Apesar de má surpresa ao atravessar riacho, a picape mostrou valentia, conforto e estabilidade em curvas
Texto: Felipe Hoffmann – Fotos: autor e Diogo Antunes
A avaliação da Fiat Toro Freedom Diesel 4×4 em Um Mês ao Volante continuou sua terceira semana no litoral norte paulista, já com menos trânsito — o que não significa velocidades médias altas, uma vez que a maioria de seu percurso foi pela rodovia Rio-Santos. Também pusemos à prova a tração integral em duas trilhas, no sertão de Barra do Una e no caminho de Castelhanos em Ilhabela, antes de retornar a São Paulo pela Rodovia dos Tamoios.
Ficou evidente o bom desempenho do motor turbodiesel de 2,0 litros, potência de 170 cv e torque de 35,7 m.kgf da Toro. Até a década de 1990, dizer que uma picape a diesel para uma tonelada deixaria para trás automóveis com motor de 2,0 litros pareceria piada, mas é o que se constata a seu volante.
Contribuem as nove marchas, que permitem ao motor estar sempre em boa rotação. Importante em um Diesel, que não consegue girar muito: acima de 3.500 rpm o torque começa a cair. Uma vantagem desse tipo de motor em subida de serra travada, como a Tamoios, é não ter que esperar o giro subir ou reduzir muitas marchas para obter saídas de curva fortes. Com 2.500 rpm suas retomadas desbancam muitos carros tidos como rápidos.
O período no litoral paulista levou a Toro a belos lugares, nos quais mostrou o habitual conforto de rodagem e boa capacidade de tração em modo 4×4
Claro que nem tudo são flores. Há um retardo (algumas vezes irritante) ao sair de um semáforo ou entrar na rodovia, causado tanto pelo retardo do turbo quanto pela estratégia de injeção progressiva de diesel para não formar fumaça preta. Esta sensação poderia ser amenizada com um conversor de torque mais “solto”, ou seja, que permitisse ao motor girar mais nas saídas. O jeito é se adaptar: ao prever uma saída mais rápida, acelerar em estol, pisando no freio com o pé esquerdo e acelerando com o direito. Não é preciso pisar fundo: 1.500 rpm, um ou dois segundos antes da saída, são suficientes.
Outro destaque na serra foi o comportamento dinâmico, não apenas pela estrutura monobloco e a suspensão traseira multibraço, mas também pela tração integral. Ao contrário da maioria das picapes, a Toro pode tracionar as quatro rodas em qualquer condição, incluindo curvas fechadas em asfalto. O usual em picapes é conectar diretamente os eixos, o que os força a seguir a mesma rotação e impede o uso em piso de alta aderência. A Toro normalmente envia o torque para a dianteira (para melhor consumo) e, caso necessário, o reparte com a traseira no modo Auto. É possível repartir 50% para cada nos modos 4×4 e 4×4 Low.
A tração funciona perfeitamente na condição de serra. Em carros com tração dianteira com certa potência, é comum perder tração na roda dianteira interna em curva fechada em subida, como em algumas da Rio-Santos e da Tamoios. Em picapes de tração traseira, a roda interna desse eixo é a que mais perde tração, sobretudo sem peso na caçamba, pela grande transferência de peso lateralmente.
Na Toro, nada disso ocorre: há perfeito casamento entre a suspensão e a tração, a ponto de se conseguirem acelerações laterais impressionantes para o tipo de veículo, com as quatro rodas empurrando como devem. A suspensão traseira provou-se mostrou acertada para curvas mais ousadas, passando a sensação de apontar o carro para dentro da curva (sobresterço) sem perda de aderência da traseira. Impressiona para uma picape.
Experiente em picapes e jipes, Heinzjürger Halle sentiu confiança na Fiat, apesar da desconfiança inicial quanto à rigidez da estrutura monobloco
Tomada de ar baixa demais
Em trilhas, outra boa surpresa. Em modo Auto, o sistema reage tão rápido que mal se percebe a diferença para 4×4. Começamos a desconfiar se em subidas íngremes o sistema percebia a condição, selecionando primeira marcha e acoplando o eixo traseiro, antes mesmo de exigirmos mais potência. Mesmo em trechos planos com bastante lama, porém, o sistema reagia de imediato.
A Fiat não aplicou bloqueio do diferencial traseiro, que algumas picapes têm. Em condições muito extremas se sente a falta do recurso, quando se deixa uma roda dianteira e a traseira do lado oposto no ar, numa subida, e se para o veículo para ver se sai do lugar. Depois de alguns instantes, o controle de tração freia as rodas que estão girando em vão para transmitir torque às que têm tração, de forma rápida e eficiente. Fora dessa situação proposital, não faz feio a qualquer picape com o bloqueio.
Com perfeito casamento entre a suspensão e a tração, a Toro consegue acelerações laterais surpreendentes, com as quatro rodas empurrando como devem
Sua capacidade chamou atenção de um “trilheiro” experiente, Heinzjürger Halle: “Impressionante como traciona bem, além de ser muito mais confortável que as picapes e jipes que já tive”, relatou o atual dono de Chevrolet S10. Embora tentado a comprar uma Toro, ficou com receio sobre o sistema de tração e o monobloco: “Com meu último carro rodei 300.000 km em sete anos. Toda vez que chegava em casa, pegava uma estrada que tirava as rodas do chão. Fiquei em dúvida se o monobloco torceria nessas condições a ponto de, a longo prazo, gerar fadigas e trincas estruturais”.
Falando com propriedade, tanto pela experiência prática por décadas quanto pela carreira dentro da engenharia mecânica, ao dirigir Heinzjürger ficou com as orelhas em pé para qualquer ruído e com os dedos no vão entre a porta e o teto, para perceber qualquer movimentação. E ficou surpreso. A coluna dianteira tão espessa e a 1,8 tonelada de peso estão lá por algum motivo.
Cuidado com trechos alagados: tomada de ar baixa, desnecessária em um Diesel, facilita a aspiração de líquido que pode parar o motor
Mas nem tudo foi positivo. Tivemos um grande susto ao passar com a Toro em um riacho (que carros de passeio superam) e o motor apagar por admissão de água, o que causa frio na espinha em qualquer pessoa que saiba o significado de calço hidráulico.
O que se espera de um veículo alto, diesel e 4×4 é maior capacidade fora de estrada. Ao ver o compartimento do motor se percebe que o filtro de ar está rente ao capô, ou seja, um ponto alto. Contudo, a admissão de ar na verdade está atrás do farol de neblina, um tanto baixa. Ao passar pelo riacho a água admitida encharcou o filtro de ar, o que criou certa restrição à passagem de ar. Na saída do filtro há um sensor de pressão e temperatura do ar que entra no compressor do turbo. Tudo indica que a central eletrônica desligou o motor, por segurança, quando percebeu queda de pressão no sensor entre o filtro e o turbo, protegendo-o de aspirar água.
Por sorte o carro chegou ao fim do riacho por estar com certo embalo quando o motor apagou. Para aumentar o susto, a central impediu nova partida — calço hidráulico foi a conclusão natural. Contudo, após 30 segundos a partida foi permitida, demorando mais um tempo para habilitar o pedal do acelerador. Durante esses momentos, via-se vapor saindo pelo escapamento, sinal de filtro de ar encharcado de água. O impedimento de partida ocorre para que a água acumulada na caixa do filtro de ar seja drenada por furos para isso (presentes em toda caixa de filtro de ar). Enquanto nos recuperávamos de um quase infarto, uma moça da região atravessou o riacho sem qualquer problema com seu Fiat Mobi…
Por que a Fiat colocou a admissão de ar naquele lugar? Para veículos do ciclo Otto e sem turbo, busca-se sempre o ponto mais frio para admitir ar: isso evita detonação e aumenta a eficiência do motor, mas não se aplica a um Diesel com turbo e resfriador de ar. Na verdade, em trânsito pesado é até melhor admitir ar mais quente para diminuir emissões de monóxido de carbono e particulado, sobretudo ao acelerar depois de longo tempo em marcha-lenta.
Depois do susto e de bom comportamento nas férias, a Toro voltou a São Paulo esbanjando estabilidade na serra e torque para as subidas
Os únicos problemas seriam a perda de potência e o aumento de emissões de óxidos de nitrogênio se o ar estiver muito quente em cargas e rotações altas, condição na qual se tem grande fluxo de ar pelo resfriador. Na Toro, esse equipamento é tão eficiente que chamou atenção durante testes com o Race Capture Pro. Mesmo acelerando a pleno, com pressão de turbo de 1,55 bar, a temperatura do ar no coletor de admissão não passou de 5°C em relação à temperatura ambiente, algo raro em motores aspirados com coletores de plástico. Então, por que a tomada de ar lá embaixo? A resposta pode ser mais simples do que parece: a admissão de ar e a caixa do filtro são as mesmas nos motores flexível e Diesel.
Passando o susto, fizemos também uma trilha leve para a praia de Castelhanos — estrada antigamente difícil, mas hoje superável com alguns 4×2 de bom vão livre do solo. A Toro se mostrou mais do que apta, com o conforto de sempre. Como não computamos os trechos de trilhas no consumo geral, a média geral da semana foi de 11,9 km/l, com o pior consumo (11 km/l) em 56 km de trecho sinuoso na Rio-Santos e o melhor (14 km/l) num trecho da mesma rodovia com inúmeras lombadas e velocidade moderada. A volta a São Paulo também resultou em bom consumo: 12 km/l subindo a Tamoios com certo vigor e mantendo 128 km/h no painel (120 km/h no GPS) no sistema Carvalho Pinto/Ayrton Senna, com arrastos aerodinâmicos extras da prancha de stand-up e da bicicleta no teto.
A Toro parte agora para sua semana final, com mais uso urbano. Aguarde.
Semana anterior
Terceira semana
Distância percorrida | 356 km |
Distância em cidade | 0 |
Distância em rodovia | 356 km |
Consumo médio geral | 11,9 km/l |
Consumo médio em cidade | 0 |
Consumo médio em rodovia | 11,9 km/l |
Melhor média | 14,0 km/l |
Pior média | 11,0 km/l |
Dados do computador de bordo com diesel |
Desde o início
Distância percorrida | 1.260 km |
Distância em cidade | 583 km |
Distância em rodovia | 677 km |
Consumo médio geral | 10,6 km/l |
Consumo médio em cidade | 10,3 km/l |
Consumo médio em rodovia | 10,8 km/l |
Melhor média | 15,7 km/l |
Pior média | 7,0 km/l |
Dados do computador de bordo com diesel |
Preços
Sem opcionais | R$ 120.890 |
Como avaliado | R$ 131.283 |
Completo | R$ 134.746 |
Preços sugeridos em 8/1/18 |
Ficha técnica
Motor | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4 |
Diâmetro e curso | 83 x 90,4 mm |
Cilindrada | 1.956 cm³ |
Taxa de compressão | 16,5:1 |
Alimentação | injeção direta, turbocompressor, resfriador de ar |
Potência máxima | 170 cv a 3.750 rpm |
Torque máximo | 35,7 m.kgf a 1.750 rpm |
Transmissão | |
Tipo de caixa e marchas | automática, 9 |
Tração | integral |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a tambor |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | independente, multibraço, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 17 pol |
Pneus | 225/65 R 17 |
Dimensões | |
Comprimento | 4,915 m |
Largura | 1,844 m |
Altura | 1,743 m |
Entre-eixos | 2,99 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 60 l |
Caçamba | 820 l |
Capacidade de carga | 1.000 kg |
Peso em ordem de marcha | 1.871 kg |
Desempenho | |
Velocidade máxima | 188 km/h |
Aceleração de 0 a 100 km/h | 10,0 s |
Consumo em cidade | 9,0 km/l |
Consumo em rodovia | 11,2 km/l |
Dados do fabricante; consumo conforme padrões do Inmetro |