Aceleração do híbrido não depende só da carga das baterias, mas sobretudo de sua temperatura de trabalho
Texto: Felipe Hoffmann – Fotos: autor e Fabrício Samahá
O Toyota Prius concluiu sua terceira semana do teste Um Mês ao Volante: é hora de analisar as medições de desempenho e estabilidade, bem como as informações trazidas pelo instrumento Race Capture Pro.
Ao analisar os tempos de aceleração, ficou claro que a única influência dos modos de condução Eco, Normal e Power é na progressão do pedal do acelerador em abertura parcial: a demanda de torque será maior em Power e menor em Eco, mas com 100% de pedal todos entregam o máximo torque permissível — considerando a carga e, principalmente, a temperatura das baterias. Tanto que o melhor resultado foi em modo Normal, atingindo 100 km/h em 11,2 segundos e 400 metros em 17,9 s, e a pior medição (12,6 e 20,1 s) veio justamente em Power.
Os melhores valores estão próximos aos do Honda Civic EXL de 2,0 litros, que fez em 11 e 17,9 s, na mesma ordem. A proximidade ao Civic, que produz 155 cv com álcool e pesa 109 kg a menos, revela a eficiência do conjunto do Prius, pois a Toyota estima que seus motores em operação combinada forneçam apenas 123 cv. Como sabemos, os dois motores não atingem potência máxima ao mesmo tempo, o que daria belos 170 cv.
O vidro traseiro duplo é adotado para melhor posicionamento do defletor traseiro, que exerce grande função na redução do coeficiente aerodinâmico (Cx) por quebrar os vórtices
Tanto a divisão entre os vidros quanto as lanternas traseiras fazem o papel de defletor, uma vez que criam um grande espaço para que a quebra dos vórtices aconteça
Mesmo a velocidade máxima divulgada em outros países (no Brasil é omitida) mostra variação entre 165 e 180 km/h, um tanto baixa para um carro de 123 cv com excelente aerodinâmica (Cx 0,24). No hipotético uso em uma Autobahn alemã sem limite de velocidade, se o motorista mantivesse o tempo todo o pé no fundo, uma vez que se esgotasse a carga das baterias se contaria apenas com o motor a combustão de 98 cv para continuar tocando o carro.
O Cx um tanto baixo se deve tanto a medidas para reduzir o arrasto, como a carenagem sob o motor, quanto ao desenho peculiar do Prius. A traseira com vidro duplo é um dos motivos da eficiência aerodinâmica, pois a divisão criada entre os vidros na verdade serve para alojar um grande defletor. As lanternas fazem a mesma função, pois tanto elas quanto o defletor criam um degrau que ajuda a quebrar os vórtices na traseira e diminui o arrasto aerodinâmico. E a quebra dos vórtices é facilmente notada quando se está em velocidade na chuva: a seção inferior e vertical de vidro fica suja, enquanto a superior se mantém limpa sem a necessidade de ligar o limpador.
Interessante foi notar que a variação de desempenho não foi, em nenhum momento, relacionada à carga das baterias: sua temperatura de trabalho é certamente o fator mais importante para o sistema decidir quanta potência pode ser usada. Afinal, como já mencionamos, se um celular comum esquenta ao ser carregado com potência de 5 a 10 W, imagine no caso do motor elétrico que seria capaz de “sugar” até 53.000 W. Talvez baterias com refrigeração líquida pudessem liberar mais energia e evitar tal variação, mas isso acarretaria um sistema mais complexo e caro. Também notamos que o motor a combustão chega à rotação de potência máxima (5.200 rpm) só depois de 135 km/h, após a rampa de ganho de rotação mostrada a seguir.
Como o gráfico demonstra, não há trocas de marchas no sistema do Prius. Apesar de também ser considerada de variação contínua (CVT), sua transmissão difere do tipo convencional: em vez de usar um sistema de polias e correias, toda a transmissão é controlada pelo sistema elétrico, o que detalharemos melhor na próxima semana com vídeo e fotos das bancadas da Uninove.
Sua melhor aceleração ter ficado próxima à do Honda Civic EXL de 2,0 litros e 155 cv, que pesa 109 kg a menos, revela a eficiência do conjunto do Prius
O carro oferece botão para desligar o controle de tração, só até 60 km/h, mas não o de estabilidade. Este último se mostrou bem calibrado, com atuação bem rápida (baixo tempo de resposta) e não muito intrusivo, permitindo até certo abuso antes de atuar. Ainda que não seja o propósito do Prius, sua capacidade de fazer curvas surpreendeu, graças ao bom equilíbrio de massa entre os eixos e à suspensão multibraço na traseira. Com comportamento neutro e pouca inclinação da carroceria, consegue-se entrar em curvas e desgarrar tanto a frente como a traseira conforme o comando do motorista, até o ponto em que o controle eletrônico entra em ação. Os pneus estreitos para seu porte e de perfil alto (195/65 R 15) não impediram bom número de aderência lateral: 0,88 g, não muito abaixo do obtido pelo Corolla XEi com pneus 215/50 R 17, que foi de 0,92 g.
O sistema de freios revelou-se bem adequado ao carro, sem deficiências ou mesmo tendência ao superaquecimento. Contudo, em certas situações cabe melhor refinamento no acerto eletrônico do sistema antitravamento (ABS). Em vias com irregularidades, dependendo do tamanho e da altura dos desníveis, as rodas tendem a uma pequena diferença de rotação que o sistema pode considerar como possível travamento. É comum, na adaptação dos projetos a países com piso de baixa qualidade como o nosso, permitir-se maior variação de rotação nesses primeiros instantes para que não haja atuação indevida do ABS, que pode aumentar a distância de frenagem.
Pneus 195 de perfil alto não impedem que o Prius se comporte bem em curvas, mas a calibração eletrônica do ABS e da assistência adicional de freios pode melhorar
Outra situação está ligada à função de assistência adicional, pela qual o sistema eleva a pressão de frenagem na linha ao perceber que uma situação de emergência, em função da velocidade e da pressão aplicada. É uma estratégia muito útil no caso de motoristas de mais idade e/ou pequena estatura, que às vezes não conseguem aplicar “no susto” a força necessária ao pedal — só que o sistema precisa diferenciar uma emergência de uma tocada mais esportiva. No Prius, é comum ele interpretar a segunda condição como se fosse a primeira.
Como exemplo, ao chegar mais rápido à curva e pressionar o pedal de freio para reduzir velocidade com mais intensidade (por volta de 50% do máximo que se conseguiria), o sistema entende como emergência e aplica uma pressão excessiva aos freios, que sem muito esforço levam a travamento de rodas e acionamento do ABS. Então o motorista rapidamente alivia a pressão do pedal, mas em alguns casos o sistema aumenta mais ainda a assistência, supondo que por algum motivo o motorista perdeu a força da perna. Enfim, quanto mais esportiva for a tocada, mais difícil de se dosar os freios desse carro.
O uso da semana foi restrito ao uso urbano pela grande São Paulo. Seu consumo geral foi de 22,9 km/l em 629 km. A melhor marca ocorreu como na semana passada: trecho de 12 km pela Marginal Pinheiros e com descida antes de chegar ao trecho de velocidade mais alta, o que permitiu carregar as baterias para rodar praticamente apenas com o motor elétrico. Chegamos assim à incrível marca de 33,3 km/l (seu melhor consumo desde o começo do teste) com média de velocidade de só 22 km/h. O indicador do painel marcou que em 80% do trecho usou apenas o motor elétrico. O pior consumo foi numa volta pelo bairro de 5 km com 11 km/h de média, na qual fez 10,5 km/l.
Interior e rodar confortáveis e baixo nível de ruído têm feito dele um carro interessante em sua faixa de preço, mesmo para quem não se importa com consumo
Interessante notar que, sempre depois de um consumo menos favorável do Prius (pois o motor a combustão tem de funcionar para carregar as baterias), o trecho seguinte vem com um consumo muito bom por ter a bateria carregada. Também se nota que em certas situações o motor a combustão liga e fica funcionando, mesmo com as baterias carregadas, e a indicação do painel não mostra energia saindo do motor a gasolina para carregá-las.
Provavelmente, o sistema liga o motor a combustão para mantê-lo aquecido para eventual necessidade de recarregar as baterias. Isso não só favorece o consumo, como mantém o catalisador acima de 300°C para que possa converter os gases nocivos, já que frio ele não converte nada. Também acreditamos haver alguma estratégia em função da temperatura do óleo lubrificante do motor, para que o combustível que foi raspado pelos anéis para o cárter não o degrade. A partir de 60°C o combustível que contaminou o óleo começa a evaporar pelo sistema de respiro do motor.
O Prius parte agora para sua reta final. Na próxima semana teremos os vídeos da habitual análise técnica em oficina e da exposição de seu trem de força no laboratório da Uninove. Não perca.
Semana anterior
Terceira semana
Distância percorrida | 629 km |
Distância em cidade | 629 km |
Distância em rodovia | – |
Consumo médio geral | 22,9 km/l |
Consumo médio em cidade | 22,9 km/l |
Consumo médio em rodovia | – |
Melhor média | 33,3 km/l |
Pior média | 10,5 km/l |
Dados do computador de bordo com gasolina |
Desde o início
Distância percorrida | 1.690 km |
Distância em cidade | 1.267 km |
Distância em rodovia | 423 km |
Consumo médio geral | 21,8 km/l |
Consumo médio em cidade | 22,3 km/l |
Consumo médio em rodovia | 20,2 km/l |
Melhor média | 33,3 km/l |
Pior média | 9,2 km/l |
Dados do computador de bordo com gasolina |
Preços
Sem opcionais | R$ 125.450 |
Como avaliado | R$ 125.450 |
Completo | R$ 125.450 |
Preços sugeridos em 26/11/18 |
Ficha técnica
Motor a combustão | |
Posição | transversal |
Cilindros | 4 em linha |
Comando de válvulas | duplo no cabeçote |
Válvulas por cilindro | 4, variação de tempo |
Diâmetro e curso | 80,5 x 88,3 mm |
Cilindrada | 1.798 cm³ |
Taxa de compressão | 13:1 |
Alimentação | injeção multiponto sequencial |
Potência máxima | 98 cv a 5.200 rpm |
Torque máximo | 14,2 m.kgf a 3.600 rpm |
Motor elétrico | |
Potência | 72 cv |
Torque | 16,6 m.kgf |
Potência combinada | 123 cv (estimada) |
Transmissão | |
Tipo de caixa | automática de variação contínua |
Tração | dianteira |
Freios | |
Dianteiros | a disco ventilado |
Traseiros | a disco |
Antitravamento (ABS) | sim |
Direção | |
Sistema | pinhão e cremalheira |
Assistência | elétrica |
Suspensão | |
Dianteira | independente, McPherson, mola helicoidal |
Traseira | independente, multibraço, mola helicoidal |
Rodas | |
Dimensões | 15 pol |
Pneus | 195/65 R 15 |
Dimensões | |
Comprimento | 4,54 m |
Largura | 1,76 m |
Altura | 1,49 m |
Entre-eixos | 2,70 m |
Capacidades e peso | |
Tanque de combustível | 43 l |
Compartimento de bagagem | 412 l |
Peso em ordem de marcha | 1.400 kg |
Desempenho e consumo | |
Velocidade máxima | ND |
Aceleração de 0 a 100 km/h | ND |
Consumo em cidade | 18,9 km/l |
Consumo em rodovia | 17,0 km/l |
Dados do fabricante; consumo de gasolina conforme padrões do Inmetro; ND = não disponível |