A flecha de prata norte-americana

A Pierce-Arrow respondeu à Grande Depressão com um carro inovador
e muito luxuoso, o Silver Arrow, mas seu êxito não foi o esperado

Texto: José Geraldo Fonseca - Fotos: Supercars.net e RM Auctions

Em meio à grave crise, a Pierce-Arrow decidiu ousar e mirou no topo do segmento de luxo com um carro inovador pelo estilo streamline, fluido

Da integração de faróis e para-lamas (dentro dos quais vinham estepes) à traseira em suave declínio, o Silver Arrow impressionou pelas linhas

Neste modelo 1934 as linhas já estavam mais tradicionais, na tentativa de aumentar sua aceitação, o que retirou um dos diferenciais do modelo

A Grande Depressão, que se iniciou com a quebra da bolsa de valores de Nova York em 1929, lançou uma sombra longa e profunda sobre os Estados Unidos da década de 1930. Em 1933 o país era uma nação à procura de trabalho. O desemprego atingia um em cada quatro norte-americanos, bancos foram fechados e correntistas não conseguiam resgatar suas economias. Havia ex-milionários pedindo empregos de baixa remuneração. A indústria automobilística refletia o estado caótico pela qual a economia do país passava. De uma saudável produção de quatro milhões e meio de veículos em 1929, ela caiu para pouco mais de um milhão anual dali a três anos. Entre os pequenos fabricantes era comum a falência.

A Depressão foi especialmente severa para o mercado de luxo. Peerless e Marmon, duas das principais marcas do setor, que chegaram a construir notáveis modelos com motores de 16 cilindros, haviam desaparecido em 1933. Não que os clientes de Cadillac, Packard ou Lincoln não pudessem mais arcar com os carros, mas — como na recente crise financeira de 2008 — preferiam não serem vistos em carros de ostentação. Aqueles que tentavam se esquecer dos tempos difíceis tinham como opção assistir à Feira Mundial de Chicago. Lá se viam carros muito especiais, entre os quais uma notável obra da empresa Pierce-Arrow: o Silver Arrow.

O carro tinha, em inglês, o mesmo nome das futuras estrelas da Auto Union e da Mercedes-Benz no automobilismo na segunda metade da década — Flecha de Prata. Esses carros de corrida se chamavam Silberpfeile, com o mesmo significado em alemão. Mas, enquanto os teutônicos tinham a cor prata porque era a oficial do país nas competições — assim como era o vermelho para a Itália, o azul para a França, o verde para o Reino Unido e o branco para os EUA —, o modelo norte-americano tinha essa cor com objetivo de passar um ar futurista. Na época o prata era muito usado por cineastas e desenhistas de ficção científica para o “mundo do amanhã”, em situações que hoje chegam a ser cômicas, como se toda a humanidade fosse vestir o mesmo modelo de roupa e apenas na cor prata.

Com o programa Ato de Ajuda de Emergência Federal do presidente Roosevelt, conhecido como New Deal, uma certa esperança surgiu, o que começou a entusiasmar os fabricantes de automóveis — em especial os de carros de luxo. E a esperança da Pierce-Arrow se depositava nesse modelo de linhas bastante avançadas para a época, no estilo que se convencionou chamar streamline, traduzível como fluido, aerodinâmico. A perspectiva em torno do sucesso dos carros da marca era tanta que em agosto do mesmo ano a empresa, graças ao capital de um grupo de negociantes de Buffalo, Nova York, voltou a conquistar sua independência após um período de cinco anos como propriedade da concorrente, e agora concordatária, Studebaker.

O período em que a Pierce-Arrow pertenceu à Stude não foi muito bom para a marca, fundada em 1865 com o objetivo de fabricar gaiolas para esquilos e pássaros e com produção de automóveis desde 1901. As vendas haviam caído de 6.795 unidades em 1930 para 2.692 dois anos depois. No entanto, foi nesse período que surgiu o motor V12 da Pierce-Arrow. Àquela época havia a tendência por motores de oito ou mais cilindros, de funcionamento mais macio — a publicidade da marca dizia que para o teste de suavidade do motor era usado até mesmo um sismógrafo. O V12 com válvulas laterais, projetado pelo engenheiro Karl Wise, foi lançado em novembro de 1931. Com ele a empresa oferecia 17 estilos de carroceria em três linhas, que incluíam entre os opcionais um dos primeiros rádios de fábrica.

As rodas podiam ser de madeira, de aço ou com raios de arame e a distância entre eixos variava entre 3,48 e 3,73 metros. O motor existia em duas versões, com cilindradas de 398 e 429 polegadas cúbicas, o equivalente a 6,5 e 7,0 litros, na ordem, e potências de 135 e 160 cv (valores brutos). A versão menor foi abandonada em 1932 e a de 462 pol³ ou 7,6 litros surgiu no ano seguinte com 175 cv. Esta foi a versão que equipou o Silver Arrow. A elegante carroceria do Silver foi desenhada pelo projetista Ogden Wright, na época com apenas 25 anos. Roy Faulkner, ex-presidente da Auburn, mal assumira como vice-presidente de vendas da Pierce e já recebeu um telefonema do jovem estilista, que lhe propôs um supercarro. Continua

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Data de publicação: 14/9/10

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