Mulsanne e Turbo R: bem escritos por linhas retas

 

Tradicionais no desenho e no requinte, os sedãs da série SZ
trouxeram à Bentley padrões de desempenho surpreendentes

Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação

 

A Bentley Motors Ltd. foi fundada em agosto de 1919 pelo inglês Walter Owen (W.O.) Bentley, um revendedor de carros da francesa DFP que sempre sonhou em desenhar e construir seus próprios automóveis. As criações de Bentley logo ganharam projeção com as cinco vitórias na prova francesa 24 Horas de Le Mans, conquistadas entre 1924 e 1930, mas a Grande Depressão causada pela queda da bolsa de 1929 colocou a empresa em crise. Em 1931 ela passava às mãos da também britânica Rolls-Royce.

Apesar de ter colocado nas ruas modelos notáveis como a série de cupês Continental das décadas de 1950 e 1960, a Bentley não teve um bom período entre os anos 70 e 80. Quando a Vickers assumiu as operações de automóveis da marca e da Rolls-Royce, em 1980, apenas 5% dos carros fabricados vinham recebendo o emblema do B — situação que chegou a colocar em risco sua própria continuidade. Mas havia algo em desenvolvimento desde 1976, já em vias de ser apresentado, capaz de melhorar esse quadro e recolocar o sobrenome de W.O. em evidência no mercado de carros de luxo.

 

 
Com o Mulsanne, em 1980, a Bentley ganhava sua versão do Rolls-Royce Silver Spirit;
o carro chegava em um momento de retração comercial para a marca britânica

 

Quando o Rolls-Royce Silver Spirit foi lançado, em outubro de 1980, o grupo inglês revelou também sua versão para a Bentley, o primeiro carro da chamada série SZ. O nome Mulsanne remetia ao passado de vitórias da marca em Le Mans: era o mesmo da reta de mais alta velocidade do circuito usado pela corrida francesa. Em seu estilo tradicional, avesso a modismos, predominavam linhas retas na carroceria e em detalhes como a ampla grade dianteira, os faróis e as lanternas. A grade era a principal diferença do Mulsanne para o Silver Spirit. O sedã estava disponível com distância entre eixos de 3,06 ou 3,16 metros, esta lançada sete meses depois e dotada de vidro traseiro menor.

 

O Mulsanne Turbo era o primeiro modelo da marca com superalimentação em mais de meio século desde os clássicos esportivos com compressor

 

No interior, as tradições de sofisticação da marca estavam respeitadas no painel retilíneo revestido em madeira de lei, nos bancos (com ajuste elétrico nos dianteiros) forrados no nobre couro Connolly, nos tapetes espessos e nos detalhes refinados. Atrás do grande volante de aro estreito vinha a alavanca de câmbio, embora houvesse console central entre os bancos individuais; atrás, um apoio de braço separava os privilegiados passageiros, que contavam com apoios de pés removíveis. Revestimento em tecido de poliéster era uma opção ao couro.

O clássico motor V8 de 6,75 litros — “seis e três quartos” em uma denominação habitual — com bloco de alumínio e comando de válvulas no bloco estava equipado com dois carburadores para o mercado europeu, mas recebia injeção Bosch para exportação aos Estados Unidos e ao Japão. Dentro da tradição da Rolls-Royce, sua potência não era divulgada — algumas vezes a empresa a definiu apenas como “suficiente” —, mas se estimam 200 cv.

 

 
Duas versões de distância entre eixos estavam disponíveis para o sedã, dotado de
sofisticado acabamento com couro, madeira de lei e espessos tapetes de lã

 

A caixa de câmbio automática de três marchas era a GM400 fabricada pela General Motors, com tração traseira. A suspensão independente nas quatro rodas usava braços sobrepostos na frente e braços semiarrastados na traseira, com subchassi e um sistema hidráulico posterior para manter a altura de rodagem independente da carga transportada; as rodas de 15 pol tinham pneus 235/70.

 

 

O Mulsanne foi comparado ao Aston Martin Lagonda e ao Maserati Quattroporte pela revista norte-americana Motor Trend em uma matéria de 2006. “O Bentley é de longe o mais tradicional dos três, de seu desenho icônico ao aconchegante interior todo revestido com couro Connolly, tapetes de lã Wilton e madeira de lei. Como o Silver Spirit, ele se comporta como alguém esperaria de um carro feito ‘por designação de Sua Majestade Elizabeth II'”.

E como ele se comportava? “Cada polegada do Bentley é sólida. As dobradiças das portas parecem fortes o bastante para sustentar a Tower Bridge [sobre o rio Tâmisa, em Londres]. A atmosfera é silenciosa, o banco traseiro é um trono imperial para se ver sobre o resto do mundo motorizado, com formas perfeitas. Todos os sinais vindos do chassi são abafados, silenciados e filtrados. Tudo é quieto, sereno e livre de contrações musculares até na torre de comando”.

 


A grade dianteira era uma das poucas diferenças entre o Bentley e o Rolls; atrás dela,

o clássico motor V8 de “seis litros e três quartos” garantia torque e suavidade

 

O perfil menos formal da Bentley — talvez se pudesse falar em mais esportivo — em comparação à Rolls-Royce foi decisivo para que o Mulsanne recebesse uma versão mais potente no Salão de Genebra de 1982. Sem recursos financeiros para desenvolver um novo motor, o grupo optou pela solução do turbocompressor, que vinha se tornando frequente em diversas marcas.

O Mulsanne Turbo usava o tradicional V8 de 6,75 litros com turbo Garret e carburador de corpo quádruplo (como o do Rolls-Royce Corniche), sendo o primeiro modelo da marca com superalimentação em mais de meio século desde os clássicos esportivos com compressor. Usar injeção eletrônica teria sido uma boa solução, mas acarretaria custos que o fabricante não podia bancar. Uma recirculação automática do ar comprimido, quando o acelerador fosse fechado, levava a pressão de ar de volta à entrada do compressor. A medida evitava que a pressão de superalimentação se perdesse a cada vez que o motorista deixasse de acelerar, o que exigiria alguns instantes para o turbo “encher” outra vez (retardo de atuação do turbo, o chamado turbo lag). Na Alemanha eram divulgados a potência de 298 cv, cerca de 50% acima do motor básico, e o torque de 62,2 m.kgf.

Próxima parte

 

Os especiais

Alguns de bom gosto, outros um tanto questionáveis, diversos Bentleys personalizados foram feitos com base nos sedãs deste artigo.

A construtora de carros especiais Jankel fez dois modelos de peruas. A Val d’Isere baseava-se nos sedãs de entre-eixos curto ou longo, que recebiam traseira encurtada. Já a Provence tinha a traseira ainda mais longa que a dos carros de origem, para oferecer mais espaço para bagagem. Ambas podiam ter tração integral — as rodas dianteiras recebiam torque apenas até 48 km/h, sendo desengatadas acima dessa velocidade. Como a definição do acabamento interno ficava a cargo do cliente, aberrações como o interior em amarelo e magenta da foto tornavam-se possíveis.

A encarroçadora Hooper criou o Empress II,baseado no Turbo R. O quatro-portas era transformado em um cupê com carroceria de alumínio mais baixa e frente inclinada, além de itens como teto solar oval e bocais de abastecimento de combustível em ambos os lados. O interior ganhava bancos individuais ajustáveis, também na traseira, e requintes como televisor, sistema de áudio Alpine e um gabinete com taças de cristal.

O Mentley Insanne (abaixo) é um Mulsanne Turbo 1983 modificado em 2002 que teve toda a carroceria refeita. Faróis de Range Rover, teto envidraçado e rebaixado em 7,6 cm, saídas de ar nos para-lamas e rodas esportivas de 20 pol garantem que o clássico sedã deixe sua fleuma britânica longe, bem longe no passado.

O carro vermelho parece um caso de personalização numa periferia brasileira qualquer? Talvez, mas é o Mulsanne que a dupla Bernie e Leepu — o mecânico Bernie Fineman e o encarroçador Nizamuddin “Leepu” Awlia — mandou modificar para marcar o fim da série Chop Shop: London Garage no canal Discovery Channel. As alterações da carroceria, feitas em aço, pretendiam lembrar um sanduíche de bacon — o mais tradicional lanche inglês —, mas é difícil encontrar alguma semelhança além da cor… O carro recebeu para-lamas exagerados, seis faróis e rodas esportivas enormes e foi usado em uma promoção da rádio Virgin.

Um Turbo R tornou-se conversível, mantendo as quatro portas, pelas mãos do encarroçador italiano Salvatore Diomante e sua empresa Autocostruzione SD, de Turim. Denominado Torpedo, o modelo amarelo estava longe de ser harmonioso nas formas, com a capota acondicionada atrás do banco traseiro, mas o que vale é o prazer de acelerar o potente V8 a céu aberto, sem abrir mão do conforto.

 

Nas telas

Automóveis caros com os da Bentley não são para filmes de qualquer orçamento, mas sempre agregam muito em imagem de requinte aos personagens, o que explica o razoável número de aparições dos modelos desta série no cinema.

O Mulsanne de 1980 pode ser visto na comédia Stella Street (2004), enquanto uma versão Turbo está no filme policial Essex Boys (2000). O primeiro Brooklands, de 1993, tem presenças nas comédias Sabrina (1995) e Ellis in Glamourland (2004), esta holandesa. Um carro mais recente (1996) do mesmo modelo está no policial Fique Rico ou Morra Tentando (Get Rich or Die Tryin’, 2005). Enfim, aparições do Turbo R inicial de 1988 estão no filme policial Efeito Zero (Zero Effect, 1998) e na ação Tiros na Escuridão (Do Not Disturb, 1999). Uma versão de 1996 pode ser notada na comédia Três é Demais (Rushmore, 1998).

Próxima parte

 

 

 
Similar na aparência ao Mulsanne, o Turbo R resolvia seus problemas de estabilidade
com uma suspensão recalibrada, pneus mais largos e direção menos assistida

 

O Mulsanne Turbo, primeiro carro exclusivo da Bentley na combinação de carroceria e chassi — e não compartilhado com a Rolls-Royce — desde o Continental R de 1952, diferenciava-se pouco da versão básica na aparência: recebia apenas grade dianteira com moldura na cor da carroceria, rodas de alumínio, dupla saída de escapamento no lado direito e os logotipos Turbo. Até a medida dos pneus era a mesma, embora eles ganhassem código de velocidade mais alto (V). No interior, a distinção fazia-se pela palavra Turbo no painel, que nem mesmo nessa versão trazia conta-giros. O carro não chegou a ser homologado para venda nos EUA.

No teste da revista inglesa Autocar, seu desempenho cativou: “É um deleite maravilhoso sentir um carro tão grande empurrar-se para frente como o Bentley Turbo faz. Há um surto perceptível quando o turbocompressor realmente começa a girar, mas sem qualquer violência; o carro apenas acelera e acelera, com uma progressão acompanhada pelas trocas de marcha virtualmente imperceptíveis da caixa GM. Este é um automóvel muito rápido, em especial considerando-se seu porte e peso”.

A revista elogiou também o nível de ruído (“um típico som de V8, nunca incômodo e não tão mais alto que no carro sem turbo”) e o requinte do interior “espaçoso e bem-acabado”. Ele acelerava de 0 a 96 km/h em 7 segundos, mais rápido que o Ferrari 365 GT, o Mercedes-Benz 500 SE, o Maserati Kyalami, o Daimler Double Six SE e o Aston Martin Lagonda, mas tinha a velocidade máxima mais baixa, por haver limitador a 217 km/h. Em preço, porém, só o Aston se aproximava do Bentley, que custava três vezes o valor do Daimler e mais que o dobro do Mercedes ou do Maserati.

Mesmo fabricantes tão nobres quanto a Bentley às vezes buscam um segmento mais acessível. Em 1984 a marca inglesa apresentava o Eight — uma versão simplificada, por assim dizer, do Mulsanne para obter menor preço. Além das diferenças de acabamento interno, como a eliminação dos espelhos de cortesia nas colunas traseiras, o Eight tinha grade dianteira em tela e suspensão um pouco mais firme e não dispunha da versão mais longa entre os eixos, o que sugeria um Bentley algo mais esportivo. De início restrito ao mercado do Reino Unido, ele foi bem aceito a ponto de motivar a empresa a vendê-lo também na Europa continental e nos EUA.

 

 
Sem abrir mão do requinte e do conforto de um Bentley, o Turbo R conquistou novos
admiradores para a marca; era mais rápido para acelerar que os concorrentes

 

Turbo R, com R de… aderência

Embora o Mulsanne Turbo oferecesse doses generosas de desempenho associadas ao conforto tradicional desses britânicos, havia críticas ao comportamento da suspensão. No livro Bentley Since 1965, James Taylor descreve: “Lá estava o problema do carro. Não havia dúvida de que sua dinâmica desapontava. Molas e amortecedores eram inalterados do Mulsanne básico, com o resultado de que o carro flutuava. Os pneus Avon Turbospeed podia lidar com o grande peso do carro a até 217 km/h, mas sua aderência era menor do que motoristas entusiastas poderiam desejar”.

 

Para honrar a tradição da Bentley, a suspensão foi recalibrada com o objetivo de aumentar a resistência à inclinação da carroceria em 50%

 

A solução foi desenvolver um sucessor mais voltado à esportividade. Esse automóvel aparecia no Salão de Genebra de 1985 com o nome Turbo R — o significado da letra nunca foi confirmado, mas um executivo da empresa a atribuiu a roadholding, ou aderência à estrada, o que faz sentido. Esse sedã nasceu em uma época de mudanças na Rolls-Royce. O responsável pelo carro foi Mike Dunn, novo engenheiro chefe do grupo, que fora diretor de engenharia de chassi e trem de força na Ford europeia.

Dunn decidiu que, para honrar a tradição da Bentley, a suspensão do Mulsanne Turbo — praticamente a mesma do pacato Silver Spirit — deveria ser toda recalibrada, tendo como objetivo aumentar a resistência à inclinação da carroceria em nada menos que 50%. O resultado foi o emprego de amortecedores mais firmes, estabilizadores mais espessos e uma barra Panhard acrescentada ao eixo traseiro. A assistência de direção era reduzida à metade para a sensação de um carro mais “à mão”. Com rodas e pneus (255/65 R 15) mais largos, o conjunto mudou por inteiro o padrão de rodagem em relação ao do Mulsanne. Pela primeira vez em décadas, um Bentley gostava de fazer curvas.

 

 
Mostrado com os faróis circulares adotados em 1989, o Turbo R passou por evoluções
discretas com o tempo, como injeção, caixa de quatro marchas e aumento de velocidade

 

O Turbo R posicionava-se na linha de quatro modelos da marca entre o Mulsanne básico (similar ao Silver Spirit) e o Continental (equivalente ao Corniche da RR). Seu motor era o mesmo do Mulsanne Turbo, mas a tomada de ar e o defletor sob o para-choque dianteiro, somados às rodas diferenciadas, traziam um leve toque esportivo ao carro ainda conservador. Entre os opcionais estavam teto revestido de vinil Everflex, mesas de piquenique — de madeira, claro — atrás dos encostos dianteiros, minigeladeira no porta-malas e porta-bebidas no console. Apesar da intenção de manter as duas opções em paralelo, a adesão dos compradores à novidade fez com que o Mulsanne Turbo saísse de produção em poucos meses.

 

 

A revista Automobile dos EUA definiu em 2009 o que o Turbo R representou a seu tempo: “Ele não foi o primeiro Bentley com turbo, mas foi o mais bem-sucedido. Embora haja modelos mais rápidos e refinados na marca depois dele, poucos tiveram tanto caráter. Os números contam: 96 km/h chegavam em 6,7 segundos — quase a aceleração de um supercarro da época. Quase todo o torque de trovão do V8 estava disponível desde a marcha-lenta. Mais importante era o fato de que o Turbo R parecia um verdadeiro Bentley. Diante de seu volante, a mística da marca começava a fazer sentido. Era um carro com o poder de converter pagãos, e sinalizou o início do retorno da Bentley”.

Comparado ao Mercedes-Benz 500 SEL pela revista inglesa Motor, o Turbo R foi mais rápido em acelerações e retomadas de velocidade, como ao passar de 0 a 96 km/h nos citados 6,7 segundos contra 8,1 s do alemão. “Dinamicamente, a questão é facilmente resolvida. Mesmo sem freios ABS, o Bentley vence por uma reta de Mulsanne. O desempenho é sensacional, a estabilidade excelente, o comportamento está ao nível do Mercedes. O que realmente lhe falta é um refinamento de topo de classe, em especial na suspensão. Então, você tem o Bentley para o prazer do motorista e o Mercedes pelo conforto”, concluiu a revista.

 

 
A imprensa aprovou as modificações que resultaram no Turbo R, elogiado como
um carro de luxo com tradição, forte identidade e comportamento esportivo

 

O modelo 1987 trazia como novidades injeção eletrônica, os esperados freios com sistema antitravamento (ABS) de série e a remoção do limitador de velocidade a 217 km/h. Na Alemanha a empresa agora anunciava 328 cv, aumento de 30 cv sobre o antigo motor com carburador. O teste da Autocar apontou 0-96 km/h no mesmo patamar de antes (7 segundos), tendo a maior potência sido compensada pela relação final 15% mais longa. Mesmo assim, o Turbo R foi elogiado: “Não há indício de retardo do turbo. O motor exibe uma silenciada, mas sincera, pulsação reminiscente dos ‘carros musculosos’ norte-americanos de uma geração atrás. Mas há tanta potência à mão a, digamos, 190 km/h — que representam apenas 3.400 rpm — que cruzar estradas é tão relaxante quanto poderia ser”.

Em um sentido amplo, a concorrência era formada pelo Bristol Brigand Turbo, o Ferrari 412, o Mercedes-Benz 560 SEL, o Porsche 928 S4 e os já conhecidos Lagonda e Double Six. Em aceleração o Bentley perdia apenas para o Bristol (o mais rápido) e o Porsche. A conclusão da revista foi: “Carros tão competentes quanto ele podem ser comprados por metade do preço, mas dirigir um automóvel desse confere benefícios, sobretudo na forma como se é tratado ao chegar”.

Próxima parte

 

Nas pistas

Para quem imagina que a tradição da Bentley nas competições ficou no passado — embora fosse retomada nos anos 2000 com o retorno a Le Mans, incluindo uma vitória em 2003 —, a versão de corridas do Turbo R pode ser uma surpresa. O modelo 1990 das fotos foi modificado pela Phantom Motors, de Crondall, Surrey, para ser pilotado pelos irmãos Simon e Stuart Worthington. Outras poucas unidades teriam seguido o mesmo caminho.

O motor V8 de 6,75 litros com dois turbos fornecia potência declarada de 530 cv, transmitida a uma caixa manual sequencial com comando no console. Molas e amortecedores bem mais firmes, freios Alcon e redução de peso da ordem de 500 kg contribuíam para o comportamento dinâmico, enquanto o interior ganhava bancos do tipo concha, novo volante, mais instrumentos e uma estrutura para proteção em capotamento. O Turbo R das fotos obteve uma vitória em Silverstone, em 2004, e participou de provas para carros antigos do encontro anual do Bentley Drivers Club.

 

Para ler

Bentley Since 1965 – por James Taylor, editora Crowood. O livro de 2012, com 192 páginas, cobre os bons e maus momentos por que a marca inglesa passou nas últimas décadas, da série T dos anos 60 à recente linha Continental. Tem informações técnicas, dados sobre edições especiais e a atuação nas pistas.

Bentley: A Legend Reborn – por Graham Robson, editora Haynes. Publicada em 2010, a obra de 184 páginas abrange toda a história da empresa desde 1921 até a atual fase sob o guarda-chuva do grupo Volkswagen.

Rolls-Royce and Bentley: The Crewe Years – por Martin Bennett, editora Haynes. A fase em que as empresas produziram carros na cidade de Crewe é abordada em um grande livro de 480 páginas, cuja terceira edição foi lançada em 2012. O autor edita publicações sobre Rolls e Bentley na Austrália.

The Rolls Royce Motor Car – And the Bentley Since 1931 – por Brendan James, Anthony Bird e Ian Hallows, editora Batsford. Mais antigo (2003), o livro de 432 páginas já está na sexta edição. Propõe-se a trazer dados detalhados de cada modelo, desde o primeiro Rolls de 1904 e do Bentley de 1931 até o período recente.

Rolls-Royce and Bentley: Classic Elegance – por Paul W. Cockerham, editora New Line Books. Duas das marcas mais renomadas em carros de luxo estão em um pequeno livro de 80 páginas, publicado em 2005.

Próxima parte

 

 

 
Embora o hábito da marca fosse omitir a potência dos motores, na Alemanha era ela
informada; lá o Turbo R surgiu com 298 cv e passou a 355 cv com as evoluções de 1994

 

Outra revista, a Car, colocou o Turbo R diante de BMW 750iL, Jaguar Sovereign V12 e o 560 SEL. “O Bentley é o mais aristocrático do grupo, tem verdadeira presença na estrada. O interior é maravilhoso para alguns, embora o arranjo impensado dos comandos possa incomodar. Não é particularmente espaçoso para um carro com cerca de 5,20 metros de comprimento. O comportamento é surpreendente, com direção precisa. O grande motor V8 turbo fornece um surto massivo, com excelente resposta ao acelerador. É o carro mais rápido para acelerar até 96 km/h. Apesar de sua aerodinâmica, é muito silencioso em alta velocidade”, analisou a publicação.

E qual deles era o melhor? “Parece que é o BMW, o mais veloz, de melhor comportamento e mais equipado do grupo, mas falta ao V12 um empurrão em média rotação. O Mercedes simplesmente não tem apelo suficiente ao motorista, o que deixa o Bentley e o Jaguar. Os britânicos oferecem algo crucial para muitos entusiastas e que o carro de Munique praticamente não tem: caráter — uma identidade única, distinta e a habilidade de fazer de cada viagem uma ocasião desfrutável”.

 

De volta à América

Apesar da importância do Turbo R como carro de imagem e como diferenciação da marca para a Rolls-Royce, a Bentley não esqueceu o Mulsanne e sua versão simplificada, o Eight. O carburador tornava-se passado em seu modelo 1987, que adotava injeção também para o mercado europeu, passando a 238 cv, e recebia freios ABS como padrão. Surgia no mesmo ano a versão S, dotada de calibração mais firme para a suspensão, rodas de alumínio — usadas pela primeira vez no modelo — e detalhes internos cedidos pelo Turbo R. Uma pequena parcela desses Mulsannes foi produzida com o entre-eixos 10 cm mais longo.

 

 
O Mulsanne 1987 adotava a injeção em definitivo e lançava a versão S; também com
um nome das pistas, o Brooklands substituía o Eight 
e o Mulsanne em 1992

 

Em novembro daquele ano a Bentley era relançada nos EUA como marca independente: até então seus carros estavam disponíveis apenas sob encomenda nas concessionárias da Rolls-Royce —  uma grande limitação para a empresa, já que a RR tinha no norte-americano seu principal mercado. O uso de injeção em toda a linha foi fundamental para isso, pois agora os motores atendiam aos limites de emissões poluentes mais severos do país de Tio Sam.

 

A série especial RT Mulliner trazia motor com 420 cv, para-choques mais arredondados, rodas de 18 pol com pneus 255/55 e bitolas mais largas

 

A limitação de velocidade deixava de existir para os modelos em 1989, o que permitia ao Turbo R alcançar 235 km/h. Faróis circulares duplos substituíam as unidades simples e retangulares, criando uma identificação mais clara em relação aos similares da Rolls, e os carros vendidos nos EUA traziam bolsas infláveis frontais. Para 1990 a central eletrônica do Turbo R integrava injeção e ignição, sem alterar a potência, e todos os modelos recebiam controle eletrônico dos amortecedores com três modos de uso, do mais macio ao esportivo. Dois anos após, a caixa automática desse modelo dava lugar a uma de quatro marchas com controle eletrônico, também fornecida pela GM, dotada de três programas de funcionamento — econômico, esportivo e de inverno, para pisos de baixa aderência.

Em setembro do mesmo 1992 o Mulsanne e o Eight cediam lugar ao Brooklands, praticamente o mesmo carro com conotação mais esportiva e o nome do circuito inglês no qual a Bentley quebrou recordes de velocidade na década de 1930. Entre as alterações estavam painel e console atualizados e alavanca de câmbio no console, mudança extensiva ao Turbo R. As duas versões de entre-eixos eram mantidas. Em 1993 o Turbo R recebia pneus 255/60 R 16.

 

 
O Turbo RT levava a 400 cv a potência do motor V8; oferecido apenas com o
entre-eixos longo, trazia a grade dianteira em tela e novos para-choques 

 

Uma evolução do Turbo R era apresentada em 1994, com novidades como tomadas de ar sob o para-choque dianteiro e rodas de 17 pol com pneus 255/55. A potência aumentava para 355 cv, elevando a velocidade máxima para 250 km/h. Outra novidade do ano era o Turbo S, voltado a alguns mercados europeus, asiáticos e do Oriente Médio, com alterações no resfriador de ar, no sistema de admissão e na central eletrônica para potência superior, estimada em 430 cv. Um diferencial autobloqueante era aplicado. Só 60 desses carros, capazes de fazer o 0-96 em 5,8 segundos, saíram da fábrica entre 1994 e 1995.

Mais tarde, em 1996, o Brooklands R buscava um tempero mais esportivo para o sedã ao usar um turbo de baixa pressão no motor V8, que ficava com 300 cv e o levava à máxima de 225 km/h. Rodas e pneus tinham as medidas do Turbo R e o entre-eixos longo ainda estava disponível. Parte desses carros saiu com especificação Mulliner, que permitia personalizar o interior conforme as preferências do cliente.

Na linha Turbo R, a novidade era a série Sport, limitada a 30 exemplares, com conteúdos que acrescentavam tecnologia ao sedã de linhas tradicionais. Tração e suspensão contavam com controle eletrônico, o painel trazia um navegador por GPS e os freios estavam mais potentes. No acabamento interno, um padrão de fibra de carbono era alternativa à clássica madeira. Toda a linha ganhava janelas dianteiras sem quebra-ventos e tinha os retrovisores reposicionados.

 

 
Se o RT não fosse exclusivo o bastante, havia a alternativa da série Mulliner, de 1998,
com motor de 420 cv, rodas de 18 pol e acabamento interno ao gosto do cliente

 

Uma nova fase com a denominação Turbo RT vinha em 1998. As alterações visuais, sempre sutis, passavam por grade dianteira em forma de tela, para-choques redesenhados e pintados na cor da carroceria e rodas de cinco raios. O motor V8 ganhava potência e torque, passando a 400 cv e 81,6 m.kgf com as mesmas evoluções aplicadas ao cupê Continental T, o que se traduzia em aceleração de 0 a 96 em 6 segundos (a máxima mantinha-se em 250 km/h). Oferecido apenas com o entre-eixos longo, o RT ganhou ainda uma edição limitada que acentuou seu caráter de exclusividade: a Mulliner.

 

 

Disponível só no modelo 1998, a série trazia motor com 420 cv e 87,7 m.kgf, aumento obtido por um novo turbo e alterações na admissão, e diferenças externas como para-choques mais arredondados, faróis de neblina, para-lamas alargados, rodas de 18 pol com pneus 255/55 e bitolas também mais largas. O interior vinha com acabamento ao gosto do comprador, que podia optar ainda por um velocímetro para os passageiros do banco traseiro e vidro traseiro menor. Foram feitas 56 unidades do Mulliner, sendo 49 com o maior entre-eixos. Outra edição especial do RT, de apenas quatro exemplares, foi a Olympian. Feita sob encomenda para o concessionário Jack Barclay de Londres, vinha com rodas esportivas e vidro traseiro menor.

O Brooklands deixava o mercado em 1998, abrindo caminho para o Arnage que, por decisão da nova proprietária da marca — a Vickers —, usaria motor BMW V8 em vez do clássico 6,75-litros. O Turbo RT ficou em produção por mais um ano. A linhagem SZ da Bentley mostrou a que veio: com 10.078 unidades produzidas com entre-eixos normal e 1.832 com o longo, a marca passou da ínfima participação de 5% para 80%, deixando a Rolls-Royce em segundo plano. Mais que isso, fez do Turbo R um carro desejado até mesmo pelos que nunca se haviam imaginado ao volante dos aristocráticos sedãs britânicos.

 

Mulsanne e Brooklands, de volta

Vez em outra, sobretudo em marcas de longa tradição como a Bentley, nomes de modelos do passado retornam ao mercado em novos produtos. É o que aconteceu com dois dos automóveis da série SZ. O primeiro foi o Brooklands, que renasceu em 2007 como um cupê de luxo derivado do sedã Arnage. De linhas conservadoras, usava um motor V8 de 6,75 litros como nos velhos tempos, só que com técnicas modernas, turbo e 530 cv. Dois anos depois, enquanto o Brooklands saía de produção, ressurgia o Mulsanne como sucessor do Arnage, com direito a uma versão Mulliner três anos mais tarde. Nele o V8 de 6,75 litros fornecia 505 cv.

 

Ficha técnica

Mulsanne (1981)

Turbo R (1985)

Turbo RT (1997)

MOTOR
Posição e cilindros longitudinal, 8 em V
Comando e válvulas por cilindro no bloco, 2
Diâmetro e curso 104,1 x 99,1 mm
Cilindrada 6.750 cm³
Taxa de compressão 8:1
Potência máxima 198 cv a 4.000 rpm 328 cv a 4.000 rpm 420 cv a 4.000 rpm
Torque máximo ND 89,9 m.kgf a 2.100 rpm
Alimentação 2 carburadores injeção multiponto, turbocompressor, resfriador de ar
TRANSMISSÃO
Tipo de câmbio e marchas automático, 3 automático, 4
Tração traseira
FREIOS
Dianteiros a disco ventilado
Traseiros a disco
Antitravamento (ABS) não sim
SUSPENSÃO
Dianteira independente, braços sobrepostos
Traseira independente, braço semiarrastado
RODAS
Pneus 235/70 R 15 255/65 R 15 255/55 R 17
DIMENSÕES
Comprimento 5,31 m 5,29 m 5,39 m
Entre-eixos 3,06 m 3,16 m
Peso 2.245 kg 2.390 kg 2.470 kg
DESEMPENHO
Velocidade máxima 185 km/h 225 km/h 242 km/h
Aceleração de 0 a 96 km/h 10,5 s 7,0 s 6,0 s
Dados do fabricante; ND = não disponível

 

 

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