"O carro contra a rotina" é como a Ford o apresentou por aqui, mas nosso Maverick logo enfrentaria um desafio imprevisto: a crise do petróleo

Apresentado como "um carro contra a rotina", o Maverick estava disponível com dois motores. A primeira opção não era nada inspiradora: o seis-cilindros em linha de 3,0 litros do Aero-Willys/Itamaraty, com válvulas em "F" (admissão no cabeçote, escapamento no bloco), solução ultrapassada já na época que prejudicava seu rendimento. A potência de 112 cv e o torque de 22,6 m.kgf (brutos, cerca de 90 cv líquidos) eram um tanto modestos para o carro de 1.340 kg. É verdade que o motor passou por mais de uma centena de modificações, incluindo uma adaptação de galeria externa de água para refrigerar o sexto cilindro, mas seu desempenho ainda estava bem abaixo do esperado para um modelo com linhas esportivas como o Maverick.

Quanto às suspensões, seguiam conceitos simples da época: dianteira independente com braços sobrepostos (superior triangular e inferior simples, com tensor de locação longitudinal) e molas helicoidais, traseira por eixo rígido com feixes de molas semi-elípticas. A mola dianteira sobre o braço triangular, como no Corcel, levava muitos a pensar que fosse um sistema McPherson.

O V8   A boa notícia ficava por conta da versão GT. Não fazia muito tempo — quatro anos — que havia chegado o Dodge Dart com seu V8 de 318 pol³ ou 5,2 litros e elevado desempenho. A Ford contava então apenas com os 272 (4,4 litros) e 292 (4,8 litros) da linha Galaxie, de potência mais modesta. Por isso, o lançamento do Maverick com o um moderno V8 de bloco pequeno, já utilizado com grande sucesso pela linha americana da marca, vinha atestar e aguçar ainda mais o gosto do brasileiro por motores americanos macios e potentes em baixas rotações, resultado do elevado torque produzido pela alta cilindrada. Continua

Nas pistas
Se o sucesso no mercado foi pífio, a não ser o GT, nas pistas o Maverick se mostrou um grande vencedor. Venceu já na estréia, na I 25 Horas de Interlagos, em agosto de 1973, e dali para frente perdeu poucas vezes para o arqui-rival Opala. Tanto na categoria de carros praticamente normais de série (Divisão 1 e depois Grupo 1) quanto na de carros bastante modificados (Divisão 3), o Maverick com seu motor 302 V8 reinou praticamente absoluto.

A Ford era representada oficialmente nas pistas pela Greco Competições, de São Paulo, que mantinha uma organizada e eficiente equipe liderada pelo seu principal titular, o saudoso Luiz Antônio Greco (1935–1992). Por intermédio de Greco, a Ford construiu um Maverick dentro das especificações da categoria Turismo Especial Brasileiro, ou Divisão 3 (abaixo). O motor 302 V8 recebeu cabeçotes Gurney-Weslake de alumínio (os mesmos do Ford GT 40) e comando de válvulas bastante "bravo". A eficiência volumétrica era tanta que justificava o uso de quatro carburadores Weber 48 IDA, com capacidade máxima de aspiração de 2.440 cfm.

O resultado final era impressionante: 450 cv líquidos a 5.800 rpm, suficientes para levar o Maverick a 240 km/h na reta principal de Interlagos. O câmbio reescalonado permitia atingir 110 km/h em primeira marcha, 160 em segunda, 200 em terceira e a velocidade final em quarta. Os freios sofreram modificações extensas, com discos nas quatro rodas e duas pinças em cada roda dianteira. O carro era tão bem acertado que era muito fácil de pilotar, com comportamento previsível em qualquer situação.

O autor deste boxe fez parte da equipe Greco pilotando nas duas categorias de julho de 1974 até o fim de 1976, quando as corridas foram proibidas no Brasil em nome da "racionalização" do uso dos combustíveis — estúpida medida imposta pelo governo por meio do Conselho Nacional do Petróleo, hoje ANP.

Da noite para o dia, as competições automobilísticas passaram de promissor negócio a vilão, afugentando patrocinadores — quem ousaria contrariar o governo militar de então? Os efeitos dessa medida, tomada apenas no Brasil, se fazem sentir até hoje, em que restou a sensação na cabeça do empresariado de que automobilismo não é investimento confiável por estar sujeito aos humores das pessoas lá na "ilha da fantasia". As corridas só voltariam a se realizar em setembro de 1977 — exatamente no Dia da Independência —, após a comunidade automobilística convencer o CNP a autorizá-las utilizando um novo combustível: o álcool.

O Quadrijet
Em julho de 1974 a GM passava a oferecer o motor 250-S como opcional para o Opala 4.100, com tuchos de válvulas mecânicos em vez de hidráulicos, taxa de compressão de 8,5:1, comando de válvulas de maior duração e levante e carburador de corpo duplo. O Opala agora era muito mais rápido que o Maverick, mas a Ford não perdeu tempo: tratou de homologar junto ao Conselho Técnico Desportivo Nacional uma versão que recebeu o nome de Quadrijet.

O carburador Motorcraft bijet cedia lugar a um Holley de corpo quádruplo, com coletor de admissão Edelbrock. O comando de válvulas passava a ser Iskenderian com 270 graus de duração, que permitia ótimo desempenho sem perda de dirigibilidade em baixos regimes de rotação. Para evitar o flutuamento das válvulas em alta rotação, as molas de válvulas agora eram duplas. A taxa de compressão subia para os mesmos 8,5:1 do 250-S.

A potência saltava para 257 cv brutos (cerca de 180 líquidos) e o torque para 41,6 m.kgf, também brutos, o que aniquilou o Opala nas pistas. A nova versão venceu logo na estréia, a 12 Horas de Goiânia, prova que inaugurou aquele autódromo na categoria Turismo e que foi vencida pelo autor em dupla com Marivaldo Fernandes. Mas nem tudo eram flores: o Quadrijet foi aposentado em 1976, pois no ano anterior a Confederação Brasileira de Automobilismo decidiu adotar regulamento técnico internacional, o Turismo de Série Grupo 1.

Pelo novo regulamento, seriam necessários 5.000 Mavericks Quadrijet produzidos em até 12 meses consecutivos para homologação no grupo. Numa época de importações caras e restritas, pouquíssimos Mavericks de rua foram equipados com o kit Quadrijet, incluindo alguns sedãs de quatro portas. Testes da época apontavam velocidade máxima de 200 km/h e aceleração de 0 a 100 km/h em menos de oito segundos. Por se tratar de uma versão especial, produzida fora da linha de montagem, tornou-se inviável cumprir as novas regras da CBA.

Torneio de campeões
Uma estratégia de marketing adotada pela Ford no lançamento do Maverick quatro-cilindros foi a organização do Torneio de Campeões (acima). Constituída de duas etapas (uma em São Paulo e outra em Brasília), foi disputada por carros originais, que eram sorteados entre os pilotos momentos antes da largada. O vencedor foi o saudoso José Carlos Pace, o "Moco", que viria a falecer dois anos depois, em um acidente aeronáutico.

Bob Sharp

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