Logo após a guerra, o Brasil estava carente de automóveis
novos, uma vez que a importação de veículos particulares fora
interrompida por três anos. Já os ingleses, depois de resistirem
bravamente a Hitler, enfrentavam racionamentos e
precisavam exportar produtos manufaturados em troca de alimentos
e artigos de primeira necessidade.
Juntando uma coisa à outra é fácil entender por que o
Brasil, então um país agrícola, foi subitamente tomado por
carrinhos ingleses —a maioria deles populares. De uma hora para
outra, passaram a ser comuns em nossas ruas marcas como Triumph,
Standard Vanguard, Austin, Jowett, Hillman, Rover e Vauxhall. A
mais popular de todas era a Morris, que por alguns meses de
1951 conseguiu a façanha de brigar com a então imbatível Chevrolet
pela liderança de vendas no Brasil.

Neste cenário, a Ford
entendeu que poderia ter seu quinhão trazendo os pequeninos Prefect
e Anglia produzidos em Dagenham. Por volta de 1947 chegaram por
aqui os primeiros Prefects, em geral verdes, azuis ou pretos. Em
termos de mecânica, eram uma miniatura dos velhos Fordinhos
americanos. Já o Anglia tinha apenas duas portas. No embalo vieram
outros Fords ingleses: os furgões Fordson (uma espécie de Prefect
de carga, muito popular entre padeiros e tintureiros) e os
caminhões Thames. Em 1949 chegou o Prefect com alterações de
estilo.
Mais baratos que os Fords americanos, Anglia e Prefect tornaram-se
bem populares por aqui. Tanto que a Ford não tardou a montá-los em
regime de CKD em sua fábrica de São Paulo, com peças vindas da
Inglaterra. Os carrinhos ingleses, porém, andavam muito menos que
os americanos. |
Bem ajustado, um Prefect podia manter velocidade de cruzeiro de 70
km/h e, nas subidas de serra, faltava-lhe força. Tinha também a
fama de esquentar muito, já que não usava bomba d'água,
mas termo-sifão. De quebra, sua aparência antiquada rendia
comparações com "caixa de fósforos em pé" e outros gracejos.

Mesmo assim, encontraram
muitos compradores por aqui. Serviram a gente em início de
carreira (como o jovem locutor Cid Moreira) e até como meio de
transporte diário para o palhaço Carequinha. Em São Paulo foram
adotados nas auto-escolas e, em cidades do Nordeste, chegaram a
ser usados como táxis. A montagem prosseguiu até por volta de
1952. Depois, para desenvolver a indústria nacional e evitar a
evasão de divisas, vieram restrições cada vez maiores às
importações. A nova geração de Prefect e Anglia já não deu as
caras por aqui.
Assim como todos os outros carros ingleses, os pequenos Fords
começaram seu longo processo de decadência no Brasil. Sua
resistência não era a mesma dos carrões americanos e nossos
mecânicos, acostumados aos brutos automóveis ianques, ajudaram a
encurtar a vida dos britânicos. Por fim, as peças de reposição
escassearam. Pelos anos 60, já em pleno domínio da indústria
nacional, carro inglês era coisa de gente sem dinheiro. No começo
da década seguinte sumiram de vez de nossas ruas, para morrer
esquecidos em ferro-velhos.
Hoje são raros os sobreviventes, que resistem em mãos de
apaixonados por modelos antigos. Nas fotos, um raro Prefect de
primeira geração no Rio de Janeiro e um Fordson em fim de carreira
no Rio Grande do Sul.
Jason Vogel |