O melhor de dois mundos

Com a opção de selecionar marchas, o câmbio
de variação contínua ficou bem mais interessante

por Fabrício Samahá

Fabrício Samahá, editorTive nos últimos dias, por uma feliz coincidência, a oportunidade de avaliar dois modelos com câmbio automático de variação contínua (CVT) que em breve estarão no site: o Nissan Sentra e o Mercedes-Benz Classe B. Foi interessante pela possibilidade de conhecer mais a fundo os sistemas, ainda que em carros diferentes em proposta e preço, e de comparar seu funcionamento ao dos demais CVTs que eu conhecia: o do Honda Fit e o do Audi A4. Não vou entrar aqui na parte técnica do assunto, já explicada em artigo na seção Técnica & Preparação. O objetivo é mostrar o que cada caixa oferece ao motorista.

A do Fit conta com três posições à frente: D (drive, marcha normal), S (sport, modo esportivo) e L (low, marcha reduzida). Passar de D para S e desta para L deixa o câmbio mais curto, de modo a levar o motor a rotações mais altas, com o que se ganha agilidade e se obtém freio-motor. A do Sentra, embora possua o exclusivo recurso do conversor de torque — mais robusto que a embreagem multidisco do Fit em condições como arrancadas em aclives —, é ainda mais simples em operação: tem apenas duas posições (D e L) com as mesmas finalidades das do Fit, além de um botão que deixa fora de ação a "marcha" mais longa.

Para quem dirige, ambas as caixas dão as mesmas sensações. Parecem uma automática comum em parte das situações de uso, mas são diferentes dela quando se comanda uma aceleração com pressão constante no acelerador — não importa se pouca ou muita pressão. Como o CVT não tem marchas definidas, mas sim uma variação contínua entre as relações extremas, nessa condição o carro ganha velocidade com rotação constante ou quase constante.

É possível, por exemplo, ir de 0 a 100 km/h a cerca de 2.000 rpm acelerando de leve. Ou, se o objetivo for máximo desempenho, levar o pé direito ao fundo e ver o motor subir até 5.000 ou 6.000 rpm, de onde não sairá até que o acelerador seja aliviado. Nada de mudanças de marcha e, em conseqüência, extrema suavidade. A Audi chegou a elaborar uma divertida propaganda de TV que destacava esse benefício: de carona em um A4 Multitronic, um fã de Elvis Presley decepcionava-se ao notar que, nas acelerações, o bonequinho do cantor aplicado ao painel não mais "dançava" nas trocas de marcha como em seu próprio carro.

Marchas virtuais
Esse é o modo mais eficiente de acelerar, sem dúvida, mas há um problema: a impressão aos ouvidos não agrada, pois estamos habituados ao aumento de rotações, marcha após marcha, à medida em que a velocidade cresce. Para evitar essa sensação desagradável foi que Audi e Mercedes, em nosso caso, aplicaram uma possibilidade que o próprio Fit tem no mercado externo: a simulação de marchas.

O Classe B usa apenas a posição D à frente, mas oferece a escolha entre os programas Conforto e Esporte, este com efeito moderado de deixar o câmbio mais curto. No A4 há duas posições, D e S. E ambos os carros permitem a seleção manual entre sete "marchas virtuais", por movimentos para a frente e para trás no Audi (ou pelo uso de comandos "+" e "-" no volante) e para direita e esquerda no Mercedes (partindo de D).

Pode parecer um contra-senso que o CVT imite um câmbio convencional, mas não é. Trata-se de obter o melhor de dois mundos: a suavidade da variação contínua ou o tempero esportivo das mudanças de marcha, conforme o interesse em cada momento. E a Audi ainda acrescentou uma excelente idéia: dois jogos de "marchas virtuais", um para a posição S, outro para a D. O motorista pode escolher entre sete relações mais próximas (S), ideais para manter o motor "cheio" em uso vigoroso, ou sete mais espaçadas (D), o que traz baixa rotação em viagens tranqüilas.

Se no início da década passada o CVT parecia fadado ao esquecimento, até mesmo pela baixa resistência dos sistemas disponíveis à época, hoje o quadro é bastante promissor. O sistema ganhou robustez — é aplicado a motores de mais de 200 cv, como nos Audis V6 e no Nissan Murano — e resolveu a questão da sonoridade por meio das "marchas virtuais". De resto, o recurso de dois jogos de relações vem a calhar nestes tempos em que configurar o carro a seu gosto é o objetivo de muitos.

É pena que os irmãos holandeses Van Doorne, criadores do pioneiro CVT chamado Variomatic, não tenham chegado a ver esse desenvolvimento — Wim morreu em 1978 e Hub um ano depois. Mas sua idéia, implantada em 1958 nos carros de sua marca DAF, tem à frente um longo futuro.

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Data de publicação: 9/6/07

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