Comparar os preços de hoje aos de modelos similares vendidos há 10 e 20 anos pode trazer algumas surpresas
Lemos e ouvimos por todos os lados: “Como os carros estão caros no Brasil!”. De fato, os preços subiram a ladeira nos últimos anos com o fôlego de um bom motor turboalimentado e, diante da grave recessão econômica, a sensação de todos nós é que comprar um novo automóvel hoje está mais difícil do que nunca.
Será mesmo? Os preços atuais são realmente mais altos do que, por exemplo, 10 ou 20 anos atrás?
No Best Cars gostamos de precisão de informações e, assim, fomos verificar se a teoria tem fundamento. Selecionamos nove modelos aleatórios de diferentes marcas que representam categorias, faixas de tamanho e de preço bastante diversas — em números redondos, de R$ 32 mil a R$ 320 mil. A cada automóvel de hoje, buscamos os carros que a eles correspondiam em setembro de 1996 e de 2006. Em alguns casos eram os mesmos modelos em gerações anteriores; em outros havia um similar em posicionamento de mercado.
Em valores atualizados, o BMW 318iS vendido há 20 anos passaria de R$ 304 mil — e o 320i de 10 anos atrás seria ainda mais caro, R$ 352 mil

Os preços antigos foram obtidos em tabelas de revistas de outubro de cada ano, que em geral traziam os valores do mês anterior, e corrigidos para agosto de 2016 (último mês disponível) pelo IGP-M, Índice Geral de Preços do Mercado, um dos métodos mais usados para atualização monetária. Descobrimos, dessa forma, quanto representariam hoje os valores pedidos em 1996 e 2006 pelos automóveis e como eles se comparariam aos atuais.
A que conclusões chegamos?
Vamos começar por baixo, ou seja, pelo segmento de entrada. Em 1996 o Fiat Mille estava em alta e havia recebido há pouco injeção eletrônica. Dez anos depois, era praticamente o mesmo carro; hoje seu lugar é ocupado pelo Uno Vivace, embora o Mobi pretenda substituí-lo. Nesses 20 anos o pequeno Fiat evoluiu menos que carros de segmentos superiores, mas o atual Vivace com bolsas infláveis e freios antitravamento (ABS) custa 39% a menos que o preço atualizado do Mille de 1996.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Mille SX 5p | 1,0, 56 cv, manual | R$ 10.750 | R$ 52.757 |
2006 | Mille Flex 5p | 1,0, 65/66 cv, man. | R$ 23.180 | R$ 44.500 |
2016 | Uno Vivace 5p | 1,0, 73/75 cv, man. | R$ 32.310 |

Talvez em 1996 você adquirisse um hatch médio, mesmo que um modelo antigo como o Chevrolet Kadett, com motor 1,8 e três portas. Sua versão de entrada GL era bastante despojada, sem ao menos direção assistida e ar-condicionado. O modelo correspondente em 2006 era o Astra Advantage, já com tais itens, cinco portas e motor de 2,0 litros, mas ainda sem ABS ou bolsas infláveis. Hoje temos o Cruze LT com controle de estabilidade, quatro bolsas infláveis e caixa automática de seis marchas de série. Quanto se paga por ele? Exatos R$ 180 a menos do que o valor atualizado do Kadett. É verdade que o Cruze hatch está defasado e em fim de produção, mas o mesmo vale para seus antecessores naqueles anos.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Kadett GL | 1,8, 98 cv, manual | R$ 16.560 | R$ 81.270 |
2006 | Astra Advantage | 2,0, 121/128 cv, man. | R$ 46.490 | R$ 89.249 |
2016 | Cruze LT | 1,8, 140/144 cv, aut. | R$ 81.090 |

Seria uma particularidade dos modelos da GM ou de opções de entrada do segmento? Para tirar a prova, vamos a seus concorrentes na Ford em versão de topo: o Escort Racer (ainda de três portas, sem ar-condicionado e com motor Volkswagen antes da adoção do Zetec) em 1996, o Focus Ghia de primeira geração em 2006 e hoje o Focus Titanium da terceira. A potência passou de 120 para 178 cv, a caixa manual deu lugar à automatizada de dupla embreagem e vieram numerosos recursos de segurança (só em bolsas infláveis o número passou de zero para seis) e de conforto, mas o carro atual custa só R$ 121 a mais do que o velho Escort em valores corrigidos — e 26% menos que o Focus de 10 anos atrás.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Escort Racer | 2,0, 120 cv, man. | R$ 19.392 | R$ 95.169 |
2006 | Focus Ghia | 2,0, 147 cv, man. | R$ 67.240 | R$ 129.084 |
2016 | Focus Titanium | 2,0, 175/178 cv, DE | R$ 95.290 |

Sedãs fazem mais seu estilo? Passemos ao Honda Civic, em 1996 ainda importado e cotado em dólar, que valia exato R$ 1. Já com transmissão automática, ar-condicionado e até bolsa inflável para o motorista, mas com modestos 106 cv no motor de 1,6 litro, aquele Honda em versão básica LX custaria hoje mais de R$ 188 mil! Mesmo o Civic 1,8 nacional de 2006, duas gerações depois, sairia em valores atuais acima de R$ 127 mil — mais caro que o novo Touring com motor turbo de 173 cv. Por pouco mais da metade do preço de 20 anos atrás, a Honda hoje oferece a versão EX de 2,0 litros, precedida pela Sport ainda mais em conta.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Civic LX | 1,6, 106 cv, aut. | R$ 38.410 | R$ 188.551 |
2006 | Civic LXS | 1,8, 140 cv, aut. | R$ 66.515 | R$ 127.693 |
2016 | Civic EX | 2,0, 150/155 cv, CVT | R$ 94.900 |

E se fosse um hatch esportivo e diferenciado, como o Volkswagen Golf GTI? Nesses 20 anos ele tornou-se nacional, ganhou turbo e ampla dotação de conforto e segurança, passou de 114 para 220 cv, trocou a caixa manual pela de dupla embreagem e as três portas pelas cinco. Mesmo assim, o mais barato é o atual: 28% abaixo do modelo de 2006 (com caixa automática) e 11% a menos que o importado de 1996, que tinha menos potência que o Golf básico de hoje, o Comfortline 1,6.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Golf GTI | 2,0, 114 cv, manual | R$ 27.550 | R$ 135.205 |
2006 | Golf GTI | 1,8 turbo, 180 cv, aut. | R$ 87.875 | R$ 168.699 |
2016 | Golf GTI | 2,0 turbo, 220 cv, DE | R$ 120.690 |

A situação seria parecida com um sedã importado de marca de prestígio, o BMW Série 3. Em valores atualizados, o 318iS vendido há 20 anos (geração E36) passaria de R$ 304 mil e a opção de entrada de 10 anos atrás, o 320i da geração E90, seria ainda mais cara: R$ 352,4 mil. Com motor turbo e toda a evolução técnica, de conveniência e de segurança esperada desse segmento, o atual 320i nacionalizado em acabamento intermediário Sport GT sai por R$ 175 mil, enorme diferença para os anteriores.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | 318iS | 1,8, 140 cv, aut. | R$ 62.045 | R$ 304.495 |
2006 | 320i | 2,0, 150 cv, aut. | R$ 169.500 | R$ 325.400 |
2016 | 320i Sport GT | 2,0 turbo, 184 cv, aut. | R$ 174.950 |
Da rude Toyota Hilux de 1996, com motor aspirado de 88 cv, à atual SRX com 177 cv e sete bolsas infláveis o preço atualizado subiu menos de 1%

Em termos de preços, o caso que mais impressiona talvez seja o do Audi A6, sedã de classe intermediária na marca. Com carroceria evoluída do antigo modelo 100, caixa manual e menos recursos eletrônicos que alguns carros compactos de hoje, a versão V6 de 1996 custaria em valores atuais mais de R$ 357 mil. Depois de 10 anos e duas trocas de geração, o modelo estava mais sofisticado e extremamente caro: quase R$ 620 mil corrigidos! Faz parecer uma grande pechincha o atual A6, que em versão única de motor (com menos cilindros, mas potência superior) sai por meros R$ 283 mil.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Audi A6 | V6, 2,8, 193 cv, man. | R$ 72.846 | R$ 357.502 |
2006 | Audi A6 | V6, 3,0, 218 cv, CVT | R$ 322.850 | R$ 619.795 |
2016 | Audi A6 | 2,0 turbo, 252 cv, aut. | R$ 282.990 |

Seria outro o quadro em relação a picapes? Nem tanto. Veja-se a Toyota Hilux com cabine dupla, tração 4×4 e motor a diesel, que em 1996 era um utilitário rude com motor aspirado de 88 cv, caixa manual, desenho antigo e rodas-livres manuais nos cubos de roda dianteiros. Dez anos depois a picape estava bem mais atual, potente e confortável na versão de topo SRV, mas o preço (atualizado) havia subido apenas 8%. Como está agora? Em nova geração e com refinamentos como sete bolsas infláveis e completo sistema de entretenimento, a Hilux mais luxuosa custa menos de 1% acima do modelo de 20 anos atrás e menos que a de 10 anos passados.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Hilux 4×4 | 2,8, 88 cv, man. | R$ 38.038 | R$ 186.676 |
2006 | Hilux SRV 4×4 | 3,0 turbo, 163 cv, aut. | R$ 105.408 | R$ 202.358 |
2016 | Hilux SRX 4×4 | 2,8 turbo, 177 cv, aut. | R$ 188.120 |

A análise não seria completa sem um segmento que, de nicho em 1996, hoje representa fatia importante do mercado: utilitários esporte. Naquela época o Land Rover Discovery era quadradão, simples, pouco potente e tinha caixa manual. Hoje ainda é quadradão, mas bastante luxuoso e potente (mais que o dobro nas versões a diesel), com fartos recursos eletrônicos e caixa automática de oito marchas. Qual é mais caro? O de 20 anos atrás por 7%. Mas o “Disco” custava ainda mais em 2006, quando usava o desenho básico do modelo atual com menor conteúdo tecnológico.
Ano | Modelo | Motor e caixa | Preço (época) | Atualizado |
1996 | Discovery TDI | 2,5 turbo, 122 cv, man. | R$ 69.745 | R$ 342.283 |
2006 | Discovery 3 TDV6 S | V6, 2,7 turbo, 190 cv, aut. | R$ 189.000 | R$ 362.840 |
2016 | Discovery 4 SDV6 S | V6, 3,0 turbo, 256 cv, aut. | R$ 319.420 |
Afinal, os carros no Brasil andam caros? Talvez sim para o poder aquisitivo dos brasileiros, mas certamente não quando os valores atuais são comparados aos de 10 e 20 anos atrás com a devida correção. E isso pode ser uma boa notícia.
Editorial anteriorFotos: divulgação (ilustrativas)