Imagem da marca, preço e problemas técnicos são razões para que diversos automóveis tenham fracassado no mercado
Texto: Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
O que leva um automóvel a encontrar êxito no mercado? Fatores como estilo, confiabilidade mecânica e preço são importantes, mas a fórmula do sucesso é mais complexa. Como saber se o público reagirá a um desenho ousado tão bem quanto as pesquisas de opinião ou uma versão conceitual sugeriram? Como evitar que um problema técnico imprevisto abale a reputação do carro? Como determinar o preço adequado, se o lançamento de um concorrente pode fazer o barato parecer caro da noite para o dia?
Por uma ou outra razão, inúmeros modelos de grandes e pequenas marcas — seja no mercado brasileiro ou em outros países — foram levados ao fracasso. Rejeitados pelo consumidor, ficaram longe das expectativas de vendas de seus fabricantes ou saíram de produção antes do que se pretendia. Casos de descuido no projeto ou de problemas técnicos, de estratégias comerciais ineficazes ou de preço inadequado. Automóveis de marcas populares que tentaram alcançar altos segmentos, carros de marcas de prestígio que buscaram se tornar populares. E muitos outros.
Seria impossível relacionar todos os carros rejeitados do mercado internacional, mas apresentamos aqui, em ordem alfabética, mais de 50 exemplos que ilustram — cada um a seu modo — o que pode dar errado na trajetória de um automóvel; na maioria deles o nome contém atalho para um artigo histórico detalhado. Ficam de fora os muitos modelos importados que não venderam bem aqui, em geral tendo o alto preço como principal fator. Ficamos apenas com os de fabricação local e com os automóveis de trajetória mundial.
Audi A2
Aplicar a tecnologia da carroceria de alumínio — então já empregada pelo topo de linha A8 — em um carro compacto era o objetivo da Audi ao apresentar o A2, em 1999. O hatch de 3,8 metros pesava pouco, a partir de 895 kg, e esbanjava economia de combustível. Mas a sofisticação técnica implicou um preço acima do que o mercado pagaria por um carro de seu porte e, em quase seis anos, 176 mil deles foram vendidos. O Mercedes-Benz Classe A, em comparação, superou um milhão em período pouco maior.
BMW 507
Nos anos 50, Max Hoffman — importador de carros esporte europeus para os Estados Unidos — sugeriu à BMW que elaborasse um roadster com o motor V8 do sedã 502. O 507 era apresentado em 1955 com linhas elegantes, chassi tubular e um V8 de 3,2 litros com potência de 150 cv. Apesar dos atributos, ficou distante do êxito pretendido por Hofmann e pela BMW, com meta de vendas de 5 mil unidades. O preço previsto de US$ 5 mil acabou oscilando entre US$ 9 mil e US$ 10.500. O roadster teve apenas 252 unidades fabricadas em cinco anos e a empresa nunca amortizou os custos de desenvolvimento, o que contribuiu para sua séria crise financeira nos anos 60. O fracasso parece ter sido decisivo para que a BMW levasse 30 anos até arriscar novamente com um conversível de dois lugares, o Z1.
A BMW nunca amortizou os custos de desenvolvimento do roadster 507, o que contribuiu para sua séria crise financeira nos anos 60
BMW Série 8
Como sucessor para os cupês Série 6, produzidos desde 1976, a marca bávara apresentava em 1989 o Série 8. Apesar de luxuoso e potente na versão 850i, que tinha motor V12 de 300 cv, o carro não emplacou, fosse pelo estilo controverso, fosse pelo exagero em tamanho e peso (1,8 tonelada) para uma marca habituada a modelos esportivos. Em 10 anos foram feitos 30.600 carros, dos quais só 7.200 chegaram aos EUA, mercado tão receptivo ao tipo de veículo.
Buick Reatta
Em meio a uma onda de esportividade, a divisão da General Motors — em geral mais focada em conforto — decidiu fabricar um cupê e um conversível de dois lugares. Lançado em 1988, o Reatta não tinha bom desempenho, apresentava baixa confiabilidade e um chassi muito flexível no modelo aberto. A Buick pretendia vender 20 mil carros por ano; conseguiu colocar 21 mil nas ruas no total dos quatro anos de produção.
Cadillac Cimarron
A crise do petróleo levou a Cadillac, divisão de luxo da GM, a rever seus planos para a década de 1980. Versões a diesel, motor Buick V6 e o chamado V8-6-4 (um V8 que tinha dois ou quatro de seus cilindros desligados sob aceleração constante) revelaram-se sucessivos fiascos. Então surgia o Projeto J, série de compactos encabeçada pelo Chevrolet Cavalier. O Cimarron seria a versão Cadillac do modelo, lançada em 1982.
Economizando nas alterações, a divisão acabou com um Cavalier com a grade característica, revestimento interno em couro e mais itens de série. O motor 1,8-litro era subdimensionado e faltava-lhe personalidade. Da previsão inicial de 50 mil unidades em 1982, menos de 15 mil foram vendidas. Em 1988 o Cavalier e os demais carros J eram reestilizados, mas não o Cimarron: era o fim de um modelo que a Cadillac quer esquecer ter produzido.
Cadillac Allanté
A receita era ambiciosa: um conversível com motor V8 e carroceria desenhada e construída na Itália pela Pininfarina, que a enviava de avião para os EUA para a montagem final. O objetivo era enfrentar o Mercedes-Benz SL, mas o mercado não concordou. O Allanté era caro — em grande parte pela produção intercontinental —, não seduzia pelo estilo e só ganharia um motor vigoroso em 1993, com a chegada do Northstar. Depois de sete anos de insucesso, saía de linha com 21 mil unidades produzidas.
Cadillac Catera
Talvez estimulada pelo êxito dos sedãs esportivos da BMW, a divisão foi buscar um adversário na linha europeia da GM — o Opel Omega de segunda geração, de 1994. Com retoques visuais, motor V6 de 3,0 litros e o nome Catera, ele chegou aos EUA em 1997 e obteve relativo sucesso por dois anos, mas as vendas logo despencaram por problemas de confiabilidade e foram encerradas em 2001.
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Chevrolet Corvair
Ralph Nader é um nome que ainda causa arrepios nos dirigentes das marcas de Detroit, EUA. No início dos anos 60 esse advogado escreveu o livro Unsafe at Any Speed, ou inseguro a qualquer velocidade, com duras críticas ao Corvair. O modelo tinha motor traseiro refrigerado a ar, de seis cilindros horizontais opostos (como no Porsche 911) e 2,6 litros, e suspensão traseira independente por semieixos oscilantes. O comportamento dinâmico era diferente do habitual para os motoristas norte-americanos, agravado pelo frequente uso de pressões de enchimento incorretas nos pneus — poucos sabiam que deviam colocar bem mais ar nos traseiros. Nader levou o Corvair ao fim e a indústria local à generalização do conjunto de motor e tração dianteiros.
Chevrolet Tracker (Brasil)
O utilitário esporte importado da Argentina, onde era feito pela Suzuki (não passava de um Grand Vitara com o emblema da gravata), chegou em 2001 com um motor a diesel de baixo desempenho, que exigia 21 segundos para ir de 0 a 100 km/h, além de ser um estranho nas concessionárias da GM. Não emplacou: em 2003 foram vendidas apenas 750 unidades. A importação foi suspensa no ano seguinte e retomada em 2007, dessa vez com motor a gasolina — as vendas melhoraram, mas a empreitada acabou em dois anos.
Apesar do desenho mais moderno e do navegador GPS preso ao para-brisa, o Vectra hatch era praticamente o mesmo carro que o Astra
Chevrolet Vectra hatch (Brasil)
Na Europa ele seguia a evolução do Astra, mantendo seu nome, mas aqui a GM preferiu “promovê-lo” a Vectra, como já fizera com o sedã, e lançá-lo em 2007 como alternativa superior ao Astra. Não funcionou: apesar do desenho mais moderno e do navegador GPS preso ao para-brisa como inovação, era praticamente o mesmo carro que o antecessor, com idênticas plataforma e mecânica, espaço interno similar e… preço cerca de R$ 10 mil mais alto. O mercado rejeitou o engodo e, em 2008, o Vectra ficou pela metade das vendas do Astra, perdendo ainda para Golf, Stilo e Focus. Saiu de produção em 2011, antes mesmo do carro que ele deveria substituir.
Chevrolet SSR
O sucesso de um carro-conceito nos salões nem sempre garante boas vendas a um modelo de produção. A GM animou-se com a recepção à picape nostálgica SSR, de 2000, e a colocou nas ruas em 2003. Com um motor V8 de 300 cv, apenas razoável para sua proposta diante de todo o peso, poucos se convenceram e só 24 mil picapes encontraram compradores em três anos de produção — a GM chegou a ter estoque para 300 dias de vendas.
Chrysler Airflow
Lançado nos EUA em 1934, foi uma inovação em engenharia e o primeiro carro a aplicar na prática teorias de aerodinâmica obtidas em túnel de vento. A cabine era mais avançada e baixa que a dos modelos da época, propiciando grande estabilidade; o para-brisa da versão Imperial foi o primeiro em curva e feito numa só peça em toda a indústria; a construção era monobloco em aço, enquanto a maioria dos carros usava carroceria sobre chassi. O consumidor norte-americano parece não ter concordado em avançar tanto e tão rápido no tempo. Além disso, seu estilo não agradou, em especial pela grade dianteira art deco, substituída em 1935 por uma mais conservadora. As vendas não reagiram e já em 1937 o Airflow saía de linha.
Chrysler TC by Maserati
Um dos incontáveis frutos da plataforma de carros compactos com tração dianteira que a Chrysler usou nos anos 80 (da qual Dodge Aries e Plymouth Reliant foram os pioneiros), o TC era um conversível de luxo com carroceria italiana e motores norte-americanos, embora o V6 fosse de origem Mitsubishi. Vendido na época a US$ 33 mil, era caro demais — sobretudo ao lado de um Chrysler LeBaron de linhas um tanto parecidas — e não convenceu pelo desempenho ou pela confiabilidade. A expectativa era de vender até 10 mil carros por ano, mas só 7.300 ganharam as ruas no total entre 1989 e 1991.
Citroën XM
Desenho ousado, suspensão hidropneumática e uma eletrônica sofisticada pareciam a receita exata para mais um Citroën marcante. O XM vendeu bem por dois anos, começando em 1989, e depois permaneceu discreto no mercado até completar 11. As razões do insucesso passam pela escolha do formato hatchback (de poucos adeptos nessa categoria fora da França), problemas de qualidade e a inaptidão das concessionárias de vários países para saná-los. Depois dele a Citroën ficou bons anos fora do segmento até que nascesse o C6.
DeLorean DMC-12
O sonho de John DeLorean era fabricar seu esportivo, um carro com portas ao estilo “asas de gaivota” e carroceria de aço inoxidável. Lançado em 1981, o DMC-12 ficou famoso no cinema como máquina do tempo da trilogia De Volta para o Futuro, mas não teve êxito comercial, em parte pelo motor V6 de 2,8 litros e desempenho insuficiente. Parceiro no negócio, o governo do Reino Unido mandou fechar a fábrica irlandesa após um só ano de produção.
Dodge 1800 (Brasil)
Interessada em disputar um segmento inferior ao de seus modelos V8, a divisão Dodge da Chrysler buscou no Hillman Avenger inglês a base para desenvolver seu 1800, lançado no Brasil em 1973. Concluído às pressas, mostrou-se um poço de problemas: defeitos na caixa de câmbio, vibrações na direção, alto consumo de combustível, baixa qualidade de produção. A empresa corrigiu parte dos defeitos e trocou seu nome para Polara em 1976, mas as vendas não decolaram. Com a aquisição da Chrysler pela Volkswagen em 1980, o “Dodginho” saiu de produção no ano seguinte.
Fiat Oggi e Prêmio (Brasil)
Vida bem curta teve o primeiro três-volumes da Fiat brasileira, o Oggi, lançado em 1983. Apesar do grande porta-malas, era derivado de um modelo já defasado (o 147), estava longe de agradar aos olhos e mantinha o péssimo câmbio da marca. Saiu de linha já em 1985. Seu sucessor, o Prêmio, era lançado no mesmo ano com estilo mais harmonioso, mas também não emplacou — apesar de ter sido o carro mais vendido na Argentina. O azar da Fiat com pequenos sedãs afetou até o Siena em sua primeira série, de 1997, mas com o tempo — e reestilizações bem feitas — ele se tornou um dos mais vendidos da classe.
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Fiat Tipo (Brasil)
O Tipo é um caso peculiar de fracasso. Como importado, entre 1993 e 1995, foi um grande sucesso, mas a versão nacionalizada chegou em 1996 quando o original já estava fora de linha na Europa. Então vieram dezenas de casos de incêndio com modelos importados, problema que a Fiat atribuiu a lavagens de motores com solvente; só mais tarde reconheceu que a culpa era de um vazamento de fluido sobre o escapamento e efetuou a devida convocação. A imagem do carro logo ficou queimada (sem duplo sentido…) e a produção local, que durou menos de dois anos, representou apenas 7% do total das vendas do Tipo por aqui.
Fiat Brava (Brasil)
O sucessor do Tipo foi o Brava, outro exemplo de fiasco da marca italiana por aqui. A intenção era importar o Bravo de três portas, mas a alta do dólar em 1999 mudou os planos e, ainda naquele ano, o Brava tornava-se brasileiro, atrasado quatro longos anos em relação à Itália. As vendas nunca decolaram, mesmo após uma revisão do motor 1,6-litro em 2001 para melhorar o torque em baixa rotação. Após vender em 2002 só 16% do total obtido pelo concorrente Chevrolet Astra, saía de linha no ano seguinte.
Ford Edsel
A Ford norte-americana buscava um carro de médio preço para complementar a oferta do Mercury, bem-sucedido na disputa com Dodge e Pontiac no segmento inferior do mercado. A companhia estava ausente da classe de Buick e Chrysler e cogitou colocar nela o novo modelo. No meio do caminho, decidiu subir de nível o Mercury e lançar em 1958 o carro E, ou Edsel, no segmento de Dodge e Pontiac.
Os motivos do fracasso do Edsel divergem entre a rejeição a suas linhas — criadas após pesquisas de opinião, resultaram numa polêmica mistura de estilos, com uma grade dianteira que rendeu apelidos chulos —, problemas iniciais de qualidade e um mau trabalho de marketing. Mesmo após correções no desenho, a linha 1960 era encerrada após um só mês de produção, fechando o total de 110 mil carros. Ele ainda é muito lembrado, mas só como símbolo de fracasso sobre rodas.
Ford Pinto
O compacto surgiu nos EUA em 1970 com uma falha técnica: o tanque de combustível podia romper-se com facilidade em colisões por trás. Um memorando divulgado mais tarde mostrava que a Ford, ao calcular o custo de convocar e modificar os carros vendidos, achou mais barato pagar indenizações por eventuais processos na justiça pelos acidentes com vítimas. A escolha saiu cara: divulgado ao público, o assunto levou a empresa a ser obrigada a fazer a convocação para reparo, sem falar no prejuízo em termos de imagem.
Havia preferência pelo Taunus, mas fatores técnicos e econômicos levaram a Ford a insistir no Maverick que os brasileiros não queriam
Ford Maverick (Brasil)
A corrida contra o tempo para colocar um automóvel nas ruas foi fatal para o Maverick, modelo norte-americano escolhido pela Ford para competir com o Chevrolet Opala. Conta-se que uma pesquisa apontou a preferência do público pelo Taunus alemão, mas fatores técnicos e econômicos levaram a empresa a insistir no carro que os brasileiros não queriam.
Ele foi lançado em 1973 com o ultrapassado motor do Aero-Willys, um seis-cilindros que — como se dizia à época — andava como quatro e consumia como oito. Mesmo com um moderno e mais econômico quatro-cilindros, dois anos depois, o Maverick ficou longe do sucesso do concorrente da GM. A versão V8 vendia pouco, pois era tempo de gasolina cara logo após o primeiro choque do petróleo, e o espaço no banco traseiro era crítico para um carro de seu porte. Durou seis anos. Por ironia do destino, o V8 é hoje muito valorizado pelos que gostam de carros antigos e potentes.
Ford Thunderbird
Com os modelos “retrô” vendendo como pães quentes nos EUA, a Ford quis participar da onda com uma releitura do Thunderbird de 1955, o carro esporte de dois lugares que depois perderia sua identidade. A plataforma e o motor V8 de 3,9 litros tinham origem na Jaguar. Do carro-conceito do Salão de Detroit de 1999 para o lançamento foram três anos, mas a produção não durou: as vendas caíram à metade após o primeiro ano e a meta de vender 25 mil por ano nunca foi alcançada. O “pássaro trovão” voou em 2005 para não mais voltar — pelo menos até agora.
General Motors EV1
Batizado com o nome da corporação e não de uma de suas divisões, o EV1 surgiu em 1996 como primeiro carro elétrico de um grande fabricante desenhado já com esse tipo de propulsão. Era um dois-lugares de linhas aerodinâmicas e motor de 102 kW (137 cv), oferecido apenas por arrendamento mercantil (leasing) sem opção de compra. Em três anos foram feitas 1.117 unidades, mas em 2002 a GM cancelou o projeto alegando demanda insuficiente para amortizar os custos. Para não ter de manter a assistência técnica por 15 anos como previsto em lei na Califórnia, recolheu e sucateou os carros. Alguns consideram o EV1 bem-sucedido em termos técnicos, mas do ponto de vista comercial foi mais um fracasso.
Honda Insight
Derivado de um carro-conceito, o primeiro híbrido da Honda aparecia em 1999 como um concentrado de tecnologia: chassi e carroceria de alumínio, aerodinâmica excepcional (Cx 0,25), opção de caixa de variação contínua (CVT) e um motor a gasolina de 1,0 litro e 68 cv combinado a um elétrico de 13 cv. A fábrica japonesa estimava vender 6.500 por ano, mas o Insight só conseguiu acumular 17 mil ao fim de seis anos. Depois dele a Honda aplicou sistemas híbridos a carros mais convencionais, como Civic e Accord, até que um novo Insight aparecesse em 2009 com cinco portas, mais espaço e maior potência — a fórmula que havia dado certo com outro híbrido, o Toyota Prius, desde os anos 90.
Honda Civic
Sim, o Civic é um grande sucesso de maneira geral — mas a nona geração para os EUA, lançada em 2011, causou decepção na crítica e no público. O carro perdeu em estilo e esportividade sem ficar mais atraente para o público tradicional, o que fez as vendas caírem 15% em um ano de crescimento de 10% do mercado. A Honda admitiu ter errado e fez uma remodelação em 18 meses, bem antes do prazo habitual desse tipo de intervenção pela marca.
Jaguar X-Type
A história é conhecida: o fabricante de carros de luxo quer explorar um segmento de preços menores e o faz compartilhando componentes com uma marca generalista. No caso do X-Type, a plataforma vinha do Ford Mondeo (a inglesa pertencia na época ao grupo norte-americano) e os motores V6 de 2,5 e 3,0 litros eram derivados da linha Duratec. Foi o primeiro Jaguar com tração integral (mais tarde foi oferecido só com a dianteira em versões de entrada) e não traseira, pois o carro doador da arquitetura tinha tração na frente, e teve versões perua e a diesel. Embora fabricado de 2001 a 2009, o X-Type nunca superou 50 mil unidades por ano, metade da meta da empresa.
Lamborghini Urraco e Silhouette
Desenvolvido em um período conturbado para a marca italiana e vendido em parte durante a crise do petróleo, o primeiro Lamborghini com motor V8 — o Urraco, de 1970 — teve baixa aceitação. Sem dinheiro para projetar um substituto, a empresa preferiu retocá-lo e lançou em 1976 o Silhouette, mais leve, potente (260 cv) e estável. Sem verba para a certificação ao mercado norte-americano, o novo carro não conseguiu atravessar o Atlântico, o que minou as chances de alcançar boas vendas — só 52 deles foram fabricados. A maré de azar só acabaria com o Jalpa, de 1981.
Lincoln Blackwood
Uma picape de luxo pode ter parecido uma ótima ideia para essa divisão da Ford nos EUA, mas o mercado não pensou da mesma forma. A Blackwood era uma versão mais requintada da Ford F-150 de cabine dupla, na qual a caçamba era coberta e revestida como o porta-malas de um sedã. Pouco mais de 3 mil foram feitas durante 15 meses, até que a empresa a renomeou Mark LT, simplificou o acabamento e reduziu o preço — a aceitação aumentou, mas não tanto quanto a Lincoln esperava.
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Mercedes-Benz Classe A (Brasil)
A tentativa da marca da estrela de fazer um carro pequeno com alta tecnologia não foi bem-sucedida por aqui. Na Europa, onde foi lançado em 1997, o Classe A enfrentou problemas iniciais com o “teste de desvio de um alce” promovido por uma revista sueca, no qual capotou. A fábrica recolheu os carros e aprimorou o projeto, com o primeiro controle eletrônico de estabilidade de série em sua categoria.
No Brasil a estabilidade não foi problema, mas houve outro — o preço subiu muito entre o projeto e o lançamento, em 1999, por causa da desvalorização do real. Sem atributos para conquistar o público tradicional da marca e caro demais em relação a outros modelos do mercado (tinha preço de carro médio), o Classe A nacional teve apenas 70 mil unidades fabricadas até 2005, número que a Mercedes pretendia vender em um ano. O fracasso repetiu-se com a segunda geração, importada da Alemanha, que ficou bem mais cara e não oferecia o espaço do irmão maior Classe B, de maior aceitação por aqui.
Merkur
Vender carros europeus nos EUA não é para qualquer marca, como a Ford pôde comprovar. Bem aceito na Europa, o Sierra deu origem ao Merkur XR4Ti, com motor turbo de 2,3 litros feito no Brasil e suspensão mais macia. Quase tão caro quanto um BMW Série 3, vendeu muito pouco. O fato de ser oferecido pelas concessionárias das conservadoras divisões Lincoln e Mercury não ajudou, pois o carro era um estranho no ninho. Foi substituído pelo maior Scorpio, com motor V6, também rejeitado.
Nissan Leaf
E não é que, tanto tempo depois do GM EV1, outro carro elétrico fracassa? A Nissan depositava esperanças no Leaf, um hatchback espaçoso, eficiente, silencioso e que não exige conhecimento especial para ser dirigido. Contudo, as vendas nos EUA em 2012 ficaram abaixo da metade do objetivo de 20 mil unidades. Motivos? Talvez o alto preço (US$ 35 mil, embora haja um crédito de impostos pelo governo como incentivo), talvez a limitada autonomia e o desconforto que ela traz sempre que não se pode contar com local e tempo adequados para a recarga.
NSU Ro 80
Fabricante do pequeno Prinz, de motor dois-cilindros refrigerado a ar de apenas 630 cm³, a NSU ousou ao partir para outro extremo de mercado com o Ro 80. O sedã, lançado em 1967, trazia linhas avançadas, embreagem automática, ótima aerodinâmica e motor rotativo Wankel, em que os pistões dão lugar a rotores. Com graves problemas de durabilidade (alguns motores revelavam desgaste antes de 30 mil quilômetros), em 10 anos só 37 mil chegaram às ruas.
Peugeot Hoggar (Brasil)
Ao retocar o bem-sucedido 206 para lançar o 207 brasileiro, a Peugeot aproveitar para aumentar a família com o sedã Passion, elaborado a partir do 206 sedã iraniano, e com a picape Hoggar, um desenvolvimento local. O resultado foi um utilitário eficiente, mas de linhas controversas e que, talvez pela imagem de manutenção cara que a empresa conquistou por aqui, nunca vendeu bem. Durante 2012 pouco mais de 2 mil delas ganharam as ruas, uma fração das 117 mil Stradas e 66 mil Saveiros. Diante do fiasco, a Peugeot já decidiu que não haverá uma picape da linha 208.
Duas mil Hoggars ganharam as ruas, uma fração das 117 mil Stradas e 66 mil Saveiros, e a Peugeot já decidiu que não haverá picape 208
Pontiac Fiero
A divisão Pontiac da GM almejava um carro esporte mais econômico que o Firebird. Para conter os custos, muitos componentes foram aproveitados de outros modelos da GM, comprometendo o potencial do projeto do modelo de dois lugares e motor central-traseiro. Lançado em 1984 omitindo a imagem de esportivo, o Fiero era bonito e arrojado. Contudo, o chassi deficiente, suspensões do Chevette, motor de desempenho modesto e câmbio manual de quatro marchas ou automático de três logo esfriaram o interesse do público. As vendas caíram e, mesmo com a reestilização de 1986 e os retrabalhos de motor e chassi, sua aceitação foi baixa — vendeu metade das 50 a 60 mil unidades necessárias para tornar o carro rentável. Saiu do mercado em 1988.
Pontiac Aztec
A mistura de estilos chegou ao ápice com um dos maiores fracassos da indústria norte-americana na década passada. O utilitário esporte com plataforma de minivan, que havia aparecido como carro-conceito em 1999, chegou ao mercado em 2001 com formas controversas. Das 75 mil unidades anuais previstas pela GM, nunca chegou a 28 mil num ano, mesmo com o empenho da GM em vendê-los a frotas de locadoras. Descontinuado em 2005, ainda é presença garantida em qualquer concurso dos carros mais feios já fabricados.
Pontiac GTO
Na década passada a GM decidiu importar da Holden, sua subsidiária australiana, um cupê com motor V8 e tração traseira para oferecer nos EUA uma alternativa aos europeus e um rival para o Ford Mustang. Baseado no sedã Commodore (Chevrolet Omega no Brasil), o Holden Monaro chegava ao mercado norte-americano em 2004 com um nome marcante do passado: Pontiac GTO. Mas não vingou. Razões? Uma, a valorização do dólar australiano, que levou o preço previsto de US$ 25 mil para US$ 34 mil; outra, a indiferença do público a um desenho já envelhecido — o Commodore fora lançado em 1997 — e ao qual faltava o ar intimidador do “carro musculoso” que lhe cedera o nome. As vendas ficaram em 40.800 unidades no total de três anos.
Porsche 914
Projetado e vendido em parceria com a Volkswagen, esse dois-lugares de motor central-traseiro pretendia popularizar a Porsche, mas chegou ao mercado mais caro do que se pretendia: a versão de seis cilindros custava mais que um Jaguar E-Type e pouco menos que o consagrado 911. A revista inglesa Car não perdoou: “Como um carro, ele é ótimo; como compra, é uma tragédia que não pode ser levada a sério”. Em 1975, depois de seis anos e 119 mil exemplares — só 3 mil com o seis-cilindros —, o 914 passava à história.
Renault Avantime
Meio cupê esportivo, meio minivan, o Avantime foi lançado em 2001 com linhas estranhíssimas — sobretudo a solução para o teto e o vidro traseiro —, antecipadas em dois anos por uma versão de conceito. Era produzido pela Matra, fabricante de carrocerias, que deixou o negócio em 2003 depois de apenas 8.500 unidades. Há quem atribua essa desistência ao fracasso do modelo, embora a Renault ainda tenha insistido no visual traseiro ao redesenhar o Mégane hatch em 2002.
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Renault Symbol (Brasil)
Não há nada errado em oferecer dois modelos na mesma categoria, um mais espaçoso e barato, outro mais caro e menor — desde que o segundo sobressaia em estilo, refinamento, imagem, aqueles fatores que convencem o público a pagar mais. O Symbol nunca se destacou tanto assim que o Logan, de modo que seu preço não se justificou. No ano passado foram emplacados 6.600 deles, ante 103 mil Sienas e 34 mil Logans.
Romi-Isetta (Brasil)
Ser econômico e facílimo de estacionar (podia até entrar de frente em vagas nas quais os outros paravam de lado) não eram vantagens tão apreciadas em 1956, quando surgiu o primeiro automóvel brasileiro, derivado de um projeto da Iso italiana. O que condenou mesmo o Romi-Isetta foram as regras do Grupo Executivo da Indústria Automobilística (GEIA), em 1957, que concediam incentivos fiscais à produção de carros com quatro ou mais lugares. Sem atender aos requisitos, o Isetta ficou caro diante dos concorrentes e tornou-se desinteressante ao consumidor. Ainda foi produzido até 1961, mas em pequeno volume, cerca de 3 mil unidades.
Smart Forfour
Animada pelo sucesso do pequeno Fortwo, a divisão da Daimler criou um modelo maior para quatro pessoas — por isso o nome Forfour. Com plataforma comum ao Mitsubishi Colt e fabricado na Holanda em uma parceria entre a então DaimlerChrysler e a empresa japonesa, o carro não emplacou e saiu de linha em 2006, dois anos após o lançamento.
Studebaker Wagonaire
A perua que queria ser uma picape: a Wagonaire de 1963 oferecia uma seção traseira retrátil no teto, sobre o compartimento de bagagem, para o transporte de cargas altas que não caberiam no espaço convencional — como uma geladeira de pé, anunciada em sua publicidade. Um problema crônico de infiltração pelo teto, não resolvido pela fábrica, fez a perua sair de linha em dois anos após meras 940 unidades.
Tucker
Repleto de inovações técnicas, o carro de Preston Tucker queria revolucionar o mercado norte-americano e tornar a segurança um elemento primordial de escolha. Se a aceitação à ideia foi boa, não faltaram dificuldades técnicas — e há quem garanta que as “Três Grandes” se mexeram para impedir que a empresa estreante ameaçasse seu espaço e sua reputação. Preston foi processado por fraude aos investidores e perdeu o local da fábrica. Embora inocentado, não conseguiu se reerguer e concluiu apenas 51 carros.
Volkswagen SP2 (Brasil)
A VW foi, nos anos 70, recordista em tirar modelos de produção, devido à estratégia da matriz alemã que impunha um lançamento a cada seis meses. Exemplo clássico de erro foi o esportivo SP2: arrojado nas linhas, mas contido no desempenho com o motor de 1,7 litro derivado do 1,6 do Fusca, ganhou o apelido de “sem potência” e não vendeu 10 mil unidades. Uma outra versão, SP1, com motor 1,6 ainda mais fraco, saiu em quantidade mínima.
Volkswagen 411/412
Conhecida como Typ 4, essa linha alemã lançada em 1968 pagou o preço da insistência da empresa na concepção tradicional de motor arrefecido a ar na traseira. Uma revista disse que a VW estava “cega para onde está indo o mundo automobilístico” e, apesar de atrativos como a injeção eletrônica e garantia de dois anos nos EUA, o 411/412 não vendeu bem em nenhum lado do Atlântico.
O preço da insistência: para uma revista, a VW estava “cega para onde está indo o mundo automobilístico” em relação ao Typ 4
Volkswagen Variant II (Brasil)
Da mesma política foram vítimas o Karmann-Ghia TC (1971-1975), que ficava longe da beleza do modelo original, e o VW 1600 de quatro portas, mais conhecido por “Zé do Caixão” (1969-1971), que só obteve êxito entre os taxistas. E o modelo mais bem-sucedido da linha, a perua Variant, era substituído em 1977 pela Variant II, ou “Variantão”, outro caso de erro de projeto. Sua suspensão, embora moderna em conceito (dianteira McPherson e traseira com braço arrastado), tornava um desafio o alinhamento de rodas e prejudicava a estabilidade. Com preço similar ao da Ford Belina II, vendeu pouco e durou só três anos.
Volkswagen Apollo, Logus e Pointer (Brasil)
A união Ford-Volkswagen na Autolatina gerou outros casos de morte precoce. Primeiro foi a dupla de gêmeos Ford Verona e VW Apollo, sedãs derivados do Escort que nasceram condenados em 1990 — a empresa já planejava a renovação da linha para dali a dois anos. Se o Verona encontrou seu espaço, o Apollo era visto como alienígena entre os habituados à marca alemã.
Do novo Escort nasceram o sedã Logus e o hatch Pointer, em 1993. Este último levou quase um ano entre a apresentação à imprensa e a chegada ao mercado, para que a fábrica pudesse reparar problemas e enganos como o uso de carburador (a versão definitiva surgiu com injeção de série, ao contrário do Logus). Apesar das linhas atraentes, ambos sofreram com defeitos de produção e baixa confiabilidade — itens como suspensão e sistema elétrico eram críticos. A separação das duas marcas em 1995 fez pairar sobre eles o fantasma da extinção, e quem quer comprar um carro que logo deve sair de linha? Deixaram o mercado em 1997.
Volkswagen Phaeton
Parte dos planos grandiosos de Ferdinand Piech, que incluíram o Bugatti Veyron, o Phaeton foi lançado em 2002 como uma alternativa pouco mais barata ao Audi A8, ou seja, um “carro do povo” como nunca se vira antes. A empresa visava a vender 20 mil carros por ano, mas a média dos primeiros quatro anos ficou ao redor de 6 mil, boa parte no próprio mercado alemão. Nos EUA a aceitação foi tão baixa que ele deixou o mercado em três anos.
Volvo 262 C
Cupês em geral são elegantes, cativam pela emoção mais que pela razão. Como ficaria a versão cupê de um carro puramente racional — sólido, espaçoso, confiável, mas tão atraente quanto um tijolo — como o Volvo da série 200? Visando ao mercado norte-americano, a marca sueca encomendou ao estúdio italiano Bertone a árdua tarefa de desenhar o 262 C. O resultado foi sofrível, sobretudo tendo em vista o charme do antigo P1800. Foi produzido apenas de 1978 a 1981.
Yugo
Um carro iugoslavo nos EUA? Sim, é o que queria Malcolm Bricklin (importador de Fiat e Subaru) ao vender por lá o Yugo, um hatch de 3,5 metros com motores de 1,1 e 1,3 litro fabricado pela Zastava. Embora tivesse preço convidativo (US$ 4 mil da época), linha de produção separada para aumentar a qualidade e mais de 500 alterações sobre o modelo original, havia problemas mecânicos, elétricos e de acabamento. Segundo a revista Consumer Reports, “qualquer carro usado era melhor que um Yugo novo”. Depois de breve êxito, tornou-se mais um rejeitado.
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