Ao buscar elementos de estilo no Fusca original, o sucessor
do New Beetle associa o ar nostálgico a linhas mais esportivas
Texto: Edilson Luiz Vicente – Fotos: divulgação
Já se vão 24 anos desde que surgiram o carro-conceito Dodge Viper e o Mazda MX5 Miata de produção, ambos inspirados em carros do passado — em especial o Viper, cujo estilo remetia ao Cobra de Carroll Shelby, lendário piloto e construtor que foi consultor no projeto do Dodge. Aqueles podem ser considerados os pioneiros do que chamamos de estilo retrô, tendência que foi seguida por numerosos fabricantes, da BMW com o Mini à Chevrolet com o Camaro.
Em 1992 foi lançado o Viper de produção e no ano seguinte aparecia o conceito Plymouth Prowler, este sim feito com a filosofia que definiria o segmento — um desenho puramente trazido do passado com interpretação atual. O sucesso de público e crítica que esses modelos obtiveram abriu as portas para a Chrysler colocar em produção também o Prowler e, mais tarde, o PT Cruiser, antecipado por modelos conceituais.
A Volkswagen, percebendo o potencial desse nicho, chacoalhou o mundo automotivo em 1994 ao apresentar o Concept 1. Ao contrário da Chrysler, que vinha trabalhando o estilo retrô de forma mais genérica, a VW redesenhou um modelo específico — não à toa, seu carro mais icônico e um dos mais importantes na história da indústria automobilística, o Fusca. O resultado foi tão bem-sucedido que a matriz alemã não pôde deixar de produzi-lo. Assim, em 1997, a Volkswagen lançava o New Beetle.
Somado aos maiores comprimento e largura e um rearranjo nas proporções por conta do capô mais longo, o Fusca ficou com um aspecto mais forte, musculoso, esportivo
Cheio de estilo, com mecânica eficiente (era baseado no Golf) e preço acessível nos mercados internacionais, o “besouro” explodiu em vendas e consolidou em definitivo essa então nova maneira de dar estilo a um automóvel. De seu lado, a Chrysler não perdeu a oportunidade e lançou em 2000 o PT Cruiser seguindo a receita aprendida com o New Beetle. Em 2012 era lançado o sucessor do New Beetle, chamado apenas de Beetle nos Estados Unidos e de diferentes nomes em outros países, como Fusca no Brasil.
Mesmo se não tiver a mesma importância do antecessor — os tempos são outros e o impacto de novidade do estilo retrô não é mais aquele —, o novo Fusca tem papel de destaque outra vez. Quanto ao New Beetle, sua trajetória teve uma peculiaridade: ficou taxado, sobretudo nos EUA (seu maior mercado), como “carro de mulher”. Embora não seja possível dar uma explicação lógica e convincente dessa fama, um carro se tornar “de mulher” pode acontecer mesmo que não tenha sido a intenção na hora de sua concepção. É o público que determina. Aqueles utilitários esporte brutamontes são tidos como “carros de homem”, e no entanto as mulheres adoram dirigi-los. Vai entender…
Basicamente, o novo Fusca continua com as características de estilo do New Beetle, exceto pelo teto de desenho mais aproximado ao do Fusca original, o que lhe confere menor altura. Somado aos maiores comprimento e largura e um rearranjo nas proporções por conta do capô mais longo, o modelo ficou com um aspecto mais forte, musculoso, esportivo, de aparência mais dinâmica.
Por conta dessas características de estilo revisadas, o Fusca tem recebido muitos comentários mundo afora sobre a Volkswagen tê-lo deixado mais masculino, como ela própria fez questão de afirmar. É claro que a empresa quer atingir o máximo desempenho possível nas vendas e, mesmo que um carro agora tão “masculino” — como ela afirma — possa vir a perder parte do público feminino que comprou o anterior, para qualquer produto o melhor é não haver qualquer tipo de estereotipagem.
O que importa é que as mudanças fizeram bem ao modelo, que ficou muito interessante e mais atual, sem deixar de ser nostálgico. A tendência é que agrade bastante a um grande público. Uma pena que o maior trunfo desse carro no exterior — ser um bom produto, com estilo e preço acessível — não se aplique ao Brasil.
A frente do Concept 1 de 1994, o primeiro carro-conceito do renascimento do Fusca, é bastante curta: bom do ponto de vista de estilo para dar aquele ar diferente e futurista, mas na prática a frente teve de ficar mais comprida e o para-choque ganhar volume, coisas normais quando se viabiliza uma ideia conceitual.
Para se obter aquele arco perfeito na curvatura do teto, as colunas foram posicionadas bem à frente e o capô ficou bem curto. Outro aspecto interessante do conceito que teve de ser ajustado para o modelo de produção, o New Beetle.
O ponto em que o modelo de produção saiu perdendo: o perfil das janelas nessa versão de conceito era levemente mais baixo, o que alongava visualmente o carro. Dessa forma as proporções ficavam mais harmoniosas.
O New Beetle de produção: o desenho dessas aberturas não tinha conexão com o restante da linha Volkswagen. O item foi desenhado para combinar com o estilo do carro e ficou bem interessante.
Pouco uso de vincos foi uma decisão acertada para a época: deixava o estilo bastante limpo, mas havia harmonia. O novo Fusca ficou melhor em termos de estilo, mas o anterior ainda não deixou de ser interessante.
Por causa do encantamento que causou na época do lançamento, não se reparava o quanto esse teto era alto e o para-brisa grande. Com o passar do tempo isso passou a incomodar um pouco.
Onde estavam com a cabeça quando desenharam o rebaixo da placa de licença dessa maneira? Essa parte mais saliente, que determina a altura do para-choque, estava posicionada muito embaixo de forma que fazia a traseira parecer caída.
Para efeito de comparação com o novo Fusca, esses para-lamas bem arredondados e um tanto grandes nas relações das proporções do carro faziam as rodas parecerem menores do que realmente eram.
O tema do desenho das janelas deveria ser o mesmo do Concept 1, mas a versão de produção aparenta ter o perfil mais alto e o comprimento das janelas menor. Essa mudança de proporção deixou o carro “cabeçudo” e, como já foi citado, depois de um tempo cansou.
O novo Fusca: no sentido transversal o capô aparenta ter pouca curvatura, em especial se comparada à curvatura transversal do teto. Parece um pouco chapado, mas não chega a incomodar. Aplicar um detalhe estético adicional, como nervuras ou alguma saliência, poderia ser interessante.
Uma superfície que forma uma moldura para as aberturas dos para-lamas é sempre bem-vinda. Em geral causa impressão de bom acabamento e cuidado estético.
Para-lamas salientes e de contornos marcados foram abandonados há muito tempo pela indústria, no fim dos anos 40, mas resistiram com o Fusca e retornaram com o New Beetle e o PT Cruiser. Hoje têm um efeito interessante por não serem algo comum.
Essa versão com defletor poderia ser chamada de Super Fuscão, em homenagem à versão 1600 S nacional da década de 1970… Brincadeira à parte, a melhora foi sensível em relação ao defletor disponível para o New Beetle, que estragava a aparência do carro.
As formas do rebaixo da placa de licença seguem o manual da identidade de estilo atual da Volkswagen. Não combina tanto com o estilo do Fusca, mas ficou bom mesmo assim. Se comparado com a solução usada no New Beetle, está muito melhor.
A saia lateral já é saliente, mas o friso também saliente causa certa estranheza ao olhar. Será que a inspiração foi o antigo estribo? Não está ruim, mas é preciso se acostumar.
O recuo da coluna “A” e a quebra na passagem para o teto são soluções mais comuns que a avançada coluna e a transição suave do New Beetle, mas o novo desenho contribui para uma aparência mais esportiva e dinâmica.
À decisão acertada a respeito da coluna “A” soma-se a decisão acertadíssima de rebaixar o teto. O perfil do carro ficou ótimo.
Para-lamas salientes tendem a diminuir as rodas visualmente. Conseguiu-se um bom resultado nesse caso, bem equilibrado, auxiliado pelo perfil mais baixo do carro.
Via de regra, as superfícies nas regiões inferiores necessitam de um acabamento para causar boa impressão. Nesse caso, é quebrada por um vinco e inclinada para dentro. O recorte na região inferior central foi bem feito e dá esportividade ao visual.
Em todo o carro o uso de vincos foi bem pensado e executado. Estão nos lugares certos e nas doses certas, em geral demarcando as transições das superfícies, de forma a valorizar a estética, aparentar mais modernidade e criar diferenciação em relação à geração anterior.
As relações entre as alturas do para-brisa, da frente e do para-choque ficaram muito boas. Por conta da redução na altura total e no aumento da largura, parece que o carro está mais assentado no chão — dá a impressão de que vai grudar bem nas curvas.
A decisão em não usar lanternas circulares, inspiradas no antigo Fusca “Fafá de Belém” e que foram usadas no New Beetle, também foi acertada. Os novos contornos ficaram muito bons e combinam bem com o estilo do carro. O desenho das funções internas está de acordo com o estilo usado nos outros modelos da marca.
Esse vinco demarca a altura do para-choque e está bem posicionado para a traseira não aparentar caída.
Ao menos lá fora, há várias versões em que esta “almofada” está com acabamento em preto, o que faz mais sentido. Assim, na cor do carro, compete visualmente com o restante do desenho do para-choque e não combina como deveria.
O para-choque recebeu o tratamento estético que faz parte da identidade de estilo da marca para todos os modelos. Essas foram as únicas peças onde conseguiram aplicar tal identidade. E não é que ficou bom?
A Volkswagen tem dado atenção aos desenhos internos de faróis e lanternas e, já há um tempo, vem apresentando resultados muito bons. Esse ficou ótimo, com um ar moderno e rico. Pena que não se estenda às versões mais simples, sem lâmpadas de xenônio, tanto lá fora quanto no Brasil.
Capricharam até nas rodas, de aparência esportiva e visual também retrô. Chamam a atenção por lembrar um pouco as rodas Fuchs, em forma de estrela, usadas no Porsche 911 do fim dos anos 60 até os anos 80 e que, quando colocadas nos Fuscas antigos, o deixavam muito atraente.
Edilson Luiz Vicente é designer com 22 anos de experiência na indústria automobilística, atuados em empresas de grande porte como Volkswagen, Ford e General Motors no Brasil, Isuzu no Japão e General Motors nos Estados Unidos. É um dos poucos de seu segmento com experiência também em projetos e engenharia. Também é professor no Istituto Europeo di Design em São Paulo. Mais informações.
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