
Houve ganhos em segurança e o E-GT é interessante, mas versão 1,6 não empolga pelo salgado preço
Texto: Kleber Nogueira – Fotos: divulgação
A Peugeot tem boas expectativas para o novo 208, hatch compacto agora feito na Argentina e que tem como a grande novidade técnica a nova plataforma CMP. O lançamento é especialmente importante para a marca francesa, que vem perdendo volume no mercado brasileiro desde que optou por deixar de oferecer produtos na faixa de entrada da tabela. Iniciou ali uma escalada para um portfólio focado em percepção de valor, por meio do estilo e da tecnologia embarcada.
A empresa alega que não existe pretensão para o novo 208 em volume de vendas, mas é claro que o carro tem de superar os baixos números que o antigo 208 vinha registrando em fim de ciclo. Pelas impressões deixadas, é certo que vai — a depender da aceitação aos novos, e um tanto salgados, preços.
O hatch chega inicialmente com uma fórmula única e conhecida de motor e transmissão: o consolidado 1,6-litro de aspiração natural, capaz de 118 cv e 15,6 m.kgf de torque com álcool, usado no 208 anterior, associado à caixa automática de seis marchas. Não será oferecida caixa manual. Estão disponíveis três versões de acabamento e equipamentos, com preços que variam entre R$ 75 e 95 mil (veja no quadro abaixo).
Os “dentes de sabre” em leds são a marca visual do novo 208, que está maior; a versão Griffe (acima) traz várias novas assistências
A Peugeot anuncia o programa Just Drive It (“apenas o dirija”), disponível para toda a linha, que oferece o carro como um serviço por assinatura. O cliente paga entrada e valor mensal de locação, que inclui despesas como manutenção e seguro, e ao fim do período contratado pode escolher comprar o carro que usou, devolvê-lo ou trocar por um novo, mantendo o programa.
Como acontecia com o antecessor, o novo 208 tem um belo desenho, que atrai os olhares e, sem dúvida, continuará a ser um argumento de vendas. Com 4,06 metros de comprimento (mais 9 cm que o anterior) e a mesma distância entre eixos de 2,54 m, ele tem como destaque visual as luzes diurnas de leds, cujo formato lembra dentes de sabre a partir dos faróis — estes, porém, só trocam as lâmpadas por leds na versão de top Griffe. O coeficiente aerodinâmico (Cx) anunciado, 0,33, é o mesmo do antigo 208 GT.
A percepção de qualidade na construção traz ganhos quando comparada à geração anterior. Isso fica mais evidente na cabine, que na versão Griffe traz bancos revestidos com camurça sintética, tecido e simulação de couro — contudo, diz a Peugeot que a camurça ficará restrita a um lote inicial. Bancos têm bom apoio lateral, mas carecem de um pouco mais de suporte lombar. O pequeno volante continua a chamar a atenção, logo abaixo do quadro de instrumentos digital que agora traz telas transparentes sobrepostas, criando um efeito de três dimensões nas informações.
Quadro digital agora simula efeito 3D e pode ser configurado; revestimento do Griffe inclui camurça sintética
A central de áudio, embora bem colocada, tem operação um tanto confusa. Os controles do ar-condicionado são operados pela central, o que exige constante uso dos menus e perda de informações do mapa que estiver espelhado do celular por Android Auto ou Apple Car Play. Acostuma-se, mas o ideal seria tudo estar mais à mão. Há espaço razoável para dois adultos no banco traseiro, dentro da média do segmento. Como no 208 antigo, o teto panorâmico não permite a abertura do vidro, apenas da persiana. Se com ela fechada a luz fica bem isolada, o calor da vidraça aquece o ambiente e exige esforço extra do ar-condicionado.
Se o motor segue inalterado, realmente nova é a plataforma CMP, já presente no novo 2008 europeu e que será estendida a automóveis da Fiat
As versões superiores trazem vários equipamentos inéditos no 208 no Brasil, como carregador de celular por indução, chave presencial, assistentes de farol e de saída da faixa (com intervenção na direção), câmera com visão de 180 graus, leitura de placas de velocidade (o limite é então mostrado no painel), monitor de atenção do motorista e monitor frontal com alerta de risco de colisão e frenagem autônoma de emergência.
Este último opera em três estágios. No primeiro nível, emite apenas alerta visual de que o veículo à frente está muito próximo. No nível seguinte há também alerta sonoro indicando uma colisão iminente. Se o motorista nada fizer, o sistema automático de frenagem entra em ação. A velocidade não deve exceder 80 km/h, quando for detectado um veículo parado, e 60 km/h quando se tratar de pedestre. Já o assistente de faixa atua entre 65 e 180 km/h, desde que as faixas demarcadas no solo possam ser lidas.
Central de áudio com tela de 7 pol concentra comandos de ar-condicionado; teclas do painel lembram as do 3008
Outros ganhos foram o controle eletrônico de estabilidade e tração — antes restrito ao 208 GT — e as bolsas infláveis laterais dianteiras, agora de série em toda a linha. Bolsas de cortina equipam as duas versões superiores. Poderia ser melhor a capacidade de bagagem: caiu de 285 para 265 litros, mesmo com uso de estepe temporário. Na categoria há modelos com 300 litros ou mais, como Fiat Argo, Renault Sandero e Volkswagen Polo. Houve redução também no tanque de combustível de 55 para 47 litros, o que pode incomodar com uso de álcool.
Esportivo elétrico
Se o motor segue inalterado, incluindo os índices de potência e torque, o que há de realmente novo na parte mecânica é a plataforma CMP (Common Modular Platform ou plataforma modular comum, no sentido de ser aplicada a vários modelos). Ela já está presente no novo 2008 europeu, em carros das marcas Opel e Vauxhall como Corsa e Mokka e, diante da fusão com o grupo FCA, será estendida nos próximos anos a automóveis da Fiat.
Inovação sob o capô, só mesmo o esportivo 208 E-GT, primeiro carro elétrico da marca no Brasil. Enquanto Chevrolet, Nissan e Renault apostaram em modelos unicamente elétricos — Bolt, Leaf e Zoe, na ordem —, a Peugeot deu ao E-GT a função de topo de linha do 208, papel em que vem substituir o antigo GT com motor turbo de 1,6 litro.
Próxima parteVersões, preços e equipamentos
• 208 Active (R$ 75 mil; fotos acima) – Bolsas infláveis laterais dianteiras, central de áudio com tela de 7 polegadas e integração a celular, controlador e limitador de velocidade, controle eletrônico de estabilidade e tração, luzes diurnas de leds, rodas de alumínio de 16 pol.
• 208 Active Pack (R$ 82.490) – Como o Active, mais ar-condicionado automático, câmera traseira de manobras, teto panorâmico.
• 208 Allure (R$ 89.490) – Como a Active Pack, mais apoio de braço para o motorista, bancos revestidos em camurça sintética, bolsas infláveis de cortina, carregador de celular por indução, chave presencial para acesso e partida, quadro de instrumentos com efeito 3D, rodas especiais, volante de couro.
• 208 Griffe (R$ 95 mil) – Como o Allure, mais assistente de farol, assistente de saída da faixa, câmeras com visão de 180 graus, faróis e limpador de para-brisa automáticos, faróis de leds, leitura de placas de velocidade, monitor de atenção do motorista, monitor frontal com alerta de risco de colisão e frenagem autônoma de emergência, sensor de estacionamento traseiro.
• Garantia – Três anos sem limite de quilometragem.
Apesar de 300 kg mais pesado e bem menos potente que o antigo GT turbo, o 208 E-GT responde rápido pelo torque instantâneo
A comparação aponta grande perda de potência, de 173 cv (com álcool) para 136 cv, enquanto o peso sobe mais de 300 kg. Contudo, com o torque de 26,5 m.kgf disponível de imediato (no GT eram 24,5 m.kgf quando enchesse a turbina), o elétrico acelera de 0 a 100 km/h em bons 8,3 segundos, perda de 0,7 s para o antigo esportivo com álcool. A velocidade máxima limitada a 150 km/h é que decepciona, embora não faça muita diferença no mundo real.
O E-GT oferece três modos de condução: Eco, focado em autonomia; Drive, intermediário; e Sport, que prioriza o desempenho. O sistema de regeneração de energia ao desacelerar também admite ajuste entre dois programas por meio da alavanca de transmissão: moderado, para sensações semelhantes às de um veículo a combustão, e aumentado, para desaceleração controlada pelo pedal do acelerador. Nesse, em grande parte das situações de uso pode-se dirigir apenas com o pedal da direita.
A versão elétrica europeia, de melhor acabamento que a argentina, traz novos instrumentos e central de áudio de 10 pol
As baterias de íons de lítio do 208 elétrico, com capacidade de 50 kWh e autonomia de 340 quilômetros pelo padrão WLTP (rendimento de 5,7 km/kWh), ficam no assoalho para favorecer um centro de gravidade mais baixo e evitar perda de espaço para bagagem, que é o mesmo do modelo a combustão. O E-GT pode ser carregado em tomadas convencionais ou carregadores rápidos de estações de recarga. Com um carregador especial é possível “abastecer” 80% da bateria em apenas 30 minutos.
O rodar suave mostra boa evolução em absorção de pequenos impactos e asperezas do piso; já o acerto de amortecedores firme e esportivo o deixa bem estável
Ao volante dos novos 208
Na avaliação em São Paulo, SP, e em rodovia, o 208 Griffe mostrou-se cumpridor, sem empolgar. Na cidade, em tráfego pesado ou mesmo em avenidas rápidas, a percepção é de razoável agilidade. A transmissão calibrada com comedimento mantém o motor numa zona confortável e favorece o consumo. Não vale a pena usar o modo Eco da caixa, pois a já pacata resposta ao acelerador se torna ainda mais lenta.
Saindo do ambiente urbano, o trecho rodoviário até a cidade de Tuiuti mostrou que seria muito bem-vinda a força de um turbocompressor, presente hoje em concorrentes como Chevrolet Onix, Hyundai HB20 e Volkswagen Polo. O acelerador exige bastante pressão para reduzir uma ou mais marchas, privilegiando o consumo. Para os mais apressados, ao menos dá para acionar o modo Sport, que segura marchas mais curtas e deixa mais rápido o curso do acelerador. Os adeptos de maior controle do carro gostariam de aletas no volante para seleção de marchas, como já existiu no modelo antigo.
O E-GT tem autonomia de mais de 300 km, recarga pelo mesmo bocal do 208 comum e espaço de bagagem mantido; a alavanca seleciona o modo de maior regeneração, para condução quase sem uso dos freios
Se o 208 seria mais esportivo com o pleiteado 1,2-litro turbo, que estará disponível para os argentinos mediante importação da Europa? Sem dúvida, seria. Mas se motor fosse algo essencial na decisão de compra, certamente Jeep Renegade, Fiat Toro, Renault Captur e outros não teriam o público cativo que têm. O próprio líder de mercado — Onix — até outro dia mal passava de 100 cv no motor mais potente, o de 1,4 litro. Nesse aspecto não há demérito à Peugeot, desde que não demore a reagir caso o mercado demonstre tal demanda.
O rodar suave mostra boa evolução em absorção de pequenos impactos e asperezas do piso, que incomodavam no antigo 208. Por outro lado, o acerto de amortecedores firme e esportivo o deixa bem estável e acaba com o “mergulho” ao atravessar lombadas do modelo anterior. Em conjunto a uma direção muito comunicativa — boa característica que foi mantida —, torna-se um carro agradável de dirigir.
No circuito do Haras Tuiuti conhecemos de perto o 208 E-GT. Como se espera pelo torque alto e instantâneo, as respostas são muito convincentes, embora o conceito de esportividade precise ser revisto pela falta de ronco do motor. Mesmo com 300 kg a mais que o modelo convencional, ele tem comportamento dinâmico apreciável, com grande estabilidade — está “na mão” em curvas de diversos traçados. O acabamento é um tanto superior ao do modelo argentino e há recursos adicionais, como acionamento elétrico do freio de estacionamento e central de áudio com tela de 10 em vez de 7 polegadas.
O motor 1,6 não desabona o 208, mas diante dos concorrentes e do preço da versão a falta de turbo se torna inconveniente
Com previsão de entregas apenas no ano que vem, a marca já aceita encomendas para o 208 E-GT, mas sem precisar valor. Não há expectativa por volume: assim como o antigo 208 GT, é um carro diferenciado e cativante que atuará como embaixador da gama.
Quanto ao 208 comum, entendemos que o motor não será um empecilho a sua aceitação, mesmo que fique certa frustração por ver uma unidade antiga — em princípio, a mesma do 206 de duas décadas atrás — em um carro novo desde a plataforma. O preço é que poderá ser obstáculo: a menos que o consumidor perceba valor em itens raros ou inexistentes em concorrentes, como os recursos de assistência, a versão Griffe custar bem mais que um Polo ou Onix completo não é um bom começo.
Mais AvaliaçõesFicha técnica
208 Griffe | 208 E-GT | |
Motor | ||
Posição | transversal | transversal |
Cilindros | 4 em linha | elétrico assíncrono trifásico |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote | |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo | |
Diâmetro e curso | 78,5 x 82 mm | |
Cilindrada | 1.587 cm³ | |
Taxa de compressão | 12,5:1 | |
Alimentação | injeção multiponto sequencial | |
Potência máxima* | 115/118 cv a 5.750 rpm | 136 cv |
Torque máximo | 15,4 m.kgf a 4.000 rpm/15,5 m.kgf a 4.750 rpm | 26,5 m.kgf |
Bateria | ||
Tipo | NA | íons de lítio |
Capacidade | NA | 50 kWh |
Transmissão | ||
Tipo de caixa e marchas | automática, 6 | direta |
Tração | dianteira | dianteira |
Freios | ||
Dianteiros | a disco ventilado | a disco ventilado |
Traseiros | a tambor | a disco |
Antitravamento (ABS) | sim | sim |
Direção | ||
Sistema | pinhão e cremalheira | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica | elétrica |
Suspensão | ||
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal | |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal | |
Rodas | ||
Dimensões | 16 pol | 17 pol |
Pneus | 195/55 R 16 | 205/56 R 17 |
Dimensões | ||
Comprimento | 4,055 m | 4,055 m |
Largura | 1,738 m | 1,745 m |
Altura | 1,453 m | 1,43 m |
Entre-eixos | 2,538 m | 2,54 m |
Capacidades e peso | ||
Tanque de combustível | 47 l | NA |
Compartimento de bagagem | 265 l | 265 l |
Peso em ordem de marcha | 1.178 kg | 1.530 kg |
Desempenho* | ||
Velocidade máxima | 190 km/h | 150 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 12,6/12,0 s | 8,3 s |
Dados do fabricante; consumo não disponível; *gasolina/álcool para Griffe; NA = não aplicável |