O 147 não era potente, mas combinava agilidade no trânsito a uma ótima estabilidade
Apesar da baixa potência, que limitava sua velocidade máxima a cerca de 135 km/h, o 147 era ágil no trânsito urbano e consumia pouco — demonstrou ser o mais econômico nacional durante vários anos. Num teste feito pela fábrica na ponte Presidente Costa e Silva, que liga o Rio de Janeiro a Niterói, RJ, o pequeno Fiat precisou de menos de um litro de gasolina para cobrir os 14 quilômetros de extensão. Em outro teste pouco convencional, desceu os 365 degraus da escadaria da igreja da Penha, no Rio, com as suspensões trabalhando bem. Os testes apareceram em comerciais de TV que deram o que falar.
O Fiat nacional trazia moderna suspensão independente McPherson nas quatro rodas, a dianteira com molas helicoidais e a traseira com feixe transversal de molas semielípticas: era a primeira vez em que se usava esse conceito na parte posterior de um carro nacional. Os pneus radiais, únicos na categoria, vinham em rodas de 13 polegadas.
Na avaliação do jornal O Estado de S. Paulo, “os mais importantes detalhes do 147 são o espaço interno e a estabilidade. Quatro pessoas ficam folgadas e há espaço para a cabeça mesmo para as mais altas. Ao contrário de muitos carros de tração dianteira, não apresenta problemas quando é acelerado em curvas. O motor garante um bom desempenho. Entretanto, para dirigi-lo bem é importante que o motor não caia de rotação. No conjunto, o carro é muito fácil de manejar”.
Ao contrário do italiano, nosso Fiat já começou com a prática terceira porta; na versão GL (à direita), encostos de cabeça, painel superior e outros cuidados
Em outra análise pelo renomado jornalista José Luiz Vieira, o Estado confirmou as qualidades: “Muito econômico, estável, bastante esportivo em estradas tortuosas. Em curvas longas ou curtas, em frenagens ou acelerações, o 147 porta-se muito bem. Motor extraordinário em projeto e execução. Sobe de giros com imensa facilidade, mantém sua rotação máxima indefinidamente e faz tudo isso sem gastar muito. Caixa de mudanças, direção e freios poderiam ser melhorados”.
“Muito econômico, estável, bastante esportivo em estradas tortuosas, motor extraordinário”, elogiou um renomado jornalista
A revista Quatro Rodas colocou-o frente a frente com o Chevette Especial 1,4, que foi melhor em consumo, transmissão, freios e nível de ruído, mas perdeu para o 147 em estabilidade, estilo e porta-malas: “O Fiat ganha nas curvas: é o mais estável entre os carros nacionais. Ele leva as vantagens de ser uma novidade, ter preço inferior e espaço interno um pouco maior. O Chevette oferece a maior economia de combustível, fator que acaba superando essas diferenças”.
Outra comparação da revista foi com o Volkswagen 1300 L: “Como 80% da área do Fiat são aproveitáveis, ele leva o dobro da bagagem do 1300, mas o VW tem bancos mais confortáveis. O Fiat tem ótima estabilidade, ao contrário do VW, que oscila sob o efeito de ventos laterais. O Fiat é melhor em consumo [média de 13,5 km/l ante 12 km/l], desempenho [de 0 a 100 km/h em 18,8 segundos contra 38,3 s] e segurança. O Fusca vence nos benefícios da ampla rede de assistência técnica e na mecânica robusta, que já ganhou confiança. Além disso é mais barato”.
Para trabalho: a Furgoneta, sem banco ou vidros traseiros, conceito comum na Europa
Aos poucos os consumidores começaram a gostar do simpático e funcional Fiat, e as vendas não demoraram a subir. O auge se deu no fim da década de 1970 e no começo da de 1980, quando chegou a superar o Fusca e o Brasília em vendas por algum tempo. A linha logo crescia: para 1978 ganhava as versões básica (mais simples que a L), GL (mais luxuosa) e a Furgoneta, um furgão com o mesmo formato de carroceria, mas que não tinha os vidros laterais traseiros, o da terceira porta nem o banco de trás.
Era uma versão rústica, usada por empresas e frotistas, em um conceito muito usado na Europa até hoje, mas que sempre foi raro no Brasil — além da Fiat, apenas a Volkswagen ofereceu algo similar nos anos 80, o Gol Furgão. O 147 GL contava com encostos de cabeça nos bancos dianteiros, revestimento aveludado, painel com instrumentos redesenhados e marcador de temperatura do motor, novo volante e cobertura no porta-malas.
As novidades do GL agradaram à revista Auto Esporte: “Revelando bom gosto na decoração interior e com um painel diferente e sofisticado, a versão se destina a uma faixa de público mais exigente. Apesar do acabamento e da melhor vedação acústica, o som do escapamento ainda se faz ouvir um tanto alto. O novo volante tem empunhadura excelente. Sua estabilidade em curvas e seu comportamento correto fazem dele um carro seguro, gostoso de dirigir”.
Próxima parte
Na Europa
Embora o 127 italiano não tenha rendido tantas opções de carrocerias quanto o 147 brasileiro, foi bastante variado em opções mecânicas. Lançado em 1971 com duas portas, usava motor de 900 cm³ e 47 cv. Logo vinha a terceira porta, que o nosso teria como padrão. Um quatro-portas aparecia em 1975. Grade dianteira, janelas laterais e lanternas traseiras estavam entre as diferenças visuais para o 147.
Frente e traseira eram remodeladas em 1977, quando surgia o motor de 1,05 litro exportado por Betim; a versão Sport (à direita), no ano seguinte, obtinha 70 cv com carburador duplo. A linha incluiu o furgão Fiorino, a Panorama e o 127 Rustica brasileiros (leia quadro na página 1), mas não a picape, tipo de veículo de aceitação restrita por lá.
A linha 1982 ganhava para-choques envolventes de plástico e nova frente, que inspiraria a de nosso Spazio. O Sport 1300 GT vinha com 75 cv, mas o 127 D (que logo receberia o visual do Spazio) e a Panorama continuavam diferentes dos demais por serem enviados do Brasil. Embora o Uno aparecesse com 1983 com a proposta de sucedê-lo, o 127 manteve-se em linha até 1987 e acumulou 3,8 milhões de unidades.
Na Espanha a Seat — que fabricou Fiats sob licença antes de se associar à Volkswagen alemã — produziu o 127 com sua marca, incluindo variações inexistentes aqui ou na Itália, como quatro e cinco portas e motor de 1.000 cm³. Renomeado Fura (à esquerda) em 1983, o 127 espanhol chegou a ter a versão esportiva Crono com motor de 1,45 litro e 75 cv. Saía de linha após dois anos.
Também espanhola, a empresa Emelba fez furgão e picape com o nome Póker (à direita) baseando-se nesse Seat, com frente diferente dos brasileiros e caçamba mais longa atrás do eixo traseiro. O pequeno jipe Samba (similar ao 127 Scout feito na Itália pela fábrica de carrocerias Rayton Fissore) e um protótipo de 127 reestilizado, o Elba, foram outras criações dela. Na Iugoslávia a Zastava, que também fazia Fiats licenciados, usou o 127 como base mecânica para o Yugo, que chegou a ser vendido em quantidade nos Estados Unidos.
A assistência técnica
Para suprir a carência inicial de concessionárias — as operações no Brasil começaram com 50 —, a Fiat tomou medidas inovadoras. A primeira foi uma frota de carros assistenciais: eram 147 adaptados para carro-oficina, com manuais de reparação, peças para emergência e ferramentas, que circulavam por todo o País para o treinamento de mecânicos das concessionárias. Também atendiam a clientes parados nas ruas com problema mecânico, muito antes que esse serviço se tornasse habitual na indústria.
Os motoristas eram técnicos-mecânicos, treinados para essa função. A operação produziu resultados positivos. O mesmo havia sido realizado pela Volkswagen nos anos iniciais nos Estados Unidos, quando Kombis-oficinas — dirigidas por alemães que mal falavam inglês — davam a mensagem do novo e estranho carro naquelas paragens.
Outra medida, que já não deu tão certo por falta de compreensão pelos próprios concessionários, foi a criação dos Pontos Assistenciais Fiat. Tratava-se de oficinas independentes e multimarca destinadas a prestar assistência a carros da marca, nomeadas pela concessionária da região, que fornecia peças, ferramentas especiais e literatura técnica. A Fiat imaginava com isso espalhar rapidamente por todo o território nacional centenas de pontos de serviço.
A empresa foi pioneira também na implementação de um serviço de atendimento ao cliente de fabricante nacional de automóveis, em 1980. O serviço foi criado nas bases do Ci Pensa Fiat (Pensa-se em Fiat) da Itália, o que incluiu o envio de funcionários aos Estados Unidos para treinamento sobre relações com consumidores.
Bob Sharp