Se os freios a disco vieram como evolução para os automóveis, por que ainda vemos freios a tambor em diversos carros? O que chama mais atenção é seu uso em picapes médias como Hilux, S10, etc., sendo que são veículos de preço alto.
Francisco de Oliveira – São Paulo, SP
O freio a disco realmente foi uma evolução nos automóveis, mas nem tudo é apenas vantagem. Na verdade, o freio a tambor detém certos benefícios difíceis de serem superados.
Em qualquer veículo, o tamanho do sistema de freios — o diâmetro do disco ou tambor — é limitado pelo vão interno das rodas. Aliás, um dos principais motivos para o aumento dos aros de rodas, além da estética, foi a necessidade de freios maiores pelo crescimento da potência e da velocidade máxima dos veículos. Basta lembrarmos que um carro compacto com motor de 1,6 litro nos anos 80 tinha potência por volta de 80 cv e aerodinâmica de “caixa de sapato”, o que resultava em velocidade máxima na faixa de 160 km/h. Hoje, um carro do mesmo segmento tem 120 a 130 cv e pode chegar a 180 ou 190 km/h.
Aumentar a velocidade está atrelado às leis da Física, como a famosa equação da energia cinética (Ec = mv²/2), em que Ec = energia cinética, m = massa (kg) e v = velocidade (m/s). A velocidade está elevada ao quadrado, ou seja, se dobrarmos a velocidade a energia cinética será quatro vezes maior. Na vida real, se um veículo hipotético precisa de 28 metros para frear de 80 a 0 km/h, precisará de 112 m de 160 a 0 km/h, considerando que os freios trabalhem da mesma forma, sem perda de ação pelo aquecimento. Indo mais ao extremo, a 240 km/h o mesmo veículo precisará de 252 m para parar — se os freios continuarem a atuar perfeitamente.
O disco (esquerda) é superior em dissipação de calor e tempo de resposta; mais barato, o tambor tem maior área de atrito e serve bem a veículos de carga
O problema é que os freios convertem energia cinética em calor por meio do atrito. Foi aí que os freios a disco se encaixaram como uma luva aos automóveis de passeio, pois o grande problema de um sistema de freios é dissipar o calor acumulado durante a frenagem — sobretudo em frenagens fortes e consecutivas. Nesse aspecto, por estar exposto ao ar, com ranhuras e fendas (no caso do ventilado, mais comum hoje), o freio a disco consegue dissipar o calor para o ar ambiente de forma muito mais rápida e eficiente que o tambor.
Essa dissipação evita que o freio sofra perda acentuada de ação por superaquecimento, quando a temperatura do fluido de freio chega ao ponto de ebulição. Como vapor é compressível, isso torna o freio muito menos eficiente por não transferir a pressão de frenagem devida às pinças. Há também uma temperatura máxima para as pastilhas, acima da qual elas perdem boa parte de seu coeficiente de atrito, diminuindo sua capacidade de frenagem. Outra vantagem do disco é o tempo de resposta: ao se liberar o pedal de freio, apenas se alivia a pressão das pastilhas ao disco. O que faz as pinças — e em consequência as pastilhas — se afastarem do disco é a própria oscilação lateral do disco.
Por outro lado, freios a tambor têm área de contato do material de atrito muito maior que discos, o que lhes permite gerar torque de frenagem muito mais alto. É por isso que ainda se adotam tambores em veículos comerciais e de carga no eixo traseiro. A atuação do freio traseiro em frenagem de emergência, em uma picape com carga máxima, é maior que a do freio dianteiro por conta do peso. Em caminhões, nem se precisa falar.
Outra vantagem do tambor é a simplicidade para integração do freio de emergência e estacionamento, algo um tanto complicado em freios a disco, pois se precisa de mecanismo complexo. Muitas vezes recorre-se a uma pinça separada ou mesmo a um freio a tambor interno no cubo só para essa função. Ou seja, é um sistema muito menos oneroso no caso do tambor.
Em automóveis de menor potência, o freio a tambor traseiro é escolhido tanto pelo fator custo quanto pela pouca atuação desses freios. Um hatch pequeno, por exemplo, tem torque de frenagem de 10% ou pouco mais no eixo traseiro numa emergência, ocasião em que o peso se desloca para frente. O valor passa à casa dos 20% em sedãs médios. Até certo ponto se poderia considerar o freio traseiro desprezível, mas ele é muito importante para o controle direcional do veículo em frenagem de emergência.
Sem freio traseiro, o veículo tende a ziguezaguear numa frenagem forte, pois do ponto de vista técnico o centro de gravidade tenta passar o eixo dianteiro o tempo todo durante a frenagem. Didaticamente, pense que você está segurando a ponta de um cabo de vassoura (sua mão seria o centro de gravidade) e que a outra ponta (o freio) está apoiada no chão. Se você empurrar o cabo pelo chão, qualquer desnível no solo fará com que o cabo saia de seu controle, o que não ocorreria se você o puxasse. No caso dos freios, o dianteiro atua como a mão ao empurrar o cabo, ao passo que o traseiro é como se fosse puxado, trazendo estabilidade para o sistema. Desde que não cause o travamento desse eixo, o que faria perder as forças direcionais e o controle do veículo.
Com valores tão baixos de atuação dos freios traseiros, pode-se chegar à conclusão de que, caso haja perda de ação nos freios, será ocasionada nos dianteiros e não nos traseiros. Então, por que adotar freios a disco na traseira em carros? O motivo é o tempo de resposta: como as sapatas estão afastadas do tambor por molas, há certo retardo nesse sistema até que o fluido de freio as movimente e aplique a pressão necessária. Em um hatch pequeno, essa diferença representa algo em torno de 2 m na distância total de frenagem a 80 km/h. Portanto, o disco traz maior segurança — não pela capacidade de frenagem, mas pela resposta.
Texto: Felipe Hoffmann – Fotos: divulgação