e 425 cv. No ano seguinte somava-se o V8 de 428 pol³ mais “manso”, com 345 cv. Essa linha foi mantida até o modelo 1967 — uma nova geração de estilo mais esportivo, mas menos potente, aparecia para o ano seguinte. Em 1974 a empresa deixava de produzir a linha Galaxie.

O primeiro automóvel da Ford

A Ford instalou-se no Brasil em 1°. de maio de 1919 para a montagem de automóveis Modelo T e caminhões TT com peças importadas da matriz. Entretanto, quando o GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística) iniciou a implantação da indústria automobilística nacional, definiu-se que tanto a Ford quanto a General Motors produziriam apenas caminhões. O primeiro modelo da Ford fabricado no país, em agosto de 1957, era um F-600 para seis toneladas com motor V8 a gasolina e 40% de nacionalização. A picape F-100 começava a ser feita em outubro.

O Galaxie 500 estreava em 1967 com linhas iguais às do norte-americano: era o maior carro então fabricado no Brasil

Foram precisos 10 anos para que a Ford passasse a produzir aqui um carro de passageiros. E, apesar da escassa motorização dos brasileiros, o modelo escolhido não era econômico e acessível, mas luxuoso e caro: o Galaxie 500, baseado no que os EUA fabricavam desde 1965. Cercada de grande expectativa, a novidade fazia sua aparição no 5°. Salão do Automóvel em 26 de novembro de 1966 no Parque do Ibirapuera, em São Paulo. Produzida a primeira unidade em 16 de fevereiro de 1967, o lançamento ao mercado dava-se em 2 de abril, um momento histórico para a Ford — e para a indústria nacional.

Construído sobre chassi, o Galaxie já trazia carroceria com deformação programada na frente e na traseira e opção de direção com assistência hidráulica

Externamente o Galaxie brasileiro era muito semelhante ao norte-americano, com porte avantajado (5,3 metros de comprimento, 2 m de largura, 3,02 m entre eixos), enorme balanço traseiro e o predomínio de linhas retas. Os robustos para-choques, as calotas, frisos, grade e o retrovisor eram cromados, seguindo a tendência da época. De cada lado da ampla grade vinham dois faróis circulares sobrepostos; as lanternas traseiras eram retangulares. Na publicidade a Ford grafava Gálaxie, com acento, para ensinar a pronúncia correta do nome.

O espaçoso interior acomodava com folga até seis pessoas em dois bancos inteiriços (o dianteiro com encosto fixo), permitidos pela montagem da alavanca da transmissão manual de três marchas na coluna de direção. O painel tinha escalas horizontais nos instrumentos e diversas luzes-piloto. Duas delas indicavam motor frio e superaquecido, em vez de um marcador de temperatura analógico (ambas apagadas em temperatura normal); outra apontava o uso do freio de estacionamento, acionado por pedal e liberado por alavanca. Integrado ao conjunto estava um rádio ainda não transistorizado.

Velocímetro horizontal, rádio integrado ao painel, transmissão na coluna; com bancos inteiriços, ele levava até seis pessoas

O sistema de ventilação forçada, raro no mercado, promovia alguma renovação de ar (não havia saídas de ar de cabine) e o desembaçamento do para-brisa. Os quebra-ventos eram movimentados por pequenas manivelas e, nas portas, molas limitadores de posição permitiam mantê-las abertas em dois ângulos, 45° e total. Tão extenso era o porta-malas (embora um tanto raso) que, à frente de toda a bagagem, ainda cabia o enorme estepe em posição horizontal. No começo, uma falha era a ausência de trava de direção e tranca para o bocal do tanque de combustível.

Motor de picape

O Galaxie era construído sobre chassi de longarinas (de desenho perimetral e não tipo escada), solução hoje abandonada nos automóveis em favor do monobloco, e já trazia carroceria com deformação programada na frente e na traseira, um fator de segurança. As suspensões tradicionais empregavam molas helicoidais bastante macias, em benefício do conforto, e só precisavam de lubrificação a cada 50 mil quilômetros. Os freios a tambor nas quatro rodas tinham regulagem automática e, pela primeira vez no País, o de estacionamento era acionado por pedal. Havia opção de direção com assistência hidráulica.

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A ambulância


Embora o Galaxie não tenha sido oferecido no Brasil em versão perua, como as norte-americanas, a Ford local fez pelo menos um desses carros. Era o Galaxie 500 ambulância, apresentado em 1969 como trabalho da própria fábrica. Segundo a empresa, ela foi desenvolvida por seu centro de estilo em horários de folga.

Além da extensão do teto até perto do limite da traseira, a perua — que manteve as quatro portas — usava o para-choque traseiro da similar feita nos EUA. Os vidros da coluna central para trás eram opacos. No compartimento dianteiro a ambulância era como o Galaxie de série, mas com couro e vinil brancos aplicados a bancos, painel, painéis de porta e até ao volante.


Na parte de trás havia uma ampla maca, que corria sobre trilhos no assoalho plano, e banco para um acompanhante no lugar do banco traseiro original. Essa parte era separada da área do motorista por um vidro corrediço. A tampa traseira abria-se em duas partes, o vidro para cima e a seção inferior para baixo — arranjo muito usado em peruas norte-americanas. Na parte mecânica, para lidar com a diferente distribuição de peso, a fábrica aplicou molas traseiras reforçadas, amortecedores e freios redimensionados e o diferencial da picape F-100.

Não se sabe se a Ford chegou a usar a ambulância (provavelmente feita em exemplar único) para transporte de feridos na fábrica. Seu emprego mais conhecido, como mostram fotos de época, era apoio a competições da Fórmula Ford na década de 1970, onde a utilidade acrescentada a um dos mais luxuosos carros nacionais ganhava apelo especial. A perua foi leiloada no encontro de carros antigos de Águas de Lindoia, SP, em 2001 e depois restaurada às condições originais.

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* Agradecimento ao Cadastro Nacional do Galaxie por imagens e informações usadas neste artigo

O Galaxie usava um resistente chassi perimetral; o motor V8 de 4,5 litros vinha da picape F-100, mas com cabeçotes de alumínio

O robusto motor V8 cedido pela F-100, com 272 polegadas cúbicas de cilindrada (4.458 cm³) e comando de válvulas no bloco, recebia cabeçotes de alumínio para reduzir o peso. Ele desenvolvia potência de 164 cv e torque de 33,4 m.kgf pelos padrões brutos usuais na época: não era o ideal para o elevado peso do Galaxie, 1.780 kg. Ainda assim, o primeiro automóvel da Ford logo assumia uma posição de prestígio no mercado, dada a escassa concorrência nacional, com qualidades que eram apreciadas nos carros norte-americanos.

Na primeira avaliação, a revista Quatro Rodas destacou sua comodidade: “Surpreende a suavidade de marcha e a quase ausência de ruído do motor no interior do carro. Nos buracos, percebe-se a alta qualidade da suspensão. No assento de trás você pode até cruzar as pernas. O torque é mais que suficiente para passar em terceira marcha de 40 km/h para até 120, sem trepidação. A direção é macia e obediente. Nas curvas, acostumados, já nem percebemos que estamos dirigindo um carro grande”.

Direção assistida e freio de estacionamento por pedal eram novidades no mercado; o ar-condicionado vinha logo depois

A Ford indicava velocidade máxima de 165 km/h. Mais tarde, em teste completo, a revista obteve aceleração de 0 a 100 km/h em 14,9 segundos e observou o desempenho limitado: “O Galaxie não tem a aceleração que suas linhas sugerem. O consumo é naturalmente alto”, como 7,7 km/l a 100 km/h constantes e cerca de 4 km/l em uso urbano. Por outro lado, seu comportamento foi aprovado.

“A aderência do carro à estrada é perfeita em qualquer tipo de pavimentação. Na estrada é possível manter-se velocidade média elevada. A suspensão apresenta equilíbrio capaz de vencer curvas de alta velocidade com toda a segurança. A direção hidráulica — que transforma a tarefa de operá-la em simples brinquedo — não atrapalha em nada”. A conclusão foi que o carro oferecia “conforto e qualidade em padrões internacionais”.

Vinil no teto, madeira no painel, apoio de braço e outros refinamentos vinham no LTD, junto ao motor de 4,8 litros

O total de produção do Galaxie em 1967, com 9.237 unidades, se manteria seu recorde até o fim da produção. Nos anos seguintes vinham novos equipamentos que acentuavam seu conforto. A linha 1969 passava a oferecer a versão LTD (de limited, edição limitada, o que na verdade não era) com acabamento mais refinado: teto revestido em vinil, grade e frisos diferenciados, tapetes espessos, painel e portas com revestimentos em jacarandá da Bahia. Trazia ainda retrovisor externo com ajuste interno (por um botão no painel, opcional), lampejador de farol alto, espelho de cortesia no para-sol direito e apoio de braço central no banco traseiro.

Embora com um motor não ideal para seu peso, o Galaxie logo assumia uma posição de prestígio, com qualidades apreciadas nos carros norte-americanos

Junto do LTD vinha um motor de 292 pol³ (4.785 cm³, obtidos com maior diâmetro dos cilindros), 190 cv e 37 m.kgf para melhora razoável no desempenho. Era vinculado à transmissão automática de três marchas — chamada de Cruise-o-Matic nos EUA e Ford-o-Matic aqui —, a primeira em carro nacional. O ar-condicionado tinha evaporador, comandos e difusores de ar ainda sob o painel, enquanto a direção assistida era tão leve que o volante podia ser movido com um só dedo, chegando a assustar os desavisados.

Em teste, a Quatro Rodas apontou que “em velocidades mais elevadas ainda falta potência ao carro, mas ele atinge 100 km/h em apenas 17,4 segundos. Enfrentar o trânsito congestionado com esse carrão é um brinquedo. Sua estabilidade é bastante boa e, em curvas onde não se chega à compressão máxima da suspensão, o LTD apresenta-se muito dócil e seguro”.

Na publicidade, destaques ao conforto, espaço e silêncio ao rodar; para o LTD, a primeira transmissão automática do Brasil

A combinação do motor 292 à caixa manual tornava-se disponível apenas no modelo 1970 do Galaxie 500, que agora acelerava de 0 a 100 km/h em 13 segundos. Na mesma época surgia o Galaxie Standard ou básico, mais simples e acessível, para concorrer com o então novo Dodge Dart e com o Chevrolet Opala 3800. Despojado no acabamento interno e externo, ele perdia a direção assistida, a ventilação forçada, as calotas e muitos cromados, e não podia vir com ar-condicionado ou transmissão automática nem como opcionais.

Antes mesmo de chegar às ruas esse Galaxie era apelidado de “Teimosão” ou “Pé-de-Camelo”, em alusão às versões populares Teimoso do Renault Gordini e Pé-de-Boi do Volkswagen, fabricadas anos antes. De pouco sucesso, o modelo básico teve cerca de 1.300 unidades produzidas até 1972, sempre em número bem menor que o do Galaxie 500 ou o do LTD a cada ano.

O Galaxie básico dispensava confortos para competir em preço com o Dodge Dart, mas a proposta teve pouca aceitação

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Os especiais

A linha Galaxie passou por diferentes transformações e adaptações, sobretudo depois de sair de produção, quando os carros tinham baixo valor de mercado. Há registro de modelos modificados para perua, conversível, limusine e até picape.


Entre as limusines, ficou famosa nos anos 80 a da cantora e empresária Lilian Gonçalves, pintada em branco-pérola com o teto de vinil creme. Realizada pela Max Golden Car a partir de dois Landaus, a transformação deixou o carro com 6,40 metros de comprimento e incluiu televisor, videocassete, geladeira e isolamento entre o motorista e os passageiros. Desde então, muitos sedãs receberam essa conversão para atender a um mercado em especial: o transporte de noivas até o casamento (acima o da empresa Bauru Limousine).

No II Salão do Veículo Fora de Série, em 1987, uma empresa apresentou o Landau Van (foto). O sedã tornava-se um furgão de lazer, com seção traseira bem mais alta, rodas largas e pintura chamativa.

O Landau foi transformado também em carro fúnebre em Caxias do Sul, RS, pela empresa RVM Carrocerias Ltda. na década de 1980. O luxuoso sedã recebia alongamento da capota e adaptação na parte traseira para o serviço, realizado com classe e sobriedade difíceis de obter em outro veículo. As portas traseiras eram soldadas. O vidro traseiro basculante servia de acesso ao compartimento.

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Vidro traseiro menor e o adorno das antigas carruagens distinguiam o LTD Landau; as lanternas traseiras mudavam para 1971

O sofisticado Landau

A Ford apontava para o caminho oposto, o do requinte, com o LTD Landau em 1971. A palavra de origem francesa identificava antigas carruagens cujo teto podia ser recolhido metade para frente e metade para trás, usando uma dobradiça central em forma de “S”. No caso do sedã Ford não havia capota conversível, mas um adorno nas colunas traseiras simulava tal dobradiça.

Além desses e de outros adornos, o Landau trazia um vidro traseiro reduzido, para tornar o interior mais privado e aconchegante; calotas raiadas, também inspiradas em carruagens; revestimento da capota em vinil corrugado, por fora, e material aveludado, por dentro; e revestimento dos bancos em couro ou em jérsei. Havia luzes de leitura na traseira, controladas pelo motorista, e dois alto-falantes em vez de um só. A transmissão podia ser manual ou automática. O ar-condicionado era o único outro opcional.

A linha recebia opção de freios dianteiros a disco para 1972 e o Landau podia ter o teto na cor areia; embaixo, LTD e Galaxie 500

Ainda no modelo 1971, as lanternas traseiras passavam a ter três elementos verticais em cada lado, mantendo o formato do conjunto, e surgia um escudo como adorno na tampa do porta-malas. Os freios do Landau traziam assistência e em todas as versões eram aprimorados, mantendo os tambores: só em 1972 surgia a opção pelos dianteiros a disco. Esse ano-modelo vinha também com opção de teto na cor areia para o Landau, aquecimento interno e lampejador de farol alto na alavanca das luzes de direção.

No teste do LTD Laudau 1972, a Quatro Rodas destacou novamente o conforto: “O molejo macio, o silêncio e o bom estofamento tornam o LTD o carro mais confortável fabricado o Brasil, comparável aos melhores carros de luxo do mundo. A qualidade do material de acabamento é um dos pontos altos. É o carro nacional mais silencioso que testamos — nem o ruído do motor é ouvido. A direção pode ser controlada com um dedo só, e é precisa em alta velocidade”.

Com caixa manual, o carro acelerou de 0 a 100 km/h em 14,4 segundos e alcançou a máxima de 157 km/h, despertando nova cobrança: “Um carro com quase duas toneladas deveria ter um motor mais possante. O LTD apresenta um desempenho modesto, faltando força nas arrancadas e subidas. Em média, faz de 3 a 6 km/l, coerente com a cilindrada e o tamanho do carro”.

Grade protuberante no centro, ressalto no capô e traseira remodelada para 1973; o LTD Landau ganhava um adorno sobre o capô


Alterações visuais davam um ar mais atual à linha Galaxie em 1973. O capô recebia um ressalto na parte central, que combinava com a seção mais protuberante da nova grade dianteira. As luzes de direção vinham na grade e, no caso do LTD Landau, faziam parte de seções retangulares na cor da carroceria, o que diferenciava melhor o topo de linha. Sobre o capô dessa versão aparecia um adorno igual ao emblema da Lincoln, divisão da Ford norte-americana, só que posicionado na horizontal.

O novo motor 302, importado do Canadá e o mesmo do Maverick, não era apenas outro aumento de cilindrada: tinha projeto mais moderno e peso 64 kg menor que o do anterior

Os novos para-lamas, que mostravam lanternas em forma de trapézio, deixavam a traseira mais plana e com sensação de maior largura. Luzes de ré vinham no para-choque. O adorno do capô estava também na tampa traseira do LTD.

Novo motor, estilo atualizado

A alta da gasolina que se seguiu trouxe dificuldade às vendas de carros grandes e de alto consumo, fazendo com que só em 1976 a Ford voltasse a efetuar modificações — as mais extensas desde seu lançamento. Os quatro faróis agora vinham em linha horizontal, com as luzes de direção nas extremidades onde antes eles ficavam, e podiam usar lâmpadas halógenas para melhor iluminação.

Faróis na horizontal marcavam a reestilização de 1976, a maior em sua história; o Landau vinha apenas em prata, incluindo o teto

A grade estava menor, com barras verticais (apenas o Galaxie 500 mantinha os frisos horizontais), e o para-choque dianteiro trazia a placa no lado esquerdo, pois na parte central havia uma tomada de ar para o radiador. Na traseira as lanternas eram conjuntos de três retângulos, com as luzes de ré ainda no para-choque, e todas as seis se acendiam, conferindo ar imponente à noite.

A versão de topo Landau, agora desmembrada do LTD, vinha em cor única prata Continental metálico com teto de vinil no mesmo tom. Contudo, a Ford atendia a pedidos de outras cores, como preto para autoridades governamentais. Suas calotas de aço inoxidável traziam no centro o símbolo da “mira” do capô. No interior, o painel dos três modelos usava novo material (plástico ABS), mais seguro em caso de colisões. O Landau ostentava tecido de alto padrão nos bancos, forro do teto em vinil prata, carpete espesso no assoalho e luzes de leitura nas colunas traseiras para os passageiros.

Todas traziam um novo motor, importado do Canadá e o mesmo do Maverick. Não era apenas outro aumento de cilindrada — agora 302 pol³ ou 4.949 cm³ —, mas um motor de projeto mais moderno, com 199 cv e 39,8 m.kgf e peso bem menor: 205 kg ante 269 kg do antigo 4,8-litros. Com caixa manual o Galaxie chegava a 160 km/h e acelerava de 0 a 100 em 13 segundos; com transmissão automática, 150 km/h e 15 segundos. O duplo circuito de freios trazia mais segurança.

No Galaxie a grade dianteira era mais simples, mas todos recebiam seis lanternas traseiras e o motor 302, mais leve e potente

A Quatro Rodas aprovou o novo motor no teste com ambas as transmissões: “Melhorou o desempenho tanto em velocidade máxima como em aceleração e retomada. Os carros conservaram a tradicional robustez, agora aliada a um desempenho mais adequado ao prestígio de que desfrutam. Mas ficaram pontos a serem revistos, a começar pelo superaquecimento do motor e a suspensão, que chega ao fim do curso mesmo sem o carro estar cheio”.

As novidades foram bem-recebidas pelo mercado: com 7.063 unidades fabricadas, 1976 foi o melhor ano da década para a linha Galaxie, atrás apenas dos totais de 1967 e 1968. Dali em diante houve poucas novidades. Em março de 1978 aparecia a série II daquele ano-modelo com para-brisa laminado (mais seguro em caso de quebra por não estilhaçar), volante de quatro raios, novo revestimento nos bancos, opção de faróis de iodo (em vez do tipo selado, sealed-beam, popularmente chamado de “silibim” no Brasil), pneus radiais (opcionais no 500) e temporizador do limpador de para-brisa.

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Nas pistas


Na época em que os últimos carros nacionais com motor V8 deixavam de ser produzidos, no começo da década de 1980, surgia uma categoria de competição para eles: a Turismo 5000. Na época, diante do alto preço da gasolina, tais modelos de alto consumo pouco valiam no mercado de carros usados — e a cultura de preservar o automóvel antigo levaria tempo a se espalhar pelo Brasil.

Os modelos da linha Dodge (como o Dart) e o Ford Maverick eram as escolhas mais comuns, por questão óbvia de tamanho e peso. Muitas vezes corria-se com um carro de uso diário sem qualquer preparação mecânica. Mas houve quem se interessasse em colocar nas pistas o Galaxie, como Luiz Francisco Baptista, preparador da oficina paulistana Agromotor (hoje Automotor).

Baptista descartou de um Landau tudo que pudesse para aliviar peso, incluindo as portas traseiras (restaram as folhas externas, soldadas à carroceria), para-choques, direção assistida (foi usada a caixa sem assistência do Galaxie básico), servo-freio e todas as forrações. De início o carro ganhou a grade dianteira mais leve do Galaxie 1967, depois trocada por uma simples abertura para o radiador. No interior, o grande banco inteiriço deu lugar ao assento de alumínio de um velho avião.

Como contou ao blog Cadastro Nacional do Galaxie, Baptista soldou a carroceria ao chassi, criando um monobloco. O fato peculiar é que a carroceria ficava mais para a esquerda, acentuando a distribuição de peso desse lado, ideal para o anel externo que só tinha curvas para a esquerda.

“O Galaxie ficou muito bom de correr graças à distribuição de pesos, distância entre eixos, bitola e as modificações de suspensão e da aerodinâmica. Também freava bem. Os freios traseiros, como em quase todos os participantes, eram a disco de Alfa Romeo 2300 com pinças de VW Brasília. Consegui deixar o Galaxie com menos de 1.200 kg: era mais leve que alguns Mavericks. Fizemos testes com motores 272 e 292. Finalmente colocamos o 302, o melhor de todos para competição”, relembra Baptista. Nas mãos de Denísio Casarini, o Landau preparado chegou a obter terceiro lugar em sua última prova.

Agradecimentos ao Cadastro Nacional do Galaxie

Carro de presidentes e de Papa


O Landau foi por muito tempo o preferido de autoridades governamentais. Em 1979, quando João Figueiredo era o presidente da República, a Ford adaptou o motor V8 para uso de álcool, novidade amplamente divulgada pela publicidade a favor do “combustível brasileiro”.

Mesmo após o encerramento de sua produção, a Presidência manteve em uso um modelo 1982 a álcool. Só em 1990, após longo tempo de serviço e em mau estado, ele foi substituído por um Lincoln Town Car, cedido em regime de comodato pela Ford ao então recém-empossado presidente Fernando Collor.


Landaus especiais serviram também ao Papa João Paulo II durante sua visita ao Brasil em 1980. Um sedã preto daquele ano recebeu quatro bancos individuais revestidos em cinza e grande teto solar na seção traseira do teto, para que o pontífice pudesse circular de pé à vista dos fiéis. Os outros dois carros usados no evento, também pretos, eram modelos 1976 e 1979, um deles com teto solar.

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Na série II de 1978 do Galaxie, novidades como faróis de iodo, pneus radiais, para-brisa laminado e volante de quatro raios

A ignição eletrônica substituía condensador e platinado na linha Galaxie 1979, o que aprimorava o funcionamento do motor e facilitava a manutenção. A embreagem hidrodinâmica para o radiador reduzia o consumo de energia e o ar-condicionado, enfim, estava integrado ao painel. O Galaxie 500 era eliminado, restando LTD e Landau, este apenas com caixa automática.

Em agosto daquele ano a Ford apresentava a Edição Especial do Landau, oferecida somente na cor Bordeaux Scala metálica, que celebrava os 60 anos da marca no País. Em uma plaqueta dourada na tampa do porta-luvas constava “Edição Especial – 60º. Aniversário da Ford Brasil S.A.”. A produção da série ficou, segundo estimativas, entre 250 e 300 exemplares.

A cor vinho e uma plaqueta no painel marcavam a edição limitada do Landau, em 1979, alusiva aos 60 anos da Ford

A Auto Esporte comparou o Landau ao Dodge Le Baron: “Em sofisticação o Le Baron ganha. Ele tem bancos mais acolhedores, todos com encosto para cabeça, e estofamento mais macio. O Landau vence em nível de ruído interno e espaço interno: tem os bancos mais largos e pode acomodar, sem apertos, até seis adultos. A estabilidade de ambos pode ser considerada boa”. O Dodge ainda teve melhor desempenho, mas o Ford oferecia o maior porta-malas.

A Edição Especial do Landau, oferecida apenas em cor vinho, celebrava os 60 anos da Ford no País com uma plaqueta dourada na tampa do porta-luvas

O motor 302 ganhava versão a álcool na linha 1980 — opção comemorada por muitos pela economia de pelo menos 10% no custo por quilômetro rodado, apesar do maior consumo. Não era o único incentivo do governo federal ao combustível renovável: o carro recolhia apenas metade da TRU (Taxa Rodoviária Única), os prazos para financiamento eram maiores e o abastecimento podia ser feito aos sábados, algo então proibido para carros a gasolina.

Além de taxa de compressão mais alta, o V8 a álcool adotava coletor de admissão de alumínio e tomada de ar quente do coletor de escapamento, para lidar com a maior dificuldade de queima do combustível. A aplicação de gasolina na partida a frio era automática, mas podia ser reforçada pelo motorista pelo uso de um botão no painel caso a temperatura estivesse muito baixa.

O motor a álcool trazia redução no custo de rodagem; agora em azul, o Landau 1980 ganhava novos bancos e ajustes na suspensão

As duas versões de combustível recebiam novo coletor de escapamento e revisão do conversor de torque da caixa automática, a fim de reduzir o consumo. O chamado azul Clássico, muito elegante, era agora a principal cor do Landau. Nos para-lamas traseiros havia pequenas lanternas no lugar dos antigos refletores. Outras mudanças eram bancos redesenhados, abertura elétrica do porta-malas acionada no porta-luvas, suspensão traseira com estabilizador e cintos dianteiros retráteis, ainda de dois pontos.

A Auto Esporte testou o LTD automático a álcool, que acelerou de 0 a 100 km/h em 13,1 segundos e alcançou a máxima de 167 km/h: “Potência e torque mais elevados se traduzem em melhores arrancadas. Ele é mais rápido que muitos carrinhos esporte que rodam por aí. O consumo mais elevado (média geral de 4 km/l) tem compensação no preço mais baixo do álcool. É um automóvel confortável, de bom desempenho, seguro, silencioso, ótimo para cidade e melhor ainda para estrada. E não pode mais ser considerado um esbanjador de divisas”.

No último teste do Landau a álcool, a Quatro Rodas observou que “se fosse projetado hoje, ele não teria o sólido chassi perimetral, que lhe proporciona uma rigidez torcional fora do comum para os padrões atuais. O acabamento é excelente, pelo cuidado da mão-de-obra e pela elevada qualidade do material. A troca de combustível não muda o rendimento, com marcas adequadas ao peso e potência”.

Fim de linha para um grande carro: apenas na versão Landau, o confortável sedã despedia-se em 1983 após 77 mil unidades

Cintos dianteiros de três pontos e novas pinças de freio vinham na linha 1981, junto da luzes de ré incorporadas às lanternas — assim, ficavam duas vermelhas e uma branca de cada lado. Esse era o último ano para o LTD: o fim do grande sedã estava próximo.

Em 2 de abril de 1983, mesma data do lançamento do Galaxie 16 anos antes, o Landau — carro oficial de autoridades governamentais e o preferido pelos altos executivos — entrava para a história, depois de 77.647 unidades produzidas entre todas as versões. Por anos a Ford continuou a receber insistentes pedidos de clientes fiéis, inconformados com ter de substituir por modelos menores os eternos topos de linha da indústria nacional.

Mais Carros do Passado

Uma carona no prestígio


O carisma que o Galaxie conquistou pode ser medido pelos usos posteriores de seu nome em outros modelos da Ford, ainda que com diferente grafia. Na Europa, a marca chamou de Galaxy uma minivan fabricada desde 1995 em três gerações (à esquerda a primeira delas). O Versailles brasileiro, clone do Volkswagen Santana, também recebeu esse nome quando vendido na Argentina (à direita).

Entre 2005 e 2007, o grande sedã que veio substituir o Taurus no mercado norte-americano recebeu o nome Five Hundred (500), de certo modo também uma referência a modelos do passado como Galaxie 500, Fairlane 500 e Torino 500.

Ficha técnica

  Galaxie 500 (1967) LTD Landau (1971) Landau (1981)
Motor
Posição e cilindros longitudinal, 8 em V longitudinal, 8 em V longitudinal, 8 em V
Comando e válvulas por cilindro no bloco, 2 no bloco, 2 no bloco, 2
Cilindrada 4.458 cm³ 4.785 cm³ 4.949 cm³
Potência máxima* 164 cv a 4.400 rpm 190 cv a 4.600 rpm 199 cv a 4.600 rpm
Torque máximo* 33,4 m.kgf a 2.400 rpm 37 m.kgf a 2.600 rpm 39,8 m.kgf a 2.400 rpm
Alimentação carburador de corpo duplo carburador de corpo duplo carburador de corpo duplo
Transmissão
Tipo de caixa e marchas manual, 3 manual ou automática, 3 automática, 3
Tração traseira traseira traseira
Freios
Dianteiros a tambor a tambor a disco ventilado
Traseiros a tambor a tambor a tambor
Antitravamento (ABS) não não não
Suspensão
Dianteira independente, braços sobrepostos independente, braços sobrepostos independente, braços sobrepostos
Traseira eixo rígido eixo rígido eixo rígido
Rodas
Pneus 7,75-15 7,75-15 215/70 R 15
Dimensões
Comprimento 5,33 m 5,33 m 5,41 m
Entre-eixos 3,02 m 3,02 m 3,02 m
Peso 1.780 kg 1.795 kg 1.840 kg
Desempenho
Velocidade máxima 165 km/h 165 km/h 150 km/h
Aceleração de 0 a 100  km/h 15 s 13 s 15 s
* Método bruto; dados de desempenho aproximados
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