Com modelos de variadas procedências, o espaço da Autostadt
revela como o automóvel evoluiu em mais de um século
Texto e fotos: Fabrício Samahá
Em Wolfsburg, uma cidade de 120 mil habitantes na Baixa Saxônia, norte da Alemanha, sede da matriz e da principal fábrica da Volkswagen, está a Autostadt ou cidade do automóvel. O espaço para visitação pública, inaugurado em 2000 e que recebe dois milhões de visitantes por ano, abrange atrações as mais variadas. Existem áreas dedicadas a cada marca do grupo alemão, como a mais recente — a da Porsche —, com maquetes que reproduzem todos os modelos de rua e de competição do mítico fabricante. Há o setor de projetos de automóveis, que mostra um Golf em modelo de estilo com parte em argila (clay), e uma maquete sendo esculpida para tomar as formas do carro.
No setor verde obtêm-se informações sobre impacto ambiental e usa-se um interessante simulador que, conforme as respostas dadas a uma série de questões, indica o tamanho da “pegada” de carbono e quantas Terras seriam necessárias se toda a população mundial tivesse o perfil do participante. Outra atração são duas torres de 48 metros que acondicionam, por meio de elevadores automatizados, até 800 automóveis para entrega aos compradores que preferirem retirá-los na Autostadt.
A partir da superior esquerda: um dos prédios da Autostadt, vista da área da Porsche, a
maquete de um Golf sendo modelada em argila, o painel com a “pegada de carbono”
de acordo com as respostas inseridas e as torres que armazenam carros para a entrega
E há algo de especial interesse para aficionados como nós: o ZeitHaus, ou casa do tempo em alemão, um museu com dezenas de carros e algumas motos de todas as épocas da história. O espaço não está restrito, como outras seções da Autostadt, a produtos do grupo Volkswagen ou mesmo à Alemanha: reúne modelos que marcaram época de diferentes procedências, sobretudo europeus, todos expostos em condições impecáveis. No caso da ala Motor Icons, ou ícones dos motores, estão à mostra 12 modelos ao lado de seus motores, unidades de um a 18 cilindros ou mesmo sem cilindro algum, como os rotativos Wankel.
O Best Cars esteve na Autostadt a convite da VW, por ocasião do lançamento do novo Golf, e traz aqui os automóveis mais marcantes da exposição. Embora eles sejam organizados em áreas temáticas — uma em função de seu desenho, outra pelos motores e assim por diante —, preferimos exibi-los aqui em ordem cronológica, o que traz uma interessante visão de como essa máquina se desenvolveu desde o século XIX. E, como de hábito, ao clicar nos nomes você tem acesso a histórias detalhadas da maioria dos modelos.
Os pioneiros
• O carro mais antigo do museu é o Benz Velo Comfortable 1899, modelo lançado cinco anos antes por Karl Benz. A versão Comfortable incluía requintes como faróis e capota conversível, mantendo o motor de um cilindro horizontal, 1,05 litro e potência de apenas 2,75 cv a 600 rpm, suficiente para atingir 20 km/h. Dois terços da produção de 1.200 unidades foram exportados.
Primeiro automóvel de 16 cilindros, o Cadillac V16 usava uma enorme unidade de 7,4 litros e 165 cv e estava disponível com 34 modelos de carroceria
• Pouco mais recente, o Bugatti Type 15 de 1912 era um carro sofisticado para a época. Derivado do Type 10 de 1908, tinha motor de quatro cilindros e 1,4 litro com 30 cv e atingia máxima de 90 km/h. A versão Type 13, com menor distância entre eixos (2 m ante 2,4 m do Type 15), chegou em segundo lugar no GP da França de 1911.
Os anos 1920
• O Bentley 3 Litre Speed foi o primeiro carro projetado por W.O. Bentley. Apresentado em 1919, teve a produção iniciada após dois anos com motor de quatro cilindros, 3,0 litros (por isso o nome) e 70 cv. A versão Speed chegava em 1924 — ano do carro exposto — com mais 10 cv e freios nas quatro rodas. O modelo venceria a 24 Horas de Le Mans naquele ano e em 1927.
• Carroceria monobloco e suspensão dianteira independente estavam entre as inovações do Lancia Lambda de 1922. A construção permitia uma cabine mais baixa, com benefício à estabilidade. O modelo 1924 mostrado tem motor de quatro cilindros em “V” e 2,1 litros, com 50 cv, e freios nas quatro rodas, raros na época.
• Um dos poucos carros norte-americanos do museu, o Chevrolet Capitol AA 1927 merece destaque por ter sido o primeiro modelo a superar um milhão de unidades produzidas em um ano. O modelo de turismo apresentado tem quatro portas e motor de 2,8 litros, quatro cilindros e 26 cv.
• A alemã Hanomag (Hannoversche Maschinenbau AG) começou com locomotivas a vapor e também fez automóveis. Esse modelo, o pequeno 2/10 PS de 1927, tem motor de 500 cm³ e um só cilindro com 10 cv, transmissão final por meio de corrente e velocidade máxima de 60 km/h. Pesava só 370 kg.
Os anos 1930 e 1940
• Considerado o primeiro automóvel de produção com motor de 16 cilindros, o Cadillac V16 452 de 1930 usava uma enorme unidade de 452 pol³ (7,4 litros) que desenvolvia 165 cv e o levava até 145 km/h. Estava disponível com 34 modelos de carroceria, como o cupê conversível exposto. Foram fabricados 4.387 deles entre 1930 e 1937, quando a Cadillac apresentou um novo motor V16 com ângulo bem maior entre os cilindros (135° em vez de 45°).
• O DKW F1 de 1931 foi o primeiro carro europeu de série com tração dianteira e, por seu êxito, levou a marca ao segundo lugar em vendas na Alemanha. O motor de dois cilindros em linha — a dois tempos, claro — e 580 cm³ produzia 18 cv e movia o pequeno carro de dois ou quatro lugares, com 3,10 a 3,40 metros de comprimento, até 80 km/h.
• A Horch foi uma das quatro marcas — as outras foram Audi, DKW e Wanderer — que compuseram a Auto Union em 1932. É desse ano o Horch 670 V12 do museu, dotado de motor de 12 cilindros, 6,0 litros e 120 cv e capaz de chegar a 145 km/h. Com até 5,55 metros de comprimento e 2.500 kg, esses carros concorriam com os mais luxuosos da Maybach e da Mercedes-Benz.
• A italiana Lancia notabilizou-se por motores em “V” bem estreito. O Dilambda 1932 trazia um V8 de 4,0 litros e 100 cv com 24° entre as bancadas, o que permitia usar um só cabeçote e resultava em uma unidade compacta. Antes dele, o Trikappa havia usado um V8 de 4,6 litros com apenas 14°.
• Esse outro Horch, o 830 BK de 1935, foi o primeiro automóvel alemão com oito cilindros em “V”. O número indica os cilindros e os 3,0 litros de cilindrada do motor inicial, mas no carro exposto ele já tinha 3,5 litros e 75 cv. BK significa a primeira evolução (série B) com distância entre eixos curta (kurz), de 3,20 em vez de 3,35 metros.
• “Flechas de prata” foi como ficaram conhecidos os carros de corrida da Auto Union e da Mercedes-Benz nos Grandes Prêmios dos anos 30, que precederam a Fórmula 1. O Type C da Auto Union, apresentado em 1934, foi desenvolvido por Ferdinand Porsche com motor central-traseiro de 16 cilindros em “V”, 6,0 litros e compressor Roots. O modelo exposto tinha 520 cv, mas a versão de 1937 era mais potente: 545 cv de 6,35 litros. O supercarro pesava apenas 750 kg a seco e sem pneus, como estabelecia o regulamento.
Próxima parte |