“Novo” de novo, Clio segue a cartilha da economia

Renault Clio (4)

Com visual retocado, o modelo mais barato da Renault tem
o consumo reduzido, mas algumas simplificações incomodam

Texto: Geraldo Tite Simões – Fotos: divulgação

 

Desde que Einstein revelou que o tempo é relativo, o conceito do que é novo ou velho também adquire certa relatividade. Para ser novo é preciso uma completa renovação, um renascimento, ou só uma atualização?

Na indústria automobilística, parece que incorporar o adjetivo “novo” ao nome de um veículo tem a função mais de despertar a atenção do que propriamente de apresentar algo inédito. Pelo menos foi essa sensação que ficou com a apresentação do Clio 2013: a Renault baseou sua estratégia de lançamento no conceito de “novo”, embora ele guarde demais as características do “velho”.

A proposta da Renault era melhorar o Clio naquilo que os consumidores apontavam como menos atraente em relação aos concorrentes. Por isso aplicou-lhe a nova identidade visual da marca na frente, investiu em um motor mais econômico e com potência até 3 cv mais alta e ofereceu mais opções de personalização, mas não mexeu no preço — o principal fator de compra de um carro que representa a base da oferta da empresa no mercado. O resultado é um compacto que pretende ser o mais potente e econômico da categoria de entrada por um preço interessante.

 

 
O Clio vermelho mostra os para-choques originais, sem o conjunto de defletores;
a frente tomou como referência o modelo europeu, duas gerações à frente

 

O motor traz 70 novos componentes, como pistões, bielas, bronzinas, junta de cabeçote, bomba de óleo, central eletrônica e injetores de combustível. Agora há um jato de lubrificante para arrefecer os pistões e ocorreu aumento significativo na taxa de compressão, de 10:1 para 12:1 — mudança que deve trazer maior aproveitamento da energia da queima do combustível, sobretudo ao usar álcool. É uma pena que tal evolução tenha demorado e chegue em um momento no qual poucos usuários permanecem adeptos do combustível vegetal, por seu preço pouco atraente, mas a taxa mais alta aumenta o rendimento mesmo com gasolina.

De resto, a Renault adotou relação mais baixa para o diferencial (ficou mais longo) e pneus chamados de “ecológicos”, com menor resistência ao rolamento, além de alterar sua medida de 175/65 R 14 para 175/70 R 13. Embora o diâmetro total tenha sido mantido, rodas menores são mais leves e ajudam a reduzir a inércia do conjunto, enquanto o perfil mais alto dos pneus compensa em parte o aumento da aspereza de rodagem causado pelo tipo “verde” — de resto, há redução de custo, tanto para o fabricante quanto para o consumidor na reposição.

O resultado das modificações foi que o Clio se tornou, por enquanto, o único modelo da categoria a obter nota A no Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular, coordenado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), entre os equipados com ar-condicionado e direção assistida. Nessa versão, o pequeno Renault obtém 13,1 km/l (cidade) e 14,3 km/l (rodovia) com gasolina e 9,1 km/l (urbano) e 9,6 km/l (rodoviário) com álcool. Sem tais equipamentos, são 14,3/15,8 km/l com gasolina e 9,5/10,7 km/l com álcool, na ordem cidade/rodovia. Os índices pelo programa não devem ser comparados aos obtidos por norma NBR, como os divulgados anos atrás para o Clio.

 

 
Os novos acessórios à venda chamam atenção, mas o Clio foi despojado de itens de
segurança como faróis de duplo refletor e repetidores laterais das luzes de direção 

 

Registrou-se também um pequeno ganho em desempenho. A potência passou de 76/77 cv a 6.000 rpm para 77/80 cv a 5.750 rpm, e o torque máximo, de 10,0/10,2 m.kgf para 10,1/10,5 m.kgf (mantendo-se o regime de 4.250 rpm), sempre na ordem gasolina/álcool. Com isso, acelerar de 0 a 100 km/h agora requer 14,3/13,7 segundos e a velocidade máxima chega a 167/168 km/h, ante 14,3/14,1 s e 166/167 km/h do modelo anterior.

Ganha daqui, perde dali

Por fora o Clio recebeu alterações sobretudo na frente, com uma grade inspirada no novo modelo francês — que já está duas gerações à frente do nosso — e redesenho de capô, para-choque e faróis. Aqui, um retrocesso em nome da economia: o duplo refletor deu lugar ao tipo simples, menos eficiente. Outra perda lamentável foi a de repetidores laterais de luzes de direção, com o agravante de que as luzes dianteiras agora ficam na parte interna dos faróis, pouco visíveis pela lateral. Se as peças seriam redesenhadas, por que a Renault não colocou as menos as luzes nas extremidades?

Nas laterais só foi descartado o friso de proteção, que pode ser recolocado como acessório. Já na traseira o Clio traz outras lanternas e uma tampa de porta-malas com vincos que se combinam aos das luzes, enquanto um defletor no alto do vidro disfarça sua curvatura característica. Na maioria das fotos da fábrica é mostrado o conjunto de anexos aerodinâmicos vendido como acessório, mas o desenho-padrão é o que deixa apenas elementos circulares nos cantos do para-choque dianteiro, destinados a faróis de neblina.

 

 
Aprimorado, o motor de 16 válvulas ganhou potência (80 cv com álcool) e tornou o
Clio o mais econômico da categoria entre os avaliados pelo programa de etiquetagem

 

Esses anexos vêm no pacote Sport (R$ 1.405), que traz saias laterais e defletores dianteiro e traseiro. O conjunto Look (R$ 632) traz frisos laterais e capas para os retrovisores na cor da carroceria, enquanto o pacote Adesivos (R$ 300) vem nas opções Faixas Esportivas e Desenho Geométrico, com peças instaladas no capô e no teto.

O interior mudou pouco: recebeu novos padrões de tecidos, porta-objetos à frente da alavanca de câmbio (que sempre fizeram falta no modelo) e um quadro de instrumentos semelhante ao de Logan e Sandero, com mostradores de temperatura do motor e nível de combustível em um quadro digital de cristal líquido, mais baratos que os analógicos. Ao menos a Renault compensou sua economia com a inclusão de um computador de bordo. No conta-giros, marcas verdes e amarelas sinalizam os pontos mais e menos econômicos, na ordem, com a transição entre 2.500 e 3.000 rpm.

Próxima parte

 

 
Parte dos instrumentos agora é digital e o conta-giros (de série) indica em verde os
regimes mais econômicos; improviso nos controles de vidros deveria ser revisto

 

O conjunto Estilo (R$ 449) conta com moldura colorida ao redor do rádio e das saídas de ar. Controle elétrico dos vidros e travas passam a ser instalados só em concessionária, algo que deveria ser revisto, tanto pela qualidade da instalação (conjuntos previstos de fábrica nos parecem mais confiáveis) quanto pelo aspecto em si: as caixas nas portas que alojam os comandos de vidros destoam totalmente dos demais plásticos usados no interior, em uma improvisação que chega a não parecer um item original.

Continuam de fora as bolsas infláveis, mesmo como opcional, e o encosto de cabeça para o passageiro do meio do banco traseiro. Para uma marca que festejou o primeiro carro do segmento de 1,0 litro com dupla bolsa inflável de série — o mesmo Clio, em 1998 —, chega a incomodar ver o sumiço desse item, ainda mais quando se sabe que em 2014 ele se torna obrigatório para todos os carros. A fábrica argumenta que as bolsas não aparecem como item solicitado pelos clientes e nenhum concorrente da categoria as oferece.

Agora sem o sobrenome Campus, o Clio mantém a opção entre três e cinco portas, mas apenas a segunda oferece o acabamento superior Expression (o Authentique pode vir com três ou cinco). O mais barato, de R$ 23.290 (R$ 2.000 a mais no caso do cinco-portas), vem de série com computador de bordo, alarme sonoro de advertência de luzes acesas, conta-giros e relógio digital; pode receber ar-condicionado por R$ 2.500.

 

 
Na rápida avaliação, o Clio 2013 mostrou bom desempenho só em alta rotação:
o motor requer uso frequente do câmbio para acompanhar o tráfego rápido

 

O Clio Expression (R$ 24.950) traz a mais limpador, lavador e desembaçador de vidro traseiro, ar quente, volante e botões do painel com detalhes cromados. Direção assistida (R$ 1.100) e ar-condicionado (R$ 2.500) são opcionais, independentes ou combinados. Em ambas as versões é possível instalar em concessionária, além do controle elétrico dos vidros dianteiros e travas, um rádio/toca-CDs com MP3, conexão USB e interface Bluetooth para telefone celular. A garantia permanece de três anos ou 100 mil quilômetros.

O acabamento das duas versões é compatível com a proposta de carro acessível, mas é estranha a composição de equipamentos por deixar a versão de três portas sem a possibilidade de direção assistida, limpador e desembaçador traseiros. Hoje a opção pelo carro de duas portas laterais se torna atraente pela segurança, já que dificulta um assalto, o que leva até a seguro mais barato — além de combinar mais com a esportividade que a Renault quis sugerir com os itens de personalização.

Em nosso rápido contato com o carro, em um dia bastante chuvoso e com trânsito pesado no Rio de Janeiro, RJ, não foi possível conferir se os novos atributos do motor são efetivos. Mas se confirmou que a escolha por um motor de 16 válvulas e alta potência específica (80 cv por litro) não se mostra ideal nas baixas e médias rotações, como em saídas e retomadas de velocidade. O Clio arranca com certa dificuldade e exige certo empenho no uso do câmbio para fornecer desempenho razoável, que só aparece em regimes mais altos — melhor esquecer a nova faixa verde do conta-giros, a não ser em condições muito leves de trânsito.

 

E o novo de verdade?

Uma pergunta inevitável na apresentação do “novo” Clio era sobre o Clio de quarta geração, lançado recentemente na Europa com linhas atraentes e soluções técnicas de vanguarda, como o motor turbo de três cilindros.

Segundo os executivos da empresa, na Europa esse carro custa cerca de R$ 40.000 e não é o modelo de entrada, pois abaixo dele há o Twingo. Com o aumento de preços habitual para o mercado brasileiro, a Renault acredita que não haveria viabilidade para sua produção local; tampouco há intenção de importar o europeu.

A questão que fica no ar é: com lançamentos modernos na categoria dos compactos como Citroën C3, Hyundai HB20 e os futuros Ford Fiesta nacional e Peugeot 208, a empresa vai se conformar em oferecer na categoria só o já envelhecido Sandero?

 

Ficha técnica

Motor
Posição transversal
Cilindros 4 em linha
Comando de válvulas no cabeçote
Válvulas por cilindro 4
Diâmetro e curso 69 x 66,8 mm
Cilindrada 999 cm³
Taxa de compressão 12:1
Alimentação injeção multiponto sequencial
Potência máxima (gas.) 77 cv a 5.750 rpm
Potência máxima (álc.) 80 cv a 5.750 rpm
Torque máximo (gas.) 10,1 m.kgf a 4.250 rpm
Torque máximo (álc.) 10,5 m.kgf a 4.250 rpm
Transmissão
Tipo de câmbio e marchas manual /  5
Tração dianteira
Freios
Dianteiros a disco
Traseiros a tambor
Antitravamento (ABS) não
Direção
Sistema pinhão e cremalheira
Assistência hidráulica (opcional)
Suspensão
Dianteira independente, McPherson
Traseira eixo de torção
Rodas
Dimensões 13 pol
Pneus 175/70 R 13
Dimensões
Comprimento 3,811 m
Largura 1,639 m
Altura 1,417 m
Entre-eixos 2,472 m
Capacidades e peso
Tanque de combustível 50 l
Compartimento de bagagem (normal/banco rebatido) 255 / 596 l
Peso em ordem de marcha 912 kg
Dados do fabricante

 

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