O exagerado conceito XM-Turnpike
Cruiser: "asas de gaivota" no teto, ogivas no parachoque dianteiro,
lanternas traseiras de estilo ousado
Alguns elementos não chegaram ao
Turnpike de produção, mas o estilo era semelhante e havia tomada de ar
sobre o parabrisa para o interior |
Na
Detroit dos anos 50, as marcas de carros de passeio comercializavam um
único modelo grande em variadas séries. Muitos nomes as batizaram ao
longo dos anos e era comum um novo nome, aplicado à série topo-de-linha,
tentar revigorar uma linha de produtos. A maior parte dessas séries não
chegou a marcar a memória do público, tamanha era a rotatividade. Mas
algumas, por um motivo ou por outro, ganharam notoriedade e viraram
ícones de uma época. Basta lembrar o
Bel Air e o Impala da
Chevrolet, o Fairlane da Ford ou mesmo o curioso Turnpike Cruiser da
Mercury, divisão intermediária da Ford Motor Company.
Lançada para 1957, essa série de topo da Mercury representou as
peculiaridades de sua época e seu país de origem como poucos carros
conseguiram. Por peculiaridades entenda-se o estilo inspirado na
tecnologia desenvolvida para aeronaves e foguetes, ícones do que havia
de mais avançado na engenharia da época. Nada da eficiência de
deslocamento desses veículos tão aerodinâmicos: a idéia era usar suas
formas para ornamentar a carroceria de carros grandes, potentes,
espaçosos e confortáveis, bem ao gosto dos americanos. Uma camada de
modernidade no que nada mais era que um padrão já tradicional.
A década de 1950 foi a que mais valorizou o estilo nos carros dos
Estados Unidos. Poucas foram as inovações técnicas relevantes, mas o
desenho definitivamente expressou a febre consumista que se apossou da
América naqueles anos em que a paz e prosperidade eram medidas de forma
material, por bens como casa, carro, televisor, fogão, lava-roupas. Cada
ano-modelo trazia reestilizações que tornavam o novo superado e forjavam
a necessidade de se adquirir o ainda mais novo. Quanto mais um carro
incorporasse aspectos visuais das aeronaves, mais se ressaltava a
sensação de modernidade desses redesenhos.
Para testar a aceitação dessas ousadias formais, Detroit deu grande
impulso aos "carros de sonho" ou carros experimentais (hoje
carros-conceito), idéia introduzida com o
Buick Y-Job da General Motors em
1938. Durante a guerra, ilustrações de carros futuristas em revistas
como Popular Mechanics, Mechanix Illustrated e Popular Science
mantinham os americanos ávidos pelo que veriam nas ruas após o
conflito. Os carros experimentais dos anos 50 preparavam o público para
parte do visual e soluções dos próximos modelos de produção. Entre eles,
um dos mais lembrados foi o Mercury XM-Turnpike Cruiser, apresentando em
1956 no Salão de Chicago.
Confeccionado na italiana Ghia, ele tinha a frente inclinada para dentro
conforme se aproximava dos parachoques bipartidos. Cada um destes trazia
duas vistosas imitações de turbinas de avião, que circundavam imitações
de ogivas. Por conta dessa inclinação, os faróis do XM-Turnpike Cruiser
eram ressaltados. A linha da cintura se elevava na parte posterior das
duas portas, formando uma espécie de barbatana com formato em “V” aberto
para as laterais até chegar às lanternas. O parabrisa era panorâmico e a
área envidraçada bastante generosa. Era nas janelas que se via o aspecto
mais interessante do modelo futurista.
O XM-Turnpike Cruiser era um cupê hardtop
e acima de cada porta havia uma abertura extra transparente no teto.
Estas duas peças de plástico se elevavam como asas de gaivota, uma
releitura do que ocorria ao clássico
Mercedes-Benz 300 SL de
1954. Depois delas, a linha do teto se rebaixava nas laterais, moldando
os vidros traseiros envolventes. O que seria a janela traseira era uma
porção mais estreita entre esses dois vidros, que podia ser deslizada
para baixo e deixar fluir o vento. Os escapamentos cromados duplos saíam
pelas laterais. No painel havia quatro instrumentos ressaltados à frente
de quatro bancos individuais.
Em 1957 a Mercury já trazia a versão de produção
daquele apanhado de idéias dignas de uma nave espacial do Buck Rogers do universo dos quadrinhos. O Turnpike Cruiser definitivo
perdeu alguns recursos futuristas de estilo e ganhou outros. Vendido
também no Canadá pela divisão Monarch, ele teve ampla divulgação como
carro-madrinha oficial da 500 Milhas de Indianápolis, em 30 de maio de
1957. A partir dos quatro exemplares conversíveis feitos para o evento,
a Mercury ofereceu algumas réplicas.
Última versão lançada, o conversível era a mais trivial da
linha. O Turnpike Cruiser — algo como “viajante das estradas” em inglês
— marcou época mesmo por conta de suas versões hardtop, cupê e sedã sem
colunas centrais.
Continua
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