Os Países Baixos, que muitos chamam de Holanda (na verdade, as Holandas
são duas das 12 províncias desse país), são conhecidos
por sua peculiar geografia, com 27% da área abaixo do nível do mar,
assim como por seus moinhos de vento, suas tulipas e seu queijo gouda.
Mas carros fabricados por lá são muito pouco famosos: à parte a
DAF, com seus modelos econômicos e câmbios
CVT, os holandeses ganharam projeção
internacional apenas com a Spyker.
Os irmãos Hendrik e Jacobus Spijker, que construíam carruagens em
Hilversum desde 1880, passavam 15 anos depois a importar os carros
alemães Benz, aplicando-lhes modificações para atender aos anseios dos
clientes holandeses. Em 1900, com a empresa já estabelecida em
Trompenburg, Amsterdã, aparecia o primeiro automóvel com a marca Spyker,
que usava motor refrigerado a ar de dois
cilindros opostos e potência de 5 cv. O sobrenome dos empresários
havia sido adequado à grafia inglesa com vistas a mercados de
exportação.
Motores mais vigorosos estavam prontos dois anos depois: um
dois-cilindros de 1,9 litro e um quatro-cilindros de 3,8 litros e 20 cv,
que trazia como requinte técnico o virabrequim apoiado em cinco mancais
para funcionamento mais suave e equilibrado. Depois deles, no Salão de
Paris de 1903, a Spyker apresentava algo especial: o 60 HP, considerado
o primeiro carro de seis cilindros no mundo, com motor de 8,7 litros e
60 cv projetado pelo belga Joseph Laviolette.
Câmbio de seis marchas (três em cada faixa de uso, como no sistema de
redução hoje comum em utilitários, o que o deixava também com duas
marchas à ré), tração permanente nas quatro rodas e freios a tambor que
atuavam em todas elas eram outras especificações peculiares. O modelo
foi avaliado pela revista inglesa Autocar — a mais antiga
do mundo sobre automóveis, fundada em 1895. "Seria impossível explorar
um carro tão potente em um subúrbio, mas o motorista nos deu uma amostra
do que ele pode fazer pelo modo como tomou a muito respeitável subida de
montanha de Anerley", contou o jornalista. Sua velocidade máxima ao
redor de 110 km/h era surpreendente.
Uma série limitada desses carros foi produzida entre 1904 e 1907, mas o
protótipo que a revista havia experimentado não foi esquecido. Na subida
de montanha promovida em 1906 pelo Clube do Automóvel de Birmingham, na
Inglaterra, o Spyker foi o único carro a vencer as ladeiras depois de
uma noite de chuva, deixando para trás os oponentes com tração em apenas
duas rodas. Hoje
o modelo pode ser admirado no Louwman Museum, na cidade de Haia.
Mas foi com carros menos exóticos — em sua maioria com motor de quatro
cilindros — que a marca holandesa ganhou maiores fatias do mercado,
amparada em qualidades como boa qualidade de construção, robustez, baixo
nível de ruído e um fundo bem protegido contra as estradas tão precárias
da época. Também em 1903 haviam sido lançados os modelos 16/20 e 20/24
de quatro cilindros, 36/50 de seis cilindros e 5,1 litros e 60/80 de
seis cilindros e 8,8 litros. Em 1906 a empresa fabricava os modelos
15/24 de 3,5 litros, 20/30 de 4,6 litros e 30/40 de 8,0 litros; o 10/15
de 1,8 litro vinha um ano depois.
Em qualquer dos casos, o número que antecede a barra indica a potência
fiscal (um enquadramento para fins tributários), enquanto o seguinte
refere-se à potência efetiva do motor, como em qualquer fabricante
daquele período. Esses Spykers já adotavam o radiador em forma circular
que caracterizaria a marca até o fim de sua existência. Os carros
holandeses vinham desempenhando bem nas pistas, como o segundo lugar
obtido pelo francês Charles Godard na corrida Pequim-Paris, em 1907, e
ofereciam versões ainda mais potentes para esse fim, como o 40/80, com
nada menos que 10,6 litros de cilindrada.
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