
Do sedã “Zé do Caixão” à perua Variant II, eles aliaram mais conforto à confiabilidade do Fusca
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
No Brasil, como na Europa, os primeiros modelos derivados do Volkswagen Sedan (Fusca) atendiam a propósitos específicos. A Kombi era um utilitário, embora sua versão Luxo até se prestasse bem ao transporte familiar, dadas as limitações do mercado nacional na época. E o Karmann-Ghia, mesmo que não esportivo em desempenho, era um cupê jovial sem pretensões de levar a família e sua bagagem.
Assim, na década de 1960 a Volkswagen era o fabricante de um só modelo para o grande público. Os alemães, que haviam detectado a necessidade de uma segunda linha mais cedo, apresentavam em 1961 a série Typ 3 ou tipo 3 (leia quadro na página 2). Com algum atraso, a estratégia foi seguida por São Bernardo do Campo, SP. O Projeto B-135 ou Brasília — nome que homenageava a capital federal, mas não tencionava chegar ao modelo de produção — tomava por base um projeto da matriz que não chegou ao mercado, o EA-97 (leia quadro abaixo).
Derivado de um estudo alemão, o sedã 1600 era o primeiro Volkswagen no mundo com três volumes e quatro portas
Havia pressa para concluir o automóvel para o VI Salão do Automóvel em São Paulo, SP, em dezembro de 1968, onde ele dividiria as atenções com lançamentos importantes como Chevrolet Opala e Ford Corcel. O novo Volkswagen 1600 era um sedã de três volumes bem definidos e quatro portas — configuração inédita da marca em todo o mundo, pois o Typ 4 de quatro portas, lançado três meses antes, seguia o formato fastback. Media 4,11 metros de comprimento com o mesmo entre-eixos do Fusca, 2,40 m.
O 1600 não poderia ser mais diferente da forma de besouro do Fusca. Por outro lado, era muito similar ao primeiro Volkswagen em concepção mecânica. O chassi-plataforma, alterado apenas no necessário para a fixação da nova carroceria, levava na traseira um motor de quatro cilindros horizontais opostos (boxer) arrefecido a ar, mas com a maior cilindrada vista na marca até então: 1,6 litro. O Fusca da época era 1,3, enquanto Kombi e Karmann-Ghia usavam motor 1,5.
Na Alemanha a linha Typ 3 recebera turbina de refrigeração baixa e carburador de fluxo horizontal, medidas que permitiam menor altura total para o motor e abriam espaço para bagagem acima dele. No Brasil, porém, o 1600 mantinha a turbina alta por questão de dificuldade de fornecedores, com o que oferecia apenas o porta-malas dianteiro e um vão para carga atrás do banco traseiro. O motor fornecia potência líquida de 50 cv e torque de 11 m.kgf (60 cv e 11,5 m.kgf pelo método bruto), suficientes para velocidade máxima de 135 km/h.
Na publicidade do 1600, o destaque à combinação de novo estilo à consagrada e resistente mecânica do Fusca
A transmissão manual de quatro marchas era comum à do Fusca, mas com diferencial mais longo (o mesmo da Kombi sem suas caixas de redução) a fim de reduzir a rotação do motor em vista da potência superior. Do 1300 vinham as suspensões tradicionais, independentes com barras de torção, sendo a traseira baseada no sistema de semieixos oscilantes. Os freios usavam discos na frente e tambores na traseira.
O Projeto B-135 ou Brasília — homenagem à capital federal — tomava por base um projeto da matriz que não chegou ao mercado, o EA-97, e resultou no 1600 de quatro portas
A produção efetiva, depois de um pequeno lote inicial, começava em janeiro de 1969. O trabalho da fábrica e da agência de publicidade Almap era convencer o consumidor de que não precisaria abandonar a resistente mecânica do Fusca “só por causa de umas linhas mais bonitas”, pois agora existia um “Volkswagen em nova embalagem”. Os anúncios chegavam a mostrar seu chassi com a mecânica para que fosse reconhecida a “alma” do Fusca no novo modelo.
Em seu primeiro teste, a revista Quatro Rodas apontou que “a concepção Volkswagen continua a mesma, com a vantagem de ter linhas bem mais atualizadas, bom acabamento e maior estabilidade. O silêncio interno é bem melhor que no 1300. Sua velocidade máxima é muito superior, embora ainda reduzida para um 1600. Ele fez 131 km/h, aproximadamente a mesma velocidade do Corcel. O motor responde de forma imediata às solicitações. Com mais potência, o 1600 consegue andar nas baixas velocidades de forma mais econômica que o 1300”.
Pelas formas e as maçanetas, o 1600 ganhou o apelido de “Zé do Caixão”; o chassi-plataforma usava barras de torção como no Fusca
Uma versão mais bem-acabada, o 1600 L, era adicionada em junho de 1969. Por um preço 11% mais alto o comprador levava acréscimos como bancos e painéis de porta revestidos em couro natural, assoalho com buclê de naílon, rádio, relógio no painel, buzina dupla e tampa do tanque de combustível com chave. Além disso, podia ter pintura em dois tons com o teto em branco, verde, bege ou preto em contraste à cor da carroceria e bancos dianteiros reclináveis. Com produção limitada, o 1600 L foi oferecido até março de 1970.
O 1600 básico recebia na linha 1970, lançada em fevereiro desse ano, novidades como para-choques de lâmina única, nova posição dos frisos laterais e bancos estofados em gomos. Pouco depois a Volkswagen anunciava a exportação do modelo para o México. A frente manteve os faróis retangulares até agosto seguinte, quando eles eram substituídos por quatro circulares na linha 1971. A tampa do motor era redesenhada.
Talvez pela falta de um nome apropriado — como um carro poderia se chamar apenas um número? —, o 1600 ganhou do público o apelido “Zé do Caixão”, nome artístico do ator e diretor de filmes de terror José Mojica Marins (1936-2020), já então consagrado. Diz-se que a alcunha vinha das formas da carroceria e das quatro maçanetas cromadas, que lembrariam alças de caixão.
Próxima parteEA-97, a antevisão do “Zé do Caixão”
Antes que o sedã de duas portas Typ 3 chegasse ao mercado europeu em 1961, a Volkswagen desenvolveu um estudo ainda mais parecido com nosso 1600 “Zé do Caixão”: o EA-97, sendo EA a sigla para Entwicklungsauftrag ou ordem de desenvolvimento em alemão.
O sedã apresentado em 1960 foi elaborado sobre um chassi de Karmann-Ghia com dimensões adaptadas, mais largo que o original do Fusca. Embora as linhas das laterais sejam semelhantes às do Typ 3, o EA-97 é bem diferente na frente e na traseira, cujas formas são praticamente as mesmas do quatro-portas brasileiro. Entre as diferenças do alemão para o nacional, além da falta das portas traseiras, estão o recorte do capô dianteiro, os faróis circulares, as lanternas traseiras em posição mais baixa e a ausência de quebra-ventos nas janelas. O interior também se parece muito.
Desenvolvido com planos de produção, o projeto incluía uma perua (bem parecida com nossa Variant) e um conversível, mas a Volkswagen percebeu que ele ocuparia um segmento de mercado muito próximo ao do Typ 3, levando a competição interna — canibalização no jargão da indústria. Assim, a decisão foi enviar o ferramental já construído para o Brasil, onde recebeu as alterações que conhecemos e se tornou o primeiro modelo da família 1600.
O estudo do sedã EA-97 hoje faz parte do acervo do Auto Museum Volkswagen, museu da empresa em Wolfsburg, Alemanha. Os demais protótipos foram sucateados.
Fotos: Collection Dr. Etzold/Käfer-Dokumentation
A Variant aparecia em 1969 com estilo inspirado na alemã e a frente do sedã; note o quebra-vento no vidro lateral traseiro
A combinação de quatro portas, mecânica robusta e bom espaço interno para os padrões da época fez do 1600 um carro popular entre os taxistas, mas não tanto entre o público particular. Depois de um incêndio na ala de pintura da fábrica de São Bernardo, no fim de 1970, a Volkswagen simplesmente o deixou de fora ao reiniciar a fabricação da linha. O “Zé” acabava por ali depois de apenas dois anos e 38 mil unidades produzidas.
Variant: porta-malas na frente e atrás
O mercado nacional estava sem uma perua derivada de automóvel desde 1967, quando a compra da DKW-Vemag pela Volkswagen levara ao encerramento da marca e, com ela, da Vemaguet depois de 11 anos de produção, incluída a fase da perua Universal. E foi pelas mãos da própria Volkswagen que esse segmento renasceu em dezembro de 1969 com a Variant brasileira.
Com turbina baixa, o motor permitia um porta-malas acima dele somado ao dianteiro, argumento bem explorado nas propagandas
Esperada durante anos, por já existir na Europa a perua Typ 3, nossa Variant seguia em desenho o 1600 de quatro portas, mas oferecia apenas duas portas e a tampa traseira de carga. Detalhe curioso era que os vidros laterais traseiros incluíam quebra-ventos, como os das portas, para aumentar a ventilação daquela região da cabine.
A Variant trazia novidades técnicas comparada ao sedã: motor de construção plana, dois carburadores (inéditos em carro brasileiro) e tanque de combustível na frente
O interior deixava impressão de refinamento incomum na marca, com o aplique no painel que imitava madeira jacarandá e os bancos revestidos em curvim com opção de tom caramelo. O banco traseiro podia ser rebatido para o transporte de objetos mais longos, embora limitado pela alta base do porta-malas. De acordo com a fábrica, ao somar o porta-malas dianteiro ao espaço traseiro até o teto a capacidade chegava a 640 litros.
A Variant trazia três novidades técnicas em relação ao sedã 1600. Uma era o motor de construção plana, em que a turbina fixada ao virabrequim permitia menor altura do motor completo — solução diversa da alemã, que usava ventoinha horizontal, mas já benéfica ao espaço para carga. Outra era o emprego de dois carburadores, inéditos em um carro brasileiro e dotados de afogador automático. Com 54 cv líquidos (65 cv brutos) e o mesmo torque do sedã, o motor permitia alcançar 140 km/h. De resto, seu tanque de combustível ficava na frente e não na traseira como o do 1600 quatro-portas.
A praticidade da Variant e sua robustez foram bem-vindas em um segmento que estava sem opções desde o fim da DKW Vemaguet
No teste inicial da Quatro Rodas houve elogios ao “acabamento cuidadoso, um dos mais perfeitos entre os carros nacionais. Os freios obedientes, a direção rápida e macia e o câmbio preciso e bem à mão, tudo lembra o Fusca. A perua é neutra nas curvas, não tende a jogar a traseira como o 1300. O consumo é o ponto alto da Variant, provando mais uma vez que os dois carburadores são mais econômicos, porque mais eficientes do que um só. A 80 km/h ela faz nada menos que 14,2 km/l. Era o carro que faltava no mercado”.
A Volkswagen não ficou muito tempo sozinha no segmento: em 1970 a Ford respondia com a Belina, derivada do Corcel. Embora próxima em tamanho, era bem diferente da Variant em concepção, com motor e tração dianteiros. Isso lhe dava vantagem em espaço para bagagem em um só compartimento, mas a perua de marca alemã era superior em tração em terrenos difíceis, sobretudo em subidas enlameadas, por ter o peso do motor sobre as rodas traseiras motrizes.
Próxima parteNa Europa
A família de modelos conhecida como Typ 3 (tipo 3 em alemão) foi a primeira tentativa da Volkswagen alemã de oferecer outros carros familiares além do Käfer, Beetle ou Fusca. A intenção era que automóveis maiores, mais confortáveis e potentes atendessem a um público mais exigente, com foco no mercado norte-americano.
Os novos modelos 1500 eram apresentados juntos em abril de 1961: sedã e perua de duas portas e conversível — este, porém, nunca chegou ao mercado. Com a mesma distância entre eixos do Fusca (2,40 metros), os carros mediam 4,34 m de comprimento. Na perua, o formato retilíneo das três janelas laterais e da tampa traseira justificava o nome Squareback (traseira quadrada) que a marca lhe aplicou nos Estados Unidos. O nome usado na Europa — Variant — teve de mudar para evitar confusão com o Valiant da Chrysler.
Com as qualidades reconhecidas do Fusca associadas a um interior mais espaçoso e arejado, a linha Typ 3 logo fez sucesso. Eram os primeiros Volkswagens com motor de 1,5 litro, também com quatro cilindros opostos e arrefecimento a ar, que oferecia 45 cv e torque de 10,8 m.kgf (líquidos). Como no besouro, a suspensão independente nas quatro rodas usava robustas barras de torção.
A versão 1500 S, de 1963, adotava dois carburadores para obter 54 cv. Um teto solar de aço, como o do Fusca 1965 brasileiro, também estava disponível. Na linha 1966 chegavam o modelo Fastback e o motor de 1,6 litro, 65 cv e 12 m.kgf; os freios dianteiros passavam a usar discos. Uma transmissão automática vinha no ano seguinte, quando o Fastback ganhava a sigla TL. Não era uma identificação geral do modelo, como seria no Brasil, mas sim de versão, assim como havia a TA e a TE.
Inovação importante aparecia para 1969: injeção eletrônica, a primeira no mundo em carros de grande produção. Um ano depois vinham capô dianteiro mais destacado, faróis e lanternas maiores e porta-malas frontal maior. A suspensão traseira de semieixos oscilantes dava lugar à de braços semiarrastados com molas helicoidais, bem superior em comportamento.
Com o fim do sedã em 1970, restavam a Variant e o Fastback por mais três anos. Em 1973, depois de mais de 2,5 milhões de unidades vendidas, a linha Typ 3 cedia espaço à Typ 4, de desenho mais parecido com os de nossos TL e Variant, mas bem diferentes em concepção mecânica.
A traseira em queda rápida, tendência na época, dava um ar mais jovial ao TL e o afastava da imagem sisuda do 1600 quatro-portas
TL, o fastback
O terceiro modelo da linha, o fastback TL, era lançado em agosto de 1970. Assim como a Kombi brasileira usava o nome de uma das versões do similar alemão, a Volkswagen escolhera para o novo modelo a designação de uma versão do Typ 3 Fastback germânico, que também oferecia TA e TE. O significado da sigla, não confirmado pela marca, era provavelmente Touring Luxury (turismo luxo).
A parte frontal da carroceria era a mesma do 1600 e da Variant, salvo por mudança no capô dianteiro e pelos quatro faróis circulares, que substituíam os retangulares daqueles modelos — contudo, os novos faróis logo eram adotados por toda a linha. A grande diferença estava na traseira em queda rápida (por isso o nome fastback) com vidro inclinado, tendência mundial na época. De início oferecido apenas com duas portas, o TL media 4,25 metros de comprimento ou 14 cm mais que o sedã.
A frente similar à do sedã, mas com quatro faróis, foi usada por pouco tempo; o motor de dupla carburação era o mesmo da Variant
O interior seguia o da Variant, com maior conforto aos passageiros de trás pelo encosto mais inclinado e o banco mais largo, já que dispensava a articulação nas laterais para ser rebatido. Os dois porta-malas somavam 344 litros de capacidade, segundo a fábrica. Para deixar o TL mais requintado havia opcionais como bancos de couro, console com conta-giros, relógio no painel e rádio Blaupunkt. O motor igual ao da perua, com dois carburadores e turbina baixa, permitia atingir 140 km/h. O preço do TL colocava-o no topo da família, seguido pela Variant — mais caros que ele, na marca, apenas o Karmann-Ghia e o TC.
A versão de quatro portas, que chegou a responder por quase 50% das vendas do TL, foi decisiva para que o modelo pudesse ser exportado a países do Oriente Médio
“Um bom desenho, mecânica precisa e tamanho médio ideal para nossas condições são as características mais positivas do cupê TL”, observou a Quatro Rodas em teste. “Os espaços dianteiro e traseiro são suficientes para levar com facilidade a bagagem de cinco pessoas. Nas curvas, o TL ameaça sair de traseira. O motor tem força suficiente, mas a dupla carburação não estava bem regulada e sentimos falta de torque”.
Na Auto Esporte o TL foi comparado ao sedã 1600: “Com dois carburadores, o TL leva vantagens em rapidez de aceleração e velocidade final. Precisa de 19,2 segundos para atingir os 100 km/h, enquanto o quatro-portas gasta 20,9 s, e mostrou-se bem mais econômico”. Por outro lado, o sedã agradou mais em estabilidade: “Mantendo a característica sobresterçante tradicional da marca, fazia as curvas com maior segurança que o TL”.
A frente baixa e mais imponente foi logo adotada e estreou o TL de quatro portas; no interior, bom acabamento e opção de couro
Eleito Carro do Ano pela mesma Auto Esporte, o TL teve o título justificado por vários fatores: “O projeto foi totalmente nacionalizado. O nosso ficou mais bonito. O automóvel tem esmerado acabamento e oferece excelente grau de conforto. É tão ‘pão-duro’ no consumo de combustível quanto a Variant. Nos testes, revelou que está perfeitamente aclimatado às nossas condições de utilização”.
O TL passou pouco tempo com o desenho original. Revelada em março de 1971 na Feira Industrial Alemã, em São Paulo, SP, uma nova frente para o fastback e a Variant era colocada no mercado em junho na precoce linha 1972. Com capô mais baixo e painel frontal inclinado para frente, o desenho lembrava o da linha Typ 4 alemã, o do VW K70 ou mesmo o do Audi 100, com os frisos cromados ao estilo “bigode” ligados ao emblema da marca. As luzes de direção vinham no para-choque, que perdia as “garras” de proteção e adotava frisos de borracha. Esse padrão de estilo seria adotado nos anos seguintes pelos esportivos SP1 e SP2, pelo Brasília e pela Variant II.
Embora lembrasse o Typ 4 alemão, o TL mantinha a mecânica tradicional; no último anúncio, a série TL Personalizado de 1972
O TL recebia ao mesmo tempo a versão de quatro portas, que preenchia a lacuna do sedã 1600 entre os taxistas e as famílias adeptas desse conforto — minoria na época, uma peculiaridade do mercado brasileiro que se pode atribuir ao sucesso do Fusca. Preenchia em termos: os dois carburadores, embora benéficos ao desempenho e ao consumo, traziam dificuldade para obter a regulagem correta. Por esse motivo muitos motoristas “de praça”, como se dizia à época, continuaram fiéis ao sedã.
Com quatro portas, o TL ganhava uma terceira janela lateral e maçanetas mais modernas, como na linha alemã, com um gatilho atrás da alça para abrir a porta (até então usava um botão para essa função), alteração que foi estendida ao duas-portas e à Variant na linha 1973. A nova versão chegou a responder por quase 50% das vendas do TL e foi decisiva para que o modelo pudesse ser exportado a países do Oriente Médio, onde era chamado de Brasília, em 1975. Afinal, a preferência por duas portas em carros familiares era algo quase exclusivo do mercado brasileiro.
Um TL de aparência mais esportiva aparecia em setembro de 1972. Chamada de TL Personalizado, a edição limitada recebia faixa preta transversal sobre o capô dianteiro e parte dos para-lamas, outras nas laterais e na traseira, rodas sem calotas (que davam lugar aos conhecidos “copinhos” em cor prata), volante esportivo de três raios, relógio no painel e retrovisor interno dia/noite. Além disso, oferecia a alegre cor verde Hippie. Disponível com duas ou quatro portas, a série acrescentava os equipamentos sem custo adicional ao comprador. Produzida só por alguns meses, ela ficou conhecida no mercado como TL Sport.
A Variant seguia a remodelação frontal do TL e foi produzida por mais tempo que ele, apesar de existir o Brasília desde 1973
Além das maçanetas, a linha 1973 do TL e da Variant ganhava lanternas traseiras maiores, saídas de ar nas colunas finais (para renovação do ar interno, o que dispensou os quebra-ventos adicionais da perua) e capa de plástico preto no painel em vez do aplique que imitava madeira. No ano-modelo 1974 as alterações incluíam novo volante, bancos com curvim liso e “copinhos” nas rodas como os do TL Personalizado. Um ano mais tarde o painel era redesenhado.
O êxito do TL, porém, caiu muito com a chegada do Passat em 1974. Como acontecera na Alemanha, onde a linha Typ 4 pareceu nascer obsoleta ao insistir no motor traseiro “a ar”, os 1600 nacionais evidenciavam sua concepção antiga se comparada à do novo modelo. A defasagem ficou clara no comparativo da Quatro Rodas em 1974, que incluiu o Dodge 1800 e o Corcel. O Passat superou o TL em desempenho, estabilidade, nível de ruído, posição do motorista, estilo, conforto e acabamento, enquanto o TL tinha melhor direção, maior espaço para bagagem, menor consumo e preço mais baixo.
O TL foi exportado ao Oriente Médio em 1975, quando recebeu novo painel no Brasil; as lanternas haviam aumentado em 1973
Já a Variant foi comparada à Belina, ao Brasília e à Chevrolet Caravan em versões de 2,5 e 4,1 litros. A perua da Volkswagen saiu-se bem em transmissão, freios, direção, nível de ruído e porta-malas, mas ficou para trás em suspensão, estabilidade, motor, estilo e conforto. Sua aceleração de 0 a 100 km/h em 26,5 segundos perdia em muito para a Belina (19,7 s) e a Caravan 2,5 (16,6 s). Vantagens eram o segundo menor preço, perdendo apenas para o Brasília, e o melhor consumo das cinco.
O TL não resistiu à competição dentro de casa: o duas-portas saía de produção em agosto de 1975, seguido em dezembro pelo cinco-portas, que precisava atender a contratos de exportação. Cerca de 90 mil unidades foram produzidas entre as duas versões. Nos anos seguintes a fábrica promoveu poucas mudanças à Variant, caso da adoção para 1977 de coluna de direção retrátil, para menor risco de ferir o motorista em caso de colisão. Ao sair de linha, as 256 mil peruas produzidas faziam dela o modelo mais bem-sucedido da família.
Próxima parteSemelhante ao Brasília em desenho, a Variant II chegava em 1977 e ficava conhecida como “Variantão” por seu maior porte
Variant II, uma revolução técnica
Das soluções mecânicas que a Volkswagen alemã havia implantado na linha Typ 4 de 1968, algumas não chegaram aos 1600 nacionais, como a estrutura monobloco. Mas as suspensões mais modernas foram adotadas aqui na segunda geração da perua, a Variant II, lançada em dezembro de 1977.
Apesar de ter recebido o apelido de “Variantão”, a nova perua bem poderia ser um “Brasilião”, pois tinha desenho muito parecido ao do hatchback lançado em 1973 — assim como o Fiat 147, o Brasília não era uma perua, embora muitos pensem que fosse por ser registrada como camioneta para recolher menos impostos. O apelido era justificado pelo aumento em 5 centímetros em largura e quase 10 cm no entre-eixos (embora com o mesmo comprimento), assim como pelas formas mais robustas.
A Variant II trazia suspensão dianteira McPherson com mola helicoidal e raio de rolagem negativo, como no Passat, e traseira por braço semiarrastado com juntas homocinéticas. A caixa de direção com pinhão e cremalheira também vinha do Passat. Os freios adotavam duplo circuito em diagonal, permitido pelo raio negativo e mais seguro em caso de falha hidráulica de um dos circuitos — sempre haveria freio em uma das rodas dianteiras, que recebem a maior parcela de peso em frenagens. Por fim, os pneus passavam a ser radiais.
Suspensão dianteira e direção do Passat, braços semiarrastados na traseira, duplo circuito em diagonal: avanços técnicos da Variant II
O conjunto de novidades, aplicado a um chassi-plataforma derivado do anterior, fazia da Variant II um carro bem superior em estabilidade. O maior benefício era eliminar a grande variação de câmber dos antigos semieixos oscilantes da traseira, o que tornava o comportamento mais previsível e seguro. Contudo, o modelo sempre impôs dificuldade para alinhar as rodas, criando uma fama negativa que abalou suas chances de sucesso.
A segunda Variant ficou longe do sucesso da primeira: apesar dos desafios da nova suspensão, o maior problema parecia ser mesmo a obsolescência da mecânica “a ar”
A nova perua era mais confortável e espaçosa, com bancos dianteiros de encosto alto (os mesmos do Passat) e quadro de instrumentos em formato retangular, mais tarde aproveitado no Gol. Pela primeira vez no Brasil havia limpador do vidro traseiro, aplicado a uma tampa erguida por molas a gás. O volume de bagagens era maior tanto na traseira quanto na dianteira, beneficiado pela suspensão menos volumosa.
Com o mesmo motor de 1,6 litro, a Variant II tinha 57 cv líquidos (mais 2 cv que no Brasília) ou 67 cv brutos, por meio de comando de válvulas mais esportivo e saída dupla de escapamento. Alcançava velocidade máxima de 138 km/h e acelerava de 0 a 100 km/h em 19 segundos.
O interior usava bancos de encosto alto e os porta-malas aumentavam, mas a Variant II enfrentou problemas e só durou três anos
O teste da Quatro Rodas considerou a melhora “indiscutível. A estabilidade melhorou muito. Somente no limite máximo sente-se uma pequena saída de traseira, mas muito fácil de ser corrigida. O acabamento é muito superior ao da Variant 1977. Na aceleração de 0 a 80 km/h o novo modelo demorou 13,1 segundos contra 17,5 s do anterior. Resta saber como o consumidor irá encarar seu alto preço, considerando-se que ela sempre custou menos que as concorrentes”.
De fato, a segunda geração ficou longe do sucesso da primeira. Os desafios trazidos pela nova suspensão podem ter participação, mas o maior problema parecia ser mesmo a obsolescência da mecânica “a ar” em um modelo que não pertencia ao segmento de entrada. Comparada à Belina II e ainda mais à Caravan, a Variant II ficava a dever em desempenho e espaço para carga na traseira. A concepção nascida com o Fusca já não parecia vantajosa.
No comparativo das três na Quatro Rodas a Variant II foi a melhor em transmissão, direção e suspensão, mas ficou em último lugar em desempenho, instrumentos e porta-malas. “Ficou claro que a Belina II com motor 1.6 é a melhor opção. Tem melhor desempenho, ótimo acabamento e gasta menos gasolina. A Caravan e a Variant II fazem diminuir bem a vantagem da Belina se comparados os preços das três”, concluiu a revista.
Embora a robustez mecânica fosse bem explorada nos anúncios, o mercado já percebia as limitações do motor arrefecido a ar
Para muitos, a Volkswagen errou ao insistir nessa fórmula em vez de produzir aqui a Passat Variant, que existia desde 1973 na Alemanha e chegou a ser fotografada em testes da fábrica. Até certo ponto, o que essa perua traria ao mercado — motor arrefecido a líquido, tração dianteira, suspensões modernas — acabou por sair em 1982 na Parati, derivada do Gol.
A Variant II, porém, não esperou a Parati nascer para se despedir: saía de produção em 1980 depois de uma carreira curta e discreta e cerca de 41 mil unidades fabricadas. Mais tarde, em 1985, a empresa se redimia do erro ao lançar a Santana Quantum — nada mais que a segunda geração da Passat Variant, agora destinada ao segmento de luxo do mercado.
Mais Carros do PassadoFicha técnica
1600 (1969) | Variant (1970) | Variant II (1978) | ||
Motor | ||||
Posição e cilindros | longitudinal traseiro, 4 opostos | |||
Comando e válvulas por cilindro | no bloco, 2 | no bloco, 2 | no bloco, 2 | |
Cilindrada | 1.584 cm³ | 1.584 cm³ | 1.584 cm³ | |
Potência máxima | 50 cv a 4.600 rpm | 54 cv a 4.600 rpm | 57 cv a 4.600 rpm | |
Torque máximo | 11 m.kgf a 2.400 rpm | 11 m.kgf a 3.000 rpm | 12 m.kgf a 3.200 rpm | |
Alimentação | carburador de corpo simples | 2 carb. corpo simples | 2 carb. corpo simples | |
Transmissão | ||||
Tipo de caixa e marchas | manual, 4 | manual, 4 | manual, 4 | |
Tração | traseira | traseira | traseira | |
Freios | ||||
Dianteiros | a disco | a disco | a disco | |
Traseiros | a tambor | a tambor | a tambor | |
Antitravamento (ABS) | não | não | não | |
Suspensão | ||||
Dianteira | independente | independente | ind. McPherson | |
Traseira | ind., semieixos oscilantes | ind., semieixos oscilantes | ind., braço semiarrastado | |
Rodas | ||||
Pneus | 165-15 | 165-15 | 175/80 R 14 | |
Dimensões | ||||
Comprimento | 4,11 m | 4,32 m | 4,326 m | |
Entre-eixos | 2,40 m | 2,40 m | 2,495 m | |
Peso | 875 kg | 950 kg | 1.020 kg | |
Desempenho | ||||
Velocidade máxima | 135 km/h | 140 km/h | 138 km/h | |
Aceler. 0 a 100 km/h | 23,0 s | 21,0 s | 19,0 s | |
Dados de desempenho aproximados |