As novidades do
Salão de Genebra, como
acontece todo ano a esta época, tomaram conta da seção de notícias
do Best Cars e de outras mídias especializadas. E chamou
atenção uma tendência que vem ganhando força: a difusão do
turbocompressor no mercado europeu,
de forma cada vez mais generalizada e em modelos mais acessíveis.
Quanto o turbo apareceu na Europa na primeira metade da década de
1970, por meio do BMW 2002 e
logo após no Porsche 911, o que
se viam eram motores de alto desempenho, mas pouco adequados ao uso
em rua. Ganhava-se potência em alta rotação, depois da entrada em
ação do sistema, mas se perdia em baixa pela menor
taxa de compressão, além da
dificuldade em acertar o funcionamento do motor com os sistemas de
alimentação da época (injeções primitivas e carburadores). O
fenômeno chamado turbo lag, hesitação do turbo, ficou por muito
tempo associado a esse tipo de superalimentação.
Foram os suecos da Saab, com o modelo 99
ainda naquela década, que começaram a aplicar o turbo como ele é
usado hoje: para ganho mais homogêneo de potência, em que se nota o
benefício sobre o motor similar de
aspiração natural desde as baixas rotações, sem sobressaltos. O
rápido desenvolvimento da eletrônica, desde então, mudou por inteiro
o resultado da instalação de turbo pelos fabricantes. Há inúmeros
motores hoje, em diferentes cilindradas, que obtêm o torque máximo
abaixo de 2.000 rpm e o mantêm constante por uma larga faixa de
operação. Em muitos casos o turbo lag está eliminado em definitivo.
Daquelas marcas pioneiras, a Porsche nunca abandonou o turbo no 911,
nem a Saab — e a compatriota Volvo, que a seguiu anos depois — em
seus automóveis de passeio. Já a BMW, após nova tentativa com uma
versão do sedã Série 7 nos
anos 80, pôs o sistema no esquecimento (à parte motores a diesel, em
que a aspiração natural não permite muito rendimento) até pouco
tempo atrás, quando apresentou o brilhante 335i. O seis-cilindros de
3,0 litros e dois turbos entrega 306 cv — mais que o V8 aspirado de
4,0 litros usado oito anos atrás — e torque constante de 40,8 m.kgf
de 1.300 a 5.000 rpm.
O que começou em carros sofisticados vem sendo trazido, pouco a
pouco, aos mais acessíveis. A principal razão é a guerra contra o
CO2, o dióxido de carbono que se acredita ser um dos grandes
causadores do efeito estufa que está aquecendo a Terra. Por isso,
exige-se eficiência cada vez maior na queima da mistura
ar-combustível. Como um motor turbo obtém desempenho similar ao de
um aspirado de cilindrada 30% a 40% maior, em média, os fabricantes
o procuram para reduzir peso e atrito, mesmo que a custo mais alto.
A Volkswagen alemã já associa turbo e
compressor em um motor de 1,4 litro, que desenvolve potência e
torque compatíveis com os de um seis-cilindros aspirado de 2,5
litros com clara vantagem em consumo e peso.
Também da VW, o utilitário compacto Tiguan nem oferece motores de
aspiração natural: os três movidos a gasolina são turbo. O mesmo se
aplica ao Lancia Delta e ao Volvo XC 60, que saem em Genebra,
enquanto a Fiat aderiu ao sistema no 1,4-litro usado por Bravo,
Grande Punto e agora o 500 Abarth. No segmento de hatches esportivos
pequenos, aliás, o turbo já é bastante comum: Opel Corsa OPC,
Peugeot 207 RC/GTI, Mini Cooper S, VW Polo GTI e Seat Ibiza Cupra
são alguns que o utilizam para chegar perto dos 200 cv com 1,6 a 1,8
litro.
No Brasil
Enquanto essa revolução técnica acontece na Europa, por aqui —
apesar de a maioria de nossos carros ter projeto europeu — o turbo
sempre teve participação discreta. A única tentativa de usá-lo em um
modelo acessível e sem pretensões esportivas foi a de Gol e Parati
Turbo de 1,0 litro, que cativavam pelo desempenho, mas tiveram
problemas crônicos com a polia do
variador de tempo do comando (VVT). Isso levou à rejeição pelo
mercado, embora o defeito não tivesse relação com a
superalimentação.
De resto, o caro Golf GTI é hoje o único automóvel nacional com
turbo. A Fiat não fez sucessores para Uno, Tempra (os pioneiros no
Brasil, em 1994) e Marea com o recurso e o Audi A3 não é mais
fabricado aqui. A ironia é que a General Motors produz em São José
dos Campos, SP o motor de 2,0 litros turboalimentado para equipar
modelos da Opel, mas não o usa no mercado interno.
Estamos à margem de um progresso em motores que teria, aqui, uma
aplicação ainda pouco explorada na Europa: usar diferentes pressões
conforme o combustível em motores flexíveis. Com as centrais
eletrônicas de hoje, é simples acrescentar a variação da pressão do
turbo ao mapeamento de injeção e ignição, de modo que ela possa ser
mais alta com álcool que com gasolina. A Saab usa tal solução nos
motores flexíveis (entre gasolina e E85
apenas) de 1,8 e 2,0 litros: o primeiro alcança 150 cv com gasolina
e 175 com E85, e o outro, 175 e 200 cv, na ordem.
Qual será o primeiro fabricante a nos recolocar no clube do turbo? |