Versão “aventureira” revela boas qualidades no novo motor e na suspensão, mas com falhas de acabamento
Texto e fotos: Felipe Hoffmann
A cada teste de Um Mês ao Volante, nosso objetivo é variar entre categorias e faixas de preços dos carros, para que a seção seja útil a leitores de diferentes perfis. Dessa vez, porém, abrimos exceção em nome da oportunidade de avaliar um lançamento recente e interessante: o Ford Ka Freestyle, que não deixa de ser concorrente direto do JAC T40 avaliado no período anterior.
Com transmissão automática ele vem em pacote fechado ao preço sugerido de R$ 68 mil, sem custo adicional para a pintura marrom Trancoso da unidade avaliada (as metálicas acrescentam R$ 1.350). Por disponibilidade da marca a versão permanecerá durante 15 dias, após os quais será fornecido outro Ka com caixa manual. Essa limitação, de certa forma, enriquece a seção por abrir a opção de compararmos o comportamento e o consumo de ambas as versões nas mesmas condições de teste.
O Ka Freestyle vem com o novo motor de 1,5 litro e três cilindros, similar ao lançado há um ano no Ecosport, mas agora fabricado em Taubaté, SP (veja vídeo sobre as vantagens dessa proposta). Sua potência impressiona: 128 cv com gasolina e 136 com álcool, valor este próximo ao de motores ao redor de 1,8 litro ou mesmo ao do Nissan de 2,0 litros. A caixa automática de seis marchas é outro recurso inédito no Ka.
Preço de R$ 68 mil inclui boa dotação de conforto e segurança, como seis bolsas infláveis, controle de estabilidade e câmera traseira de manobras
Entre os equipamentos de série destacam-se ajuste de altura do banco do motorista e do volante, alarme volumétrico, ar-condicionado, bancos com couro e tecido, bolsas infláveis frontais, laterais dianteiras e de cortina; câmera traseira de manobras, sensor de estacionamento traseiro, computador de bordo, controle eletrônico de estabilidade e tração, faróis de neblina, fixações Isofix para cadeira infantil, rodas de alumínio de 15 pol e sistema de áudio com tela de 6,5 pol, compatível com Android Auto e Apple Car Play. A garantia de três anos inclui as três primeiras revisões gratuitas.
De maneira geral o Ka Freestyle agrada tanto no visual como no acabamento interno. A carroceria é bem construída, mas não demonstre o capricho de acabamento do Volkswagen Polo Highline TSI (de preço semelhante), com vãos maiores e menos regulares entre capô, para-choque, para-lama dianteiro e coluna dianteira. A tampa traseira chega a passar a impressão de estar sempre mal fechada. Vãos maiores barateiam o processo de produção.
No desenho do pequeno hatch, a Ford Brasil conseguiu alinhar boa aparência com funcionalidade, atendendo às necessidades de um projeto global — o Ka foi desenvolvido aqui e é vendido em mais de 100 países, o que não deixa de trazer boa reputação aos engenheiros locais. Um mercado que o modelo teve de atender foi o indiano, onde se chama Figo e substitui o Fiesta de geração anterior, do qual recebeu o nome. Essa previsão no projeto se reflete no grande espaço interno na altura das cabeças, por causa do uso comum de turbantes a bordo dos carros naquele país.
Vãos de carroceria poderiam ser menores e mais regulares; para-choque traseiro está mais saliente; porta-objetos oculto ao fechar a porta; trava exposta no acesso ao porta-malas
Detalhe curioso é que a tampa traseira termina reta, mas o novo para-choque ficou mais ressaltado: a carroceria poderia ser mais comprida sem afetar o tamanho total do carro. O resultado é um compartimento de bagagem pequeno em volume (257 litros) e comprimento. Além disso, o triângulo vem numa bolsa presa apenas com velcro — inútil nessa versão, que recebe tapete de borracha extra. Outro ponto que mostra a redução de custo é o mecanismo de trava da tampa traseira exposto, que enrosca em alças de malas ou danifica objetos planos. A abertura da tampa é realizada apenas por um botão no painel ou pelo controle remoto da chave — falta uma maçaneta.
O acerto de suspensão agrada para um veículo mais alto, com boa absorção de impactos e controle de movimentos: é uma calibração ao estilo europeu
Por outro lado, o compartimento dispõe de ganchos laterais para pendurar sacolas e rede oferecida como acessório. Interessante notar as “grades” no porta-malas, que têm como função extrair o ar de dentro da cabine pela parte de menor pressão da carroceria — o famoso vácuo na traseira. Além de auxiliar a circulação de ar interna, esses extratores permitem a saída de ar da cabine quando as bolsas infláveis estouram, o que resulta num aumento repentino de pressão interna se não houver para onde o ar sair. Tal pico de pressão, em casos extremos, pode estourar os tímpanos de quem estiver dentro do carro.
O espaço interno agrada, apesar do pequeno comprimento do carro, tanto para o motorista como aos passageiros. A posição de dirigir também é boa, mas falta regulagem do volante em distância. Os bancos de acabamento diferenciado oferecem bom apoio, o painel tem acabamento em tom marrom (combina com a carroceria na cor de nosso carro) e desenho harmonioso, além de um porta-objetos escondido na lateral esquerda que só é acessível ao se abrir a porta. Há vários porta-copos, embora não um apoio central de braço. E o ar-condicionado poderia ser automático em um carro de seu preço.
Bancos com couro e tecido e painel marrom diferenciam o Freestyle, que tem instrumentos simples; ar-condicionado automático seria mais coerente com o preço
O painel simples e fácil de usar carece de mais opções de computador de bordo: há só uma medição, sendo que hodômetro parcial, consumo e velocidade média não zeram juntos. Também incomoda seu controle pelo botão no painel, obrigando o motorista a passar a mão pelo meio do volante. O velocímetro marca praticamente o real, com diferença de 2 a 3 km/h, o que agrada. Os instrumentos usam iluminação automática conforme a claridade ambiente: não se acende durante o dia, mesmo com os faróis ligados. A luz aparece quando o sensor de claridade no painel detecta que ficou escuro, o que o leva a alternar entre aceso e apagado no entardecer e deixa o painel escuro por algum tempo ao passar sob uma ponte de dia. Não seria mais fácil ser ligada aos faróis?
A central de áudio Sync 3 com tela de 6,5 polegadas, novidade no Ka 2019, merece elogios, pois é fácil e intuitiva de usar, tanto o sistema de som como o telefone. Oferece integração a celular por Android Auto e Apple Car Play e grande filtragem de ruídos do carro nas ligações, a ponto de a pessoa do outro lado da linha pensar que se está em uma sala. O sistema possui bom reconhecimento de voz para fazer ligações e uma função importante: liga para um número de emergência cadastrado em caso de acidente, enviando a localização. Pode fazer toda a diferença em casos extremos, como colidir em lugar deserto ou sair da pista e cair num barranco, ficando desacordado. A Ford se vangloria com depoimentos nos Estados Unidos de pessoas que dizem ter sido salvas pelo sistema.
O Ka Freestyle rodou sua primeira semana com gasolina, apenas em trechos urbanos. A primeira sensação é de boa agilidade, com “casamento” eficaz do novo motor com a caixa automática e níveis gerais de ruído e vibração bastante baixos — só os mais atentos notarão alguma peculiaridade dos três cilindros, pois foi eliminada a “oscilação” característica que incomoda em alguns modelos com esse tipo de motor.
Central de áudio Sync 3 é fácil de usar, filtra bem os ruídos na ligação telefônica e permite cadastrar fone de emergência, ao qual ligará em caso de acidente
O acerto de suspensão também agrada para um veículo mais alto — o vão livre do solo é pouco menor que o do Ecosport —, mostrando boa absorção de impactos, ajudada pelos pneus de perfil 60, e controle de movimentos da carroceria. É uma calibração ao estilo europeu, mais eficaz em absorver pequenos e rápidos impactos (como remendos de asfalto) e movimentar menos a carroceria em grandes oscilações, como uma lombada. São as mesmas características notadas no Fiat Argo e no VW Polo avaliados na seção, diferentes das percebidas no Nissan Kicks e no Toyota Corolla, de estilo asiático. Mesmo que muitos gostem da sensação de estar “conectados ao solo”, em trechos mais longos as pequenas vibrações do piso trazem cansaço e desconforto aos ocupantes.
Dos 595 quilômetros rodados na semana em São Paulo, SP, 538 foram contados para consumo com média geral de 13,8 km/l. O melhor consumo foi de 19,8 km/l em 39 km, com 80% do trecho pelas Marginais dos Rios Tietê e Pinheiros e média de 59 km/h, e o pior de 6,3 km/l em apenas 6,7 km de trânsito pesado com média de 18 km/h. Como referência, no trecho-padrão de 70 km com boa parte pelas Marginais, o Polo TSI fez 14,6 km/l com média de 32 km/h, enquanto o Ka fez 13,9 km/l com média de 33 km/h. Ou seja, o novo três-cilindros não ficou longe da eficiência do moderno motor turbo com injeção direta da Volkswagen, ambos com caixa automática e em carros do mesmo segmento.
Como este Ka tem pouco tempo a mais conosco, já passamos a usar álcool, do qual teremos resultados de consumo na próxima semana. Até lá.
Mais Avaliações
Primeira semana
Distância percorrida | 538 km |
Distância em cidade | 538 km |
Distância em rodovia | – |
Consumo médio geral | 13,8 km/l |
Consumo médio em cidade | 13,8 km/l |
Consumo médio em rodovia | – |
Melhor média | 19,8 km/l |
Pior média | 6,3 km/l |
Dados do computador de bordo com gasolina |
Preços
Sem opcionais | R$ 67.990 |
Como avaliado | R$ 67.990 |
Completo | R$ 69.340 |
Preços sugeridos em 27/9/18 |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 3 em linha |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 84 x 90 mm |
Cilindrada | 1.497 cm³ |
Taxa de compressão | 12:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima (gas./álc.) | 128/136 cv a 6.500 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 15,6/16,1 m.kgf a 4.750 rpm |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | automática, 6 |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a tambor |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 6 x 15 pol |
Pneus | 185/60 R 15 |
Dimensões | |
Comprimento | 3,954 m |
Largura | 1,695 m |
Altura | 1,57 m |
Entre-eixos | 2,49 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 52 l |
Compartimento de bagagem | 257 l |
Peso em ordem de marcha | 1.135 kg |
Desempenho e consumo (gas./álc.) | |
Velocidade máxima | ND |
Aceleração de 0 a 100 km/h | ND/11,2 s |
Consumo em cidade | 11,1/7,4 km/l |
Consumo em rodovia | 13,2/9,4 km/l |
Dados do fabricante; consumo conforme padrões do Inmetro; ND = não disponível |