O Boss 302 vinha com 290 cv no motor de 4,95 litros e visual mais esportivo;
para quem quisesse mais, o Boss 429 (em vermelho) chegava a 375 cv
Se a intenção fosse adquirir um puro-sangue, o Mach 1 era a melhor pedida. Vendido apenas como fastback — ou SportsRoof, como chamava a Ford —, era oferecido com motores de 5,8, 6,4 e 7,0 litros. Seu visual mais encorpado e intimidador que o do modelo básico incluía capô pintado de preto, ornado com uma tomada de ar e pinos externos de trava como opção. A faixa preta que cortava a lateral vinha com a inscrição Mach 1 próxima ao para-lama dianteiro. Por dentro, oferecia novos bancos com encosto de cabeça e acabamento esportivo.
O chefe
Apesar de toda a gama de versões, o fabricante de Dearborn precisava de um carro para competir com o Camaro Z/28 nas disputas do SCCA (Sports Car Club of America, clube de carros esporte da América). Convocou Larry Shinoda, que trabalhava para a GM, e foi então que surgiu o Mustang 302 Boss (chefe em inglês). Ainda mais intimidador que o Mach 1, ele trazia persianas no vidro traseiro semelhantes às do Lamborghini Miura, defletores dianteiro e traseiro e capô preto que garantiam a imponência. As entradas de ar laterais foram retiradas.
O motor era o V8 de 4,95 litros preparado para 290 cv. Outra opção era o 429 de bloco grande, 7,0 litros e 375 cv, aplicado pela primeira vez ao modelo, o que exigiu extensas modificações. Montado pela Kar Kraft, empresa de Brighton, Michigan, o Boss 429 vinha com para-lamas alargados, rodas de 7 pol de tala e interior requintado, mas não oferecia ar-condicionado ou câmbio automático. Sua versão destinada às competições da Nascar podia chegar a 500 cv, um absurdo para a época. Caros, a Ford colocou nas ruas 1.628 unidades com motor 302 e 859 com o 429, o que garantiu a homologação para as competições nas duas categorias.
“Carro de macho”? Não só: Connie Kreski, garota da Playboy de 1969, ganhou
um GT 500 rosa com a nova frente do Shelby, diferente do Mustang comum
Testado pela revista Hot Rod, o Boss 302 convenceu: “É um carro excepcional, comparando-se ao Camaro Z/28. É o carro de melhor comportamento que a Ford já fez, o que por si só já o torna válido. O 302 V8 rivaliza muitos blocos grandes em desempenho e versatilidade, tanto dentro quanto fora das pistas. A Ford fez o melhor trabalho possível com um ‘carro musculoso’ que serve para rua e competição, sem grandes alterações exigidas para a transição”.
Para 1971 a traseira vinha mais próxima
da horizontal no fastback, o que lhe rendia o
apelido de flatback ou traseira plana
A esse tempo a Ford já havia assumido total controle das operações da Shelby, que em 1969 apresentava uma renovação visual, com frente bastante diferenciada dos Mustangs convencionais. O GT 350 agora vinha com um V8 de 351 pol³ (5,75 litros), mas os dias dessas versões especiais estavam contados. Carroll, insatisfeito com o projeto desde as mudanças de 1966, queria deixar o empreendimento — e a Ford estava perdendo o interesse, pois o lançamento dos Boss 302 e 429 havia criando uma competição interna. O carisma dos carros de Shelby fez com que sobrevivessem até 1970.
Nesse ano, o Mustang perdia dois de seus faróis e as entradas de ar laterais eram abolidas de todos os fastbacks. O 302 Boss e o Mach 1 eram as versões de topo da linha — o primeiro custava US$ 9 mil, três vezes o preço da versão básica. As mudanças de estilo deram um novo fôlego ao Boss, que nesse ano ganhava outro adversário, o Dodge Challenger. Apesar de todas as opções do Mustang, as vendas estavam em queda.
O Mustang 1971 estava ainda mais longo e largo, com traseira quase horizontal;
ao lado do Mach 1 (em cima) estava o Boss 351, agora com o V8 de 5,8 litros
Lee Iacocca fora eleito presidente executivo da Ford Motor Company e Henry Ford II assumia a presidência do conselho. Nada mais justo: afinal, a criação de Iacocca era uma mina de ouro. Contudo, mesmo tendo se tornado um ícone e recebido duas reestilizações, aos sete anos o Mustang já sofria o peso da idade. Suas linhas angulosas estavam defasadas e precisavam de uma reformulação geral. Baseado no conceito Milano (leia boxe na página anterior), o Mustang 1971 ganhava um desenho que nada tinha a ver o antigo.
A frente trazia dois faróis e a traseira vinha mais próxima da horizontal no fastback, o que lhe rendia o apelido de flatback (traseira plana), enquanto o cupê trazia o vidro posterior em recesso entre as colunas. Com mais 7,5 cm de largura, mediam 17 cm a mais nessa dimensão que o primeiro Mustang. Os 4,75 metros de comprimento indicavam que o carro havia crescido demais, o que não agradava aos admiradores do modelo original. Por dentro, o painel redesenhado abandonava a impressão de dois postos de direção.
A opção de motores continuava vasta: um seis-cilindros de 4,1 litros e 145 cv e os V8 de bloco pequeno com 4,95 litros (210 cv) e 5,8 litros (240 e 285 cv, de acordo com a versão). O Cobra Jet e o Super Cobra, equipados com o gigante 429, despejavam 370 e 375 cv, na ordem. Já o 302 e o 429 Boss davam lugar ao 351 Boss de 5,75 litros e 330 cv, produzido em apenas 1.800 unidades. A reformulação não conteve a queda das vendas, que fecharam com índice menor que o ano anterior. Era a pior fase do Mustang, com volume 75% menor que no recorde de 1966.
O luxuoso Mustang Grandé (marrom) convivia com os esportivos Sprint (em
branco) e Mach 1 (em azul); o amarelo de 1973 mostra o formato hardtop
Os anos seguintes trariam ainda mais problemas. Com a crise do petróleo em 1973, provocada pelo embargo da Opep (organização dos países exportadores de petróleo), e a legislação sobre emissões poluentes, os motores passaram a minguar. O controle de poluição eliminou o chumbo tetraetila — altamente poluente — da gasolina, o que reduziu sua octanagem e exigiu que os motores tivessem a taxa de compressão diminuída, com reflexo direto no desempenho. Parte da redução de potência, apenas teórica, devia-se à adoção em 1972 de valores líquidos, em média 35% inferiores aos brutos divulgados até então.
Como exemplo, o motor 4,1 de seis cilindros, que até 1971 tinha 145 cv brutos, teve uma queda brusca da taxa de compressão e passou a oferecer apenas 98 cv líquidos. O V8 351 Cobra Jet caía de 285 cv brutos para 200 cv líquidos. A fase áurea dos “carros musculosos” havia sido sepultada. À crise do petróleo e às normas de emissões somava-se a campanha das seguradoras, que elevavam os custos de seguro desses carros muito potentes e nada primorosos em comportamento dinâmico.
No último ano daquela geração, 1973, o Mustang pouco mudou: ganhava para-choque dianteiro capaz de absorver impactos de baixa velocidade sem danos, como exigia a lei, o que acrescentou outros 10 cm a seu comprimento. Com o anúncio de que aquele era o último ano para o conversível, essa versão e o próprio Mustang tomaram certo fôlego nas vendas.
Mudança radical: o Mustang II chegava em 1974 bem menor e mais leve, com
carrocerias cupê e hatchback e motores bem modestos, sem opção V8
Mustang econômico
Diante do cenário desfavorável aos “musculosos”, a Dodge deixava de produzir o Charger e o Challenger, pois não fazia mais sentido um carro esporte incapaz de um desempenho à altura. Em vez de aposentar o Mustang, porém, Ford apresentava em agosto de 1973 uma completa reformulação de estilo em seu pônei, tornando-o pacato e insosso. Batizado de Mustang II, o modelo 1974 apelava para o conforto, seu interior era sofisticado e a publicidade fazia questão de enaltecer esses atributos.
O desenho era desanimador, com linhas retas que o assemelhavam muito a sedãs médios daquela época que não deixaram saudades. Havia duas carrocerias: um cupê três-volumes, que obteve maior aceitação, e um hatchback de três portas. O acabamento Ghia vinha apenas como cupê, e o mais esportivo Mach I, só no hatch. Ao adotar a plataforma do compacto Ford Pinto, o Mustang II encolheu: os antigos 2,74 metros de entre-eixos se tornavam 2,44 m e o comprimento caía para 4,44 m. Da primeira versão sobrara apenas o emblema do cavalo: toda a mecânica era baseada na do Pinto.
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