Há grandes oportunidades no mercado de segunda mão: saiba como escolher bem para evitar problemas
O mercado está ótimo para compra de veículos usados. Tudo bem que é consequência de uma crise pela qual ninguém gostaria de passar, mas a vida é como pilha: sempre tem o lado negativo e o positivo. Cabe a nós olharmos mais para o positivo.
Desde sempre sou procurado por amigos e internautas com dúvidas sobre qual moto comprar, mas recentemente sumiu aquele discurso “não importa o preço, quero saber qual a melhor”. Ah, como era bom ter dinheiro sobrando. Agora a pergunta começa sempre com um valor, do tipo “o que você recomenda comprar com R$ 20.000?”. E nesse cardápio entram as usadas, que surgem como excelentes oportunidades.
Primeiro vamos olhar para o mercado. A oferta de veículos usados cresceu muito, mais ainda quando se trata de motos acima de 400 cm³. Em geral esse é um veículo de lazer, quase um luxo, enquanto as motos abaixo dessa categoria são bens de uso ou de trabalho, praticamente um gênero de primeira necessidade.
Arranhões e amassados podem indicar queda: verifique se nada mais sério foi afetado
Na hora do sufoco, a primeira coisa que uma família corta é o luxo. Eu mesmo tive de vender uma moto que amava, já que o prometido meteoro não veio e o fim do mundo foi adiado mais uma vez. Como meu mundo estava quase acabando, tive de vender a moto e planejei ficar só de scooter — até que surgiu uma galinha morta. Não, não é a penosa, mas é o nome que se dá a uma oportunidade muito rara de fazer um ótimo negócio. E fiz.
Dessa minha experiência surgiram outros amigos que estão na mesma situação. Por isso decidi escrever um rápido manual com 10 dicas de como comprar moto usada sem rolos, tretas nem perder a amizade.
Não se fixe apenas no preço: às vezes um modelo mais caro na aquisição torna-se menos oneroso no custo de seguro, um importante quesito
1) Tamanho é documento. Um erro muito comum, em especial com os novatos, é se deixar atrair por tentadoras ofertas de motos grandes e potentes, que depois vão dar muito trabalho para pilotar, ter um valor de seguro impagável e dificuldade de manutenção. Por isso a primeira dica é focar menos no valor e mais na “usabilidade” da moto. Pense: para que eu quero uma? Não precisa começar com uma 125/150, a menos que for entregar pizza, mas pode partir para a faixa 250/300 e aumentar aos poucos.
2) Não se fixe apenas no preço. Faça uma pesquisa, sobretudo, do custo de seguro. Às vezes um modelo mais caro na aquisição torna-se menos oneroso nesse importante quesito. Para exemplificar, uma moto de R$ 35.000 com seguro de R$ 1.200/ano logo se torna menos dispendiosa que uma moto de R$ 30.000 com seguro de R$ 4.000/ano. Antes de fechar negócio, faça a cotação com pelo menos três companhias — alguns sites de classificados já trazem a simulação desse custo.
Da mesma forma, após definir o modelo de seu interesse, escolha itens como pneus, relação final (coroa, corrente e pinhão), pedaleiras e manetes e veja quanto custa e se estão disponíveis em concessionária. Podem-se encontrar ótimas ofertas de motos importadas, mas que correm o risco de ficarem vários dias paradas na oficina por falta de peças. Embora com a internet se possa comprar (e receber em casa) a maioria das peças de reposição, é bom saber se o modelo escolhido tem rede de assistência na sua região e em outras que sejam relevantes para você.
3) Verifique a documentação. A vistoria para a transferência de documentos foi terceirizada pelos Detrans. Se perceber o menor erro, não feche negócio, porque depois isso vira uma burocracia infinita para regularizar. Confira número por número, incluindo a quilometragem, que não pode ser menor na moto do que a registrada no laudo. Se a moto estiver com alguma dívida, espere o dono regularizar: dívidas que não reconhece também podem trazer problemas para quitar.
4) Pesquise se o modelo passou por convocação (recall) e se foi documentado no manual do proprietário. Aproveite para checar se foram feitas pelo menos as primeiras revisões obrigatórias, sob pena de anular a garantia, caso ainda esteja vigente. Pergunte por eventuais chaves-reserva.
5) Motos com até um ano de uso ou cerca de 15.000 km rodados geralmente estão em bom estado. A desvalorização média em 12 meses varia de 12 a 15%, mas pode ser maior em alguns casos, como quando o produto sai de linha.
Um dono cuidadoso troca manoplas e manetes danificados antes da venda; pneus com fissuras podem confirmar que a moto rodou pouco, mas precisam ser trocados
6) Na análise da moto, comece pelo aspecto geral. Os sinais de maus tratos e conservação inadequada estão na folga excessiva da corrente, desgaste dos pneus, pedaleiras raladas e até peças quebradas. O maior dedo-duro são os pneus: quando ficam velhos, surgem pequenas fissuras como uma porcelana craquelada. Isso pode confirmar que a moto rodou pouco, mas assim que fechar negócio terá de trocar os pneus, porque a borracha ressecada não tem boa aderência e pode levar a estouros. Atenção a pedaleiras e manetes ralados, sinal de queda. Pode não significar nada sério, mas um dono cuidadoso troca as peças antes de anunciar a venda.
7) Não se assuste com as marcas naturais de uso. Uma coisa que me deixava irritado ao vender uma moto era o comprador apontar marcas naturais de uso no bagageiro, ponta de manetes, de manoplas, etc. Costumo dizer: se quiser uma moto sem marca de uso, compre uma zero-km. Moto é um meio de transporte, não uma peça de decoração delicada.
Verifique a documentação: se perceber o menor erro, até na quilometragem, não feche negócio porque depois isso vira uma burocracia infinita para regularizar
8) Ligue o motor frio e fique de olho no escapamento. Esse é o momento mais denunciador de um motor fadigado. Se perceber fumaça cinza ou azulada, esqueça e parta para outra.
9) Cuidado com motos “reformadas” ou repintadas. Prefiro comprar uma moto com arranhões visíveis do que com rachaduras estruturais escondidas pela nova pintura. Moto reformada, só se for para coleção.
10) Tecnologia é tudo. Se puder escolher entre moto com ou sem freios antitravamento (ABS), dê preferência para a segurança. Em usadas a diferença de preço é pouca ou nem existe. Tecnologias como controle de tração, monitor de pressão dos pneus, manopla aquecida, computador de bordo são úteis. Da mesma forma, se pretende usar acessórios como bauleto, bagageiro, faróis auxiliares e protetores, dê preferência a motos equipadas com eles: para instalar depois o custo é maior, além da mão de obra da instalação.
Por fim, pesquise bem antes de fechar negócio e pechinche — mas muito, porque todos sabemos que em época de crise as condições de negociação melhoram. Para motos usadas, em geral não vale a pena financiar porque os juros estão para cima da estratosfera. Tente a estratégia de parcelar o valor à vista no cartão de crédito, modalidade que tem sido bem aceita pelos comerciantes.
Coluna anteriorGeraldo Tite Simões é jornalista e instrutor de pilotagem dos cursos ABTRANS e Speed Master