Duradouro na primeira geração, o topo de linha da marca britânica soube se reinventar para os novos tempos
Texto: Francis Castaings e Fabrício Samahá – Fotos: divulgação
O automóvel mais longevo da famosa marca britânica Jaguar começou a nascer em 1962. Bem-sucedida com sua variada linha de sedãs do período, que incluía o grande Mark X e os menores Mark 1/Mark 2 e S-Type, a empresa do felino decidia substituí-los por um único modelo. Seis anos depois, em 26 de setembro de 1968, era apresentado o XJ6. Projetado pelo fundador da empresa Sir William Lyons (1901-1985), o sedã de quatro portas misturava linhas modernas e clássicas. Muito atraente, foi talvez o sedã mais bonito da década.
Sua estrutura monobloco era uma das primeiras a adotar deformação progressiva em caso de impacto para maior proteção dos ocupantes. O carro media 4,81 metros de comprimento, 1,77 m de largura, 1,35 m de altura e 2,77 m de distância entre eixos e pesava 1.560 kg. Na frente destacavam-se a grade cromada com o símbolo do felino selvagem sobre ela e quatro faróis circulares. A identificação com a marca era clara, sobretudo com o Mark X, apesar de romper com o desenho dos demais antecessores.
Elegante, equilibrado, o XJ6 é visto como um dos sedãs mais bonitos dos anos 60
Por dentro o XJ6 era muito bem-acabado, uma tradição da fábrica. Misturava esportividade e elegância com madeira nobre abundante e bancos dianteiros (reclináveis) e traseiro muito confortáveis. Um automóvel para pessoas exigentes, que gostavam de frequentar a primeira classe. O painel esbanjava instrumentos: atrás do volante de dois raios, com arco metálico para o acionamento da buzina, ficavam conta-giros e velocímetro e ao centro mais cinco mostradores, como voltímetro e manômetro de óleo. Havia ajustes de altura do banco e de distância do volante.
Com o XJ de 12 cilindros e sua versão para a Daimler, o Double Six, a Jaguar alcançava o patamar dos mais sofisticados sedãs do mundo
O XJ6 usava os motores iniciados com a linha de esportivos XK, com seis cilindros em linha e duplo comando de válvulas no cabeçote de alumínio. A inédita versão de 2,8 litros, alimentada por dois carburadores horizontais, desenvolvia potência de 149 cv e torque de 25,1 m.kgf, suficientes para velocidade máxima de 185 km/h — uma opção modesta, destinada a países com tributação mais pesada a motores de alta cilindrada. Também estava disponível o motor de 4,2 litros, 186 cv e 39,2 m.kgf herdado do Mark X 420, de arquitetura antiga, mas que garantia robustez e permitia alcançar 204 km/h.
Em ambos a transmissão era manual de quatro marchas, com alavanca no assoalho, e havia opção pela dotada de caixa overdrive Laycock de Normanville. A tração era traseira. O XJ6 usava suspensão independente com subchassis em ambos os eixos, pneus E70 VR 15, caixa de direção por pinhão e cremalheira e freios a disco nas quatro rodas (os traseiros do tipo interno, próximo ao diferencial) com duplo circuito e assistência. Havia dois tanques de combustível com capacidade total de 105 litros e bocais de abastecimento sobre os para-lamas traseiros.
Muito couro e madeira, fartos instrumentos, bancos reclináveis: o requinte do XJ6
A revista inglesa Classic & Sports Car relembrou em 2015 o êxito do modelo: “Era um símbolo de status acessível para as classes médias. Você poderia pagar duas ou três vezes seu preço e não obter algo tão supremamente capaz, pois o XJ6 era um milagre de refinamento de lã de algodão e supressão de ruídos, que reconciliava os conflitantes requerimentos de conforto e estabilidade com mais sucesso que qualquer carro no mundo”.
A chegada do V12
As vendas não demoraram a decolar. O XJ6 agradou pela sofisticação externa e interna, conquistando adeptos tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. Os concorrentes na época eram o também inglês Rover P6 3500 e os alemães BMW 2500 e 2800, Mercedes-Benz 300 SEL e Opel Diplomat. A versão para a Daimler, outra marca do grupo, vinha em outubro de 1969: mais luxuoso, o Sovereign trazia para-lamas mais largos e grade diferenciada. Uma transmissão automática Borg-Warner era oferecida para os modelos de 4,2 litros em dezembro seguinte.
Passo decisivo para a consagração do sedã era dado em julho de 1972 com o XJ12, a versão de 12 cilindros em “V”. O motor de 5,35 litros, adotado no ano anterior no esportivo E-Type, tinha bloco de alumínio, comando simples e quatro carburadores para fornecer 250 cv e 41,6 m.kgf. Com o dobro de cilindros, o desempenho exuberante era sua marca: acelerava de 0 a 100 km/h em 7,9 segundos e alcançava 225 km/h, marcas muito respeitáveis para um sedã de 1.870 kg e capazes de rivalizar com vários esportivos. A caixa automática passava a ser de série, assim como pneus 205/70 R 15. Por fora era percebido um ressalto sobre o capô e, ao centro da grade, a indicação de um grande “V” com a palavra Twelve indicando o número de cilindros.
Com o motor V12 de 250 cv do esportivo E-Type, o XJ12 alcançava 225 km/h
A versão Daimler Double Six (duplo seis) Vanden Plas, apresentada dois meses depois, tinha poucas diferenças externas como a grade. Assim como o XJ12, era oferecida em comprimento normal ou com chassi 10 centímetros mais longo e entre-eixos de 2,86 m. Com esses automóveis a Jaguar alcançava o patamar dos mais sofisticados sedãs do mundo, mas problemas de estrutura de carroceria, baixa resistência à corrosão, falhas em componentes elétricos e deficiências de acabamento estavam manchando a carreira do carro.
“Foi o motor V12 que deu ao XJ o refinamento total que ele merecia”, conta a Classic & Sports Car. “Era o primeiro carro de passageiros de 12 cilindros de produção em massa desde os dias do Lincoln Zephyr norte-americano e, de certa forma, ridiculamente supraqualificado para as condições vigentes no começo dos anos 70 com sua velocidade máxima. Sem esforço, ele superou os oponentes de oito cilindros em termos de suavidade e potência, mesmo custando pouco mais que o XJ 4.2″.
Próxima parte
Nas telas
Há grande quantidade de sedãs XJ no cinema, sobretudo os modelos das décadas de 1960 a 1980. Da série inicial merecem destaque os XJ6 da comédia australiana A Grande Trapaça (The Big Steal, 1990), da ação inglesa Sweeney 2 (1978), da comédia italiana Per Amare Ofelia (1974), do filme de terror norte-americano Silent Night, Bloody Night (1974), do suspense francês Traficante do Sexo (Le Protecteur, 1973), do policial ítalo-francês Juste Avant la Nuit (1971), da comédia britânica Carry on Behind (1975) e da ação francesa L’Héritier (1973). Um desses carros é destruído na ação Zero Tolerance (EUA, 1994). Ainda da primeira série são os XJ12 da ação Death Machines (EUA, 1976) e da comédia Le Farò da Padre (Itália, 1974).
Modelos da segunda série têm presença digna de nota no drama Trágica Obsessão (Obsession, EUA, 1976), no policial Na Caçada da Noite (The Long Good Friday, Inglaterra, 1980), na comédia La Liceale al Mare con l’Amica di Papà (Itália, 1980), na aventura Running From The Guns (Austrália, 1987) e nos filmes de ação Witness to a Kill (Canadá, 2002), The Octagon (EUA, 1980) e Forced Vengeance (EUA, 1982).
Entre os XJ6 da terceira série, vale mencionar o drama Quando Setembro Chegar (Until September, 1984), a comédia Jogos de Conexão (A Good Man In Africa, 1994) e os filmes de ação Against All Odds (1984), Black Snow (1990), Wicked Game (2002) e Anjos da Noite – Underworld (Underworld, Inglaterra, 2003). E ainda o policial Los Angeles – Caminho para a Morte (American Perfekt, 1997) e várias comédias nos EUA, como Um Peixe Chamado Wanda (A Fish Called Wanda, 1988), Cheque em Branco (Blank Check, 1994), Touch and Go (1986), Like Father Like Son (1987), Out on a Limb (1992) e Death Becomes Her (1992). Na ação inglesa Fórmula 51 (The 51st State, 2001) há um bom racha pelas ruas de Liverpool.
Carros da série XJ40 podem ser vistos na ação Desejo de Matar 5 (Death Wish V: The Face of Death, 1994) e no suspense Sugar Hill (1993), filmes norte-americanos. Da série X300 destacam-se os sedãs dos filmes de ação O Homem Que Sabia de Menos (The Man Who Knew Too Little, EUA, 1997) e Resgate Sem Limites (Belly of the Beast, Canadá, 2003), enquanto um XJ12 aparece no policial Ransom (EUA, 1996). Vale citar ainda o esportivo XJR do drama Poster Boy (EUA, 2004).
Entre as aparições relevantes dos XJ8 e XJR da série X308 estão a ação Sociedade Secreta (The Skulls, EUA, 2000), o drama Destinos Cruzados (Random Hearts, EUA, 1999), o policial O Homem Mais Procurado (A Most Wanted Man, 2014) e as comédias Túmulo com Vista (Plots with a View, Inglaterra, 2002), Sedutora e Diabólica (Mini’s First Time, EUA, 2006) e Um Presente para Helen (Raising Helen, EUA, 2004).
A geração X350 de 2002 também foi numerosa nas telas, como nos filmes de ação Sem Saída (Throttle, 2005), 007 – Cassino Royale (Casino Royale, 2006) e 007 Contra Spectre (Spectre, 2015), nas comédias Simplesmente Amor (Love Actually, Inglaterra, 2003) e A Nova Cinderela (A Cinderella Story, EUA, 2004), no drama sul-coreano Oldboy (2003) e no drama inglês Ponto Final – Match Point (Match Point, 2005). Enfim, modelos da recente geração X351 podem ser vistos nos filmes de ação 007 – Operação Skyfall (Skyfall, 2012), Risco Imediato (Good People, 2014) e Policial em Apuros 2 (Ride Along 2, 2016), que usa um XJR.