
Depois de 30 dias julgado sob diferentes ângulos, o Kicks vai à oficina para mostrar sua mecânica e construção
Texto: Felipe Hoffmann – Fotos: autor e Saito Produções
Na quarta e última semana do teste Um Mês ao Volante, o Nissan Kicks SV continuou em percursos urbanos, rodando 411 km com gasolina. A média geral foi de 12,4 km/l, sendo a melhor marca de 14,6 km/l (com média de velocidade de 31 km/h) e a pior de 5,8 km/l num trânsito intenso (16 km/h de média para o percurso de 12 km). Aproveitamos para gravar a análise técnica em vídeo, à qual você assiste abaixo.
Como temos feito sempre, comparamos o consumo apresentado no computador de bordo àquele calculado entre os abastecimentos, feitos no mesmo posto (de bandeira Ipiranga) e na mesma bomba, parando sempre o enchimento no desarme automático. Na média entre três comparações, o carro nos informou consumo 3% melhor que o constatado no posto, o que indica boa confiabilidade do computador da Nissan. Caiu por terra, ao menos nesse caso, a tese apontada por alguns de que a marca usaria em seus carros uma medição muito otimista, algo como 10% melhor que a real.
Vale notar que descartamos o último abastecimento, em outro posto Ipiranga, no bairro paulistano do Morumbi. A bomba registrou improváveis 39,5 litros num tanque de 41 litros, sendo que a luz da reserva ainda não havia acendido no painel. Feitas as contas, o computador acusava consumo 15% melhor — diferença, a nosso ver, causada por desonestidade do posto e não da Nissan. Estamos à disposição da Ipiranga para indicar, se houver interesse, o endereço do posto que não está honrando sua reputação.
O Kicks agradou a equipe pelo espaço interno e de bagagem, o consumo e o comportamento, com ressalvas para absorção de impactos e ruído de rolagem
Ainda em relação a combustível, uma ressalva: a luz de reserva aparece quando a autonomia é muito baixa. Houve um caso em particular, ao se trocar de combustível, em que a luz apareceu quando a autonomia indicada era de apenas 6 km, entrando 37 litros até o automático. Mesmo em se tratando de um carro de consumo moderado, o motorista de primeira viagem no Kicks pode ser pego de surpresa se aguardar o acendimento da luz para procurar um posto em rodovia.
De maneira geral, o Kicks vem-se mostrando realmente econômico no uso urbano. O baixo peso aliado à transmissão automática de variação contínua (CVT) traz grandes benefícios nesse tipo de uso, como abordamos na semana passada. O comportamento em curvas também agrada, quando se leva em conta a altura do carro. Apesar da sensação de amortecedores um pouco macios para o uso mais empolgado, o carro demonstra um bom acerto na geometria de suspensão e direção. A inclinação da carroceria não se mostra exagerada, provavelmente por barra estabilizadora dianteira e eixo de torção traseiro mais rígidos do que o usual.
A Nissan deixou estabilizador e eixo traseiro mais rígidos para atenuar a inclinação em curvas, o que se nota em linha reta quando um lado passa por irregularidades
A desvantagem da rigidez desses componentes é a maior influência de um lado da suspensão no outro. Por exemplo, ao entrar em uma curva de maneira mais ousada, a suspensão do lado externo tem dificuldade de se comprimir muito, pois o estabilizador está, ao mesmo tempo, transferindo parte dessa compressão para a suspensão do lado interno da curva. Na prática cria-se um esforço de “empurrar para baixo” a suspensão do lado externo, enquanto se “puxa para cima” o lado interno a fim de diminuir a inclinação da carroceria. Por outro lado, em linha reta ocorre maior oscilação na inclinação do veículo quando se passa por um remendo — por exemplo — com um dos lados do carro, devido à explicada “resistência” do lado que sofreu a alteração se comprimir. Essa característica é bem notada no Kicks.
Com o equipamento de medições Race Capture Pro, obtivemos dados que detalham em números certos comportamentos descritos nas semanas anteriores. Primeiro, a aceleração lateral (que indica a aderência disponível em curvas) mostrou bons resultados para um SUV, com média de 0,84 g em uma volta completa (1 g seria a aceleração da gravidade). Como referência, embora de categoria distinta, o VW Polo TSI alcançou média de 0,96 g.
Já o comportamento da CVT pode ser notado no gráfico 1 (acima), no qual se percebe a estratégia de manter a rotação do motor baixa com carga (torque) alta, o método carga sempre recomendado pelo Best Cars. Com isso, consegue-se o melhor consumo sem detrimento do desempenho, além do conforto de menor ruído. Com o pedal do acelerador em torno de 25%, a central determina rotação constante na atuação da CVT para melhor consumo. Interessante notar que o conversor de torque atua na saída, para garantir o “pulo” inicial, sendo bloqueado perto dos 5 segundos: note a rotação do motor caindo. A rotação fica constante e baixa até atingir 60 km/h, enquanto a carga fica por volta de 70%.
Já ao sair com um pouco mais de pedal, a estratégia adotada é emular marchas, para que o motorista ouça a variação de rotação do motor e não tenha a sensação típica de CVT. Essa medida, porém, de certa forma prejudica tanto desempenho quanto consumo. O gráfico acima mostra a aceleração com 50% de pedal.
Com o pedal do acelerador em 100% (gráfico acima), a CVT continua a emular marchas. O resultado é semelhante à transmissão de veículos esportivos, com pequena queda de rotação entre marchas: a cada “troca”, varia entre 5.750 e 5.000 rpm. O desempenho poderia ser melhor caso a transmissão segurasse a rotação de potência máxima (5.600 rpm), mas isso traria ruído alto e constante de motor, comportamento que não agrada a muitos motoristas. Vale notar que, mesmo nessa condição, não há trancos nem interrupção de torque.
Analisamos também a operação do controle eletrônico de estabilidade e tração, um equipamento de série. O motorista consegue colocá-lo em ação facilmente quando deseja criar efeito de subesterço ou sobreesterço. Caso tente fazer o sobreesterço mais exagerado, a atuação do controle de estabilidade é quase instantânea, mas no subesterço passa a sensação de esperar tempo demais — permite que o carro escorregue bastante com a frente, mesmo quando o motorista impõe maior ângulo ao volante. Nesse caso o torque do motor é cortado logo no início do evento, mas a atuação no sistema de freios demora. Fica a impressão de que o sistema adota a estratégia de tentar só cortar o motor para ver se o motorista consegue controlar o carro.
O Kicks tem bom espaço interno, mas o acabamento é bem simples para seu preço; sistema de áudio e ar-condicionado podem passar por evoluções
Desde o começo do teste comentamos sobre vários aspectos internos, mas convém citar outros. Quando o encosto do banco traseiro é rebatido, o assento não se move, criando um degrau entre o porta-malas e o banco rebatido que pode atrapalhar o transporte de algo maior. O sistema de ar-condicionado possui boa distribuição e eficiência, mas deveria ter controle automático de temperatura em um carro de seu preço. Também não é silencioso como deveria: da posição 1 para a 2 surge um fluxo de ar exagerado e aumenta consideravelmente o ruído, enquanto 1 resulta em fluxo insuficiente.
De maneira geral, o Nissan Kicks finaliza sua avaliação agradando nos quesitos espaço interno e de bagagem, consumo e comportamento dinâmico. Mostrou-se adequado em desempenho e, de maneira geral, na operação da transmissão CVT. Como pontos negativos, sobretudo para sua faixa de preço, ficaram a absorção de pequenos impactos pela suspensão e o ruído de rolagem dos pneus, itens que merecem a atenção da Nissan para mantê-lo entre os utilitários esporte mais vendidos do mercado.
Para o próximo mês de avaliação, embora continuemos na aliança Renault-Nissan, mudamos de segmento e faixa de preço: já começamos a rodar com o Kwid Intense, que mostrou bons atributos no comparativo com o Fiat Mobi. Veremos como ele se sai em 30 dias de avaliação e na análise técnica a partir da quarta-feira, dia 3.
Semana anterior
Período final
Distância percorrida | 411 km |
Distância em cidade | 411 km |
Distância em rodovia | – |
Consumo médio geral | 12,4 km/l |
Consumo médio em cidade | 12,4 km/l |
Consumo médio em rodovia | – |
Melhor média | 12,9 km/l |
Pior média | 5,9 km/l |
Dados do computador de bordo com gasolina |
Desde o início
Distância percorrida | 1.753 km |
Distância em cidade | 1.468 km |
Distância em rodovia | 285 km |
Consumo médio geral | |
gasolina | 13,1 km/l |
álcool | 9,4 km/l |
Consumo médio em cidade | |
gasolina | 13,1 km/l |
álcool | 9,3 km/l |
Consumo médio em rodovia | |
gasolina | – |
álcool | 9,6 km/l |
Melhor média | |
gasolina | 18,1 km/l |
álcool | 11,4 km/l |
Pior média | |
gasolina | 5,7 km/l |
álcool | 4,8 km/l |
Dados do computador de bordo |
Preços
Sem opcionais | R$ 87.490 |
Como avaliado | R$ 90.490 |
Completo | R$ 90.490 |
Preços sugeridos em 2/4/18 |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 78 x 83,6 mm |
Cilindrada | 1.598 cm³ |
Taxa de compressão | 10,7:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima (gas./álc.) | 114 cv a 5.600 rpm |
Torque máximo (gas./álc.) | 15,5 m.kgf a 4.000 rpm |
Transmissão | |
Tipo de caixa | automática de variação contínua |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a tambor |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | eixo de torção, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 17 pol |
Pneus | 205/55 R 17 V |
Dimensões | |
Comprimento | 4,295 m |
Largura | 1,76 m |
Altura | 1,59 m |
Entre-eixos | 2,61 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 41 l |
Compartimento de bagagem | 432 l |
Peso em ordem de marcha | 1.132 kg |
Desempenho e consumo (gas./álc.) | |
Velocidade máxima | 175 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 12,0 s |
Consumo em cidade | 11,4/8,1 km/l |
Consumo em rodovia | 13,7/9,6 km/l |
Dados do fabricante; consumo conforme padrões do Inmetro |