O SUV testado por um mês passou a usar álcool; entenda por que a suspensão tem certos comportamentos
Texto e fotos: Felipe Hoffmann
Em sua terceira semana no teste Um Mês ao Volante, o Jeep Compass Sport com motor flexível trocou de combustível, passando a encarar o uso urbano com álcool. Os resultados de consumo até agora foram bons para o tipo de carro, com média geral de 7,3 km/l nos 357 quilômetros rodados no período pela capital paulista. A melhor marca média foi de 10,2 km/l, em um trecho percorrido à alta média de 49 km/h, e a pior de 4,4 km/l, em trajeto de bairro à média de 30 km/h. Deixaremos a comparação de consumo entre gasolina e álcool para a semana final, quando teremos melhor amostragem.
Apesar da grande massa (que tem maior impacto em uso urbano ou com variação de velocidades e inclinações de via) e da ampla área frontal (de maior influência em uso rodoviário, por gerar maior arrasto aerodinâmico), o Compass tem fatores que ajudam no consumo em certas condições, como o tamanho dos pneus. Quanto maior o diâmetro total, menor é a resistência ao rolamento — razão para a migração de aro 26 para 29 nas bicicletas mais caras.
O exemplo do carrinho de rolimã é válido: quanto maior o rolamento usado, mais rápido o carrinho vai na mesma descida. No caso do Sport, com pneus de série 60, há outra vantagem: quanto maior a altura das laterais do pneu (flancos), menores serão os atritos internos, que afetam entre 85% e 90% da resistência ao rolamento, além do ganho na absorção de impactos.
Posição de dirigir e conforto ao rodar foram elogiados pela colaboradora, que gostaria de mais espaço para bagagem: o do Compass perde para SUVs compactos
A colaboradora Julia Pacheco também dirigiu o carro na semana e elogiou a elevada altura que se reflete em boa visão do trânsito, a acertada posição de dirigir, o “porta-bolsas” embaixo do banco do passageiro e o espaço interno geral. Gostou também do apoio de braço central regulável em distância, bem como do conforto de rodagem e do isolamento acústico. Assim como outros da equipe, mencionou os retrovisores externos biconvexos, que eliminam pontos cegos. A simplicidade dos bancos de tecido e do espelho interno, que não é fotocrômico, não incomodou.
O que não agrada no Compass, na opinião da motorista? Como esperado, ela achou excessivos os movimentos laterais (rolagem da carroceria) ao passar em desníveis com um lado do carro apenas, o que indica o uso de barras estabilizadoras mais rígidas. Notou ainda que a frente raspa com certa facilidade em valetas e rampas, por haver um defletor embaixo do para-choque com função de melhora aerodinâmica, e considerou que a capacidade de bagagem (410 litros) não é coerente com os mais de 4,40 metros de comprimento do SUV. De fato, o volume no Jeep é menor que em modelos compactos como Honda HR-V e Nissan Kicks.
O acerto de suspensão do Compass tem-se revelado muito bom para o tipo de veículo. Destaca-se a absorção de irregularidades: em ruas com buracos enormes ou mesmo num trecho habitual nosso, com uma emenda de ponte que forma um degrau acentuado — na maioria dos carros, produz uma pancada que dói até na espinha —, o Jeep passa como se fosse algo pequeno. Contudo, fica a impressão de que dois times acertaram os amortecedores, um para os dianteiros e outro para os traseiros, e nunca se conversaram.
Pneus de perfil mais alto da versão Sport favorecem conforto e economia; defletor baixo sob o para-choque dianteiro muitas vezes raspa ao passar por lombadas
A frente tende a ser mole em desníveis da via (como nas Marginais Pinheiros e Tietê) e em lombadas, fazendo a suspensão trabalhar muito o curso. Lembre que os amortecedores atuais possuem sistemas internos que atuam diferentemente em cada situação, podendo ser bem “soltos” para absorver impactos rápidos, como buracos, e firmes em movimentos lentos, como mudanças de direção e lombadas. No caso na suspensão dianteira do Compass, faltou o acerto no meio do caminho: ela absorve bem os buracos e remendos, mas em mudanças de direção em velocidades mais altas se torna mais firme que o esperado, como que buscando um toque esportivo.
A capacidade do Compass de “engolir” grandes irregularidades, somada ao afundamento da dianteira, faz supor geometria neutra ou pró-mergulho
O problema surge em lombadas. Naquelas longas, ao passar devagar nada de diferente acontece, mas entre 35 e 40 km/h a suspensão dianteira se recolhe quase que inteira ao encontrar a lombada, se distende muito na saída do obstáculo e se comprime bastante quando o peso recai sobre os pneus, momento em que o defletor raspa no chão. Essa condição é agravada pelos amortecedores firmes na traseira, que aumentam o “mergulho” da frente (em termos técnicos, há maior rotação no eixo chamado de pitch).
Por outro lado, caso o motorista decida desprezar a lombada e passar a 50 ou 60 km/h, o carro pouco se movimenta e nenhum eixo chega ao fim de curso, mostrando que o curso de suspensão é realmente grande. Para evitar a sensação de carro mole e que a suspensão se distenda muito após o impacto, uma solução (comum em marcas asiáticas) é impor maior resistência ao retorno do amortecedor, mas isso tem um efeito colateral, relatado em outras avaliações: as rodas perdem contato com o solo em remendos ou qualquer impacto rápido, pois demoram para retornar.
O subchassi traseiro preso à estrutura com buchas melhora a absorção de impactos e vibrações, mas produz movimentos laterais à carroceria em algumas situações
Já o acerto firme da suspensão traseira, além de acentuar o “mergulho” da dianteira em algumas situações, transfere mais os impactos e faz os passageiros sentirem certo desconforto nas costas, lembrando um pouco o efeito comum em picapes. A questão se acentua porque, com o bom acerto da dianteira, o motorista quer desfrutar a facilidade de passar rápido em buracos e desníveis onde carros comuns dariam fim de curso. A situação melhora com carga maior no eixo traseiro.
Um parêntese: parece bem melhor nesse Compass Sport, comparado à versão Limited 2018 do comparativo de quatro SUVs, a movimentação lateral da traseira ao passar por remendos e buracos: antes excessiva, foi atenuada, embora a FCA garanta não ter havido alteração no produto. Esse movimento se deve em parte ao arranjo da suspensão traseira McPherson, com os braços inferiores fixados ao subchassi e este ligado à estrutura do carro com buchas (diferente do sistema do Renegade, com o subchassi fixado diretamente à estrutura). Como o Compass é um modelo superior e mais refinado, as buchas melhoram a absorção de impactos e o conforto de rodagem, mas sendo muito macias podem criar movimentação lateral.
Voltando à questão do “mergulho” da frente, vale esclarecer que um dos motivos desse comportamento vem da geometria de suspensão. Desde a década de 1990, anunciam-se carros em que a geometria de suspensão tem característica anti-dive ou antimergulho: com tal geometria, as forças durante a frenagem criam uma força resultante que “empurra” o eixo para cima, fazendo o carro frear sem inclinar a carroceria. Bom exemplo era o Volkswagen Passat de 1998, com suspensão dianteira mais elaborada, que tinha comportamento oposto ao do antigo Santana — este “mergulhava” em frenagens e levantava a frente em aceleração.
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