Os lares de milhões de
brasileiros foram invadidos, desde a semana passada, por uma pesada
campanha oficial de televisão sobre a suposta auto-suficiência do País
na produção de petróleo. São R$ 37 milhões — do seu, do meu, do nosso
dinheiro — com que o governo tenta nos convencer de que a Petrobrás,
com uma nova plataforma, passou a produzir o "ouro negro" em
quantidade suficiente para não precisarmos mais da importação. Como
parte do espetáculo, o presidente Lula molhou as mãos no petróleo,
como o fizera Getúlio Vargas em 1953 por ocasião da fundação da
estatal.
Há quem diga que de propaganda do governo, sobretudo em ano eleitoral,
sempre se deve desconfiar. E neste caso com toda a razão: a propalada
auto-suficiência é uma mentira. O que o Brasil produz em quantidade
que supera seu consumo atual é o petróleo pesado, mas há um elevado
consumo (para obter o óleo diesel, por exemplo) de petróleo leve.
Então, o pesado é exportado para que possamos importar o leve. Este é
o país "mais independente" de que fala a campanha que estamos pagando.
E, como também se espera de propaganda com fins eleitoreiros, há nesta
algumas promessas que não resistem ao bom-senso. "Muito mais empregos
em todas as áreas", anuncia a Petrobrás, enquanto a imagem mostra uma
linha de produção de automóveis. Alguém pode explicar o que uma coisa
tem com a outra? É evidente que para gerar empregos na indústria
automobilística, por exemplo, deve-se antes aumentar a demanda por
veículos. O que o governo federal tem feito com esse objetivo? Alguém
já ouviu falar em redução — substancial — da carga tributária?
Alguma demanda, acredito, até poderia ser obtida indiretamente se a
tal auto-suficiência trouxesse redução substancial dos preços de
combustíveis. Isso tornaria mais acessível o uso do automóvel e, a
médio prazo, poderia aquecer o mercado. Mas essa possibilidade foi
descartada pelo presidente da Petrobrás,
José Sérgio Gabrielli.
Portanto, o ingênuo brasileiro que acredita em
duendes, no coelhinho da Páscoa e na publicidade do governo pode tirar
o carro da chuva: vai continuar a pagar caro, muito caro, pelos
combustíveis. Enquanto isso, os Estados Unidos preferem importar
petróleo, guardando suas reservas para uma eventualidade futura. E o
americano paga hoje, em meio às turbulências, em torno de R$ 1,70 pelo
litro de gasolina comum.
Do México
Em meio ao triste cenário do mercado nacional, comentado no
Editorial anterior, uma boa notícia: a chegada
do Ford Fusion, vindo do México
em pacote bem-equipado por R$ 80 mil. Não só deixou sem sentido o
preço do concorrente direto nacional — o novo Vectra Elite 2,4, de
motorização equivalente, mas inferior em equipamentos e atualização
técnica —, como fez parecer caros os sedãs médios feitos aqui, como
Corolla, Civic e Mégane, que chegam perto do preço do Fusion sendo
menores, menos potentes e mais modestos em itens de série.
Há quem não veja com bons olhos essa vantagem para o produto
importado, temendo queda de vendas para a indústria nacional e
conseqüente desemprego. Do ponto de vista do consumidor, porém, a
concorrência é muito bem-vinda — e dela há tempos precisávamos. Os
modelos trazidos de outros países, Mercosul à parte, pagam um pesado
imposto de importação que diminui muito suas chances de competir com
os feitos aqui.
Protecionismo não resolve nada, como o provam os principais mercados
do mundo, em que nacionais e importados brigam de igual para igual.
Desde que o dólar deu seu primeiro salto, em 1999, a indústria
nacional — com raras exceções — tirou o pé do acelerador, deixou
defasar os produtos, reciclou velhos projetos sob a máscara de "nova
geração" e subiu preços de maneira assustadora. Agora, com boas
novidades vindas do México (inclua-se o Honda Accord com preço
reduzido e o Volkswagen Jetta em breve, entre outras), o mercado pode
voltar a experimentar o bom sabor de uma competição. Que vençam os
melhores.
Seja quanto ao petróleo ou quanto aos automóveis, ser patriota é muito
bom. Mas ser feito de bobo não tem a menor graça. |