
Rural era o nome da perua Jeep por aqui, onde estreava com peças importadas e motor 2,6 de 90 cv
Versão brasileira
A versatilidade e a robustez da Jeep Station Wagon chamavam a atenção da Willys-Overland do Brasil S.A., fundada em São Bernardo do Campo, SP em 26 de abril de 1952. A empresa montava desde 1954 o Jeep Universal (já com capô alto, devido ao motor com cabeçote em “F”) e oferecer uma perua dele derivada, mantendo suas qualidades de resistência, seria ideal para um país com vias de tráfego tão precárias quanto as do Brasil da época.
Renomeada Rural-Willys (assim mesmo, com o modelo antes da marca), a perua começava a ser montada aqui em julho de 1956 com peças importadas e o mesmo desenho do modelo norte-americano. A pintura “saia e blusa” — verde e branca, vermelha e branca ou azul e branca — dava um toque de charme ao utilitário rústico, com suspensões dianteira e traseira de eixo rígido com molas semielípticas, caixa de três marchas com redução e tração nas quatro rodas. O motor a gasolina de seis cilindros em linha e 2,6 litros tinha 90 cv brutos.
Tração 4×4, espaço para seis pessoas nos bancos inteiriços e grande compartimento de carga eram argumentos da Rural; a tampa traseira abria-se em duas partes
No interior da Rural havia dois bancos inteiriços, de modo a dar lugar a até seis pessoas. A parte do banco destinada aos passageiros da frente era toda rebatida, incluindo o assento, para dar acesso ao espaço traseiro ou mesmo para o transporte de cargas maiores na cabine. No espartano painel havia apenas velocímetro no centro com os marcadores de temperatura do motor e nível de combustível. O acesso ao compartimento de carga dava-se por duas tampas, uma aberta para cima e outra para baixo. O estepe ficava em pé na lateral direita.
Um motor fabricado em Taubaté, SP, o primeiro a gasolina de produção brasileira, era adotado em 1959. No ano seguinte, aproveitando a oportunidade da nacionalização completa dos componentes, a Willys redesenhava sua frente com estilo exclusivo para o Brasil, mais largo e imponente, concebido pelo mesmo Brooks Stevens que criou o modelo original. Há quem diga que ela se parece com a estrutura frontal do Palácio da Alvorada, em Brasília, DF, se vista invertida. Vinham também o para-brisa e o vidro traseiro inteiriços, como nos EUA.
Em teste da versão 4×4 na revista Mecânica Popular, Mauro Salles — mais tarde um famoso publicitário — anunciou-a como “o mais brasileiro dos veículos nacionais”, pois já alcançava 97% de conteúdo local, incluindo a fundição do bloco do motor. Era “um carro ideal para o fazendeiro que pode usá-la toda brunindo, para passear, depois de fazê-la como ferramenta de produção. Onde passa uma charrete, um carro de boi, ela também passará”.
Mostrada na publicidade em cenas urbanas ou em terrenos difíceis, a Rural ganhava em 1960 uma frente mais larga e imponente, exclusiva para o Brasil
Outras qualidades apontadas: “A Rural tem ótima visibilidade. O espaço para carga foi aumentado e o banco é facilmente dobrável, deixando 4 m³ à disposição. Os freios são excelentes, não demonstram fadiga. O motor se mostrou valente em todas as provas, mesmo com esforços violentos”.
A Willys redesenhava a frente em 1960 com estilo exclusivo para o Brasil, mais largo e imponente, concebido pelo mesmo Brooks Stevens que criou o modelo original
Claro que a velocidade máxima medida de 107 km/h e a grande altura impunham limitações, “mas só o imprudente terá histórias a contar sobre sua instabilidade” e “o motor dá um ótimo rendimento nas velocidades reduzidas”, defendia a revista. Como críticas havia o pedal de acelerador e a alavanca de transmissão pesados, “os bancos incômodos e duros, como se o fazendeiro fosse transportar novilhos na boleia”, e o distribuidor em posição baixa, desprotegido em trechos alagados.
A fábrica chegou a estudar uma versão da Rural com três bancos para até oito pessoas, terceira porta do lado direito e estepe externo junto à tampa traseira. As novidades estavam previstas para 1961, mas não chegaram ao mercado, da mesma forma que o Saci. O que saía nesse ano era a Pickup Jeep, que ampliava a gama de opções (leia quadros abaixo sobre esses modelos).
Próxima parteO Jeepster e o Saci

Dentro da proposta de expandir a linha Jeep, a Willys colocava no mercado norte-americano em 1948 o Jeepster, modelo de perfil esportivo e voltado ao lazer. As linhas básicas do Jeep tornavam-se mais atraentes com a baixa altura de rodagem, a frente emprestada pela Station Wagon e a traseira de formas mais refinadas, com os para-lamas da picape.
Trazia ainda pneus de faixa branca, calotas e o estepe na parte posterior em posição inclinada. Com desempenho modesto fornecidos pelos 63 ou 72 cv brutos — de acordo com o motor de quatro ou seis cilindros — e tração somente traseira, não agradou: apenas 19 mil unidades foram vendidas em quase três anos.
A ideia foi recuperada em 1962 pela marca no Brasil, tendo como principais diferenças a maior distância entre eixos, a frente da Rural e o estepe na parte traseira. Denominado Saci, o “jipe esportivo” (projeções acima) foi apresentado no Salão do Automóvel daquele ano até com sugestão de preço, mas não chegou à produção.
Para marcar o cinquentenário do Jeepster, em 1998, a Chrysler — detentora da marca Jeep — apresentou um carro-conceito com o mesmo nome e proposta, mas dotado de motor V8 de 4,7 litros e 275 cv, transmissão automática e enormes pneus em rodas de 19 polegadas. Não passou do estudo.
A picape
Tradicional na produção de caminhões leves, a Willys lançava nos EUA já em 1946 uma versão do Jeep com caçamba, a Pickup Willys. Da aparência frontal à distância entre eixos, passando pela mecânica, a picape era muito similar à Station Wagon e podia transportar 500 kg de carga. No ano seguinte aparecia uma versão de entre-eixos longo apta a uma tonelada.

No Brasil ela foi lançada em 1961 como Pickup Jeep, com tração 4×2 ou 4×4, banco para três pessoas e a frente mais larga da Rural brasileira. Podia transportar 800 kg de carga e vir com caçamba de aço ou carroceria de madeira. Versatilidade não faltava com as versões furgão, ambulância, de cabine dupla, bombeiro e carro-forte. Foi por muito tempo a única picape nacional a reunir tração 4×4, reduzida e roda-livre — e a mais barata delas.
A proposta de uma versão Luxo (fotos acima em preto e branco) era revelada em 1963. A Pickup ganhava para-choques e grades cromados e pintura em dois tons: apenas o teto e a parte superior da frente, mas não o capô, vinham em branco. A ideia não chegou à produção. Depois da compra da Willys, a picape era renomeada Ford F-75 (acima em laranja) em 1972. Ganhava opção do motor de 2,3 litros em 1975 e mais tarde a versão a álcool. Deixou de ser produzida apenas em 1982.
A versão militar F-85 (acima), criada em 1962, substituiu picapes Dodge da Segunda Guerra Mundial e foi muito usada pelo Exército, a Marinha e os Fuzileiros Navais, além de exportada para Portugal. Recebia para-choques reforçados, grades protetoras nos faróis, guincho mecânico, gancho para reboque na traseira e para-brisa rebatível. Uma capota de lona substituía o teto e não havia portas. Para transporte de pessoal podia chegar a 10 lugares. Algumas foram equipadas com metralhadoras, outros com canhões. E ganharam um curioso apelido: “Cachorro Louco”.