Tornou-se comum a presença de mulheres pilotando nas ruas e até nas pistas, mas existe algum impedimento técnico?
Sempre fui um pouco refratário a escrever sobre mulheres motociclistas, porque enaltecer esse tipo de atividade funciona para alimentar ainda mais certos preconceitos. Pilotar moto nunca foi exclusivo da condição masculina — minha mãe era motociclista nos anos 40, assim como minhas tias, e isso não fez delas melhores nem piores que suas colegas.
Não gosto de desenvolver esse tipo de pauta “mulher que faz coisas de homem” porque não acredito, nem nunca acreditei, que mulher não possa fazer alguma das atividades consideradas “masculinas”. E esse tipo de artigo serve para estimular atitudes como “puxa, ela é fera mesmo, joga futebol como um homem!”. Com certeza seria capaz de encontrar centenas de mulheres que jogam futebol muito melhor que eu… E com moto não é diferente.
Felizmente os tempos mudaram, passamos por grandes transformações no comportamento social e hoje as mulheres já representam cerca de 50% das compras de motos em algumas cidades. Esse número pode ser maior, porque ainda são comuns homens comprando motos para esposas ou filhas.
E não é só nas ruas. Atualmente é comum a presença de mulheres competindo em motovelocidade, motocross, enduro, etc. E no mesmo nível de competitividade que os homens, porque, à exceção das atividades fora de estrada, não há necessidade de maior força muscular nem resistência física.
Já faz alguns anos que recebo constantes inscrições de alunas em meu curso de pilotagem SpeedMaster e observei que até o tipo de moto mudou. Antes as mulheres escolhiam motos urbanas, scooters, em alguns casos as custom ou as de uso misto. Hoje vejo uma quantidade muito grande de mulheres pilotando motos esportivas de 250, 600 e até 1.000 cm³ com a maior desenvoltura do mundo. Já surgiram até grupos femininos de motociclistas (mas que nos aceitam, os estranhos de sexo masculino) que se reúnem para competir ou simplesmente viajar.
Do ponto de vista técnico, não existe nada que possa diferenciar homens e mulheres no que diz respeito à pilotagem de moto. Alguns especialistas em comportamento apontam até uma vantagem das mulheres: por serem capazes de separar os comandos dos dois hemisférios do cérebro, elas — teoricamente — teriam condições de, por exemplo, conversar sem perder a orientação do caminho, coisa que eu me atrapalho até sem falar nada. Na verdade, sabemos que as mulheres são capazes de falar e fazer qualquer coisa ao mesmo tempo.
Chega até a ser charmoso encontrar mulheres espremidas em macacões de couro, pilotando motos esportivas de 120 a 200 cv. E como essas motos são praticamente monopostos, não tem nem como levar o namorado na garupa.
O mercado já percebeu esse crescimento do público feminino sobre duas rodas e começou a oferecer linhas de equipamentos especialmente para elas. É evidente que a anatomia de homens e mulheres é diferente (ou deveria ser). Por isso capacetes, luvas, botas e conjuntos de couro e poliéster são feitos já prevendo o uso por mulheres. Podemos encontrar capacetes em cores exclusivas, jaquetas com caimento respeitando a cintura mais fina e numeração especial.
E não é diferente com as motos. No segmento de scooters e motonetas é comum os fabricantes oferecerem uma versão especial para o público feminino com cores e acabamento especiais. Difícil é vender depois… Em muitos casos, nem elas próprias gostam dessas opções.
Outro dado interessante desse público é que está cada vez mais bem informado. Com a facilidade da internet, as mulheres pesquisam muito antes de comprar, desde equipamentos até a moto. E também se preocupam mais com a segurança do que os homens. Talvez até por vaidade, é mais comum ver mulheres de luvas, botas e capacete fechado.
Só espero que as motociclistas não comecem a adotar o comportamento masculino no trânsito. Pela própria natureza, as mulheres costumam ser mais cuidadosas e gentis, mas já é possível encontrar mulheres motociclistas adotando o modelo truculento de pilotagem, e até violento, antes característica masculina. Vamos torcer para que as mulheres, motociclistas ou não, continuem sendo mulheres!
Vêm aí novas regras
Em recente fórum internacional sobre trânsito foram apresentadas algumas propostas para aumentar a segurança dos motociclistas. Voltou à pauta a velha questão das motos circulando nos corredores entre os carros, e 20 países apresentaram proposta de proibir o tráfego de motos nesses espaços. Mas com uma ressalva: que as motos possam circular quando o trânsito estiver parado. Uma decisão tacanha. Quer dizer que se os carros engatam a primeira para andar alguns metros as motos devem sair dos corredores e entrar no meio deles? E como fiscalizar isso?
Além disso, pelas estatísticas oficiais, a maioria absoluta dos acidentes envolvendo motos acontece em cruzamentos e não em corredores. E mais: estudos mostram que uma moto colocada atrás do carro representa mais risco ao motociclista em caso de abalroamento. Por outro lado, continuam fora da fiscalização as películas escuras demais dos carros e o uso de telefone celular por motoristas.
A boa notícia é que foi apresentada proposta para melhorar a formação dos motociclistas. Agora as motoescolas deverão fazer aulas em vias públicas e não apenas em local fechado e espremido. Finalmente acordaram que um dos problemas enfrentados pelos novos motociclistas é o baixíssimo nível de instrução na formação básica.
Pelo menos é um passo, porque vivemos uma condição totalmente inversa do resto do mundo. O Estado não dá formação, mas cobra um comportamento exemplar e, se não obedecer… multa!
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